Aventar
14/11/2018 by António de Almeida
É natural que em alturas como esta se recorde uma velha e instrutiva história de Churchil, o velho estadista inglês. Conta-se que certo dia recebeu, na bancada conservadora de Westminster, um jovem deputado do seu partido que tinha acabado de ser eleito pela primeira vez. Virando-se para a bancada oposta, onde se sentam os trabalhistas, o jovem deputado comentou: “é então ali que estão os nossos inimigos”. Churchil, com a sua imensa sabedoria, corrigiu-o de imediato: “ali sentam-se os nossos adversários; os nossos inimigos sentam-se ao nosso lado, nesta mesma bancada”.
Deixei de votar PSD há alguns anos, a última vez que o fiz em 2002, era líder um tal cherne de má memória, que prometeu um choque fiscal, que pressupunha uma significativa baixa de impostos, mas que chegado ao governo, logo tratou de contribuir para a asfixia dos cidadãos e empresas, aumentando a carga fiscal, pela mão da então ministra de Estado e das Finanças, Manuela Ferreira Leite. Desconfiado face ao histórico, nem o suposto liberalismo de Passos Coelho me seduziu, o tempo acabou por justificar os meus receios, uma coisa foi o discurso, outra a prática, resultando num brutal aumento de impostos. Que apesar de todas as propagadas reposições e reversões, este governo manteve, apesar de aqui ou ali ter satisfeito alguma clientela política, na prática foi sempre tirar ao A para dar ao B, baixar o imposto X para subir o Y, tudo somado, no final a receita não pára de aumentar, porque o Estado precisa se financiar e sai cada vez mais caro ao bolso dos contribuintes, particulares ou empresas, tornando a economia anémica e pouco competitiva, se comparada por exemplo com países da nossa dimensão ou até inferior, como Irlanda ou Holanda.
O meu afastamento do partido laranja não impede que siga com curiosidade a sua vida política, também olho para outros partidos com algum interesse, mas o PSD sempre foi um caso à parte, pelas suas guerras internas. Para não ir mais longe, fico-me no presente milénio, quem não lembra o discurso da má moeda no consulado Santana Lopes? Os sucessivos ataques de Menezes a Marques Mendes? As setas viradas ao contrário de Pacheco Pereira na liderança de Menezes? O afastamento de toda a “ala liberal” por Manuela Ferreira Leite sob a influência do ideólogo da Marmeleira? Que posteriormente perante um mau resultado eleitoral, entregou de bandeja o partido a Miguel Relvas e Passos Coelho? Seria de esperar que o PSD aprendesse alguma coisa com a sua história, mas na verdade os laranjas continuam a proporcionar comédia da boa, praticamente a roçar o non-sense.
Numa disputa interna Rui Rio vence Santana Lopes, convida o rival para a direcção do partido, mas este acaba por sair e fundar um novo partido, para concorrer às eleições. Não subestimem o menino guerreiro, em campanhas eleitorais o homem é fortíssimo e pode bem conseguir fazer eleger um pequeno grupo parlamentas, às custas do PSD. Rui Rio, político de quem os portugueses até têm boa imagem, por ter sido presidente da Câmara do Porto e ter enfrentado Pinto da Costa, homem de rigor ao que dizem, começou por prometer um banho de ética política, arriscando-se a levar uma monumental banhada. Não lhe bastava o caso Feliciano Barreiras Duarte, tem agora um novo com José Silvano. Ficámos a saber que a deputada Emília Cerqueira acedeu ao computador do seu colega no parlamento, que o acesso contabiliza imediatamente uma presença no sistema da A.R., curioso que os restantes partidos não aproveitem este assunto, eles lá saberão porquê, mas não deve andar longe da razão porque também deixaram morrer a questão das ajudas de custo contabilizadas através da distância em kms entre a residência declarada e o parlamento. Mas como a deputada é do Alto Minho, está tudo bem, porque não se pode duvidar das pessoas do Alto Minho, segundo percebi das declarações da deputada.
Certo é que isto foi mais um episódio que nasceu no interior do PSD, o partido que volta e meia revive a noite das facas longas. O grupo parlamentar é próximo de Passos Coelho, mas leal a Luís Montenegro que tacticamente se resguardou para o pós-legislativas 2019, quando Rui Rio no rescaldo da derrota colocar o lugar à disposição. Será então a sua vez de lidar com um grupo parlamentar escolhido por diferente tendência, sim, porque cá se fazem, cá se pagam e o PSD nessa matéria não tem emenda. E cada vez tem menos adesão dos portugueses, pese embora ainda seja o principal partido da oposição em Portugal, porque não mostra ser uma alternativa credível ao actual governo, que com ou sem geringonça, tudo irá depender dos resultados eleitorais, irá continuar na próxima legislatura.
Com várias tendências desunidas no PSD, a cisão de Santana Lopes e previsível eleição de grupo parlamentar, a manutenção do peso eleitoral do CDS, que não parece ser capaz de crescer por aí além, existe a possibilidade de algum dos novos partidos conseguir fazer eleger deputados, mesmo que poucos, o espaço à direita do PS apresenta-se fragmentado, apesar do PS estar cada vez mais à esquerda, percebe-se a razão, pretende travar o crescimento do BE que considera a principal ameaça. Não será em 2019, estas coisas levam tempo e até agora ninguém se chegou à frente, mas a erosão dos partidos tradicionais também em Portugal, levará mais cedo ou mais tarde ao surgimento do populismo. A incógnita reside em saber quando virá e sob qual forma chegará ao rectângulo. Tal como noutras paragens, os partidos e políticos para isso muito terão contribuído.
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