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terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Três anos, dez meses, 28 dias

Tiago Freire
Tiago Freire | tiagofreire@negocios.pt 21 de fevereiro de 2017 às 00:01

São apenas 31 dias no cargo, mas os suficientes para que tenha sido criado um contador decrescente que marca a data da sua (eventual) saída. Se não for reeleito, faltam três anos, dez meses, 28 dias e qualquer coisa.

Trump, honra lhe seja feita, está a ser extraordinariamente fiel a si próprio e ao que apresentou durante a campanha eleitoral. A surpresa, para muitos, é que o violento choque com a realidade não tenha sido suficiente para moldar, mesmo que vagamente, o homem mais poderoso do mundo.
O Presidente está a ser, no cargo, o que sempre foi: infantil, precipitado, manipulador, mentiroso, misógino e egoísta. Quando, numa reveladora birra, ataca os tribunais e a imprensa por não agirem como ele quer, é a sua total ausência de espírito democrático que fica bem à mostra. Em termos simples, não é uma pessoa que o mundo possa desejar como líder dos EUA.
Acontece que o mundo não vota para essa eleição, que Donald Trump ganhou muito à sua maneira, contra a opinião publicada de praticamente toda a gente que conta (ou contava) na formação da opinião pública. Os Estados Unidos, esse bicho mutante, complexo e fascinante, é capaz disto e do seu contrário.
Dito isto, Wall Street explode. Os mercados não têm moral, mas mesmo em termos egoístas não é fácil perceber a euforia.
A desregulação da banca e os cortes de impostos deverão suportar uma aceleração económica no curto prazo. Bem como a aposta em obras públicas. No entanto, e são já vários os analistas que para isso alertam, no médio prazo a receita de Trump não tem qualquer sustentabilidade. E trará défices maiores nas contas públicas e uma explosão da dívida.
Perseguir os imigrantes significa aumentar brutalmente os custos da mão-de-obra nos EUA; da mesma forma que o preço dos bens crescerá, quando os automóveis passarem a ser feitos novamente em Detroit em vez de no México. As exportações vão ressentir-se, mesmo que a China não retaliasse numa guerra tarifária. Num mundo económico globalizado, Trump vai em sentido contrário. Mas, por muito que lhe custe, um homem não chega para mudar o modelo mundial, sobretudo quando não tem alternativa credível.
E quanto à guerra? Bem, a guerra costuma ser um bom negócio, desde que não vá longe demais. E, agora, o risco é esse, pela primeira vez em muito tempo.
O Presidente Trump, pelo que mostrou até agora, é politicamente indefensável. Mas as suas ideias poupam-nos ao dilema de eventualmente aceitarmos isso pelos benefícios económicos que delas possam vir. Não há dilema porque não haverá benefícios. A Reaganomics não funcionaria porque o mundo é agora demasiado diferente, ao passo que o Trumponomics não é exactamente uma estratégia. São três ou quatro slogans, e um homem vaidoso e irado a gesticular. A bolha está à vista de todos, vai rebentar e todos vamos pagar.
Faltam três anos, dez meses, 28 dias e qualquer coisa. Se Trump não for reeleito.

Ovar, 21 de fevereiro de 2017
Álvaro Teixeira

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