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terça-feira, 3 de julho de 2018

O drama da direita

Ricardo Costa28/06/2018

Ricardo Costa


opiniao@newsplex.pt

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Rui Rio e Assunção Cristas atravessam um período difícil de afirmação das suas lideranças, acentuado pela ausência de um projeto comum de PSD e CDS para 2019

Aproxima-se a tradicional pausa política das férias de verão e, a partir de setembro, inicia-se a última etapa pré--eleitoral. PS, PCP e BE vão a jogo com o que conquistaram nos últimos anos de exercício de poder e de condicionamento sobre o poder. PSD e CDS desafiam o poder vigente, ou tentarão desafiar, com grandes incertezas sobre a possibilidade de reconquistarem esse poder. De facto, é no lado da (chamada) direita que se preservam as grandes dificuldades, enfatizadas pelas opções de ambos os partidos de seguirem o seu próprio caminho. Teria mais impacto haver bloco comum em alternativa; a sua falta gera naturais e previsíveis obstáculos que a dicotomia gera na definição de mensagens comuns. E também na ausência de identidade e na contradição da atitude: por um lado, Assunção Cristas combate invariavelmente o governo; por outro, Rui Rio parece interessado em construir pontes seguras de entendimento com o PS. E, na descoordenação, fica mais fácil para António Costa. E também para o eleitorado que hesita.

Para além das decisões estratégicas, a tal direita confronta-se com o problema de sempre: o carisma das lideranças. Que traz consistência, confiança e alinhamento, nomeadamente para um eleitorado que, sociologicamente, sempre terá um caráter de forte ligação personalista. A tal direita, nomeadamente depois de ostracizada pela esquerda que se fez vencedora com Abril, sempre se afirmou com líderes que entrassem pelo centro e, ademais, disputassem o eleitorado do PS e fossem intransigentes com a esquerda radical e ortodoxa. Sá Carneiro, Cavaco Silva, Durão Barroso, Passos Coelho (decisivo para a luta contra Sócrates), Freitas do Amaral e Amaro da Costa no lançamento do CDS, Lucas Pires e Manuel Monteiro na resistência ao declínio do CDS, Paulo Portas. Independentemente do maior ou menor êxito na aspiração eleitoral imediata, essas lideranças fizeram o caminho para se alcandorarem ao poder ou dele se aproximarem e marcaram os seus partidos (com os “ismos” que todos conhecem em fileiras endógenas), tornando mais difícil o percurso dos seus sucessores. Não podemos, por isso, esquecer que Passos e Portas deixaram raízes até porque, mesmo numa conjuntura implausível, conseguiram ganhar. Juntos e com carisma, cada um à sua maneira e cada um convencendo os seus. Logo, o problema original de Assunção Cristas (que não repetirá no país o que aconteceu na eleição municipal em Lisboa) e de Rui Rio é comum e é de afirmação das suas lideranças, requisito imprescindível à direita para ter sucesso.

Depois virão os programas, as propostas, as reformas e as pessoas. Sem identidade pessoal de grande lastro, não valerá a pena. E ainda mais não valerá a pena se, olhando para o lado, os aspirantes e desafiadores são tudo menos líderes agregadores, tão-só chefes de fação ou secção. Não se estranha, em consequência, que as desavenças, os dissensos e as derrotas internas se acumulem no PSD e no CDS – as desautorizações do grupo parlamentar com Fernando Negrão e os desaires do aparelho de Cristas nas contendas do Porto são apenas os sinais mais imediatos de que o futuro não deixará de ser crítico.

Dir-se-á que sobra Marcelo como figura tutelar da direita. Que, na sua veste ecuménica, não resistirá a mexer nas lideranças se as legislativas de 2019 confirmarem o declínio. Não parece. Marcelo ama hoje o país e o amor que o país lhe oferece. Deseja terminar com esse legado a sua vida política, esquecendo as brigas e as lutas que o caracterizaram no passado. Pode custar-lhe, mas não se envolverá, tirando os comentários adequados. Fica a questão: com quem pode contar a direita para ganhar?

Professor de Direito da Universidade de Coimbra. Jurisconsulto

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