(Carlos Esperança, 13/04/2018)
A Síria foi uma das muitas estações onde descarrilou o comboio das primaveras árabes, onde a população urbana ansiou conquistar ao ditador, Bashar al-Assad, um quinhão de liberdade que acabou em pesadelo, aos gritos de ‘Deus é grande’, com várias potências a disputarem um espaço estratégico da geopolítica mundial, numa guerra onde xiitas e sunitas vertem o ódio e o petróleo ao serviço de potências e interesses divergentes.
A ONU identificou 25 ataques químicos de 2011 a 2017 e os investigadores atribuíram a maioria dos ataques às forças governamentais da Síria. Não se pode lavar a imagem de Assad, mas deixa de fora a autoria de outros ataques. O mosaico de interesses cruzados e de aliados suspeitos, de tantos e tão desvairados lados, dificultam a investigação.
A Síria teve armas químicas e usou-as, mas, tal como Saddam, aceitou que o seu arsenal fosse destruído, e Assad teria de ser demasiado estúpido para reincidir, caso dispusesse delas, pela repercussão devastadora quando a correlação de forças o favoreceu.
O antigo acordo entre a Síria e o Irão para construção do oleoduto para escoar o petróleo da região do Mar Cáspio, evitando a Turquia e preterindo sauditas e outros países do Golfo, no fornecimento de petróleo ao Ocidente, parece ser ainda a causa primordial da guerra que devastou o primeiro país e ameaça o segundo.
Surpreende que a Senhora May, que não conseguiu provar a origem do envenenamento do ex-espião russo, já tenha descoberto provas do último ataque químico de Assad, que Macron garanta possuí-las, sem as apresentar, quando a primeira precisa de disfarçar o desastre do Brexit e o segundo a imparável contestação social.
Putin é frio, inteligente e perigoso. Entrou no Médio Oriente por inépcia ocidental e não larga a imprevisível hegemonia que conquistou e cuja disputa pode custar uma tragédia mundial, enquanto engole sapos para tolerar a Turquia e lança advertências a Israel.
Trump, acossado pela conexão russa, pelas investigações judiciais e previsíveis derrotas eleitorais do seu partido, necessita de uma guerra para, à semelhança de May e Macron, aliviar a pressão interna, e não dispõe de uma sem riscos controláveis, sendo ele próprio volúvel, imprevisível e irrefreável.
Antigamente os animais falavam, agora twitam. Trump fala de mísseis como as tias de Cascais de cãezinhos treinados que, entre ósculos e lambidelas recíprocas, os designam «bonitos, novos e inteligentes».
Enquanto a espada de Dâmocles, nuclear, paira sobre a Humanidade, os curdos são mais uma vez sacrificados, a China avança para a hegemonia, à boleia de péssimos dirigentes políticos na Europa e EUA, e o Mundo, assustado, anseia pela paz, duvidosa e precária.
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