Ladrões de Bicicletas
Posted: 06 Dec 2017 01:54 AM PST
O Negócios continha na segunda-feira várias análises sobre o que se julga saber acerca das ideias de Centeno para “a Europa” (felizmente, e ao contrário do que se depreende da manchete, há muito mais Europa para lá da desta prisão monetária). De todas as informações neste domínio, a novidade, que me pareceu tão relevante como outra coisa qualquer, é que o chamado Presidente do chamado Eurogrupo, de origem algarvia, gosta de cozinhar choquinhos fritos com tinta; um petisco, realmente.
Entretanto, e num plano talvez mais relevante, aproveito para relembrar que a tragédia da esquerda grega foi achar que as relações internacionais num quadro euro-imperialista eram uma espécie de debate entre parceiros em que vencia o melhor argumento. A farsa de parte da esquerda portuguesa é continuar a achar no fundo isso, somando-lhe agora a ilusão de que Centeno é um Cristiano Ronaldo das finanças que joga pelo nosso lado lá fora, como já afiançou Rui Tavares. A metáfora futebolística é de Schauble, lembre-se, e serve bem os propósitos ordoliberais alemães de nos fazer jogar pelas suas regras formais e informais, favorecendo os que estão sempre dispostos a fazê-lo.
No fundo, e mudando de metáfora, acho bastante mais adequada a fórmula de Pacheco Pereira, que tanto incomodou a sabedoria convencional: “será o mesmo que passar a ter como ministro das Finanças um general do exército inimigo”. Este realismo contrasta também com uma parte da esquerda portuguesa, que no fundo já só consegue pensar nos, e com os, termos do adversário. Assim também se explica a hegemonia do neoliberalismo, nas suas várias versões, incluindo a de Centeno. Na boa lógica do Eurogrupo, que Varoufakis acabou por descrever de maneira brutalmente clara depois do golpe europeu e da rendição grega, esta terá força na medida em que estiver alinhada com Merkel e agora com Macron.
A informalidade do Eurogrupo serve o directório das grandes potências. A formalidade das restantes instituições europeias serve as regras políticas que de forma explícita expandem as forças de mercado à custa da soberania democrática de Estados nacionais desprovidos de instrumentos decentes de política, o que é pior para as periferias, claro. Felizmente por cá, como João Ferreira indica, há quem se rebele contra esta máquina bem montada pelos de cima. E não por acaso, são os mesmos que avisaram a tempo para as consequências da economia política de Maastricht para os de baixo. Se este tipo de posição tiver força, talvez não estejamos ainda fritos.
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