por estatuadesal
(In Blog O Jumento, 25/04/2018)
Uma das heranças do salazarismo foi a falsa imagem de um ditador honesto e austero, imagem que todos os dias é passada de forma subliminar quando, por exemplo, o Expresso lança uma campanha sugerindo que os nossos deputados se andam a lambuzar em ajudas.
Os salazaristas raramente deram a cara pelo ditador; quem os viu em 1974 ficou a saber que eram todos democratas, alguns até tiveram o cuidado de evitar o PDC ou o CDS e optaram por um partido ligeiramente mais à esquerda, o então PPD.
Mas, há quarenta anos que a democracia é confrontada com a suposta superioridade do salazarimo nos domínios da ética, da competência e do nacionalismo, sugerindo-se que o país tem vindo a ser destruído pelos democratas e pela democracia. Dantes, esta mensagem era defendida pelos mais encarquilhados do salazarismo e do colonialismo, hoje é passada de forma subliminar por muito boa gente, a começar por jornalistas.
É bom recordar que o 25 de Abril aconteceu num momento em que o regime enfrentava uma grave crise económica, em que muitos produtos alimentares de primeira necessidade eram racionados, e quando o regime estava isolado internacionalmente e à beira de uma derrota militar na Guiné.
É bom recordar que muitos das grandes fortunas, hoje elogiadas como sinal de um empreendedorismo que nunca terá ocorrido em democracia, foram construídas à sombra da pior das corrupções, com os trabalhadores a terem de suportar um regime de salários de miséria e a total ausência de direitos, com os patrões a usarem a polícia do Estado para beneficiarem dessas condições.
É bom recordar que, desde o mais pequeno balcão do Estado até ao ministro, a regra era a da corrupção, nada no Estado funcionava sem se pagar por fora. Desde as Alfândegas à Inspeção Económica, tudo era oleado com dinheiro.
É bom recordar que, no tal Estado bondoso, morria-se de uma coisa, as aldeias e até algumas vilas tinham esgotos a céu aberto, eram raras as aldeias com acesso à electricidade, nas estradas mal dava para passarem dois carros, nas escolas reinava a tacanhez e os liceus, de que muitos se recordam como modelos, tinham uma boa parte dessa imagem graças a professores que eram opositores do regime.
Os exemplos poderiam multiplicar-se pondo fim a uma falta de memória que permitia que Passos Coelho, nas suas viagens, se sentasse em cima das memórias de Salazar, como se a inspiração deste passasse por osmose. Se compararmos, os quarenta e tal anos de ditadura com os mais de quarenta anos de democracia, não encontraremos no presente nada que se compare com a pouca vergonha que foi o salazarismo.
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