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quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Do povo e do putedo

por estatuadesal

(In Blog Aspirina B, 22/11/2019)

O populismo, na política portuguesa, começou em 2019? Usando o Aspirina B como grupo focal, a primeira vez que se fez referência ao populismo foi logo em Dezembro de 2005, tinha o blogue apenas dias de existência. Vale a pena recordar Luis Rainha e a citação que traz de Louçã: ““O que faz falta em Portugal é abrir a cultura, destruir a ideia de que a criação da mediocridade populista é a cultura de que o povo precisa e de que o povo gosta”. Depois desta estreia, o conceito voltou em 2007 aos escritos e por cá tem acompanhado o devir político nacional. Populista foi sempre a retórica do PCP e do BE, um populismo de esquerda clássico onde se desconfia do Estado de direito democrático, do Parlamento, e se repete a cassete sectária onde o “povo” pertence aos monopolistas de embrulho marxista. E populista começou a ser, exclusivamente, o discurso do PSD e do CDS a partir de 2008, onde o desabamento do seu império bancário e o sentimento de impotência perante Sócrates e a sua equipa levou a direita portuguesa a apostar tudo no moralismo e na judicialização da política, esteios do populismo larvar e inorgânico, mediático. Em 2008, Cavaco lançava – em tandem com o PSD – a estratégia do assassinato de carácter recorrendo à mais universal, básica, chicana: Sócrates era mentiroso. Nasceram os martelos “Falar verdade aos portugueses” e “Política de Verdade”, os quais enterraram a direita portuguesa numa decadência moral e intelectual que só se tem agravado. Foi dessa indigência e putrefacção que vieram o Chega e a Iniciativa Liberal.

A entrada de André Ventura e João Cotrim de Figueiredo na Assembleia da República está a ter um curioso e benéfico efeito no jornalismo político. De repente, passou não só a ser legítimo como urgente denunciar e desconstruir os discursos populistas e demagógicos. No entanto, esses discursos são em tudo variações do que tem sido considerado, validado, por esse mesmo jornalismo político como o normalzinho da Silva “fazer política”. A alteração de atitude e comportamento explica-se facilmente. Estando o jornalismo político dominado pela direita, agora há que defender o PSD e o CDS de clones que ameaçam manter a direita na oposição nos próximos séculos por causa de uma imparável fragmentação e radicalização. Isso significa que se tornou permitido, dentro das redacções do risível “jornalismo de referência”, fazer aquilo que estava vetado no passado. Antes das últimas legislativas, um qualquer passarão ou bronco do PSD e do CDS pôde dizer as maiores barbaridades no Parlamento e no espaço mediático que tal era levado ao colo e protegido pela “imprensa”. Estava tudo bem, contra os socialistas valia tudo. Agora, com os estreantes rivais em chungaria, alto e pára o baile. Saltam exercícios de aplaudida salubridade e apelo à razão e à decência. A pulhice entranhada no PSD e no CDS é para uso exclusivo, eis a lição do jornalismo político português. Afasto deste argumento sobre textos de opinião e reflexão o trabalho jornalístico sobre a tese de doutoramento do Ventura, o qual é uma típica investigação de jornalismo genérico e fundamental.

Como se vê na notícia acima, apenas um exemplo e muito longe de ser o mais grave, o populista André Ventura é uma criação do populista Passos Coelho. O mesmo Passos que em 2010 promovia a ideia de se julgarem e condenarem políticos por razões exclusivamente políticas. O mesmo Passos Coelho, de braço dado com Cavaco Silva, que em 2018 fez campanha para a recondução de Joana Marques Vidal sugerindo que tanto Costa como Marcelo pretendiam ser cúmplices de criminosos.

Talvez o fenómeno a que estamos a assistir na comunicação social, então, também se explique recorrendo às referências metafóricas de Ventura e Passos, isso de terem aparecido as prostitutas baratas no bar de alterne das putas finas.

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