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terça-feira, 15 de setembro de 2020

The intercept Brasil

Rio, 12 de setembro de 2020
Sem carne, sem leite, sem arroz

Esse mês não tem carne vermelha, nem arroz e nem leite na minha casa. Me recusei a pagar R$6 em um litro de leite. Desde o início da pandemia de coronavírus, o volume de compras no mercado foi diminuindo mês a mês. Tudo está mais caro.

Questionei nas minhas redes sociais o que as pessoas cortaram da lista de compras e as respostas se repetiram. A manteiga, o leite, o arroz, o feijão, o óleo de soja e a carne vermelha foram limados das nossas listas de compras mensais. Uma das pessoas que me respondeu disse que está fazendo como todo pobre: substituindo o arroz por macarrão. Inclusive, a orientação do presidente da Associação Brasileira de Supermercado, João Sanzovo Neto, é incentivar o consumo de massas.

O queijo também foi um produto bastante citado nas respostas. Ele sumiu da nossa mesa. Falo por mim e por alguns amigos, mas ter queijo em casa é simbólico. Quando a gente consegue melhorar um pouquinho de vida passa a ter queijo todo dia porque esse é um status que o pobre faz questão de ter. Mas agora ele voltou a faltar. O quilo da mussarela está passando dos R$40 – mesmo preço do pacote de 5kg de arroz em alguns lugares.

A essa altura você talvez já saiba os argumentos que justificam a alta dos alimentos. Estamos em entressafra. Com o dólar alto, a galera do agro está vendendo a produção para outros países para faturar mais. Supostamente, o auxílio emergencial fez o povo comprar mais comida. Além daqueles que correram para os mercados para fazer estoque de alimentos lá no início da pandemia. Com menos oferta e mais procura, os preços sobem. São as leis de um mercado que nunca foi justo. Quem tem grana se adapta e quem não tem deixa de comer. Mas é apenas isso? O governo não pode fazer nada? Ou o mercado regula tudo e se faltar comida, paciência? Sim, é exatamente o que pensa Jair Bolsonaro.

Não há esperança de um cenário melhor nos supermercados pelo menos até o final do ano. O fato é que com a taxa recorde de desemprego (menos 8,9 milhões de postos de trabalho) e a redução do auxílio emergencial pela metade, muitas famílias não terão como comprar comida. O pobre que já foi o mais afetado pelo coronavírus é o que não consegue fechar a conta no caixa – lembro também que essas pessoas têm cor e você não precisa nem clicar para adivinhar qual é. Dou só uma chance.

A covid evidenciou um cenário de precarização da vida e do racismo estrutural a que estamos submetidos. Agora, os altos preços dos alimentos e o desemprego servem de gasolina para esse ciclo sem fim da desigualdade social no Brasil.

Te pergunto o que você já deixou de comprar no supermercado com a alta dos preços nos últimos tempos. Porém, também deixo o alerta que, para além das substituições nas nossas listas de compras, temos algo maior para nos preocuparmos nesse cenário: a fome.

Isso aqui é de julho do ano passado: “Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira”. Quem disse essa frase? Claro que vocês também já sabem.

Isso é de quinta-feira passada, sobre o arroz: "Eu não vou interferir no mercado, o que tem que valer é lei da oferta e da procura". Sim, ele de novo.

Faz parte de um projeto em andamento, um projeto eficiente de morte. Um projeto tocado por Bolsonaro e outros mais. Quem leu isso aqui não se surpreende.

Quem não leu, precisa ler.

PRECISA.

AGORA.

Juliana Gonçalves
Diretora de Redes Sociais/Repórter

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