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quinta-feira, 1 de março de 2018

A sério que é à séria?

por Autor Convidado

lingua_portuguesa_televisaoIsaac Pereira

É um erro habitual na forma de falar, sobretudo na região de Lisboa, e em especial, ali para os lados da Assembleia da República. Mas a forma de falar também já se transpôs para a escrita. Frequentemente faz a sua aparição nos jornais e nas têvês, e agora também nos sítios "on-line".
Isto sim, é a língua no seu esplendor mais virulento.
A expressão "à séria", possui requintes de modo "chique-burlesco", e é tão risivelmente paroquial e provincial que até faz um asno cantarolar. É uma espécie de modinha ou coisa que o não valha, assim, como dizer, tão "fin de siécle", não achas ó Ramalho Ortigão?

Só escrevo isto para que te previnas. Quando leres ou ouvires alguém dizer que "isto" ou "aquilo" é uma coisa "à séria", passa um raspanete à senhora membrana auricular e, para não chorares, esfrega a retina dos teus meninos olhinhos.

United Stupids of America

United Stupids of America

por João Mendes

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É curioso que a administração norte-americana se empenhe tanto em manter potenciais terroristas afastados do país, usando o pretexto para criar legislação xenófoba, quando luta activamente por manter a vida facilitada aos terroristas que, nascidos e criados em solo americano, decidem metralhar uma escola ou um concerto com uma arma semiautomática. Não, não é nada curioso. É só estúpido. E talvez, mas só mesmo talvez, tenha algo que ver com os vários massacres que acontecem, todos os anos, na land of the free. Ler mais deste artigo

Animais e bestas

por CGP

Como qualquer um que não é funcionário público ou não ganha o suficiente para aceder a hospitais privados sabe, o Sistema Nacional de Saúde está um caos. A dívida a fornecedores continua a aumentar, causando os respectivos problemas de fornecimento. Em Faro, os médicos têm sofrido pressões para dar altas precoces devido à sobrelotação. Em Vila Nova de Gaia, doentes passam dias em macas nas urgências à espera de lugar. Adultos com diabetes continuam sem acesso a bombas de insulina de última geração. Segundo o tribunal de contas, a situação do Sistema Nacional de Saúde é extraordinariamente débil. Perante esta situação, os representantes dos eleitores de Lisbolalaland decidiram recomendar a construção de um novo hospital público... para cães e gatos. No fundo, faz sentido que num sistema de saúde em que se trata pessoas como animais, se comece a tratar animais como pessoas. Segundo a deputada do PAN (que conseguiu convencer todos os malucos que se sentam na Assembleia Municipal, incluindo os do PSD e CDS que já têm experiência suficiente para ter juízo), "os animais têm vindo a assumir uma importância crescente no seio familiar". É verdade. Os animais são baratos, crescem e ficam autónomos mais depressa do que os filhos. Faz todo o sentido não só apadrinhar esta mudança demográfica, como subsidiá-la. Só faltou sugerir que, à falta de dinheiro, se feche a ala pediátrica do Santa Maria para dar espaço ao hospital público veterinário. O próximo passo é transformar as escolas primárias fechadas em centros de dias para animais e dar abatimentos fiscais por cada animal doméstico. Se as pessoas crescentemente substituem filhos por cães e gatos, é normal, na cabecinha desta gente, que o estado vá atrás e subsidie este comportamento. Pelo menos, estas prioridades dão votos.

Ladrões de Bicicletas


A questão europeia

Posted: 28 Feb 2018 11:32 AM PST

Fonte: INE, Contas Nacionais

Se há coisa em que a esquerda tomaria a dianteira à "cultura de compromisso" à direita, era começar a olhar para as contas externas. Para as contas da Balança de Transações Correntes, mas mais em particular para a Balança Corrente.
Por facilidade, os gráficos apenas abordam essa realidade a partir de 1995. Já nessa altura, a economia portuguesa estava entrosada no Sistema Monetário Europeu, com toda a política macroeconómica subordinada à política cambial-monetária europeia, decidida pelo Governo Cavaco Silva e prolongada pelo Governo Guterres, mantendo o escudo português indexado ao marco alemão. Foi a opção europeia. Nessa altura, o nosso défice comercial já era largamente deficitário. E assim continuou após a criação do euro em 2000, até 2010, sem que o saldo positivo da balança de serviços - onde se encontram as receitas de turismo - tivesse evitado essa tendência.

Fonte: INE, Contas Nacionais

A partir de 2010, "miraculosamente", o défice comercial atenua-se. E assim continuou até 2013. Foi o período de intervenção externa, com o devido apoio ideológico do Governo PSD/CDS, de Pedro Passos Coelho/Paulo Portas, tendo Assunção Cristas como ministra. O défice atenuou-se porque o consumo privado foi asfixiado e o investimento privado sofreu a maior queda de que há conhecimento na História recente de Portugal. Mas mal a retoma se iniciou em 2013, os problemas voltaram a revelar-se. Apenas a avalanche de turistas tem compensado o agravamento do défice comercial. E já começa a revelar-se insuficiente...
Se a preços correntes (primeiro grafico), o saldo da Balança Corrente se mostra positiva (Paulo Portas mostrou-se felissíssimo na campanha eleitoral de 2015 com esses escassos valores), já a situação das transações em volume (segundo gráfico) parece revelar melhor as fragilidades presentes.
Há causas para esta situação.
A par de diversos choques externos verificados no início do século passado - aumento das taxas de juro do BCE (1999/2002), rebentamento da bolha dot.com(2000), entrada da China para a OMC (2001), desmantelamento alfandegário da UE face ao exterior (2004), forte apreciação do euro (até 2008), crise internacional..., há uma causa de fundo. E ela está na política seguida desde o início dos anos 90 com a liberalização dos movimentos de capitais, a desregulamentação das actividades financeiras e a privatização das empresas públicas.
Relembro o que se escreveu no livro "A Crise, a Troika e as alternativas" (Tinta da China, Agosto de 2013), de vários autores, alguns deles deste blogue:

Essas opções tenderam "a atrair, de facto, montantes elevados de capital estrangeiro. O grande afluxo de capitais cria condições propícias ao aumento do investimento e do consumo, o que contribui para estimular a economia nacional e atrair mais capitais. Inicia-se, deste modo, um período de rápido crescimento, que se reflecte normalmente num aumento geral dos preços e, nesse sentido, em perda de competitividade dos produtos nacionais nos mercados internacionais. A perda de competitividade deveria conduzir à desvalorização da moeda nacional, permitindo então recuperar alguma competitividade da procura interna face ao exterior. No entanto, as autoridades nacionais estão comprometidas com a política de estabilidade cambial, como parte da sua estratégia de atracção de capitais externos. Assim, estando os preços internos a aumentar e a taxa de câmbio inalterada, os produtores nacionais vão perdendo capacidade de enfrentar a concorrência externa".


A consequência foi a transladação de investimentos para os sectores não transacionáveis (supostamente protegidos), a desvalorização  dos activos nacionais (que são adquiridos ao desbarato e procedendo-se a uma concentração internacional) e a subida da dívida externa, com as consequências que se viu na chamada "crise da dívidas soberanas" (que teve associado um programa cujos efeitos prolongou ainda mais a entrada de capitais externos).
E é isto. Como resolver este constrangimento? De cada vez que se cresce, afunda-se o défice externo. Para o resolver, a solução não está no ajustamento salarial. Não é panaceia e não pode estar em nome da nossa sobrevivência como povo que tenderá a emigrar. E a definhar.
Este devia ser o debate nacional.

A essência do capitalismo selvagem

CRÓNICA

José Miguel Pinto dos SantosSeguir

1/3/2018, 0:07

No fundo, no fundo, o capitalismo “selvagem” é um sistema de cooperação e ajuda mútua entre pessoas livres. E que trás mais prosperidade que qualquer tipo de socialismo, selvagem ou pseudocivilizado

Depois de se fazer um grande negócio tem-se duas opções. Uma é começar a “gozar a vida”, como o homem da parábola que disse “ó alma, tens muitos bens em depósito para largos anos, descansa, come, bebe, regala-te” (Lc 12, 19). A outra é ilustrada pela opção que Kinokuniya Bunzaemon 紀伊国屋文左衛門 (1669—1734) tomou depois da sua viagem cheia de perigos:

“Apesar de o vento ser ainda forte na baía, comparado com o oceano revolto de onde vinham, o mar interior parecia-lhes, como se costuma dizer, ‘liso como um soalho’. Pouco depois do nascer do sol chegaram à frente de Edo e lançaram ancora não muito longe do estuário do Sumida-gawa.

“Por aquela altura, todos os mercadores de frutas, esperavam impacientemente a chegada dos navios com laranjas provenientes da região de Kishū, devido à iminência do Festival dos Foles. Nem o vento, nem as vagas, nem a tempestade, nada os impedia cada manhã de acreditarem que seria nesse mesmo dia que os navios chegariam. Mas o único navio que não desapontou as suas expectativas foi o Navio dos Mortos. Quando foi conhecida a sua chegada, a alegria dos grossistas e armazenistas e merceeiros foi indescritível e rapidamente se começou a entoar pelas ruas e vielas da grande cidade o poema que imortalizou esta grande aventura:

“Sobre o mar tenebroso é avistada
Uma vela, uma vela esbranquiçada.
De onde virá?
Da longínqua costa de Kishū
Trás precioso tesouro,
Laranjas d’ouro.” 

“Como um formigueiro cobre uma laranja aberta, assim os mercadores no seu entusiasmo cobriram o navio, cada um oferecendo mais que o outro por cada caixa. O resultado foi Bunzaemon encaixar nesse dia de mais de cinquenta mil ryō.

“É comum, e apenas natural, que depois de um grande ganho ou vitória uma pessoa anseie por sossego e descanso de modo a usufruir do seu lucro e espólio. É o que se chama ‘gozar tranquilamente da vida.’ Mas não era assim com Bunzaemon. Depois disto ele pensou: ‘A uma batalha segue-se outra. Devido ao persistente vento de oeste que sopra desde há várias semanas nenhum navio terá conseguido navegar de Edo para Osaka. Com certeza que lá haverá escassez de salmão salgado, enquanto aqui a oferta é tão abundante que se pode comprar baratíssimo. Quanto não ganhará o primeiro que consiga levar até lá um carregamento?’

“Quando propôs aos seus homens esta nova ventura todos aceitaram acompanhá-lo. Assim Bunzaemon comprou imediatamente um carregamento de salmão salgado, embarcou-o e pôs-se à espera de vento favorável. Não teve de esperar muito. Ao fim de  poucos dias o vento mudou de repente e uma forte brisa começou a soprar de leste. Aproveitando a primeira aragem o Navio dos Mortos foi o primeiro a sair do porto, enquanto os outros mercadores, menos despachados, ou ainda estavam a embarcar os fardos ou ainda se dirigiam para o mercado para adquirir a mercancia. Após uma viagem de vários dias o Yūrei-maru entrou no porto de Osaka, e também ali Bunzaemon conseguiu um lucro de muitas dezenas de milhar de ryō, de modo que que, quando regressou a Kumano, vinha senhor de uma inaudita soma acima dos cem mil ryō.

“Como Bunzaemon considerava que tinha podido fazer as suas viagens apenas devido aos esforços do capitão Kichidayu remunerou-o principescamente com mil ryō em ouro. A tripulação também foi remunerada tão generosamente que nenhum dos homens podia acreditar na sua boa fortuna.

“Em Kumano, a notícia da sua chegada a Edo tinha sido recebida com muita alegria pelos homens da Daikokuya e por todos os seus vizinhos. Quando Bunzaemon regressou a bordo do Yūrei-maru toda a cidade o foi acolher e oferecer os seus parabéns. A partir desse dia o Mestre da Daikokuya deixou de o acolher como aprendiz, mas passou a tratá-lo como convidado.

“Depois de contar ao seu benfeitor as suas transações e aventuras, Bunzaemon foi ter com os mercadores a quem tinha comprado as laranjas que tinha vendido em Edo e disse-lhes: ‘Agradeço-vos me terdes vendido tão barato as laranjas há uns dias atrás. Obtive um grande ganho com o carregamento que levei até Edo, e não gostaria de ser o único a lucrar enquanto todos vós perdestes dinheiro. Assim gostaria de vos dar agora o dobro do que então vos paguei.’

“Todos ficaram agradecidos com esta não esperada liberalidade, e a sua fama espalhou-se por toda a região de Kii. A partir desse dia não houve quem não conhecesse a sua generosidade e quando Bunzaemon queria investir nalgum produto todas as portas se lhe abriam e ninguém lhe punha dificuldades nas negociações, transações e contratos.

“Pouco tempo depois, Bunzaemon decidiu abandonar a pequena cidade de Kumano e ir viver para a grande cidade de Edo e tornar famoso o seu nome em todo o Império negociando em larga escala. Assim determinado foi-se despedir dos grandes mercadores de Kumano e pediu-lhes que lhe dessem o direito exclusivo de lhes comprar todas as laranjas e madeiras que vendessem para fora da província. Todos eles, sujeitos a uma pesada dívida de gratidão, simpatia e obrigação para com o jovem magnata, aceitaram a proposta de boa vontade e prometeram-lhe manter os seus armazéns em Edo bem abastecidos.

“Assim sucedeu que Bunzaemon se foi estabelecer na freguesia de Hachobori em Edo, quando tinha dezanove anos de idade. Chamou à sua empresa Kinokuniya e tornou-se o maior comerciante de laranjas e de madeira de todo o Japão e todos os dias a sua prosperidade crescia, de modo que ficou a ser conhecido, até hoje, como o Príncipe dos Mercadores.”

É um dos mitos do marxismo que o sucesso nos negócios e a acumulação de fortunas se obtém com exploração, não com cooperação. Bunzaemon sabia melhor: sucesso momentâneo não é verdadeiro sucesso, e para ser continuado em iterações futuras necessita da boa vontade e cooperação dos outros players. Para conseguir essa boa vontade é necessário algo mais do que se ser justo e honesto nas contratações, transações e negócios: é preciso ser-se liberal com as pessoas. No fundo, no fundo, o capitalismo “selvagem” é um sistema de cooperação e ajuda mútua entre pessoas livres. E que beneficia mais toda a sociedade e trás mais prosperidade que qualquer tipo de socialismo, selvagem ou pseudocivilizado.

Professor de Finanças, AESE Business School