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terça-feira, 15 de outubro de 2024

 

Israel versus Irão: a Rússia entrou no jogo

By estatuadesal on Outubro 14, 2024

(Por M.K. Bhadrakumar, in Outras Palavras, 10/10/2024, revisão da Estátua)

2018: Putin encontra-se, em Teerão, com então presidente do país, Hasan Rohani

Um grande analista do Médio Oriente sustenta: os mísseis iranianos já são capazes de penetrar a “cortina de ferro” israelita. Há indícios claros de que Moscovo está apoiando Teerão – e de que ambos firmarão, em breve, um pacto de defesa mútua.


Israel, aparentemente, pôs na gaveta o seu ataque planeado contra o Irão. Uma combinação de circunstâncias pode estar na base desse recuo, o que desmente a retórica intensa de Telavive, de que estava pronta para agir.

Apesar da brilhante gestão dos média por Israel, surgiram relatos de que o ataque de mísseis iranianos a 1 de outubro foi um sucesso espetacular. Foi uma demonstração da capacidade de dissuasão do Irão para esmagar Israel, se necessário. O fracasso dos EUA em intercetar os mísseis hipersónicos iranianos trouxe uma mensagem própria. O Irão afirma que 90% dos seus mísseis penetraram nos sistemas de defesa aérea de Israel.

Will Schryver, engenheiro técnico e comentador de segurança, escreveu no X: “Não entendo como, alguém que viu os muitos vídeos dos ataques de mísseis iranianos contra Israel, pode não reconhecer e não admitir que foi uma demonstração impressionante das capacidades iranianas. Os mísseis balísticos do Irão ignoraram as defesas aéreas dos EUA/Israel e realizaram vários ataques com grandes ogivas contra alvos militares israelitas.”

Evidentemente, na situação de pânico que se seguiu em Israel, até 4 de outubro ainda havia indecisão sobre qual tipo de resposta dar ao Irão. Como disse o presidente dos EUA, Joe Biden, “se eu estivesse no lugar deles [israelitas], estaria a pensar em outras alternativas além de atacar campos de petróleo”. Esta declaração foi feita numa rara aparição na sala de imprensa da Casa Branca, um dia depois das autoridades israelitas dizerem que uma “retaliação significativa” estava iminente.

Biden acrescentou que os israelitas “ainda não concluíram como — e o que vão fazer” em retaliação. Biden também disse aos repórteres que o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, deveria lembrar-se do apoio dos EUA a Israel ao decidir os próximos passos. Também afirmou que estava a tentar mobilizar o mundo para evitar uma guerra total no Médio Oriente.

Nesta pantomina, é mais seguro acreditar em Biden, já que a verdade é que, sem a ajuda prática e financeira — e a intervenção direta — dos EUA, Israel simplesmente não tem fôlego para enfrentar o Irão. O dominío regional de Israel restringe-se a executar planos de assassinato e a atacar civis desarmados.

Mas, mesmo aqui, é discutível o quão autossuficiente Israel é, em comparação com o Irão. Surgiram relatos de que foi a nova inteligência tecnológica dos EUA que localizou o paradeiro do líder do Hezbollah, Sayyed Nasrallah, o qual foi transmitido a Israel, levando ao seu assassinato.

Curiosamente, o diretor da CIA, William Burns, interveio para refutar os rumores de que o Irão tenha conduzido um teste nuclear no último sábado, 5 de outubro. Falando numa conferência de segurança na segunda-feira, Burns afirmou que os EUA monitoraram de perto a atividade nuclear do Irão em busca de qualquer sinal de que o país esteja acelerando em direção a uma bomba nuclear. “Não vemos evidências hoje de que tal decisão tenha sido tomada. Observamos isso muito cuidadosamente”, disse ele. Burns desfez, assim, suavemente, outro pretexto para atacar o Irão.

Um fator crítico que obrigou Israel/EUA a adiar qualquer ataque ao Irão foi o severo aviso de Teerão de que qualquer ataque à sua infraestrutura por Israel seria respondido com uma reação ainda mais dura. “Ao responder, não hesitamos nem agimos precipitadamente”, afirmou o ministro das Relações Exteriores, Abbas Araghchi, que, aliás, fez uma viagem ao Líbano e à Síria no fim de semana para enviar uma “mensagem” desafiadora a Israel — como ele afirmou — de que “o Irão apoiou fortemente a resistência e sempre a apoiará.”

No início de 4 de outubro, o Líder Supremo, Aiatola Ali Khamenei, usou um raro sermão público para defender o ataque de mísseis do Irão contra Israel, dizendo que foi “legítimo e legal” e que, “se necessário”, Teerão o faria novamente. Falando em persa e árabe durante as orações de sexta-feira em Teerão, Khamenei disse que o Irão e o Eixo da Resistência não recuarão diante de Israel. O Irão não “procrastinará nem agirá apressadamente ao cumprir seu dever” de confrontar Israel, declarou Khamenei.

No entanto, o que desmotiva os israelitas e causa desconforto nos EUA é outra coisa — a crescente sombra da Rússia sobre o cenário do Médio Oriente.

Analistas militares norte-americanos divulgaram que certas armas altamente avançadas da Rússia foram transferidas para o Irão nas últimas semanas, apoiadas pelo envio de pessoal militar russo para operar esses sistemas, incluindo mísseis S-400. Há especulações de que o secretário do Conselho de Segurança da Rússia (ex-ministro da Defesa) Sergei Shoigu fez recentemente duas visitas secretas ao Irão.

Aparentemente, Moscovo também respondeu ao pedido iraniano do envio de dados de satélite, relativos a alvos israelitas, para realizarem o seu ataque de mísseis a 1 de outubro. A Rússia também forneceu ao Irão o sistema de guerra eletrónica de longo alcance “Murmansk-BN”. O sistema “Murmansk-BN” é um poderoso sistema de guerra eletrónica, capaz de bloquear e intercetar sinais de rádio inimigos, GPS, comunicações, satélites e outros sistemas eletrónicos até 5.000 km de distância, neutralizando munições “inteligentes” e sistemas de drones — e é capaz de interromper sistemas de comunicação via satélite de alta frequência pertencentes aos EUA e à NATO.

Sem dúvida, o envolvimento russo no impasse do Irão com Israel é potencialmente um divisor de águas. Do ponto de vista dos EUA, isso levanta o espectro preocupante de um confronto direto com a Rússia, algo que Washington quer evitar.

É nesse cenário que agências de notícias oficiais russas citaram o assessor presidencial Yury Ushakov, no domingo, afirmando que Putin planeia encontrar-se com o seu homólogo iraniano, Masud Pezeshkian, na capital do Turquemenistão, Ashgabat, em 11 de outubro. Ushakov não elaborou sobre a reunião. De facto, isso é uma surpresa, já que os dois líderes programaram encontrar-se novamente na cúpula do BRICS, na cidade russa de Kazan, de 22 a 24 de outubro.

Claro, os iranianos também estão sendo discretos. Tanto Moscovo quanto Teerão anunciaram que os seus presidentes visitariam Ashgabat em 11 de outubro para participar numa cerimónia marcando o 300º aniversário de nascimento do poeta e pensador turcomano Magtymguly Pyragy. Fumaça e espelhos! (aqui e aqui).

É totalmente concebível que, no meio das crescentes tensões regionais, Moscovo e Teerão possam ter pensado em antecipar a assinatura formal do pacto de defesa russo-iraniano, originalmente programado para acontecer em Kazan.

Se for assim, o evento de sexta-feira será semelhante à visita não programada do então ministro das Relações Exteriores soviético, Andrei Gromyko, a Nova Deli para a assinatura do histórico Tratado de Paz, Amizade e Cooperação entre a Índia e a URSS, em 9 de agosto de 1971.

Curiosamente, Ushakov acrescentou que Putin não tem planos de se encontrar com Netanyahu. Putin ainda não respondeu a um pedido de Netanyahu para uma conversa telefónica, feito há cinco dias. Uma lenda que Netanyahu criou, nos últimos anos, para impressionar o seu público doméstico (e confundir as ruas árabes) — de que ele tinha um relacionamento especial com Putin — está a desmoronar-se.

Por outro lado, ao marcar uma reunião urgente em Ashgabat — na verdade, o presidente do Turquemenistão, Serdar Berdimuhamedov, esteve em Moscovo apenas na segunda-feira/terça-feira para uma visita de trabalho — o Kremlin está deixando claro para Washington e Telavive que Moscovo está irrevogavelmente alinhado com Teerão e ajudará este último, não importa o que for necessário. (Veja, no meu blog outro artigo, “Crise na Ásia Ocidental leva Biden a quebrar o gelo com Putin”, 5/10/24, aqui).

A história não estará a repetir-se? O Tratado Indo-Soviético de 1971 foi o tratado internacional mais consequente assinado pela Índia desde sua independência. Não foi uma aliança militar. Mas a União Soviética aumentou a capacidade militar da Índia para uma guerra iminente e criou espaço para que o país fortalecesse as bases de sua autonomia estratégica e da sua capacidade de ação independente.

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