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sábado, 3 de março de 2018

Alemanha e França ponderam medidas comuns para combater protecionismo dos EUA

ECONOMIA

3/3/2018, 13:13

Angela Merkel pretende criar um imposto comercial comum a França como reação ao protecionismo dos EUA. Trump anunciou a imposição de taxas alfandegárias sobre as importações de aço e alumínio.

CARSTEN KOALL/EPA

Autor
  • Agência Lusa
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A chanceler alemã, Angela Merkel, anunciou este sábado a vontade de “tornar realidade” um imposto comercial comum a França como “reação” ao protecionismo imposto pelo presidente norte-americano, Donald Trump.

Em Washington, Trump anunciou a imposição de taxas alfandegárias sobre as importações de aço e alumínio, devendo o aumento dos preços prejudicar as indústrias que usam este produto, como fabricantes de automóveis e aviões ou fornecedores de materiais de construção.

Trump anunciou que vai impor uma taxa alfandegária de 25% a partir da próxima semana sobre aço importado e 10% sobre o alumínio, importações estas que, disse, são uma ameaça à segurança nacional dos EUA.

Hoje, na sua tradicional mensagem semanal em vídeo, Merkel referiu que, após a reforma fiscal de Trump, o Governo alemão está a seguir com atenção o impacto da medida na competitividade das pequenas e médias empresas alemãs.

“Isso significa que, se pensarmos em como vamos desenvolver uma base comum para os impostos sobre as empresas na França e na Alemanha, então também teremos em conta as realidades que temos atualmente nos Estados Unidos”, disse Merkel, indicando esperar por resultados nesse sentido até ao fim deste ano.

A Alemanha e a França já tinham dado conta do interesse em avançar juntos nalgumas questões, como na harmonização do imposto sobre as empresas, uma das apostas contidas na agenda reformista do Presidente francês, Emmanuel Macron.

Também como forma de pressão, o coordenador para a Cooperação Transatlântica do Governo alemão, Jurgen Hardt, indicou hoje que irá seguir, em breve, para Washington, onde irá analisar com as autoridades norte-americanas a situação criada com a decisão de Trump.

Num comunicado, o coordenador explicou ser necessário, mais do que nunca, um diálogo de cooperação entre a Alemanha e os Estados Unidos, “com respostas comuns e soluções”, apesar das diferentes opiniões sobre as políticas comerciais.

Secretário-geral do PCP alerta para regresso de “bloco central informal” PS/PSD

PCP

3/3/2018, 18:33

O secretário-geral do PCP advertiu para a possibilidade do regresso de "um bloco central informal" entre o PS e o PSD que atinja a Segurança Social sob a "máscara das reformas estruturais".

João Relvas/LUSA

Autor
  • Agência Lusa
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O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, advertiu para a possibilidade do regresso de “um bloco central informal” entre o PS e o PSD que atinja a Segurança Social sob a “máscara das reformas estruturais”.

Intervindo numa sessão para assinalar os 97 anos do PCP, em Lisboa, Jerónimo de Sousa disse que, desde o congresso do PSD, em meados de fevereiro, se “acentuam expressões de consensualidade” e se regista a “assumida articulação entre PS e PSD em torno das `reformas estruturais´”.

A “enganosa designação” de “reformas estruturais” esconde “medidas de agravamento da exploração do trabalho, de retrocesso económico e de injustiça social”, disse Jerónimo de Sousa, frisando que, no passado, resultaram em “desregulação económica, flexibilização laboral e desproteção social”.

Um caminho que pretendem não só consolidar, mas relançar afivelando a máscara das `reformas estruturais´ e à sombra de uma suposta inócua descentralização (mas, de facto, uma transferência de encargos e desresponsabilização do Estado) e uma consensualizada política de investimentos e aplicação de fundos comunitários, vendidos como a coisa mais natural, tão natural como o ar que respiramos”, acusou.

Para Jerónimo de Sousa, aqueles “consensos” constituem “um primeiro passo no caminho dos consensos e de restauração de um bloco central informal para voos mais largos, em que muitos aspiram a que a Segurança Social torne a marcar lugar”.

O secretário-geral comunista pediu “mais força” para o PCP, partido que afirmou “portador da política patriótica e de esquerda” e questionou: “ou pode-se considerar de esquerda aqueles que reduzem os direitos e alteram a legislação laboral para pior, que criam malfeitorias para os trabalhadores em nome dos interesses do capital?”.

“Ninguém se pode afirmar de esquerda quando em relação aos direitos dos trabalhadores se põe de um lado e não do lado deles”, disse, perante centenas de militantes que participaram no comício de aniversário do PCP, no auditório da Faculdade de Medicina Dentária de Lisboa.

“Se uma mulher decide ter relações sexuais com um produtor para subir na carreira, não é violação”, diz advogado de Weinstein


HÁ 27 MINUTOS

O advogado de Harvey Weinstein, acusado de assédio e abuso sexual, disse que se uma mulher decidir ter relações sexuais com um produtor para subir na carreira, isso não pode ser considerado violação.

O produtor Harvey Weinstein está a ser acusado de assédio e abuso sexual por mais de cem mulheres

YANN COATSALIOU/AFP/Getty Images

Autor
  • Rita Porto
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O advogado do produtor Harvey Weinstein afirmou que se uma mulher decidir ter relações sexuais com um produtor de Hollywood para progredir na carreira, isso não pode ser considerado uma violação.

Se uma mulher decide que precisa de ter relações sexuais com um produtor de Hollywood para subir na carreira, e efetivamente tem relações sexuais e considera toda a situação ofensiva, isso não é violação”, disse Benjamin Brafman, numa entrevista ao jornal The Times.

Para o advogado, uma mulher nesta situação “tomou uma decisão consciente”. “Agora, por mais ofensiva que possa ter sido toda a saga para ambas as partes, isso não é um crime. É mau em muitos sentidos, quando se olha para isto. Mas esta tem sido a reputação da indústria desde antes de eu ser nascido.”

Na entrevista, Brafman, que já representou pessoas como músico Jay-Z e o ex-diretor do FMI Dominque Strauss-Kahn, considerou ainda que Weinstein “é uma das pessoas mais interessantes” que já defendeu. “Não estou preparado para o condenar só porque ele viveu, durante um período de tempo, de uma maneira que pode não ser apropriada ou pode ser vergonhosa.”

Recorde-se que mais de cem mulheres, incluindo atrizes de Hollywood como Ashley Judd, Rose MacGown, Gwyneth Paltrow, Kate Beckinsale e Salma Hayek, acusaram o produtor de assédio e de abuso sexual. Alguns dos incidentes ocorreram há cerca de 40 anos.

Weinstein, que está a ser investigado pela polícia norte-americana e britânica, nega as acusações de violação e está a fazer um tratamento para a adição sexual, lê-se na AFP.

O advogado disse que não acredita que o produtor de filmes como “Pulp Fiction”, “A Paixão de Shakespeare” ou “Kill Bill” seja processado e até o tem aconselhado a não reagir às acusações. Brafman e Weinstein já se conheciam antes dos escândalo. O motivo que o levou a aceitar o caso? “Acho que ele precisa de mim.”

Entrevista a João Ferreira do Amaral

por estatuadesal

(In Expresso, 03/03/2018)

ferreira_do_amaral

(Depois de sabermos que Passos Coelho vai ser contratado para leccionar como catedrático de economia, vem mesmo a propósito esta entrevista a um VERDADEIRO professor catedrático de economia. Leiam e avaliem se Passos alguma vez teria gabarito para dar uma entrevista com o substracto que esta encerra. É como comparar um vinho Barca Velha com uma vulgar água-pé.

Comentário da Estátua, 03/03/2018


João Ferreira do Amaral é peremptório: “Nos últimos 20 anos a nossa evolução foi um desastre completo. Não vejo razão alguma para os próximos 20 anos serem melhores. Pelo contrário, acho que vão ser ainda piores”. Muito crítico da adesão portuguesa ao euro, em entrevista ao Expresso, o economista e professor do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) renova os alertas: o crescimento em 2017 foi “bom”, mas “a questão está em saber se temos condições a prazo para progredir. E continuo a achar que não temos. Não nos enganemos”.

Foi das primeiras vozes a opor-se à adesão portuguesa à moeda única e em 2013 disse ao Expresso que “só a saída do euro evita décadas de estagnação em Portugal”. Continua a defender o mesmo? 

Sim, e com maioria de razão. Hoje, o PIB é apenas 15% superior ao que era há 20 anos. Nunca houve um período tão longo de quase estagnação. A dívida pública multiplicou por duas vezes e meia e a dívida externa líquida, que era praticamente zero, hoje é mais de 100% do PIB. Além do desemprego ser maior. Nos últimos 20 anos — grosso modo, o período do euro — a nossa evolução foi um desastre completo. Não vejo razão alguma para os próximos 20 anos serem melhores. Pelo contrário, acho que vão ser ainda piores. Vamos atravessar uma nova fase, com uma situação muito pior à partida do que tínhamos em 1999, quando o euro foi criado.

Mas a situação económica melhorou desde 2013...

Claro que temos uma situação económica melhor. Este Governo procedeu bem. Hoje, já se esqueceu o que foram as tentativas de pressão europeia sobre o Governo para mudar a política no início do mandato. Houve coragem em seguir uma política que, a meu ver, faz todo o sentido, impulsionando a economia através dos rendimentos, o que permitiu criar mais postos de trabalho, reduzir o desemprego, aumentar as contribuições para a Segurança Social e ir equilibrando as finanças públicas. Agora, isto é um efeito de curto prazo, que terá tendência a não se prolongar, porque as condições são muito adversas ao crescimento.

Os alertas sobre a acumulação de défices externos, gerando uma dívida insustentável, continuam válidos? Com um crescimento de 2,7% e as exportações em alta, já ninguém fala sobre isso. 

O problema de Portugal é que esquecemos rapidamente as coisas! Houve um ano bom em 2017, espero que 2018 também seja. O crescimento tem sido bom nas exportações, há equilibro da balança de pagamentos, o que é importante. O crescimento é saudável. Agora, é um crescimento dentro de um ambiente muito bom, nomeadamente ao nível financeiro, com as taxas de juro muito baixas. Se houver uma crise financeira, tudo se altera. A questão está em saber se temos condições a prazo para progredir. E continuo a achar que não temos. Não nos enganemos. Praticamente continuámos a não convergir para a média europeia. Tivemos um crescimento bom, mas, antes da moeda única, 2,7% teria sido considerado um mau ano. Isto não tira mérito ao governo. Agora, está muito longe de resolver os problemas.

OS PAÍSES ENDIVIDADOS ESTÃO MUITO MAIS VULNERÁVEIS DO QUE EM 2007. ACHO EXTRAORDINÁRIO QUE HAJA QUEM ACHE QUE OS PROBLEMAS ESTÃO RESOLVIDOS. NÃO ESTÃO

Em 2013 também disse que não é possível fazer a reestruturação necessária da economia portuguesa dentro da moeda única. Não foi feita? 

Não foi. Temos de investir muito mais em capital físico e capital humano. Ora, isso não será possível com as condicionantes financeiras de pertencermos à zona euro. Temos uma dívida pública de mais de 120% do PIB e, de acordo com o Tratado Orçamental, temos de reduzir para 60% no prazo de 20 anos. É impossível. Obrigaria a excedentes das finanças públicas que não são possíveis. Só tentar esse impossível — e o Tratado Orçamental obriga-nos a isso — será suficiente para não se investir o que é necessário. Portanto, ou se altera o Tratado e, provavelmente, teremos outra discussão terrível na zona euro, ou então, não faremos esse investimento.

Em 2016, já com este Governo, o investimento público caiu para mínimos históricos. 

Sim. É certo que também se juntou a questão do calendário dos fundos estruturais. Mas, é nítido. Normalmente, e isso é tradição há muitos anos, quando é preciso cortar nas finanças públicas, corta-se no investimento, porque é aquilo que dá origem a menos protestos. Temos de investir muito. Fala-se nas infraestruturas e equipamentos, mas acho que é no capital humano que temos de investir mais. E isso é caro. Estamos muito atrasados nesta matéria.

Podemos não cumprir o Tratado?

O Tratado implica objetivos de défice e de dívida. No défice estamos lá perto, não é difícil cumprir 0,5% do PIB em termos estruturais. Mas, na dívida, se não cumprirmos a trajetória de redução para 60% do PIB no prazo de 20 anos, ficamos sujeitos a ter de aplicar as políticas que a Comissão Europeia achar por bem impor. E isso é inaceitável.

A dívida é a maior ameaça sobre a economia portuguesa? 

Penso que sim. O défice é mais gerível. O nosso défice podia até ter sido corrigido de forma mais gradual. O problema do programa da troika é que quis fazer tudo ao mesmo tempo, criando um desequilíbrio tremendo e um impacto social inaceitável. Penso que os programas da troika vão ficar nos anais como um disparate de política económica. Há outro aspeto que é hoje quase ultrajante: estamos dependentes das agências de rating. Isso é inaceitável e foi fruto da moeda única.

Como assim?

Para um país da moeda única se financiar está todos os dias a olhar para o que as agências de rating dizem. Não é o caso do momento atual, porque as taxas de juro estão muito baixas. Mas, a prazo é inaceitável, significa um completo condicionamento. Isto acontece porque a única fonte que um país do euro tem hoje para se financiar é o acesso aos mercados financeiros, como uma entidade ou empresa qualquer. Nem sempre foi assim. Quando os países dispõem de emissão monetária própria, podem dosear com a utilização de financiamento monetário em situações de dificuldade. O Reino Unido fartou-se de usar e os Estados Unidos também têm usado.

Portugal tem beneficiado de juros muito baixos, também fruto da política do Banco Central Europeu. O que acontece se subirem? 

Um país que tem cento e vinte e muitos por cento de dívida pública e mais de 100% de dívida externa líquida não pode estar descansado. Qualquer problema nos mercados financeiros que implique um aumento da taxa de juro é sempre penalizador. E é evidente que o período relativamente prolongado de taxa de juro quase zero leva a uma sobrevalorização dos ativos financeiros que vai ter de ser ajustada mais cedo ou mais tarde. Isso significará uma crise e estamos singularmente mal preparados, pior preparados do que estávamos em 2007.

Aí, coloca-se de novo um cenário de crise do euro? 

Sim. Se as instituições da moeda única se mantiverem como estão, é evidente que se coloca. Até porque os países endividados estão muito mais endividados do que em 2007, logo, muito mais vulneráveis. Acho extraordinário que haja quem ache os problemas estão resolvidos. Não estão.


A voz no deserto contra o euro

Foi uma das primeiras vozes em Portugal a manifestar oposição à adesão nacional ao projeto da moeda única europeia. Desde os finais dos anos 90 do século passado que João Ferreira do Amaral nunca mais parou de alertar para os problemas que a pertença à zona euro implicam para a economia portuguesa. Natural de Lisboa, onde nasceu em 1948, licenciou-se e doutorou-se em Economia pelo Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG) da Universidade de Lisboa, onde é professor catedrático desde 1995. Entre outras publicações, é autor dos livros “Contra o Centralismo Europeu — Um Manifesto Autonomista” (2002), “Porque Devemos Sair do Euro” (2013), “Em defesa da independência nacional” (2014) e “A Solução Novo Escudo” (2014, em coautoria com Francisco Louçã). Também se tem dedicado à investigação histórica. É coautor do livro “Povos Antigos em Portugal” (2ª edição, 2000) e autor da obra “Celtas e Indianos em Portugal — Áreas Etno-Culturais em Portugal no I Milénio a.C.” (2017).

OUTROS ASSUNTOS

EXPORTAÇÕES

“As exportações beneficiaram muito com a descida do euro. Mas é inegável que houve um esforço interno importante a nível empresarial. A capacidade para aproveitar as oportunidades foi boa”

INVESTIMENTO PÚBLICO

“A variável investimento é difícil de perceber nos Orçamentos do Estado. Antes, a informação era melhor, mais detalhada. Agora, é muito reduzida. Sabemos pouco sobre o que está a acontecer com o investimento público e era útil saber mais”

GERINGONÇA

“Foi uma inovação, que está a funcionar. Penso que pouca gente acreditaria que desse resultado, mas a verdade é que deu. E tem contribuído para a alteração da política. Isso deve-se, de facto, ao António Costa”

ESTADOS DO LESTE EUROPEU

“Temos autoridades com ações duvidosas do ponto de vista das próprias leis comunitárias e com um conceito de democracia muito sui generis. É o mínimo que se pode dizer”

BREXIT

“Foi uma surpresa. Acaba por fazer tomar a consciência que o projeto europeu está a patinar”


“O euro é uma tentativa de forçar a criação de um Estado europeu”

“A Europa da União Europeia é ultracentralista e de criação tendencial de um superestado europeu”, considera João Ferreira do Amaral. O professor do ISEG diz que “gostava” da Europa das comunidades, mas “não gosta” da União Europeia.

Há consciência na zona euro de que há problemas por resolver? 

Penso que há consciência de que isto não funciona. Daí a pressão para tentar encontrar dentro da zona euro mecanismos que melhorem as perspetivas de crescimento para as economias menos competitivas.

Que mecanismos são esses? 

Há tentativas de criar o tal ministro das Finanças europeu, que não percebo bem o que é. E, também, de completar a união bancária, o que teria alguns efeitos positivos, mas penso que não sucederá facilmente, porque a Alemanha se opõe a alguns aspetos. Depois, fala-se na criação de um Fundo Monetário Europeu, que penso que será para apoiar os países endividados em termos de dívida pública. Mas são ideias ainda muito vagas.

Essas mudanças vão avançar? 

Sou muito cético. Penso que o mal da moeda única é o projeto em si. É uma quadratura do círculo tentar ter uma política monetária única e, praticamente, uma política macroeconómica única, para economias muito diferentes. Não funciona. E há grande possibilidade de não haver mudanças efetivas, porque os interesses são muito divergentes. Nomeadamente entre a Alemanha e os seus aliados próximos — que têm determinado o funcionamento da zona euro — e os países em dificuldades e mais endividados. Temos cinco países do sul da Europa — França, Itália, Espanha, Portugal e Grécia — que têm cerca de 50% do PIB da zona euro, com uma má performance em termos de crescimento e em que três deles têm dívidas públicas acima dos 100% do PIB (Portugal, Itália e Grécia) e os outros dois estão praticamente nos 100% (Espanha e França). Acho que os interesses da Alemanha irão prevalecer. Portanto, o futuro da zona euro é ainda mais incerto hoje do que no passado.

Em 2014 publicou o livro “Em Defesa da Independência Nacional”, onde diz que a União Europeia está condenada a desaparecer se não for reformada. Continua a achar o mesmo? 

Sem dúvida. E na altura ainda não sabia do ‘Brexit’.

Há um divórcio entre as pessoas e o projeto europeu?

Exatamente. A emergência dos populismos tem a ver com o projeto europeu ter descambado com a União Europeia. Eu distingo o processo de integração europeia entre a Europa das comunidades, até 1992, e depois de 1992, com o Tratado de Maastricht e a fundação da União Europeia. São dois projetos diferentes. Eu gostava da Europa das Comunidades, não gosto da Europa da União Europeia. E há muita gente que pensa assim.

Porquê?

A Europa da União Europeia é ultracentralista e de criação tendencial de um superestado europeu. E grande parte do eleitorado europeu não aceita isto. Portanto, o projeto está condenado ao fracasso. Quando se entra numa fuga para a frente federalista, sucede este tipo de coisas.

É o que tem acontecido, essa fuga para a frente?

Sim, com base na moeda única. Penso que o euro é um projeto muito perigoso, porque é uma tentativa de forçar a criação de um Estado europeu usando a economia e a moeda. Deu mau resultado, como não podia deixar de ser. Não havia nenhuma razão económica a justificar a criação da moeda única. A Europa não era uma zona monetária ótima, longe disso, e hoje ainda é menos do que na altura.

Como viu a eleição de Mário Centeno para a presidência do Eurogrupo?

É bom para o país e principalmente para ele. Mas tenho muitas dúvidas de que leve a resultados na zona euro. Poderá haver alguma cosmética, mas o essencial da zona euro vai manter-se como está.


O lado B do aumento do emprego

O crescimento do emprego surpreendeu João Ferreira do Amaral. A vertente negativa foi a fraca evolução da produtividade

“Surpreendido.” É desta forma que João Ferreira do Amaral, economista e professor do ISEG, confessa ter ficado com o crescimento do emprego em Portugal no último ano. Uma surpresa “agradável, porque é mais gente que se empregou, mais rendimentos que as pessoas recebem”. Mas que também teve uma vertente negativa. “O outro lado da questão é que significou um aumento muito pequeno da produtividade, se é que não diminuiu mesmo. E isso não é saudável”, alerta.

Explicação? João Ferreira do Amaral diz que “ainda ninguém sabe muito bem” e considera que o tema “merece um estudo”. Mas, deixa pistas: pode ser o resultado do “aumento do emprego em sectores onde a produtividade — que é um conceito mais aplicável à produção física — não seja tão evidente, como é o caso dos serviços”.

O economista destaca a redução do desemprego de longa duração, “normalmente o mais difícil de reduzir”. Queda que pode estar relacionada com “o tipo de emprego criado, em sectores como a construção civil e os serviços, retomando o padrão de antes da crise”. Destacando que “ainda bem que há este emprego e as pessoas voltam a trabalhar”, alerta que “é preciso criar condições para que o emprego se vá alterando no futuro. E isso só se faz com investimento”.

Já no que toca ao desemprego jovem, embora tenha descido, ainda está nos 23,5%. “É um problema duplamente complicado. Primeiro, como em todos os outros países, porque é uma geração que passa anos na indecisão do que fazer pois não tem emprego. Segundo, em Portugal isto é agravado pela nossa situação periférica”, frisa João Ferreira do Amaral. E deixa um aviso: “Um dos meus receios em relação ao futuro é que a nossa periferia se agrave em termos económicos.” Isto porque “os jovens quando não encontram emprego emigram, nomeadamente os de maiores qualificações. É isso que leva a que uma região se degrade e se agrave o seu carácter periférico”. Um risco que “foi muito claro durante a fase da troika, mas que continuará se o desemprego jovem se mantiver elevado”.

O desafio demográfico é incontornável. Para João Ferreira do Amaral, “Portugal tem de fazer um estudo sério, assumido por toda a gente a nível político, encarando as projeções sobre a evolução da população. E começar a ter uma política de imigração. Vamos ter de recorrer à imigração, necessariamente”. E remata: “O importante é que isso se faça de forma a que os imigrantes sejam bem integrados na sociedade portuguesa. Tem de se evitar a criação de guetos e temos as experiências negativas de outros países para saber o que devemos evitar.”

O fim de um mundo

por estatuadesal

(António Guerreiro, in Público, 02/03/2018)

Guerreiro

António Guerreiro

Há pouco mais de um ano, Emily Bell, directora do Tow Center for Digital Journalism, depois de ter chefiado o sector digital do diário britânico The Guardian, publicou um artigo numa revista dos Estados Unidos que teve um grande impacto, onde anunciava um dos muitos “fins” que configuram o nosso tempo. Título do artigo: “O fim do mundo tal como o conhecemos: como o Facebook devorou o jornalismo”.

Não se pode dizer que seja uma daquelas catástrofes espectaculares, de grandiosos efeitos. Nada disso, é uma catástrofe serena cujo alcance e consequências ainda não foram experimentadas até ao fim e estão em grande parte por avaliar. Há quem diga que o pior ainda está para vir. Como os jornais não gostam de se apresentar a nu perante os seus leitores (acreditam que falar dos seus males é potenciá-los), pouca gente percebe o que se passa e os que percebem  acham que apenas há a registar uma morte natural e portanto inelutável.

Na mesma ocasião, Emily Bell lançou este dado impressionante: “Em cinco anos, o ecossistema da informação sofreu uma mudança mais vasta do que a que se deu ao longo dos 500 anos precedentes.” Já este ano, a revista Wired publicou uma longuíssima investigação que tinha como título “Inside the Two Years that Shook Facebook – and the World”. Fazia-se aí o retrato de uma rede social que acabou por dominar o mundo dos media, ainda que não queira ser uma empresa desse ramo. Em 2015 superou o Google enquanto veículo para a circulação de conteúdos jornalísticos na Internet, tornando-se a força dominante na indústria das notícias, tanto as falsas como as verdadeiras.

E isto, como sabemos, teve profundas implicações éticas e políticas. E levou a uma discussão sobre o impacto desta rede social nas democracias. Em Janeiro, Mark Zuckerberg mudou o algoritmo do Facebook e prometeu um maior controle sobre as notícias falsas, depois de se ter tornado muito evidente que a rede era muito vulnerável tanto à mentira como à propaganda e que, sob determinadas condições, se tinha tornado um instrumento com vocação totalitária. A ingerência russa nas eleições americanas contribui para uma nova percepção pública do Facebook, uma imagem que Zuckerberg quis corrigir.

Antes da mudança do algoritmo, já ele tinha decidido realizar uma experiência em seis países (Sri Lanka, Guatemala, Bolívia, Cambodja, Sérvia e Eslováquia) que consistiu em eliminar os media profissionais, de modo a privilegiar os conteúdos privados. Foi uma decisão muito contestada, considerada “de cariz orwelliano”.

O que se passa é que os jornais se tornaram tão vulneráveis às decisões desta rede social que até uma pequena variação do algoritmo pode ditar-lhes a sorte. Conter e filtrar as fake news causa danos a quem produz notícias verdadeiras. O Facebook tornou-se mais poderoso que os media e ganhou o estatuto de plataforma que é também editora, algo que não fazia parte da sua vocação original. Mas não é apenas por se ter tornado o principal veículo das notícias que está a destruir a indústria mediática: é também porque concentra o mercado publicitário, do qual apenas umas migalhas sobram para os jornais.

Poderiam os jornais deixar de servir de alimento a essa rede social tão voraz? Certamente que podiam, mas estão enredados num terrível paradoxo, para o qual não encontram saída: ao mesmo tempo que são devorados pelo Facebook, não conseguem sobreviver sem ele. E, num plano mais vasto, todos nós fomos apanhados nesta estratégia fatal: quer queiramos quer não, tornámo-nos todos produtores de conteúdos para o Facebook e não há maneira de conseguirmos resistir.