Posted: 05 Oct 2020 03:54 AM PDT
«Há especialistas que sabem responder muito melhor do que eu à pergunta sobre quantos deputados pode ter um partido com 7% dos votos, porque há muitos factores a ter em conta. Em que círculos eleitorais são obtidos esses votos, quantas pessoas votam, quantos partidos concorrem, como de distribuem os votos. As incógnitas são várias.
Numa perspectiva muito conservadora, é possível eleger um deputado com perto de 2% do total de votos. Nas últimas legislativas, porém, três partidos conseguiram sentar três parlamentares (um cada um) em São Bento com menos de 1,5% cada. O PAN, com cerca de 3,5%, elegeu quatro. E a CDU, com aproximadamente 6,5%, elegeu 12.
A última sondagem publicada neste fim-de-semana no Expresso sobre intenções de voto nas legislativas aponta para que os dois maiores partidos mantenham valores idênticos aos obtidos em 2019. O PS sobe ligeiramente e o PSD desce algumas décimas, mas no essencial, no topo, pouco muda. O Bloco mantém-se em terceiro, perdendo votos. E o Chega sobe a quarto lugar, passando literalmente pela direita a CDU, o CDS, a IL e o Livre.
É aqui que está a grande diferença. O crescimento do Chega já não é só uma intuição, é uma evidência nas sondagens. Com estes valores, o partido de André Ventura passaria em tempo recorde, e com uma certa facilidade, de um deputado único para o quarto maior grupo parlamentar, com pelo menos uma dúzia de deputados (a percentagem que obtém na sondagem coloca-o acima da CDU nas legislativas de 2019).
Valorizando estes números, que são os mais recentes, o CDS passaria a contar tanto quanto a Iniciativa Liberal conta actualmente, por exemplo. Nestas condições, o contributo de Francisco Rodrigues dos Santos para um eventual bloco de direita seria irrelevante e não faria qualquer diferença.
É pelo facto de o Chega ser o partido que teria mais a ganhar numa ida às urnas que, neste momento, não interessa a nenhum dos principais partidos que haja uma crise política. O Presidente da República tem-no repetido à exaustão, numa tentativa de que esses mesmos partidos vejam além das negociações orçamentais.
É que, a julgar por estes números, o que mudaria se houvesse eleições antecipadas não era a chefia do Governo, que continuaria a caber ao PS. Tão pouco mudaria a liderança da oposição, que se manteria nas mãos do PSD. A grande mudança seria naquele pequeno partido de extrema-direita que hoje, só com um deputado, já influencia muito o discurso, o debate e a agenda parlamentar, introduzindo temas já por várias vezes considerados inconstitucionais. É esta a razão por que nenhum responsável político quer ouvir falar em crise e em eleições.
Todos nós já conhecemos André Ventura desde que era vereador do PSD em Loures e vamos escrutinando as suas propostas e declarações. Mas agora importa saber mais. Além dele, quem é o Chega? Diogo Pacheco Amorim? Elementos herdados de partidos ou movimentos extremistas? E mais? Quem teria lugar no Parlamento se as sondagens se confirmassem? Quem são e de onde vêm os militantes que sobressaíram no último congresso para mostrar que pensam diferente do líder (e que conseguem ser mais radicais do que ele)? Há um Chega além de Ventura?
Tenho muito mais perguntas para os próximos tempos. Tentarei também ter as respostas.»
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