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segunda-feira, 18 de março de 2019

Sobre o recorte do discurso para compor uma mensagem

18/03/2019 by j. manuel cordeiro

A questão colocada não foi esta e, portanto, “É uma opinião” não foi uma resposta à pergunta colocada no título do artigo. É um bocadinho diferente. E mostra como jornalismo militante constrói uma mensagem.

Para referência, aqui fica o texto desta parte. Pode-se constatar que a resposta veio na sequência do jornalista ter afirmado que uma democracia “[p]assa por termos políticos eleitos, por exemplo. Esse é um princípio basilar da democracia. Na Coreia do Norte isso não existe, existe um princípio sucessório.” Ao que Cunhal respondeu “É uma opinião”. Não se percebe se a opinião é sobre a totalidade ou sobre parte do que havia sido dito. Em todo o caso, partindo da premissa do jornalista, podemos questionar-nos se na Inglaterra há democracia. Parece que a rainha não é eleita.

Acredita nas negociações entre Donald Trump e kim Jong-un, o líder norte-coreano?

Não conheço as negociações, não tenho nenhum juízo em relação a isso, não conheço os seus conteúdos.

Sabemos o essencial do que está em causa: a Coreia do Norte quer o fim das sanções económicas e os EUA querem a desnuclearização.  A questão que lhe coloco é se considera que as duas partes têm credibilidade suficiente para esperarmos algo de positivo das negociações.

Acho que com todas as reservas que tínhamos na altura, sempre considerámos que esse processo de negociações podia levar a uma solução política, nomeadamente em termos de reunificação das duas coreias. Houve uma cimeira, mas o resultado ficou aquém do que se perspectivava.

O PCP tem algum grau de solidariedade relativamente ao regime norte-coreano?

Em relação ao regime norte-coreano, nós caracterizamo-lo como um país com vontade de atingir o socialismo, mas assumimos que temos diferenças e até divergências. Não nos revemos numa fulanização e até numa cultura de personalidade que prevalece muito, que eu percebo, tendo em conta a cultura daqueles povos orientais…

E incomoda-o o facto de a Coreia do Norte não ser uma democracia?

Eu não fazia essa classificação de ser ou  não ser. O que eu acho é que, primeiro, há o principio que eles afirmam, em segundo lugar, nós, em relação ao nosso projeto de sociedade, seria com certeza bem diferente do modelo da Coreia do Norte, tendo em conta a nossa cultura, tendo em conta a nossa história, tendo em conta o nosso povo. Estas opiniões críticas não invalidam que nos coloquemos do lado de uma solução política, de uma solução pacífica…

Estava a ouvi-lo e lembrei-me de uma frase que ainda hoje queima o PCP: a frase de Bernardino Soares, que bem conhece, segundo a qual não tinha a certeza de que a Coreia do Norte não fosse uma democracia.

Não estava a fazer a pergunta a ver se eu caía nessa, não?

Não, eu fiquei com dúvidas, depois da sua resposta, sobre se concorda com ele, porque o Jerónimo de Sousa não me disse se considera ou não que a Coreia do Norte é uma democracia, disse-me que não tinha certezas sobre isso.

As certezas que tenho são as conclusões do congresso do PCP: nós temos diferenças de opinião e até divergências.

Porque é que tem tanta dificuldade em admitir que não há uma democracia na Coreia do Norte?

O problema não é esse. O que é a democracia? Primeiro tínhamos de discutir o que é a democracia.

Passa por termos políticos eleitos, por exemplo. Esse é um princípio basilar da democracia. Na Coreia do Norte isso não existe, existe um princípio sucessório.

É  uma opinião. Digo-lhe pela terceira vez: nós, em relação a esse e outros países que se afirmam de construção do socialismo, nessa matéria temos diferenças e divergências. Os caminhos para a transformação social e o socialismo na nossa pátria são de certeza diferentes.

O PCP defende uma democracia; a Coreia do Norte não.

O PCP defende uma democracia avançada tendo em conta os valores de Abril, sem perder a perspetiva da construção do socialismo.
[Polígrafo]

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