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quarta-feira, 6 de maio de 2020

Teremos sempre a praia. Nem que seja de máscara

Curto

Rui Gustavo

Rui Gustavo

Jornalista de Sociedade

06 MAIO 2020

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É hoje: depois da primavera mais bizarra das nossas vidas, vamos ficar a saber quão surrealista será o verão. A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) vai divulgar esta quarta-feira o manual de utilização para a época balnear que arranca a 1 de junho em todo o país. Apesar de termos mais de 900 quilómetros de costa e um número de praias tão incontável quanto os grãos de areia que as compõem, a verdade é que vai haver uma lotação máxima de banhistas por causa da pandemia de covid-19 que, à hora do fecho deste curto, já tinha matado 1074 pessoas em Portugal.
A cura ou a vacina para a doença ainda parece algo longe de descobrir, já morreu em Portugal um homem com 29 anos (é a primeira vez que alguém tão novo sucumbe ao sars-cov 2 no nosso país), houve um caso positivo no Belenenses SAD, mas a notícia de que vai ouvir falar hoje é esta: como é que vamos fazer praia este ano?
No final de abril, uma comissão técnica liderada pela APA – e de que fazem parte 11 entidades, entre as quais a Direção Geral de Saúde – decidiu que a única maneira de garantir que as praias de verão não serão um foco de infeção de covid 19 é restringindo a sua utilização. Isto é, pela primeira vez em Portugal, as praias vão passar a ter uma lotação máxima para que a distância social de dois metros entre as pessoas seja respeitada. Mas como? Torniquetes? Lotação máxima nos parques de estacionamento? Acrílico na areia? Vamos todos andar de máscara na praia? A polícia marítima vai andar a medir distâncias na areia e a passar multas a quem não respeitar a nova lei? As criancinhas com balde e pá serão expulsas sem piedade? As praias sem vigilância também vão ter lotação máxima? E quando a maré subir?
Em Espanha, um autarca testou um método original que consistia em desenhar quadriculas de dois metros e meio na areia com a ajuda de um trator. Tal como um castelo de areia, não devem resistir à maré e será um trabalho de Sísifo manter as quadriculas perceptíveis um verão inteiro.Também em Espanha, dois irmãos viciados no bronze, desenharam uma estrutura hexagonal para separar as pessoas que, garantem, poderá ser o futuro.
No final da reunião com a APA, em abril, Catarina Gonçalves, coordenadora do programa Bandeira Azul, explicou ao Expresso que o uso de máscara ia ser obrigatório em esplanadas e cafés. E que o número de banhistas terá de ser definido praia a praia, de acordo com as características de cada uma. Só hoje vamos saber exatamente como.
Nas praias com acesso condicionado esse controlo poderá ser feito através da contagem de lugares nos estacionamentos, nas outras através de um número máximo de pessoas nas áreas concessionadas e nas zonas para chapéus-de-sol. Os nadadores salvadores teriam a responsabilidade de evitar os aglomeramentos e seriam responsáveis por cem metros quadrados de areal. Mas só a polícia Marítima tem autoridade para expulsar pessoas da praia. E não há homens suficientes para vigiar os já referidos mais de 900 quilómetros de costa.
António Pina, presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve, para onde vão milhares de portugueses e estrangeiros todos os verões (este ano serão quase só portugueses porque as vagens de turismo para o estrangeiro deverão continuar proibidas para quase toda a gente), apelou logo ao “bom senso” e disse que “não será atrativo” chegar à praia e ver “polícias de pistola em punho”.
A Visão ouviu há dias responsáveis autárquicos – para quem vai sobrar a batata quente –e parece claro que há nuvens negras no horizonte. Joana Balsemão, vereadora da Câmara de Cascais, garante que não irá tomar “medidas que promovam a descriminação”. Isto é, não vai aumentar as áreas concessionadas nem fechar os acessos a quem vai para a praia de comboio. Isaltino Morais, presidente da Câmara de Oeiras, foi fleumático: “Franciscos às sextas e Marias às quintas? Não me parece”. Inês de Medeiros, presidente da Câmara de Almada confessou não estar “a ver” como é que vai fazer para controlar os quilómetros de praia da Costa de Caparica.
Hoje, dia 4 do estado de calamidade que apesar do nome assustador dá mais liberdade do que o de emergência, só pode por o pé na areia quem for para a água de prancha (nas suas múltiplas formas), ou de cão para a beira-mar. Mas a partir de 1 de junho, de uma maneira ou outra, teremos sempre a praia.

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