Por estatuadesal |
(Eugénio Rosa, in Resistir, 10/01/2021)
Para se poder compreender os efeitos da crise atual quer a nível social (rendimentos dos trabalhadores) quer a nível económico (criação de riqueza) é importante ter um quadro claro da situação em que se encontrava o país antes da pandemia, até para se poder conhecer para onde estamos a caminhar nestas duas áreas vitais para a vida dos portugueses. Este estudo é apenas um alerta de um outro lado da crise para reflexão.
OS SALÁRIOS EM PORTUGAL CORRESPONDEM A METADE DA MÉDIA DOS PAISES DA UE, MAS EM MUITOS BENS OS PORTUGUESES SÃO OBRIGADOS A PAGAR PREÇOS EUROPEUS (combustíveis, gás, etc)
O gráfico 1, com os últimos números disponibilizados pelo Eurostat mostra a grande diferença entre os salários pagos em Portugal e os salários praticados nos países da União Europeia.
Antes da crise, o salário horário médio em Portugal era já menos de metade do salário horário médio nos países da União Europeia. Entre 2006 e 2018, a percentagem que o salário médio hora pago aos trabalhadores portugueses representava em relação ao salário médio hora na União Europeia diminuiu de 52,3% para apenas 48,9%. Portugal continua a ser um país de muito baixos salários, o que determina que a sua economia tenha uma baixa intensidade tecnológica e de conhecimento e seja extremamente frágil como a experiência tem estado e está a mostrar. E é com estes baixos salários que os trabalhadores portugueses estão a enfrentar as consequências dramáticas da crise, nomeadamente a perda de rendimentos. O quadro 1, com dados do INE mais recentes, confirma as baixas remunerações que são pagas no setor privado em Portugal em 2020, o que torna a situação ainda mais difícil mesmo para aqueles que têm trabalho.
A remuneração bruta total é muito baixa em Portugal (6,05€/hora segundo o INE em 2020). Em junho de 2020, quando comparado com idêntico mês de 2019, verifica-se já uma redução 18,4% na remuneração hora bruta total que resulta do facto das entidades patronais, aproveitando a crise que as afeta, começarem já a pressionar as remunerações para as baixar ainda mais com o objetivo de transferir os custos da crise para os trabalhadores. Ainda não há luz no túnel. E acentua-se a insegurança com a ameaça de novo confinamento.
A RIQUEZA CRIADA EM PORTUGAL ERA JÁ INSUFICIENTE ANTES DA PANDEMIA E CAIU COM A CRISE
Mesmo antes da crise, o PIB (riqueza criada) por habitante em Portugal já era muito inferior à média dos países da UE como revelam os dados do Eurostat do gráfico 2. Baixos salários geram baixa riqueza criada.
Em 2010, o PIB por habitante em Portugal correspondia a 66,6% do PIB médio por habitante dos países da União Europeia e, em 2019, tinha descido para 64,7%. Portugal ao invés de convergir para a média da UE estava a divergir. A riqueza criada por habitante no nosso país é cada vez mais insuficiente.
Antes da crise, cada trabalhador em Portugal criava por trimestre riqueza (PIB) avaliada entre 11.869€ (1º Trimestre de 2019) e 11.990€ (4º Trimestre de 2019) o que, comparado com a média dos países da UE correspondia a cerca de 64,7%. Com a grave crise causada pela pandemia que levou ao fecho de uma parte significativa da economia, a queda da riqueza criada por trabalhador foi brusca e acentuada (-13,6% no 2º Trim.2020 quando comparado com o trimestre homólogo de 2019). Com o desconfinamento no 3º Trim.2020 registou-se uma certa recuperação da economia já que o PIB por trabalhador aumentou, entre o 2º Trimestre e o 3º Trim.2020, de 10.282€ para 11.553€ (+12,3%), o que mostra que o teletrabalho é um mito. Com a ameaça de novo confinamento causada pela nova onda do COVID 19, a concretizar-se, a contração da economia será maior que a do 2º Trim.2020, pois a economia está mais fragilizada e muitas empresas, que conseguiram sobreviver ao 1º confinamento, é de prever que já não consigam agora. Ficaremos com um país e uma economia mais destruída e com maior desemprego. E os apoios não resolvem o problema.
UM ESTADO CADA VEZ MAIS ENDIVIDADO, CUJA DIVIDA TERÁ DE SER PAGA COM OS NOSSOS IMPOSTOS
Para apoiar as empresas e as famílias a divida pública tem aumentado assustadoramente. Segundo o Boletim Estatístico do Banco de Portugal de jan.2021, entre dez.2019 e out.2020, portanto em apenas 10 meses, a divida das Administrações Públicas aumentou de 310.466 milhões € para 330.000 milhões €, e a divida na ótica de Maastricht subiu de 249.985 milhões € para 268.143 milhões €. No fim de set.2020, a divida das Administrações Públicas já correspondia a 160,8% do valor do PIB e a de Maastricht a 130,8%.
Um aumento da taxa de juro criará uma situação insustentável ao país pois os encargos com uma divida desta dimensão poderão tornar-se incomportáveis.
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