Ladrões de Bicicletas
Posted: 30 Dec 2017 01:13 PM PST
Dou valor aos produtos tradicionais portugueses. Não porque considere que o que é nacional é sempre bom, ou que os produtos feitos em Portugal são os melhores do mundo. Ninguém conhece o mundo suficientemente bem para dizer uma coisa dessas.
Valorizo os produtos tradicionais - tapeçaria, olaria, culinária e doçaria, vestuário e calçado, vinhos e licores, joalharia, trabalho em madeira, etc. - porque transportam em si muitos anos de conhecimento acumulado que seria um absurdo desperdiçar.
No entanto, esse valor tende a ser desperdiçado. Não porque os produtos sejam feios, pouco saborosos, pouco saudáveis ou disfuncionais - muitos são o contrário disto. O seu preço não é necessariamente muito mais alto do que os equivalentes "modernos" (quando existem).
As sociedades contemporâneas desperdiçam os produtos tradicionais por muitas outras razões. Desde logo, porque a maioria das pessoas tem pouco tempo para pensar no que compra e para procurar o que quer comprar. Ou quando tem tempo não tem o hábito de consumir com consciência. Gastamos boa parte do nosso dinheiro em espaços comerciais controlados por grandes empresas de distribuição, que preferem comprar produtos estandardizados e em grandes quantidades (o que se presta pouco à produção tradicional) e que investem milhões em publicidade para convencer as pessoas a comprá-los. Empresas que pagam miseravelmente a quem tem pouco poder negocial, como acontece com muitos produtores de bens tradicionais, contribuindo assim para o abandono dessas actividades.
Claro que não são só os produtos tradicionais feitos em Portugal que devem ser valorizados. Simplesmente estes estão mais próximos de nós, temos mais oportunidades para os conhecer e adquirir do que aos de outros países. Como em tantos outros domínios - arquitectura, vestígios de civilizações passadas, livros antigos, música regional, etc. - temos a responsabilidade individual e colectiva de preservar conhecimentos ancestrais que merecem ser preservados, mas que tendem a ser destruídos pela lógica do consumo de massas.
Valorizemos pois os produtos tradicionais portugueses. E como aqui escrevi há quase uma década (para quem o argumento é relevante), não entreguemos à direita o monopólio das tradições.
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