07/03/2018
by João Mendes
Na sequência das Legislativas de 2015, o Partido Socialista chegou a acordo com BE e PCP/PEV para liderar um governo minoritário. Perante este acordo histórico e inesperado, PSD e CDS ficaram muito aborrecidos, porque a democracia representativa pode ser uma grande maçada, e amuaram durante uns meses.
Depois de vários meses a carpir, o CDS decidiu fazer o moving on e procurou mudar ligeiramente o discurso, aproveitando o grande vazio em que o PSD se havia transformado, apesar de na realidade nada ter mudado. Utópica, Assunção Cristas começou por se assumir como alternativa para liderar a direita, apesar de não o poder ser sem o PSD, e já fala em ser primeira-ministra. Já dizia o poeta que o sonho comanda a vida, e Cristas também tem o direito de sonhar, coitada!
Na São Caetano à Lapa, enquanto o partido definhava nas sondagens, Pedro Passos Coelho viu as várias teorias da conspiração serem reduzidas a pó, umas atrás das outras, até não restar discurso, coerência, credibilidade, sanção ou diabo para contar história. Defunto que estava o passismo, Rui Rio lá decidiu sair da poltrona e avançar, cumprido finalmente uma promessa de longa data, e derrotou a barriga de aluguer que o passismo havia entretanto desencantado para se perpetuar no poder.
Chegado ao trono laranja, Rui Rio decidiu fazer mudanças que não agradaram aos mais altos oficiais do antigo regime, que trataram de lhe dar o troco e de lhe proporcionar o mais curto estado de graça de sempre de um líder partidário recém-eleito. Apuparam Elina Fraga no congresso, escolha que levou Paula Teixeira da Cruz a acusar Rio de traição, emocionaram-se com a intervenção crispada de um dos seus antigos líderes, Luís Montenegro, e fizeram a folha ao novo líder parlamentar, traído por elementos da sua própria lista, que tinham aceitado trabalhar com ele, sempre com a retaguarda protegida pelos ideólogos-observadores da nova direita radical portuguesa.
Rui Rio, contudo, não recuou. Nem parece interessado em seguir a via da confrontação com o governo, via essa que já deu provas claras da sua absoluta inutilidade, manifestando inclusive disponibilidade para trabalhar com os socialistas (e até com bloquistas e comunistas) em algumas matérias, nomeadamente na área dos fundos comunitários. Internamente, a notícia não foi bem-recebida pelo sector ressabiado, que alucina com Estalines e se masturba com Pinochets. De pouco lhes adianta, pelo que já deu para perceber. Para Rio, os restos do passismo, em bicos de pés e aos berros, mais não são do que a expressão de uma “convulsãozita”, apesar das facas longas.
Em São Bento, António Costa bem pode abrir garrafas de champanhe. A vida não lhe poderia correr melhor! Com os indicadores económicos a validar a sua estratégia, ainda que em larga medida embalados por variáveis externas que se podem a qualquer momento inverter, Costa conseguiu a proeza de firmar acordos sólidos com partidos que nunca estiveram para aí virados, esvaziou e expôs ao ridículo o discurso catastrofista da direita, que em muito contribuiu para o fim do passismo e para a ascensão de Rui Rio, que num dos primeiros actos oficiais se apresentou ao primeiro-ministro, antes mesmo de se reunir com Assunção Cristas ou com o grupo parlamentar do seu partido. Melhor seria impossível.
E agora, o que se segue? Ora, se nada de extraordinário acontecer, tipo uma violenta crise provocada pelos terroristas financeiros de Wall Street ou da City, António Costa arrisca-se a um sossegado passeio a caminho da renovação do seu mandato, com uma maioria absoluta no horizonte. E, a julgar pelo histórico, nada de bom poderá vir de uma maioria absoluta do PS. Agradeçamos, portanto, ao professor doutor Pedro Passos Coelho, e respectiva entourage de criaturas radicalizadas, por se terem demitido das suas funções e por terem transformado o PSD num pequeno partido de protesto. Tivessem eles saído no devido tempo, e talvez pudéssemos esperar umas Legislativas mais disputadas. Agora é tarde e tudo se tornou fácil demais para António Costa.
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