Ladrões de Bicicletas
Posted: 27 Feb 2018 04:47 PM PST
Da série "Boss", na SIC Radical, que mostra como gerir a comunicação social
Quem leia o Público de hoje, sente a mão de Marcelo por detrás de cada palavra. A peça de David Dinis, director do jornal, entra na cabeça do presidente da República e diz que o jornal "apurou" que ele "voltou mais preocupado do que partira para o segundo encontro numa semana" com Rui Rio.
E nem foi só ao jornal que o pensamento do presidente chegou. Marques Mendes, no espaço concedido na SIC pelo militante nº1 do PSD, afirmou que “o Presidente deve ter vindo [de S.Tomé] com os cabelos em pé”.
O que aflige tanto Marcelo?
Continua o Público em espaço noticioso nobre, nas páginas 2 e 3 do jornal: "No Palácio de Belém, o estado de espírito confirma os receios com a desunião do maior partido da oposição. E com a forma como Rui Rio parece querer lidar com ela, em confronto com os críticos internos, achando que o que perde em desunião, pode ganhar na imagem que dele terá o país".
Aliás, David Dinis expressou ontem essa mesma preocupação quando partilhou com a editora de Política da Antena 1 Flor Pedroso o espaço de comentário moderado por Ana Lourenço na RTP3:
"Uma guerra dentro de casa, com o PSD dez pontos atrás do PS, à beira de eleições legislativas, diria que, no mínimo, há um sentido de risco... ia dizer mal medido... " (16'30'')
"Estamos a falar de um ano e meio. É muito tempo para comprar uma guerra interna desta dimensão e muito pouco tempo para apresentar propostas que o diferenciem. Neste momento, só tem a guerra. Nem sequer propostas tem para apresentar. Portanto, o país só fala - nós aqui - só podemos estar a falar de duas coisas: da aproximação de Rui Rio a António Costa, com a agenda de António Costa acrescento eu, e da guerra interna no PSD" (26'30'')
"A estratégia confrontacional neste momento do PSD parece um disparate total"(30'30'')
"A carga ideológica do CDS desapareceu (...) é um partido aberto, jovem. No fim, pode contar um bocadinho se o PSD... Não estou à espera de um crescimento exponencial do CDS. Mas se o PSD não se acautela e passa ano e meio em guerra... quer dizer... as pessoas que não quiserem votar na esquerda, que é preciso equilibrar, vão votar em quem? (33'45'')
Mas alguém acredita que o risco seja que os eleitores do PSD votem no CDS? O CDS não sairá muito do seu nicho: basta olhar para as sondagens. O risco é, portanto, outro.
O que quer então Marcelo?
Quer que o PSD negoceie já com o PS e feche tudo em 2018. Disse Marcelo em on: "Temos pouco meses, muito poucos, para debatermos e decidirmos o que há a decidir" ou "não é daqui a meses, em pleno ano eleitoral de 2019, quando já for tarde". Mas Rui Rio saiu de Belém a dizer que reformas estruturais não são coisas que se façam assim. Demoram e disse mesmo que nem tem soluções para já. Requer muito tempo, ouvir, conversar, negociações... (7'36'')
E Rio tem razão.
Mas por que está então este presidente preocupado com rapidez e a tentar marcar por fora o ritmo ao PSD, quando sabe que reformas de fundo não se fazem assim? O Público continua:
“Só falta um ano e meio para as legislativas. Se o PSD for partido para as eleições, desafiando oito anos da liderança anterior, é dar uma maioria absoluta a António Costa. E maioria absoluta, já se sabe, é cenário de que em Belém se prefere nem ouvir falar, diz uma fonte ouvida pelo PÚBLICO".
Ora aí está a preocupação de Marcelo Rebelo de Sousa. E esse é que deveria ser o título: "Marcelo quer evitar maioria absoluta do PS".
Mas por que não quer Marcelo que o PS tenha maioria absoluta? Por que razão não é estranho aos jornalistas que um Presidente da república embarque, desta forma, numa disputa partidária? Não seria vantajoso para o país ter estabilidade política? Até do ponto de vista de um pensamento de direita, o PS poderia libertar-se dos partidos mais à esquerda...
Tudo indica que Marcelo considera que eventuais consensos nacionais, a fechar entre o PS e o PSD, poderiam representar uma facada nas costas dos partido à esquerda. Pelo menos, Marcelo aposta que eles os sintam como tal, o que colocaria a esquerda sobre os holofotes com um rodapé televisivo a dizer "Crise à esquerda". Seria o primeiro passo para uma vitória à direita.
Eis a vantagem da "cultura de compromisso".
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