Sair da História em barcos fluviais
(Por Régis de Castelnau in Reseau International, 28/07/2024, Trad. Estátua de Sal) Não assisti à “cerimónia” de abertura da feira olímpica. Ainda assim, não convém passar ao lado. Assistir a um espetáculo caro, concebido por Patrick Boucheron e Thomas Jolly, para permitir ao psicopata do Eliseu encenar-se, desculpem, há limites para o masoquismo. Sabíamos perfeitamente que lá íamos encontrar uma cultura extraordinariamente “baixa, vulgar, vistosa como um vidro de explorador” que um Ocidente globalizado, depois de ter arrancado as suas raízes, tenta impor ao mundo. É evidente que não falhámos o prognóstico. Boucheron e Jolly deram-nos, previsivelmente, a quantidade certa de modernidade conformista e vendedora, com algumas provocações woke dirigidas ao público americano, como a dizer-lhe: “concordando com JD Vance, somos ‘clientes subservientes’, mas vejam, somos capazes de ser tão estúpidos como vocês”. Até à passagem da barcaça dos Estados Unidos, saudada com incríveis espasmos de adoração submissa, pelos comentadores televisivos.
Também não vou entrar na questão desportiva, apesar de sempre ter adorado o desporto em geral e os Jogos Olímpicos em particular. Mas, parafraseando Philippe Bordas, diria que “o Olimpismo só durou um século. O que ainda se chama olimpismo e faz de si próprio um espetáculo não passa de uma farsa, um artefacto próprio de um mundo distorcido pelo dinheiro, pela genética e pelo bio-poder”. A última vez que assisti a uma cerimónia de abertura foi nos Jogos de Pequim de 2008. A mensagem enviada ao mundo foi muito clara. Era a de Fernand Braudel na sua “História das Civilizações”: “Imaginem uma civilização contínua no outro extremo do mundo, inalterada há milénios, governada por dinastias imperiais superiores às de Roma, ignorante da filosofia grega, do alfabeto, da democracia, do cristianismo, do individualismo, do feudalismo, do Renascimento ou do Iluminismo, cujo povo supera o nosso em inteligência e cujas instituições superam as nossas em eficácia. Imaginem-nos a prosperar hoje, ultrapassando-nos em todos os domínios de atividade”. E enquanto isso, entre dois gaguejos de Biden - o nosso próprio Imperador -, reelegemos Macron e contemplamos com prazer o espetáculo da nossa saída acelerada da História. |
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