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terça-feira, 16 de janeiro de 2018

François Chesnais e os impasses do capitalismo

por estatuadesal

(Por Eleutério F. S. Prado, in Blog Outras Palavras, 16/01/2018)

O sistema emparedou a si mesmo ao esgotar o planeta, eliminar trabalho em massa e financeirizar-se. “Solução” tem sido exploração inédita, ataque aos direitos, corrosão da democracia. Reagiremos a tempo?

capital

É preciso começar pelo fim. François Chesnais escreveu em novembro de 2017 uma série de três pequenos artigos para o portal A l’encontreem que atualiza a sua compressão dos impasses atuais do capitalismo globalizado. Na última sentença do terceiro artigo, cita com aprovação uma frase de um filósofo francês muito conhecido por seus trabalhos seminais em sociologia da ciência: “numa perspectiva diferente, compartilho o julgamento de Bruno Latour segundo o qual as classes dominantes já não pretendem governar, mas apenas se protegerem do mundo”. Pois, diante das perspectivas para manter o modo de vida dominante, chegaram à conclusão paradoxal – e que permanece amplamente tácita – de que “não há mais lugar na terra para eles e para o resto dos habitantes do mundo”.

Nessa visão, pois, a classe dominante está assustada com o presente e sem esperanças em relação ao futuro.

Os três artigos, em última análise, procuram encontrar os fundamentos econômicos dessa percepção. Ainda que more reconditamente na subjetividade social das classes dominantes nos países capitalistas em geral, ela se revela, por exemplo, no comportamento amalucado de um governante como Donald Trump. Mas não só na cabeça atual do imperialismo norte-americano. Revela-se também na atuação política da direita fascista que, com diferenças locais, brota e cresce agora em muitos países do mundo sejam eles do centro ou da periferia. Ainda que ela possa, sim, produzir também enormes desastres humanitários, deve-se observar que essa direita aparece no cenário político contemporâneo como uma nova farsa – não oferece qualquer futuro digno para as mulheres e para os homens, apenas a violência que procura manter ainda o que já está em processo acelerado de decomposição.

Os três artigos são muito técnicos, mas traduções para o português podem ser encontradas no sítio Economia e Complexidade: parte 1, parte 2, parte 3. Aqui se apresenta um resumo desse material que pretende colher as suas principais teses de um modo acessível para aqueles que não são nem economistas nem críticos da economia política. Antes desses três textos, ele escreveu em fevereiro de 2017, ainda no A l’encontre, um artigo inicial que suscitou muitas controvérsias e mesmo críticas fortes. Pois, a sua tese central afirmava peremptoriamente que o capitalismo encontrara agora dois limites intransponíveis:

No livro III de O Capital, Marx afirma que “a produção capitalista tende constantemente a exceder os limites que lhe são imanentes, mas só o consegue fazer utilizando meios, que, mais uma vez, e agora em escala maior, recolocam depois perante si essas mesmas barreiras”. A questão posta é a de saber se a produção capitalista está agora se confrontando com barreiras que ela não pode mais ultrapassar, nem mesmo temporariamente. Estaríamos em presença de duas formas de limites intransponíveis, com implicações muito fortes para a reprodução do capital e a gestão da ordem burguesa, sobretudo para a vida civilizada. Uma delas, decorrente dos efeitos da automação, remonta ao século XIX e tem um caráter imanente, interno ao movimento do capital, sobre o qual Marx insistiu fortemente. A outra, decorrente da destruição pela produção capitalista dos equilíbrios ecossistêmicos, particularmente da biosfera, não foi prevista por Marx e foi inicialmente definida como um limite externo.

Ora, a tese de que o capitalismo encontrou agora um limite interno insuperável sofreu críticas porque não tem apoio nem nas estatísticas nem nos textos de Marx. Na verdade, parece reeditar um velho argumento determinista, segundo o qual o desenvolvimento do capitalismo termina necessariamente num colapso. Assim posta, entretanto, ela contraria a dialética do desenvolvimento da relação de capital. Entretanto, como se verá em sequência, também é possível encontrar em seus textos uma tese alternativa e esta, sim, tem boa procedência. E, diante dela, a figura de tal “limite intransponível” vai aparecer ao final – mesmo sendo um erro em sentido estrito – apenas como exagero, como ênfase retórica.

Na verdade, quando se lê o conjunto dos artigos, vê-se que Chesnais apresenta duas barreiras internas e um limite externo para o desenvolvimento atual do modo de produção capitalista. Note-se, porém, que barreiras são limites, mas não limites intransponíveis. Assim compreendidas, então de acordo com a lógica de evolução do capital com sujeito automático do capitalismo. Como ele mesmo lembra, Marx escrevera no Livro III de O capital que “a produção capitalista tende constantemente a superar os limites que lhes são imanentes, porém consegue isso apenas em virtude de meios que voltam a elevar diante dela esses mesmos limites, em escala mais formidável”.  E isto se vale apenas para os limites internos, os quais são transformados em barreiras pelo “sujeito” capital que sempre atua, na verdade, por meio da vontade e do tino dos capitalistas e dos agentes do Estado.

Para compreender a questão, é preciso começar dizendo que o capitalismo não pode sobreviver de modo sadio senão elevando a massa de mais-valor (M) que é gerada nos processos de produção de mercadorias reais sob o comando da relação de capital. E essa massa (M) é algebricamente igual à razão do mais-valor por unidade de produção (M/P) multiplicada pelo próprio volume de produção (V) (ver quadro).

quadro

Note-se, então, que a elevação da força produtiva, isto é, o aumento da produtividade do trabalho – uma característica intrínseca e crucial desse modo de produção –, tende constantemente a reduzir a massa de mais-valor por unidade de produção. E isso tende a ocorrer no longo prazo mesmo se aumenta a razão entre o mais-valor e o valor adicionado. Resulta daí que o capitalismo está sempre sabotando a sua própria saúde de explorador bem-sucedido. Portanto, para que essa massa aumente constantemente e para que ele permaneça são e salvo, é preciso que o volume de produção se eleve sem cessar, numa taxa superior à taxa de redução da razão mencionada.

Ora, a elevação do volume de produção depende da taxa de lucro prospectiva e, assim, da capacidade do próprio capitalismo de gerar demanda efetiva por meio do investimento. Porém, essa taxa de lucro também tende a cair no longo prazo com o progresso das forças produtivas, ou seja, com o próprio processo de acumulação. Como se sabe, o aumento da produtividade eleva o capital constante (capital investido em máquinas, instalações, materiais primas) em relação ao capital variável (capital investido na contratação de trabalhadores) e isto tende a reduzir a taxa de lucro. Como também se sabe, há também tendências contrariantes que impedem essa queda no curto prazo, mas não no longo em princípio.

Essas relações têm enorme importância na história real do capitalismo. E elas, por isso, estão subjacentes aos argumentos aqui examinados. Contudo, é preciso ir por partes.

Considere-se agora, em primeiro lugar, o limite externo tal como indicado pelo autor. Ele advém da deterioração progressiva, atualmente acelerada, das condições ambientais ou ecossistêmicas da atividade humana no planeta. Como ficou claro no parágrafo anterior, o capitalismo, para sobreviver, precisa expandir constantemente o volume da produção e, para tanto, ele tem de explorar sem cessar e imensamente a natureza. Ocorre que essa expansão, como indicam os inúmeros estudos ecológicos, está atingindo ou mesmo já atingiu a capacidade de carregamento do planeta Terra.

Como se sabe, essa capacidade tem sido ampliada rapidamente desde o último quartel do século XVIII pelas fantásticas conquistas da ciência e da tecnologia. Porém, há inúmeros indícios, tais como o aquecimento global, a acidificação dos oceanos, a poluição ambiental, a destruição das espécies, etc., indicando que a natureza não está mais disposta a suportar os desatinos da civilização humana. Em consequência, ou certas atividades extrativas de recursos da natureza se tornam impossíveis ou os seus custos fixos tendem a se tornar extraordinários. Eis como o próprio autor aqui discutido explica a emergência dessa limitação:

Marx escreveu que “o capital, enquanto representa a forma universal da riqueza – o dinheiro – é a tendência ilimitada e incomensurável a superar os seus próprios limites. Caso contrário, deixaria de ser capital (…)”. Deve, portanto, extrair sem limites, nas reservas terrestres de matérias-primas, os recursos do solo e do subsolo, até que em algum momento começa a minar de forma cada vez mais séria a biosfera e os ecossistemas. A exploração ilimitada da força de trabalho comprada vai junto com a exploração sem limites, até ao esgotamento, dos recursos naturais. Ora, essa tendência, a partir de meados do século XX, tem se realizado por modos de produzir e de consumir que causam um crescimento exponencial (…) devorador de recursos dificilmente renováveis e altamente emissor de gases com efeito estufa.

Além desse limite externo que hoje não parece assustar apenas os ignorantes e os celerados da produção sem limites, os textos aqui examinados mencionam ainda duas poderosas barreiras à expansão do capitalismo no seu estágio atual de desenvolvimento.

A primeira delas advém da terceira revolução tecnológica (isto é, da informática e da comunicação), assim como da quarta (ou seja, da impressão 3D, da robotização). Segundo Chesnais, com elas, estão sendo introduzidas nos processos de produção tecnologias “drasticamente poupadoras de trabalho”. Ademais, isto está acontecendo num momento em que o capitalismo deixou de ter “o planeta inteiro para conquistar”. Assim, com o advento em sequência dessas duas revoluções tecnológicas, a razão do mais-valor por unidade de produção tende a cair fortemente sem que tal queda possa mais, supostamente, ser compensada pelo aumento do volume de produção.

Em resumo, com adventos das novas tecnológicas, a massa de mais-valor passa a cair e o capitalismo entra supostamente em declínio. A classe dominante enxerga essa possibilidade como mera destruição de empregos, como substituição de trabalhadores por robôs – não como algo que mina a sua própria riqueza.

Se isto ocorrer, apenas acentuará uma tendência que já se manifesta contemporaneamente: a emergência de tal limite não significará, como convém o próprio Chesnais, “o fim da dominação política e social da burguesia, menos ainda a sua morte, mas abrirá a perspectiva de que ela conduza a humanidade para a barbárie”. Assim, fica claro que não existe outro limite decisivo ao capitalismo – ainda não mencionado aqui – do que a ação política de todos aqueles que ele esfola e oprime, principalmente dos trabalhadores que, por impulso próprio, podem se organizar livremente para conseguir a própria libertação.

Uma outra barreira econômica, como já se indicou, é mencionada nos escritos aqui resenhados. Em decorrência da grande crise dos anos 1970, os estados capitalistas mais importantes, em particular os Estados Unidos, por meio de desregulações, desencadearam aquilo que ficou conhecido como o processo de financeirização do capitalismo. A onda de mundialização do capital decorrente foi um processo amplo que trouxe várias transformações importantes seja na esfera da produção de mercadorias seja na esfera do comércio nacional e internacional. Contudo, as transformações financeiras se mostraram como as mais decisivas para a reconfiguração do modo de produção.

Chesnais entende que a financeirização deve ser compreendida como a ascensão do capital portador de juros ao comando da acumulação.  “O capital como propriedade” – segundo ele – “invadiu os poros do capital como função”. Mais do que isso, ele afetou não apenas “a produção e a gestão industrial, mas invadiu toda a vida social”. O crescimento dos ativos financeiros – as ações, títulos privados, títulos públicos e depósitos bancários – cresceu espetacularmente durante as últimas três ou quatro décadas. Se o seu montante, em porcentagem, equivalia ao PIB mundial em 1990, agora, ele corresponde a cerca de 300 por cento dele. É, pois, essa enormidade que se levanta agora como uma barreira ao desenvolvimento do capitalismo.

Pois, em consequência dela, os direitos de extração de renda cresceram e continuam crescendo bem mais rápido do que a produção da renda, isto é, a geração de valor. Estes ativos são capitais fictícios, isto é, dão direito a rendimentos na forma de juros principalmente, mas não têm valor e não comandam eles próprios a produção de qualquer valor – ainda que assim pareça para os seus proprietários. Trata-se, porém, de uma ilusão. Eis que a geração de valor e de mais-valor se dá apenas na esfera do capital industrial. A valorização dos capitais fictícios apenas pode ser mantida porque ela também se dá em parte ficticiamente, por meio da simples rolagem das dívidas – algo que se revela no crescimento vegetativo dos ativos financeiros.

Por isso, concordando agora com os críticos, ele escreve: nas últimas décadas, “se houve um aumento do volume de mais-valor, isto não significa que ocorreu um aumento dele em relação ao capital acumulado. A característica saliente do momento atual do capitalismo é uma inadequação crônica desse volume relativamente à massa de direitos de extração de renda”.

Ora, como o capitalismo pode enfrentar essa barreira que ele mesmo pôs para si mesmo? Das duas, grosso modo, uma: ou ocorre uma destruição de capital real e fictício para exterminar o peso das dívidas e para restaurar a lucratividade do capital industrial ou se eleva cada vez mais a taxa de exploração. A primeira alternativa só acontecerá por erro ou inevitabilidade; se sobrevir, ocorrerá por meio de um grande dominó de quebras sucessivas. Como o capitalismo contemporâneo é de fato capitalismo de Estado, essa possibilidade tem sido evitada de todos os modos possíveis, em particular por meio do salvamento dos grandes bancos e grandes empresas. Eis que geraria uma ruptura imensa, uma depressão profunda, com consequências devastadoras para a sobrevivência do sistema.

Assim, apenas a segunda alternativa tem sido posta em prática por meio do neoliberalismo, por meio da “doutrina do choque” (Naomi Klein), por meio da mentira sistemática. Busca-se por todos as maneiras por nas costas dos trabalhadores em geral o peso de uma restauração improvável da saúde do sistema. Em consequência, todas as conquistas dos trabalhadores ao longo do século XX estão sendo, pouco a pouco, espantosamente, destruídas no centro e na periferia… E, com elas, todas as esperanças na socialdemocracia… mesmo se isto produz, como também observou agudamente Bruno Latour, uma desagregação cada vez maior das sociedades.

De qualquer modo, uma frase que se encontra no começo do primeiro artigo parece adequada para encerrar esta nota. Tudo isso em conjunto, segundo Chesnais, propõe um desafio: é preciso “que aqueles e aquelas que são explorados pela burguesia, ou que não estejam a ela vinculados, encontrem maneiras de se libertarem desse curso mortífero”.

“Oh não! Outro filme de adolescentes”

por Sérgio Barreto Costa

Capturar

A justiça portuguesa está nas mãos de adolescentes. É um retrato preocupante mas não vejo outra forma de interpretar aquilo que os nossos dois semanários de referência – o Sol e o Expresso –, noticiaram nas suas últimas edições. O primeiro relatava o entendimento existente entre a procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, e a sua grande amiga Francisca Van Dunem, ministra da Justiça. O segundo narrava o confronto aberto entre as duas magistradas, descrevendo-as como grandes rivais. Acreditando eu nas competências de investigação dos hebdomadários em causa, só posso concluir que Marques Vidal e Van Dunem eram as melhores amigas na altura em que os jornalistas do Sol pegaram no tema e, um ou dois dias depois, quando o Expresso se debruçou sobre o assunto, se tinham já transformado em inimigas figadais. E, como todos sabemos, só as adolescentes são capazes de uma variação dessa magnitude em tão curto espaço de tempo. Agora é só uma questão de confirmar se foram vistas com sapatos novos iguais durante a última semana e tudo passa a fazer sentido. É esta a grande vantagem de termos uma comunicação social à moda antiga: informação útil e esclarecedora, sem ficarmos na mão das redes sociais e dos seus constantes boatos e futilidades.

Diga-se de passagem que não é a primeira vez que sou visitado por esta suspeita relativa à idade mental dos nossos altos dignitários. Quando o ex-presidente do Supremo Tribunal de Justiça e o ex-procurador-geral da República decidiram destruir as escutas que envolviam o camarada José Sócrates, recordei, com saudade, os meus anos de liceu, em que usava todo o tipo de artimanhas, tretas e estrangeirinhas para safar os amigos dos castigos dos progenitores ou da ira das namoradas ciumentas. E aquelas que me despertam as mais gratas lembranças são as totalmente estapafúrdias, como quando afirmei à professora de História ter assistido com os meus próprios olhos ao momento em que o pastor-alemão Alarico devorou o trabalho que o meu colega João tinha feito sobre a brutalidade das invasões bárbaras. “Levou a peito”, disse-lhe, enquanto tentava puxar uma lágrima. Há poucas coisas mais bonitas do que a solidariedade entre portadores de acne e de hormonas instáveis.

As 10 estradas mais perigosas de Portugal

por admin

O trânsito frenético, o estado do piso, a sinalização e a incúria dos condutores, coloca estes 10 exemplos entre as estradas mais perigosas de Portugal. O problema da sinistralidade em Portugal continua a ser grave. O asfalto tem melhorado e os indicadores mostram evolução positiva, mas continuam a existir “pontos negros” e vias particularmente mortíferas. Conheça 10 das estradas mais perigosas em Portugal e, se costuma conduzir em alguma delas, deixe-nos nos comentários o relato da experiência.

Nos últimos anos assistimos à redução de cerca de 40% no número de vítimas, mas 2017 trouxe novo aumento. Segundo a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária (ANSR), no final de Novembro já tínhamos mais 53 mortos e 1.900 acidentes do que em igual período do ano passado. Até os acidentes com motociclos e ciclomotores, também em quebra anteriormente, voltaram a aumentar em número de mortos e feridos.

São 460 mortos e 118 mil acidentes mas a lista negra não se distribui igualmente por todo o país. No topo aparecem, por ordem de vítimas, Porto, Setúbal e Lisboa, ficando o fim da lista para o interior. Portalegre e Bragança são as regiões com menos mortes. Lisboa, por seu lado lidera na contabilidade de feridos graves e número total de acidentes, seguido do Porto.

Além da distribuição geográfica, o tipo de estrada é também muito relevante quando analisamos estes números. Segundo a ANSR, 36% das vítimas mortais acontecem em Estradas Nacionais, 33% em arruamentos, 9,2% em auto-estrada, 9,2% em estradas municipais, 5,9% em Itinerários Complementares e 1,9% em Itinerários Principais. Para quem conhece a realidade das estradas portuguesas, não é surpresa que as Nacionais apareçam no topo da lista. É, contudo, um perfeito indicador do tipo de acções que ainda são necessárias para debelar a questão. Velocidade excessiva, consumo de álcool e condução perigosa são parte do problema, mas o mau estado do piso e a falta de estruturas de segurança ajudam a criar os infames “pontos negros”

1. Estrada Nacional 1

CoimbraCoimbra - Alfredo Mateus

Antes da construção da A1 e da migração de parte substancial do tráfego para essa via, a EN1 era a principal via de ligação com o Norte do país. Passa por uma série de grandes e pequenas localidades, mas o trânsito que foge às portagens parece esquecer-se disso. Muito tráfego, peões a atravessar e má sinalização transformam alguns dos seus pontos em armadilhas.

2. Estrada Nacional 125

Tavira - Joe Price

A EN125 atravessa longitudinalmente o litoral sul do Algarve, ligando Vila do Bispo a Vila Real de Santo António. Trata-se de uma via com uma elevada taxa de sinistralidade rodoviária, agravada pela existência de diversos pontos negros. Com a introdução de portagens na A22, tornou-se uma alternativa gratuita a esta autoestrada, tendo o acrescento de tráfego resultado num aumento de 30% na sinistralidade em 2012. Como a EN1, é na passagem por zonas residenciais que se torna particularmente perigosa.

3. Estrada Nacional 2

Ponte de TrajanoPonte de Trajano - Fernando Ribeiro

A EN2 atravessa Portugal de Norte a Sul e é a estrada de maior extensão do país, tendo o seu início em Chaves e fim em Faro, no Km 738. Devido às suas características, é comparada (a uma escala menor) à Ruta 40 (Argentina) ou à Route 66 (E.U.A.). Passa por 11 distritos, oito províncias, quatro serras, 11 rios e 32 concelhos. Não é de admirar portanto que tenha troços em diferentes estados de manutenção e perigosidade.

4. Estrada Nacional 10

locais para visitar na Serra da Arrábida

Castelo de Sesimbra

No seu troço original, ligava Cacilhas a Vila Franca de Xira. Porém, após a construção do 1º troço da A1, a EN10 foi reclassificada em 1961, indo até Sacavém, aproveitando o troço velho da N1. Ao ligar uma série de concelhos muito povoados da margem sul e norte à A1, A12, A2 e A9 é muito concorrida. A sua zona mais perigosa ocorre ao quilómetro 128, na margem norte, entre Forte da Casa e Alhandra.

5. Estrada Nacional 118

Alamal - Gavião

Construída para ser a Marginal de toda a margem esquerda do Rio Tejo, desde a fronteira até Lisboa. Servia como alternativa à N3, que resume o mesmo objectivo que a N118, mas na margem oposta do Tejo. É das Estradas Nacionais mais fáceis de conduzir, devido ao seu traçado quase sempre plano e rectilíneo. Só mesmo um pequeno percurso na zona do Tramagal (Abrantes) é muito sinuoso. Apesar disso, com 44 mortos entre 2010 e 2015, entra para lista negra das mais mortais em Portugal.

6. Estrada Nacional 13

Caminha

Até à entrada em funcionamento da A28, a EN13 era a via principal de comunicação entre o Minho e o Porto, e uma das principais ligações rodoviárias entre Portugal e Espanha. Após a entrada em funcionamento da A28, a EN13 foi progressivamente adaptada para trânsito local, fazendo actualmente parte da área urbana de muitas localidades no seu trajecto. É nestas zonas densamente povoadas que o percurso se torna mais perigoso.

7. Estrada Nacional 109

Figueira da Foz

A Estrada da Costa da Prata começava no Porto, logo à saída da Ponte Luís I, e rodeava o Cais de Gaia, rumando depois para Leiria. Passa por muitas praias da Costa da Prata como Valadares, Espinho, Esmoriz, Ovar, Mira, Figueira da Foz e Termas de Monte Real. Mau estado do piso, excesso de velocidade em algumas das rectas e ultrapassagens com pouca visibilidade obrigam a atenção redobrada.

8. Estrada Nacional 18

Guarda

A Estrada do Interior vai de Ervidel à Guarda e atravessa o Rio Tejo na Ponte de Portas de Ródão. Depois de começarem as portagens na autoestrada da Beira Interior (A23), o tráfego automóvel da EN18 disparou. Particulares e empresas começaram a optar por esta via e o estado do piso é desigual ao longo do percurso. Há zonas densamente arborizadas e outras são demasiado estreitas para deixar passar dois veículos pesados. Torna-se ainda mais complicada no pico do inverno.

9. Estrada Nacional 103

Bragança

Começa em Neiva, perto de Viana do Castelo, onde entronca com a EN13, e prolonga-se pelo Este do Alto Minho e por toda a zona Norte de Trás-os-Montes, passando por localidades como Braga, Chaves e Vinhais, até acabar em Bragança. Pela sua dimensão e localização, a EN103 oferece uma viagem dura e sinuosa mas de um encanto ímpar. O gelo no inverno e o reduzido número de locais de ultrapassagem justificam a inclusão nesta lista.

10. Estrada Nacional 4


Estremoz

A Estrada do Alentejo Central liga o Montijo à parte final da A6, perto de Montemor-o-Novo. Seguindo em paralelo com esta auto-estrada, é uma alternativa para o não pagamento de portagens. Bastante concorrida por pesados, tem zonas do pavimento muito degradado, desníveis e lombas de grandes dimensões e sinalização defeituosa.

Fonte: quilometrosquecontam.com

Sidónio e batatinha

por estatuadesal

(Daniel Oliveira, in Expresso, 13/01/2018)

Daniel

Daniel Oliveira

Tendo Passos Coelho dado ao PSD um cunho ideológico que nunca tivera, seria expectável que o debate da sucessão passasse pelo recentramento da sua identidade. Pelo contrário, a grande discussão entre Rui Rio e Santana Lopes foi saber qual dos dois foi mais fiel às posições do líder cessante. Porque não há identidade alguma para discutir.

Costuma dizer-se que o PSD é o mais português de todos os partidos. De facto, do ponto de vista das grandes famílias políticas europeias, é filho de pai incógnito. Isto resulta do contexto histórico em que se fundou: quando ser de direita era impensável, quis aderir à Internacional Socialista enquanto herdava grande parte da base de apoio do Estado Novo.

Os contactos internacionais de Soares permitiram que fosse o PS a ocupar o espaço que Sá Carneiro desejou e os combates do PREC determinaram que fosse o PS a liderar o combate aos comunistas e à extrema-esquerda. Para o PSD ficou uma função: ser alternativa ao PS. Do ponto de vista prático, é o grande partido da direita portuguesa. Só que o equívoco do seu nome e da sua fundação e a necessidade de falar para uma maioria social de esquerda impedem-no de construir um discurso coerente. As suas lideranças formam-se nesta crise identitária que erradamente se toma por pragmatismo. E nesta disputa isso foi muito evidente, até porque Santana representa a tralha “passista” com a qual teve uma relação distante e Rio não parece querer representar nada.

Não é por serem do mesmo partido que Rio e Santana não conseguiram discutir grandes diferenças políticas. Até dentro dos pequenos partidos elas existem. A ausência de clivagens com substância não resulta da falta de clivagens, resulta da falta de substância. Sobrou o estilo e esse foi miserável. Por isso, nos dois penosos debates televisivos, ficámos a saber, para além de uns vaguíssimos estados de alma sobre economia, com quem Rui Rio foi almoçar e quantas vezes Santana disse que ia sair do PSD.

O problema não é os debates terem sido violentos. Ficaram a léguas do momento em que Seguro acusou Costa de representar os negócios. Mas essa acusação tinha interesse para o conjunto dos eleitores. As conversas entre Rio e Santana ficaram ao nível da concelhia e não deviam ter saído das sedes. A violência supera-se, a me

PSD e PS passam, ciclicamente, por momentos em que nos perguntamos se alguma vez recuperarão. Quando estão na oposição quase todos os candidatos a líder parecem péssimos. Depois, se o poder lhes cai no colo, logo ganham uma certa gravitas. O único a quem isso não aconteceu foi mesmo Santana Lopes. Só que se olha para estes dois e percebe-se que não vai sair daqui o próximo primeiro-ministro. Rui Rio, que cheguei a pensar que seria um autoritário destinado a representar o cansaço com regime, não tem carisma para ser o Sidónio Pais modernizado que desejava. O que diz de extravagante, que costuma vir de candidatos antissistémicos, não o diz por ser um populista, que até mostrou não ser. É só a autoconfiança de um amador a falar. E Santana continua Santana, um bobo cheio de malícia que, não sendo levado a sério, sabe que nem as suas baixezas o prejudicam. É uma anedota demasiadas vezes contada da qual já ninguém se vai rir. O que a campanha revelou dos dois explica porque se discutiu tanto o que cada um fará se perder as eleições. É, se formos realistas, o tema mais relevante para o futuro próximo do PSD.

Oh, how I love the smell of napalm in the morning!

por estatuadesal

(Miguel Sousa Tavares, in Expresso, 13/01/2018)

mst

Miguel Sousa Tavares

1 Não há como passar um tempo fora da querida pátria para voltar e perceber que nada do que acontece no mundo é mais importante do que os ‘casos’ que nos consomem e ocupam um dia atrás do outro. Qual ameaça norte-coreana, qual acordo de Governo na Alemanha, qual discussão aberta sobre a sanidade mental do Presidente americano, qual guerra surda de poder no Médio Oriente, qual desmoronar da catástrofe chamada Theresa May, qual visita de Macron à China, no papel de Senhor Europa? Nada disso serve para ocupar a primeira parte de um telejornal, a primeira parte de um jornal diário. Deixemos o mundo de fora, temos coisas bem mais urgentes e interessantes com que nos ocuparmos!

Por exemplo: o suicídio público a que o PSD se entregou, numa longa, absolutamente indigente e, portanto, palpitante, campanha eleitoral para escolher quem será o cordeirinho que António Costa irá comer de ensopado daqui a menos de dois anos. Mas essa palpitante campanha acontece apenas entre eles, como se ganhar o partido fosse suficiente para ganhar o país. Na TVI, apesar dos esforços de Judite de Sousa, nenhum dos dois candidatos pareceu preocupado em atrair a atenção do país. Um peru e um galo combatiam dentro de uma capoeira — que é, por definição, um local fechado. E o tema principal da discussão remetia-nos de volta a 2004 e às “trapalhadas” do Governo de Santana ou a saber quem tinha sido mais leal ao Governo de Passos Coelho. Mas haverá por aí alguém que tenha saudades de 2004 ou de 2014?

2 Grande questão jurídico-constitucional é saber se a PGR pode ou não ser reconduzida após o mandato de seis anos previsto na Constituição. Como sempre os nossos mestres juristas gostam que as leis nunca sejam claras, mas sim ambíguas, o que lhes dá duas oportunidades de brilhar: quando as escrevem e, depois, quando são chamados a interpretar o que escreveram. Não é, seguramente, deficiência técnica: é um modo de vida. Neste caso concreto, a ambiguidade consiste em a letra da lei permitir a recondução e o espírito da lei apontar para o oposto. O que deixa a questão para ser resolvida no âmbito de uma decisão política, que cabe ao Governo e ao PR.

Eis o que o PSD — que nomeou a actual PGR — mais queria. Não podendo agora reconduzi-la como fez com o governador do Banco de Portugal, que reconduziu sem saber se voltaria a ser Governo, o outro “partido de governo” quer, todavia, manter um “direito de pernada” sobre a nomeação de futuros PGR. Eles podem nomear; quem vier a seguir só pode reconduzir quem eles nomearam, sob pena da mais grave das suspeições: querer controlar o Ministério Público. Ora, eu acompanho o consenso geral sobre a boa prestação de Joana Marques Vidal — sobretudo sobre a discrição e ausência de vedetismo com que vem exercendo o cargo e a sabedoria com que gere essa ingovernável instituição que é o MP. Mas já não acompanho o resto, que é apenas um argumento ad terrorem: o de dizer que a sua não-recondução equivaleria a afastar quem se atreveu a “enfrentar os poderosos”. Tal não é verdade, desde logo porque Sócrates, por exemplo, já tinha sido alvo do MP no processo Freeport. Mas não é verdade, sobretudo, porque nenhum PGR controla, de facto, o Ministério Público. Com maior ou menor protagonismo, limitam-se a desempenhar o papel de uma rainha de Inglaterra, com direito anual a um Discurso da Coroa escrito por ela. Duvido que, enquanto magistrada, Joana Marques Vidal tivesse deixado a investigação da ‘Operação Marquês’ durar tanto tempo e atravessar tantas peripécias que em nada prestigiaram a instituição. Ou que tivesse subscrito a junção da ‘Operação Marquês’ à do BES e da PT, que nada têm que ver com ele directamente e que apenas servirá para eternizar o julgamento, criando um daqueles megaprocessos que tanto se diz deverem ser evitados, mas imposto pela tentação de um magistrado de se arvorar em justiceiro de todo o regime. Ao contrário do que os juízos apressados gostam de concluir, no nosso sistema judiciário, o perigo não está em o PGR ficar dependente do poder político, mas sim em ser dependente e refém dos magistrados que alegadamente chefia. E isso faz da escolha de um PGR uma questão menos importante do que se quer fazer crer.

3 Verdadeiramente menor, mesquinho mesmo, é o caso da ida ao futebol do ministro Mário Centeno com o filho. O jornalismo terrorista do “Correio da Manhã” e a turba-multa das redes sociais acham que um ministro só tem duas hipóteses: ou não vai ao futebol ou vai para a bancada para ser sovado durante 90 minutos pela coragem colectiva dos pacatos cidadãos que habitam os nossos estádios. Depois admirem-se se qualquer dia só quiser ser governante quem tiver a ganhar com isso. Aí está o PSD para o exemplificar.

4 O primeiro presidente do Novo Banco, Vítor Bento, veio agora admitir que a resolução do BES, que lhe deu origem, vai custar-nos dez mil milhões (menos um do que a minha própria estimativa). Mas, acrescentou ele, não havia alternativa. Como? Terei lido bem? Dez mil milhões é alternativa a alguma coisa? Gostaria agora de ouvir agora a opinião dos que louvaram a “coragem” da “solução” que Carlos Costa, Passos Coelho e Maria Luís Albuquerque encontraram para o BES... E isto não é um julgamento sobre a gestão do BES, mas sobre a sua resolução e a forma como foi criado e gerido o Novo Banco. Acharam que era só mudar a administração e o nome e emprestar-lhe cinco mil milhões — que, depois, seriam obviamente devolvidos aos contribuintes. O resultado está à vista. Mas não há maneira de aprendermos: aí está o Montepio para o exemplificar, mais uma vez.

5 Nos Globos de Ouro de Hollywood o traje obrigatório para as mulheres era o vestido preto, símbolo da campanha “Time’s Up”, contra os violadores, os abusadores, os assediadores sexuais machos da indústria cinematográfica americana. Na plateia — onde, segundo a nova polícia de costumes, se sentavam e aplaudiam alguns deles ainda não expostos publicamente — tudo o que era actriz consagrada, actriz na berra ou candidata a actriz usava o símbolo da campanha: #metoo. Todas — as passadas, as presentes e as futuras — autodeclaradas vítimas dos abusos de Harvey Weinstein e outros abusadores como ele. Todas jurando agora terem sido alvo de propostas desonestas, beijadas sem consentimento, apalpadas, encostadas à cama sem defesa. E quantas, pensei para comigo, treparam assim no meio sem nunca terem aberto a boca antes de treparem? E quantas, no clima de caça aos abusadores agora instalado, se atreverão a não dizer “me too” e a vestir a farda oficial se quiserem trepar no meio? Pensamentos obscenos, reconheço, que provavelmente me tornarão alvo de uma denúncia-crime da nossa sempre vigilante Comissão para a Igualdade. Mas eis que o manifesto das 100 actrizes, escritoras e produtoras francesas foi muito além dos meus obscenos pensamentos, ao denunciar “as mulheres auto-retratadas como pobres indefesas sob o mando dos diabos falocratas... numa nova moral vitoriana oculta sob esta febre de levar os porcos ao matadouro”. Ou, como disse a escritora Abnousse Shalmani, uma das signatárias, “este feminismo transformou-se num novo estalinismo, com todo o seu arsenal: acusação, ostracismo, condenação”.

Para já, boicota-se o Polanski, esse porco violador que deixou uma obra inesquecível no cinema. A seguir, virá o Nabokov e a sua “Lolita”, o Hemingway e sua jovem italiana da Finca Vigia, o García Márquez e a sua jovem puta triste, e por aí fora — na literatura, no cinema, na pintura — até que não reste memória de algum génio considerado lascivo. E viveremos todos de consciência tranquila. Até mesmo as mulheres que assediam homens e que oficialmente não existem.

(Miguel Sousa Tavares escreve de acordo com a antiga ortografia)