Translate

terça-feira, 23 de junho de 2020

Um passito para trás

Curto

Pedro Cordeiro

Pedro Cordeiro

Editor da Secção Internacional

23 JUNHO 2020

Partilhar

Facebook
Twitter
Email
Facebook

Bom dia!

Portugal terá sido melhor a confinar do que a desconfinar? Tinham-nos dito que o aligeiramento das medidas restritivas contra a covid-19 podia andar para trás caso a situação pandémica se agravasse. Ora, embora o planalto tenda a manter-se e o número de mortos diários seja baixo há vários dias, o certo é que a região de Lisboa e Vale do Tejo tem representado uma percentagem muito alta dos novos contágios a nível nacional (ontem era de 63%, mas já andou acima dos 90%). E o desconfinamento andou mesmo para trás. As dificuldades, aliás, não passaram despercebidas a títulos da imprensa mundial como “Le Monde” ou o “Politico.eu”.
Vigoram desde a meia-noite medidas de contenção na área metropolitana da capital: prolongamento do estado de calamidade em 15 freguesias, sobretudo nos concelhos de Amadora, Odivelas e Loures (que, com Lisboa e Sintra, somam mais de metade dos novos casos); proibição de ajuntamentos de mais de dez pessoas, com multas até 350 euros (os casos de Lagos e Carcavelos aí estão a mostrar o preço da irresponsabilidade); obrigação de fechar às 20h para lojas e cafés (que não restaurantes); reforço da vigilância e fiscalização pelas forças de segurança, nomeadamente nos centros comerciais. Com os jovens a liderar as contaminações, o fim das aulas (sem que nada se saiba sobre o regresso às mesmas, céus!), será preciso assustá-los?
É fácil intuir que o recuo terá impacto económico. A Associação Portuguesa de Centros Comerciais já afirmou que estes “são um aliado no combate eficaz à propagação do novo coronavírus” e “cumprem todas as regras de segurança sanitária decorrentes da lei, as recomendações da Direção-Geral da Saúde e as melhores práticas promovidas pela indústria a nível global”. Os lojistas estão preocupados e pedem uma “justa repartição de sacrifícios” entre si e os proprietários dos centros comerciais. Já agora, fique a saber que o ritmo de crescimento do desemprego abrandou em maio, embora haja mais 103 mil pessoas sem trabalho do que há um ano. Henrique Raposo alerta para uma inaceitável caça ao infetado no ambiente laboral, que a edição semanal do Expresso abordou. A propósito, lembra o “Público”, a partir de hoje quem perdeu rendimentos pode entregar a declaração respetiva, nomeadamente para evitar cortes de água, luz e gás.
Falar de economia em Portugal é falar de turismo, seja cá dentro ou lá fora. Num momento em que vários governos europeus mantêm fronteiras encerradas a viajantes oriundos do nosso país — decisão que o Presidente da República associa a uma guerra por conquistar turistas —, especialistas contactados pelo Expresso consideram que pode estar em causa um excesso de honestidade (sim, admito que o conceito seja difícil de digerir). O primeiro-ministro não entende e frisa que alguns dos que nos fecham a porta fazem muito menos testes. A oposição, com quem Marcelo Rebelo de Sousa encetou ontem reuniões, pede clareza no discurso político sobre a pandemia. Já em Fátima, onde surgiu um foco de infeção, a palavra de ordem é testar. E para as bandas da Intersindical, o importante é não desmobilizar.
Neste clima de regresso às restrições e fronteiras fechadas, a escolha de Lisboa para a fase final da Liga dos Campeões soa quase contraditória. As altas figuras da nação celebraram o facto numa cerimónia “de estadão” em que o autor destas linhas farejou parolice e durante a qual António Costa festejou um “prémio merecido” aos profissionais de saúde. Que estes heróis da pandemia merecem prémios ninguém duvida. Talvez remuneração e condições de trabalho lhes digam algo mais que a festa da bola. E se a excitação das autoridades passa pelo turismo e por projetar uma imagem de porto seguro, Daniel Oliveira aponta os riscos da publicidade negativa.
Olhando para o mundo mais vasto, há mais de nove milhões de casos de covid-19 no planeta, como mostra o excelente trabalho da equipa de infografia do Expresso. A Organização Mundial de Saúde assinalou um triste recorde de novos casos. O globo vai aprendendo, mais devagar do que o desejável, a viver esta nova realidade, sendo certo que a pressa não favorece o rigor. No Brasil, que passou o milhão de casos e conta mais de 50 mil mortos, a pandemia ameaça culturas de forma irreversível. Na Arábia Saudita o hajj, peregrinação anual de muçulmanos a Meca, vai ser muito diferente e vazio. O Reino Unido quer reabrir a cultura em julho. Espanha tenta perceber o que correu mal na proteção aos lares de terceira idade. E todos continuam à procura de uma vacina, que a Universidade de Oxford não crê ser alcançável antes do outono. Todas as notícias sobre a pandemia estão em permanente atualização aqui.

Sem comentários:

Enviar um comentário