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quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

Raríssimas: como todos os debates acabam

por estatuadesal

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 14/11/2017)

Daniel

Daniel Oliveira

Como ministro, Vieira da Silva recebeu uma queixa por uma irregularidade estatutária: a Raríssimas tinha ficado sem tesoureiro. A queixa não era o que ficámos a conhecer na reportagem da TVI. Com dez mil IPSS, não me choca que ela seguisse a tramitação normal que, no Estado, sabemos ser lenta. Também o foi em Belém, que só esta semana encontrou a correspondência enviada, sem que isso causasse grande choque. De resto, tudo o que aconteceu na Raríssimas vem desde 2013 e este governo tinha tanta informação como o anterior. O terceiro sector não está sob tutela do Estado. Como 75% dos recursos da Raríssimas não são públicos, não é o Estado que anda a ver se gastam o dinheiro em gambas e vestidos. Isso cabe aos órgãos da própria associação.

Passamos então para a responsabilidade do próprio Vieira da Silva como vice-presidente da Assembleia Geral. É, como sabe quem participou em associações, um cargo honorífico. É verdade que não devia ser, mas o mal é geral, não é dos políticos. Dirão que o convite a políticos revela a tentativa de proximidade destas associações em relação ao poder. É verdade e sobre a total dependência do terceiro sector em relação ao Estado já escrevi. Estes dois anos, em que a comunicação se tornou mais atenta, têm-nos feito subitamente descobrir o país em que vivemos.

Mas mesmo que não fosse um cargo honorífico, as irregularidades divulgadas dificilmente poderiam ser do conhecimento da Assembleia Geral.

Muito do que tenho lido por aí revela um total desconhecimento do funcionamento das associações. O que a Assembleia Geral aprova são as contas, conhecendo as grandes rubricas. Não estão lá as gambas e os vestidos. Desde que as IPSS foram dispensadas de ter revisores oficiais de contas, que teriam deveres diferentes, a Assembleia Geral só poderia conhecer esses abusos se o tesoureiro os reportasse.

Esperou seis anos, em que colaborou com a trafulhice, para o dizer. Não à Assembleia Geral, como era seu dever, mas à TVI. Atribuir a cargo de vice-presidente da Assembleia Geral um papel de cúmplice deste tipo de irregularidades só pode resultar de má-fé ou ignorância.

Muitas empresas foram doadoras da Raríssimas até este escândalo rebentar. Mais do que o Estado, aliás. Algumas, segundo sei, estão a retirar o seu apoio, o que compreendo mas deixa-me preocupado. A anterior primeira-dama, Maria Cavaco Silva, foi madrinha da instituição e até lá levou a Rainha de Espanha. Marcelo Rebelo de Sousa visitou a Casa dos Marcos. Vieira da Silva aceitou ser vice-presidente da Assembleia Geral. Ricardo Batista Leite, deputado do PSD, tinha aceite ser vice-presidente da próxima direção. E os serviços do Estado decidiram financiar a Raríssimas, no correspondente um quarto dos seus recursos, menos do que a média das IPSS, que andará por metade. Todos os fizeram porque todos os que conheciam a Raríssimas tinham a melhor opinião sobre o seu trabalho. A não ser que se prove má-fé na ajuda que deram, a caça a quem se ajudou uma IPSS que trabalha numa área tão difícil é absurda.

Até porque a boa opinião que todos tinham do trabalho junto dos utentes dos serviços da Raríssimas não era, segundo grande parte dos relatos que me chegam, injustificada. A instituição foi premiada em Portugal e no estrangeiro porque, ao que parece, faz mesmo um bom trabalho naquela área. Preocupa-me, aliás, a situação em que se encontra agora, pondo em risco as pessoas que dependem dela. Penso que uma das coisas a que estamos obrigados a fazer, como cidadãos, depois desta indignação, é a apelar para que haja uma direção que transmita credibilidade, para que os apoios regressem e para que os utentes continuem a ter o ajuda que precisam. O bom trabalho que a Raríssimas faz não é incompatível com uma presidente arrivista, abusadora e que maltrata o dinheiro que não é seu. As coisas na vida são mais contraditórias do que este tipo de polémicas fazem pensar.

O que revela muito sobre a fragilidade da nossa sociedade civil é sermos incapazes de fazer qualquer debate – incluindo o do funcionamento do terceiro sector – sem que ele se transforme, mesmo quando isso é manifestamente forçado, num mero confronto partidário. A tentativa de transformar este caso numa espécie BPN do PS, que alguns comentadores mais ativistas e imaginativos tentam ensaiar, diz tudo da má-fé com que algumas pessoas estão a lidar com este caso.

Mas é natural que o debate acabe sempre assim. A maioria dos portugueses sabe o que são os partidos mas nunca meteu os pés numa associação. E essa anemia da nossa sociedade civil ajuda a explicar muito do que deveríamos estar discutir com este caso: porque temos uma sociedade civil tão frágil, totalmente dependente do Estado e que todos esperam que seja tutelada por ele.

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Valha-me Deus, a Justiça é discutida

por estatuadesal

(Francisco Louçã, in Público, 12/12/2017)

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Os casos sucedem-se: primeiro foi o juiz Neto de Moura e os seus pergaminhos que condenam à morte a mulher adúltera, agora vem um juiz de Viseu absolver um acusado porque a mulher agredida seria “moderna” e “autónoma” e portanto que se safasse. Há nisto várias coincidências, todas preocupantes. Mesmo que se admita que a comunicação social está mais atenta à repetição do folclore machista do que ao direito administrativo, estes acórdãos em si mesmos já são suficientes para demonstrar casos sucessivos de argumentos baseados no simplismo reacionário e de falta de senso ao exibi-lo. Mas há outra coincidência, essa porventura mais profunda, que é a resposta do próprio sistema judicial ao facto de ser criticado.

Começo pela primeira, para se poder medir o significado da segunda. Conta o PÚBLICO que, no tribunal uma testemunha do acusado afirmou que “Ângelo admitiu que dava pontapés em Susana, mas ‘de raspão’, e que a esmurrava, mas não era ‘a sério’, e que ela também lhe dava beliscões. E a outra contou que Ângelo admitiu que lhe batia, mas que ‘não era do nada’”. As testemunhas da ofendida não mudaram a decisão do juiz, absolvição, a mulher que tivesse saído de casa. Não se invocou uma doutrina religiosa castigadora, em todo o caso. Ora, se a mulher tivesse saído de casa e o julgamento chegasse ao outro juiz que cita a Bíblia, talvez fosse por isso condenada, ela. Não é boa notícia, que a decisão do tribunal possa desviar-se da lei para navegar ao sabor das alergias de cada juiz.

A mediatização destes dois processos prova então o quê? Que há uma agenda na comunicação social contra os juízes, aliás erguidos em pedestal noutros casos, ou simplesmente que estas sentenças suscitam choque e pavor? Ora, que se discutam as decisões dos tribunais é simplesmente o novo normal de uma sociedade em que toda a vida pública é mediatizada e mesmo espectacularizada, tantas vezes com empenho e agrado dos seus protagonistas (já viu juízes a darem entrevistas suculentas ou até desembargadores com programas de televisão, não viu?). A justiça será mediática mesmo que não o queira, embora aconteça até que o quer, desde que fale e decida mas não tenha que ouvir.

Assim, esta mediatização suscita outra coincidência ou convergência: a dos magistrados que vêm a público queixar-se das pressões que sofrem por via da exposição mediática. Deixo de lado os casos em que os agentes judiciais, magistrados ou outros, violam o segredo de justiça para manipular a comunicação social com notícias bombásticas, verdadeiras ou falsas, ou para conseguirem condenações antecipadas na opinião pública. Isso tornou-se um sistema tão enraizado que tem sido sugerido que a única solução seria acabar de todo com o segredo (e como se investigaria então o crime complexo?). Mas cinjo-me aqui à mediatização legítima, ao conhecimento do que o tribunal decidiu mesmo.

Ora, cai o Carmo e a Trindade quando isso acontece, porque é uma pressão. “Se agora vai existir uma sindicância sobre todas as decisões dos juízes, qualquer dia não julgam. Têm medo de toda a gente“, avisa Manuela Paupério, dirigente sindical dos juízes.

Acerca de um misterioso texto assinado por seis misteriosas figuras de topo da justiça – não se conhece nem o texto completo nem a lista dos seis – um dos misteriosos autores esclarece o Expresso que “ao proferir uma decisão o juiz não tem de ser politicamente correto ou conformar-se com as ‘modas’ das maiorias” mas, ainda assim, sugere que o juiz “tem de usar particulares cautelas nas suas formas de expressão não exorbitando os princípios constitucionais e legais a que está vinculado”. Que o juiz “não exorbite” a lei parece razoável, só se estranhando que tenha de ser repetido. Mas o que é a tal “moda” e o tal “politicamente correcto” com que o juiz não se deve “conformar”? E se não se conforma como se disforma?

Há demasiada gente a pronunciar-se”, explica outro misterioso signatário. Demasiada gente? Pois, toda a gente pode discutir dado que a sentença é pública, o que aliás é um princípio fundamental da justiça. A justiça, por isso, produz informação: quer que se saiba. Mas não pode haver uma “sindicância sobre todas as decisões dos juízes”, isso nunca. A justiça pretende assim ser Estado e portanto decidir de modo a mostrar a lei e o exemplo, mas quer que não se veja ou, se se vir, que não se discuta? Quer obediência mas não opinião? Quer lei mas não democracia? Espero que alguém perceba que isto cava uma sepultura.

A justiça é pública e vive numa sociedade de informação líquida, mesmo que poluída. O seu problema não pode ser a atenção crítica, só pode ser a sua consistência. É melhor mesmo que os juízes apliquem a lei.

PS- Rui Tavares, a propósito de uma entrevista sobre o meu livro recente, “Sombras”, que aliás não leu, resolveu fuzilar aqui no PÚBLICO: “vendilhão de apocalipses”. Não valendo a pena esperar que ele tenha substância ou sequer elegância, resta-me desejar-lhe as melhoras.

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Uma Cabala muito bem feita

Novo artigo em Aventar


por Bruno Santos

Uma das pessoas envolvidas na corrente polémica sobre a Raríssimas terá vindo a público em protesto e auto-defesa, afirmando que toda essa controvérsia era “uma Cabala muito bem feita”. Entre as expressões que as pessoas - principalmente os políticos - acusadas publicamente de vigarice têm sempre à mão, contam-se algumas de fino recorte literário, metafórico e etimológico, como “campanha negra”, “conspiração”, “calúnias”, “interesses ocultos”, “vêm aí eleições” e a famosa “Cabala” que aqui nos traz entretidos por instantes.

Ora, a verdade é que a Cabala, que é um sistema de conhecimento (gnose) esotérico e de transmissão oral chegado até nós por via hebraica, nada tem que ver com as raríssimas tendências da direcção de uma IPSS povoada de gente famosa - principalmente políticos - com especial atracção por marisco, viaturas de alta cilindrada e a praia de Copacabana.

A Cabala, a verdadeira Cabala, chegou ao povo judeu por influência e transmissão dos Caldeus, através do profeta Daniel e do escriba e sábio Esdras. Aos israelitas anteriores ao desaparecimento das dez tribos ditas “não-judaicas” - todas com a excepção de Judá, Benjamim e Levi -, a Cabala chegou através dos egípcios, pelas mãos de Moisés.

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Jornalismo de sarjeta e… calma!

por estatuadesal

(In Blog Aspirina B, 14/12/2017)

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(Andam para aí choros e rasgar de vestes dos donos das televisões e dos jornais tradicionais contra as redes sociais, acusando-as de serem um meio de propagação de "fake news". Na verdade, os orgãos de comunicação social tradicional sempre foram canais de transmissão de "fake news", aquelas que interessam a quem lhes paga a publicidade, ou que interessam ao poder global dominante, como se viu no caso da guerra do Iraque com as fantasiosas armas químicas do Saddam. Este artigo é mais uma prova de que continuam a fazer o que sempre fizeram.

Quer-me parecer que choram porque estão a perder um monopólio que lhes dava lucros chorudos. E como todos os monopólios, quando aparece a concorrência, perdem poder e rendas de situação.

Estátua de Sal, 14/12/2017)


Hoje, logo pela manhã, o DN noticiava que o valor do financiamento atribuído à Raríssimas quadruplicara com o actual governo. Escândalo, sugeria a manchete. Falcatrua, sugeria também, isto de o ministro Vieira da Silva ter passado pela associação tivera como resultado um favorecimento imoral. O quádruplo das verbas previstas pela governo anterior é muito múltiplo. Mas é verdade?

Não, é mentira. O insuspeito Observador foi ler melhor os despachos e chegou à conclusão de que as verbas são praticamente as mesmas – na ordem dos 1 200 000 euros, apesar do aumento do número de camas. Com o esclarecimento do Ministério da Saúde (também reproduzido pelo site), mais se confirma a fraude noticiosa do DN.

Até à hora a que escrevo, o DN mantinha a notícia inalterada.

Sobre este assunto da Raríssimas e a tentativa logo pronta de envolver um importante membro do Governo nas eventuais irregularidades (pela jornalista da TVI e pela oposição de direita), importa referir uma entrevista que ouvi ontem, por acaso, na SIC Notícias (já depois das 21h00) ao ex-tesoureiro denunciante das irregularidades e na qual, pelos vistos mais moderado, ele sublinha que gostaria que o problema não fosse levado para o campo dos ministros ou políticos que tenham colaborado com a associação, porque não é aí que ele está. Que convém não perder o foco: a gestão danosa, autoritária e prepotente da presidente agora demissionária. Pareceu-me ser um reparo ao próprio jornalista. Li também que não é a mesa da Assembleia Geral que aprova as contas. Podendo nós questionar-nos por que razão este senhor demorou algum tempo a denunciar as irregularidades observadas, parece, de facto, ter havido abuso de poder e aproveitamento por parte da presidente. Se são pecadilhos ou crimes, a justiça o dirá. Convém, porém, não esquecer que o trabalho realizado no que aos doentes diz respeito é meritório, muito meritório mesmo, atendendo aos casos que as imagens mostram, e que a dirigente de uma associação deste tipo tem todo o direito e, porventura, o dever de tudo fazer, incluindo lobbying, para aumentar a visibilidade da associação, inclusive a nível internacional, e os donativos para a causa. Parece-me ir demasiado entusiasmo na justiceira e assanhada (sempre em direcção aos mesmos) Ana Leal. Um entusiasmo politiqueiro, telenovelesco e de devassa que não se justifica de todo num trabalho sério.

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