Translate

segunda-feira, 9 de abril de 2018

Entre as brumas da memória

O discurso de Lula da Silva na íntegra

Posted: 08 Apr 2018 11:10 AM PDT

Para memória futura, deixou aqui o texto do longo discurso de Lula, ontem, 07.04.2018, antes de se entregar à polícia para ser preso.

«Queridas companheiras e queridos companheiros,

Querido companheiro Wagner, presidente da CUT,

Querido companheiro Aloísio Mercadante, ex-Senador, ex-Deputado Federal, ex-Ministro da Ciência e Tecnologia, ex-Ministro da Educação, ex-Ministro da Casa Civil da presidenta Dilma, porra se eu tivesse tantos títulos assim eu seria Presidente da República.

Companheiro Guilherme Boulos, nosso companheiro que está iniciando uma jornada sendo candidato a Presidente da República pelo Psol, mas é um companheiro da mais alta qualidade que vocês têm que levar em conta a seriedade desse menino. Eu digo menino porque ele só tem 35 anos de idade e quando eu fiz a greve de 78, eu tinha 33 anos de idade e consegui, através da greve, chegar a criar um partido e virar Presidente. Você tem futuro meu irmão, é só não desistir nunca.

Quero cumprimentar essa garota [Manuela Davila], essa garota bonita, garota militante do PCdoB, que também está fazendo a sua primeira experiência como candidata a Presidenta da República pelo PCdoB, porque eu acho um motivo de orgulho e uma perspectiva de esperança para esse país ter gente nova se dispondo a enfrentar a negação da política, assumindo a política e dizendo nós queremos ser Presidente da República para mudar a história do país.

Quero agradecer a companhia dessa mulher[Dilma Rousseff]. Possivelmente a mais injustiçada das mulheres que um dia ousaram fazer política nesse país. A injustiçada pelo jeito de governar, acusada de não saber conversar, acusada de não saber fazer política, mas eu quero ser testemunha de vocês: a Dilma foi a pessoa que me deu a tranquilidade de fazer quase tudo que eu consegui fazer na Presidência da República pela confiança, pela seriedade, e pela qualidade e competência técnica da Dilma. Eu sou….eu sou grato, grato de coração porque não teria sido o que foi se não fosse a companheira Dilma. Portanto Dilma você sabe que eu serei profundamente, para o resto da vida, repartirei o meu sucesso na Presidência com Vossa Excelência, independentemente do que aconteça nesse mundo.

Quero cumprimentar o meu querido companheiro Fernando Haddad que viveu o melhor período de investimento na educação brasileira.

Quero cumprimentar o meu companheiro Celso Amorim. Companheiro que certamente foi o mais importante Ministro das Relações Exteriores que esse país já teve, que colocou o Brasil como protagonista mundial durante todo nosso governo.

Quero parabenizar o nosso companheiro Ivan Valente, deputado pelo Psol, companheiro que está aqui.

Quero cumprimentar o nosso valoroso, o nosso extraordinário João Pedro Stédile, presidente e coordenador do Movimento Sem Terra.

Quero cumprimentar, eu não sei o nome, mas o companheiro presidente do Psol, o Juliano, jovem presidente do Psol.

Quero cumprimentar o nosso querido escritor Fernando de Moraes que está escrevendo a biografia do meu governo que nunca termina, porra. Eu estou quase para morrer e ele não termina minha biografia.

Quero cumprimentar o nosso querido companheiro Paulo Pimenta, líder do PT. O homem que tem o blog dos deputados mais importante em Brasília e o cidadão que melhor tem enfrentado o Moro e a operação Lava Jato, naquilo que são os defeitos dela. Parabéns, companheiro Pimenta.

Quero cumprimentar o índio mais esperto do Brasil o Presidente do Piauí, o Governador do Piauí, o companheiro Wellington, que está cumprindo o terceiro mandato e pelo andar das pesquisas ele está a caminho de cumprir o quarto mandato como governador do Estado do Piauí.

Quero, aqui, cumprimentar o companheiro Emídio, tesoureiro do PT e ex-prefeito de Osasco, que tem trabalhado incansavelmente para a gente recuperar o papel do PT na história desse país.

Quero cumprimentar o companheiro Orlando Silva, presidente, ou melhor, deputado do PCdoB.

Quero cumprimentar o nosso companheiro Índio, que é da Intersindical, é um companheiro de muita qualidade.

Quero cumprimentar o Presidente da CTB que está aqui, que é companheiro Adílson, que é um companheiro também muito importante no movimento sindical.

Quero cumprimentar a nossa companheira Gleisi Hoffmann, a nossa querida Presidenta do nosso partido.

Quero cumprimentar, quero cumprimentar o companheiro Luiz Marinho, presidente do PT, Ministro do Trabalho, Ministro da Previdência. Quero contar duas coisas do Marinho: o Marinho foi catador de algodão, catador de café e catador de amendoim em Santa Fé. O Marinho foi pintor na Volkswagen. O Marinho foi presidente desse sindicato. O Marinho foi presidente da CUT. O Marinho foi certamente o mais importante Ministro do Trabalho no meu governo. E o Marinho foi o melhor Ministro da Previdência, que foi o ministro que acabou com as filas da Previdência. E o Marinho foi o melhor prefeito que São Bernardo teve e agora é nosso Presidente estadual. Quero cumprimentar o nosso Senador, o nosso querido Lindbergh, grande Lindbergh, que eu conheci ainda na campanha para derrubar o Collor, tentei tirá-lo do PCdoB para levar para o PT, mas a minha relação de amizade com o João Amazona era tão forte que eu não tive coragem de conversar com ele.

Quero cumprimentar aqui, gente, eu não tenho o nome de todo mundo. Quero cumprimentar e chamar aqui o Wagner, Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e o companheiro Moisés. É que está ali atrás e eu não estou vendo o nosso companheiro Senador da República, não, Vereador, mas futuro Senador, Eduardo Suplicy. Eu não posso falar que ele teve uma tontura porque isso não é recomendável para quem está sendo candidato, viu. Eu vou dizer que você estava sentado ali conversando com eleitores, está bem?

Eu pedi para vir aqui o companheiro do Sergipe, vice-presidente do PT. Companheiro que tem a incumbência de coordenar as Caravanas da Cidadania por todo território nacional e vocês têm acompanhado pela internet o companheiro Márcio.

Eu pedi para vir aqui dois sindicalistas porque eu acho… eu nasci nesse Sindicato. Quando eu cheguei aqui esse sindicato era um barraco. Esse prédio foi construído já na nossa diretoria. Aqui, para vocês saberem, eu fui diretor de uma escola de Madureza, que tinha 1.800 alunos. Vocês pensam que eu sou só torneiro mecânico? Podem dizer: diretor de escola com 1.800 alunos. Pois bem, e a minha relação com esse sindicato… aqui está o Paulão que é vice-presidente do sindicato e é presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos e é da Secretaria do Movimento Sindical do PT. Bem, eu não tenho nominata, eu estou chutando tudo de improviso que eu estou vendo. Mas eu queria, Wagner, aproveitar sua presença aqui para que esse pessoal soubesse que, na minha consciência, parte das conquistas da democracia brasileira a gente deve a esse Sindicato dos Metalúrgicos a partir de 1978. Aqui foi minha escola. Aqui eu aprendi sociologia, aprendi economia, aprendi física, química e aprendi a fazer muita política porque, no tempo que eu era presidente desse sindicato, as fábricas tinham 140.000 professores que me ensinavam como fazer as coisas. Toda vez que eu tinha dúvida eu is na porta da fábrica perguntar para a peãozada como fazer as coisas nesse país. Na dúvida não erre, na dúvida pergunte e, se você perguntar, a chance de você acertar é muito maior. E o Wagner é o companheiro que está cedendo esse prédio para a gente fazer toda a nossa campanha. Quero agradecer ao Moisés. O Moisés é companheiro do Wagner, é diretor financeiro do sindicato e é um companheiro que nunca se negou a contribuir com o movimento social, a contribuir com outras tarefas da democracia. Não para partido político, mas para o movimento social esse sindicato nunca negou absolutamente nada. Então eu quero uma salva de palmas para esses companheiros que são um sustentáculo da nossa luta. Esse sindicato, diferente de outros sindicatos, esse sindicato tem quase 283 diretores. Para ser diretor desse sindicato, as pessoas têm que ser eleitas pelo chão da fábrica para um comitê. Se não estiver no chão da fábrica não é eleito. E, depois de eleito membro do comitê, se escolhe os que vão ser diretores do sindicato e tem a diretoria executiva, mas tem 283 pessoas que são diretores e que são conselheiros. Se a gente fizesse isso em todo sindicato do Brasil certamente a gente teria muito menos pelegos no movimento sindical brasileiro.

Pois bem, eu fiz questão de citar ele porque às vezes o cara compra o alimento, lava o alimento, cozinha o alimento, leva para a gente comer e a gente sai sem saber quem nos deu o alimento. Então foram esses guerreiros aqui que deram essa possibilidade extraordinária da gente estar aqui fazendo isso.

A segunda coisa é que…. Eu confesso que vivi meus melhores momentos políticos nesse sindicato. Eu nunca esqueci a minha matrícula do sindicato. A minha matrícula é 25.986 de outubro, de setembro de 1968. E, de lá para cá, eu mantenho uma relação com esse sindicato que eu acho que é uma relação mais forte porque qualquer presidente que tenha aqui, Vicentinho já foi presidente, Meneghelli já foi presidente, Guiba já foi presidente, Zé Nobre já foi presidente, Feijóo já foi presidente, quem mais? O Guiba já falei, agora o Wagnão e, por todos eles, eu sou tratado como se fosse ainda Presidente desse sindicato, pela relação que nós ficamos. Mas aqui… o Rafael, foi o penúltimo presidente aqui.

Eu queria dizer para vocês que eu estou contando isso para tentar chegar ao que eu quero dizer para vocês.

Em 1979, esse sindicato fez uma das greves mais extraordinárias. Nós conseguimos fazer um acordo com a indústria automobilística que foi, talvez, o melhor. E eu tinha uma comissão de fábrica com 300 trabalhadores. E o acordo era bom. Eu resolvi levar o acordo para a assembleia. E resolvi pedir para a comissão de fábrica ir mais cedo para conversar com a peãozada. E eu fazia a assembleia de manhã para evitar que o pessoal bebesse um pouquinho à tarde. Porque quando a gente bebe um pouquinho, a gente fica mais ousado. Mesmo assim não evitava porque o cara levava litro de conhaque dentro da mala e eu passava ainda tomava uma “dosinha” para a garganta ficar melhor, coisa que não aconteceu hoje.

Pois bem, nós começamos a colocar o acordo em votação e cem mil pessoas, no estádio da Vila Euclides, não aceitavam o acordo. Era o melhor possível. A gente não perdia dia de férias, não perdia décimo terceiro salário e tinha 15% de aumento. Mas a peãozada estava tão radicalizada que queria 83 ou nada. E nós conseguimos. E aí passamos um ano sendo chamados de pelegos pelos trabalhadores.

A gente, Guilherme, ia na porta de fábrica e a peãozada … o Jorge Viana, está aqui meu querido senado do Acre, que eu não vi, ele é baixinho. Nosso querido companheiro, foi governador, foi prefeito, agora é senador do Acre. Obrigado pela presença, companheiro. Olha para falar em nome dos artistas aqui, eu queria falar todos, eu queria que o nosso Osmar Prado viesse aqui. Ele é o decano. Olha, tem muita gente aqui. E tem a mulherada do Pará também que está aqui. Mas eu citei o Osmar Prado porque o Osmar Prado é um artista de uma qualidade irrepreensível. O que Deus não deu de tamanho para ele, deu de inteligência e de capacidade artística. E ele já fez papéis extraordinários. Mas tem um que nunca esqueço que ele era o motorista e era tratado como se fosse chamado de Tabaco. E o Tabaquinho marcou a minha vida e eu fico mais feliz porque ele tem uma posição política extraordinária. E eu acho que esse aqui tem lado, esse tem lado, esse tem lado [apontando para os artistas que o rodeavam] e é com essa gente que a gente vai construir a nova política desse país.

Marco Aurélio, e a minha água Marco Aurélio? Olha eu vou dar para ele dizer uma coisinha sobre o Tabaco.

[Osmar Prado: O Tabaco tinha três mulheres e ainda as que tinha por fora. Aí eu pedi ao escritor que desse o final que desse o final ele sendo traído, porque todo traidor um dia é traído. E aí aparece a mulher do Tabaco, com uma penca de filhos, grávida. Ele diz: mulher como você está grávida? Faz mais de um ano que eu não vou lá.]

Isso é vingança das mulheres. Vingança, porque o homem pensa que só ele é esperto, mas as mulheres também são espertas.

Então, companheiros e companheiras … nós conseguimos, nós conseguimos … os trabalhadores não aprovaram o acordo … tem uma pessoa passando mal ali na frente, ali perto da escada, nessa direção … chegou o médico aí? Olha gente, se tiver um médico aqui, por favor. Tem uma médica, que vai passar e chega aí. Segura ela aí que tem uma médica que está indo para aí. Ela está ali perto daquelas câmeras de televisão ali. Olha lá, aquele pessoal que está levantando a mão. Muito bem … Espero que não tenha sido a minha voz porque se for eu tenho que para de fala.

Mas eu ia dizendo para vocês que nós não conseguimos aprovar a proposta que eu considerava boa e o pessoal, então, passou a desrespeitar a diretoria do sindicato. E eu ia na porta de fábrica e ninguém parava. E a imprensa escrevia: Lula fala para os ouvidos moucos dos trabalhadores. Nós levamos um ano para recuperar o nosso prestígio na categoria. E eu fiquei pensando com ar de vingança: os trabalhadores dizem que podem fazer cem dias de greve, quatrocentos dias de greve, que eles vão até o fim. Pois eu vou testá-los em 1980. E fizemos a maior greve da nossa história, a maior greve. Quarenta e um dias de greve, com dezessete dias de greve eu fui preso e os trabalhadores começaram, depois de alguns dias, a furar a greve e nós então … eu sei que o Tuma, eu sei que o Dr. Almir, eu sei que Teotônio Vilela ia dentro da cadeia e dizia para mim: ô Lula, você tem que acabar com a greve, você precisa dar um conselho para acabar com a greve. E eu dizia: eu não vou acabar com a greve, os trabalhadores vão decidir por conta própria. O dado concreto é que ninguém aguentou quarenta e um dias porque na prática o companheiro tinha que pagar leite, tinha que pagar conta de luz, tinha que pagar gás, a mulher passou a cobrar dele o dinheiro do pão e ele então começou a sofrer pressão não aguentou. Mas é engraçado porque na derrota a gente ganhou muito mais, sem ganhar economicamente, do que quando a gente ganhou economicamente. Significa que não é dinheiro que resolve o problema de uma greve. Não é 5%, não é 10%, é o que está embutido de teoria política, de conhecimento político e de tese política numa greve.

Agora nós estamos quase que na mesma situação, quase que na mesma situação. Eu estou sendo processado e, eu tenho dito claramente, o processo do meu apartamento, eu sou o único ser humano que sou processado por um apartamento que não é meu. E ele sabe que o Globo mentiu quando disse que era meu. A Polícia Federal da Lava Jato quando fez o inquérito mentiu que era meu. O Ministério Público, quando fez a acusação, mentiu dizendo que era meu e eu pensei que o Moro ia resolver e ele mentiu dizendo que era meu. E me condenou a nove anos de cadeia. É por isso que eu sou um cidadão indignado, porque eu já fiz muita coisa com meus 72 anos, mas eu não os perdoo por terem passado para a sociedade a ideia de que eu sou um ladrão. Deram a primazia dos bandidos fazerem um pixuleco pelo Brasil inteiro. Deram a primazia dos bandidos chamarem a gente de petralhas. Deram a primazia de criar quase que um clima de guerra negando a política nesse país. E eu digo todo dia, nenhum deles, nenhum deles tem coragem ou dorme com a consciência tranquila da honestidade e da inocência que eu durmo. Nenhum deles.

Eu não estou acima da Justiça. Se eu não acreditasse na Justiça eu não tinha feito um partido político. Eu tinha proposto uma revolução nesse país. Mas eu acredito na Justiça. Numa Justiça justa. Numa justiça que vota um processo baseado nos autos do processo, baseado nas informações das acusações, das defesas, na prova concreta que tem a arma do crime.

O que eu não posso admitir é um procurador que fez um Power Point e foi para a televisão dizer que o PT é uma organização criminosa que nasceu para roubar o Brasil. E que o Lula, por ser a figura mais importante desse partido, o Lula é o chefe. E portanto, se o Lula é o chefe, diz o procurador: “eu não preciso de provas, eu tenho convicção”. Eu quero que ele guarde a convicção dele para os comparsas deles, para os asseclas deles e não para mim. Não para mim. Certamente um ladrão não estaria exigindo provas. Estaria de rabo preso, de boca fechada, torcendo para a imprensa não falar o nome dele.

Eu tenho mais de 70 horas de Jornal Nacional me triturando. Eu tenho mais de 70 capas de revista me atacando. Eu tenho mais de milhares de páginas de jornais e matérias me atacando. Eu tenho mais a Record me atacando. Eu tenho mais a Bandeirantes me atacando. Eu tenho mais as rádios do interior, rádios de outros estados. E o que eles não se dão conta é que quanto mais eles me atacam, mais cresce a minha relação com o povo brasileiro.

Eu não tenho medo deles. Eu até já falei que gostaria de fazer um debate com o Moro sobre a denúncia que ele fez contra mim. Eu gostaria que ele me mostrasse alguma coisa de prova. Eu já desafiei os juízes do TRF4 que eles fossem para um debate na universidade que eles quisessem, no clube que eles quisessem para provar qual é o crime que eu cometi nesse país. E eu, às vezes, tenho a impressão e tenho a impressão porque eu sou um construtor de sonhos, eu há muito tempo atrás, eu sonhei que era possível governar esse país envolvendo milhões e milhões de pessoas pobres na economia, envolvendo milhões de pessoas nas universidades, criando milhões e milhões de empregos nesse país. Eu sonhei que era possível um metalúrgico, sem diploma da universidade, cuidar mais da educação do que os diplomados e concursados que governaram esse país e cuidar da educação. Eu sonhei que era possível a gente diminuir a mortalidade infantil, levando leite, feijão e arroz para que as crianças pudessem comer todo dia. Eu sonhei que era possível pegar os estudantes da periferia e colocá-los nas melhores universidades desse país para que a gente não tenha, para que a gente não tenha juízes e procuradores só da elite. Daqui a pouco nós vamos ter juízes e procuradores nascidos na favela de Heliópolis, nascido em Itaquera, nascido na periferia. Nós vamos ter muita gente dos Sem Terra, do MTST da CUT formada. Esse crime eu cometi. Eu cometi e é esse crime que eles não querem que eu cometa mais. É por conta desse crime que já tem uns dez processos contra mim. E se for por esse crime de colocar pobre na universidade, negro na universidade, pobre comer carne, pobre comprar carro, pobre viajar de avião, pobre fazer sua pequena agricultura, ser microempreendedor, ter sua casa própria. Se esse é o crime que eu cometi, eu quero dizer: eu vou continuar sendo criminoso nesse país porque vou fazer muito mais. Vou fazer muito mais.

Companheiros e companheiras, eu em 1990, em 1986 eu fui o deputado constituinte mais votado na história do país e nós ficamos descobrindo que dentro do PT, Manuela, companheiros, o Ivan era do PT na época, havia uma desconfiança que só tinha poder no PT quem tinha mandato. Quem não tinha mandato…

Puts, eu não citei o senador Humberto Costa que eu vi aqui, Humberto Costa Senador de Pernambuco e eu esquecei de citar para vocês, ninguém me deu nominata. A Fátima [Bezerra}será a nova governadora do Rio Grande do Norte. Esse aqui [Wadih Damous], junto com o Paulo Pimenta, é o companheiro que mais briga e mais denuncia a Lava Jato. O Rosseto [Miguel] foi Ministro do Trabalho e da Previdência e talvez será o governador do Rio Grande do Sul nessas eleições agora. Está aqui nossa companheira Jandira Feghali que é uma companheira extraordinariamente combativa. O Glauber Rocha, é Braga, é Braga pô. Ô gente, vai pegando e trazendo para mim. Alguém prepara uma nominata para mim que eu vou citando as pessoas.

Então companheiros, quando eu percebi que o povo desconfiava que só tinha valor no PT quem era deputado, Manuela e Guilherme, sabe o que eu fiz? Deixei de ser deputado. Porque eu queria provar ao PT que eu ia continuar a ser a figura mais importante do PT sem ter mandato, porque se alguém quiser ganhar de mim no PT só tem um jeito é trabalhar mais do que eu e gostar do povo mais do que eu, porque se não gostar não vai ganhar.

Pois bem, nós agora estamos num trabalho delicado. Eu talvez viva o momento de maior indignação que um ser humano vive. Não é fácil o que sofre a minha família. Não é fácil o que sofrem os meus filhos. Não é fácil o que sofreu a Marisa e eu quero dizer que a antecipação da morte da Marisa foi a safadeza e a sacanagem que a imprensa e o Ministério Público fizeram contra ela. Tenho certeza. Porque essa gente eu acho que não tem filho, não tem alma e não tem noção do que sente uma mão ou um pai quando vê um filho massacrado, quando vê um filho sendo atacado. E eu, então, companheiros, resolvi levantar a cabeça.

Não pensem que eu sou contra a Lava Jato, não. A Lava Jato, se pegar bandido, tem que pegar bandido mesmo, que roubou, e prender. Todos nós queremos isso. Todos nós, a vida inteira, dizíamos, só prende pobre não prende rico. Todos nós dizíamos. E eu quero que continue prendendo rico. Eu quero. Agora, qual é o problema? É que você não pode fazer julgamento subordinado à imprensa, porque no fundo, no fundo, você destrói as pessoas na sociedade, na imagem das pessoas e depois os juízes vão julgar e falam: “eu não posso ir contra a opinião pública porque a opinião pública está pedindo para cassar”. Quem quiser votar com base na opinião pública, largue a toga e vá ser candidato a deputado. Escolha um partido político e vá ser candidato. Ora, a toga ela é um emprego vitalício. O cidadão tem que votar apenas com base nos autos do processo. Aliás, eu acho que ministro da Suprema Corte não devia dar declaração de como vai votar. Nos Estados Unidos termina a votação e você não sabe em quem o cidadão votou exatamente para que ele não seja vítima de pressão. Imagine um cara sendo acusado de suicídio [assassinato] e não tenha sido ele o assassino. O que que a família do morto quer? Que ele seja morto. Que ele seja condenado. Então o juiz tem que ter, diferentemente de nós, a cabeça mais fria, mais responsabilidade de fazer acusação ou de condenar.

O Ministério Público é uma instituição muito forte por isso esses meninos que entram muito novos, fazem um curso de direito, depois faz três anos de concurso porque o pai pode pagar. Esses meninos precisam conhecer um pouco da vida. Conhecer um pouco de política para fazer o que eles fazem na sociedade brasileira. Tem uma coisa chamada responsabilidade. E não pensem que quando eu falo assim eu sou contra. Eu fui presidente e indiquei quatro procuradores e fiz discurso em todas as posses e eu dizia, quanto mais forte for a instituição, mais responsáveis os seus membros têm que ser. Você não pode condenar as pessoas pela imprensa para depois você julgá-las. Vocês estão lembrado que quando eu fui prestar depoimento lá em Curitiba eu disse para o Moro: você não tem condições de me absolver porque a Globo está exigindo que você me condene e você vai me condenar.

Pois bem, eu acho que tanto do TRF4 quanto Moro, a Lava Jato e a Globo, elas têm um sonho de consumo. O sonho de consumo é que, primeiro, o golpe não terminou com a Dilma. O golpe só vai concluir quando eles conseguirem convencer que o Lula não possa ser candidato a Presidente da República em 2018. Eles não querem, não é porque eu vá ser eleito. Eles não querem que eu participe. Apenas porque existe a possibilidade de cada um de nós se eleger. Eles não querem o Lula de volta porque pobre, na cabeça deles, não pode ter direito. Pobre não pode comer carne de primeira. Pobre não pode andar de avião. Pobre não pode fazer universidade. Pobre nasceu, segundo a lógica deles, para comer e ter coisas de segunda categoria.

Então, companheiros e companheiras, o outro sonho de consumo deles é a fotografia do Lula preso. Eu fico imaginando a tesão da Veja colocando a capa minha preso. Eu fico imaginando a tesão da Globo colocando uma fotografia minha preso. Eles vão ter orgasmo múltiplos.

Eles, eles decretaram a minha prisão. E deixa eu contar uma coisa pra vocês: eu vou atender o mandado deles. E vou atender porque eu quero fazer a transferência de responsabilidade. Eles acham que tudo que acontece neste país acontece por minha causa. Eu já fui condenado a 3 anos de cadeia porque um juiz de Manaus entendeu que eu não preciso de arma, eu tenho uma língua ferina, então era preciso fazer o Lula calar, porque se ele não calar, ele vai continuar falando frases como eu falei: “está chegando a hora da onça beber água” e os camponeses mataram um fazendeiro e eles acharam que essa frase minha era a senha.

O que que eu quero transferir de responsabilidade? Eles já tentaram me prender por obstrução de justiça, não deu certo. Eles agora querem me pegar numa prisão preventiva, que é uma coisa mais grave, porque não tem habeas corpus. O Vaccari já tá preso há três anos. O Marcelo Odebrecht gastou 400 milhões e não teve habeas corpus. Eu não vou gastar um tostão. Mas eu vou lá com a seguinte crença: eles vão descobrir, pela primeira vez, o que eu tenho dito todo dia. Eles não sabem. Eles não sabem que o problema deste país não chama-se Lula, o problema deste país chama-se vocês, a consciência do povo, o Partido dos Trabalhadores, o PCdoB, o MST, o MTST, eles sabem que tem muita gente. E aquilo que a nossa pastora diz, e eu tenho dito todo discurso, não adianta tentar evitar que eu ande por este país, porque tem milhões e milhões de Lulas, de Boulos, de Manuela, de Dilma Rousseff para andar por mim. Não adianta tentar acabar, sabe, com as minhas ideias, elas já estão pairando no ar e não tem como prendê-las. Não adianta tentar parar o meu sonho, porque quando eu parar de sonhar, eu sonharei pela cabeça de vocês e pelos sonhos de vocês. Não adianta achar que tudo vai parar o dia que o Lula tiver um enfarte, é bobagem, porque o meu coração baterá pelo coração de vocês e são milhões de corações.

Não adianta eles acharem que vão fazer com que eu pare, eu não pararei porque eu não mais sou um ser humano, sou uma ideia, uma ideia misturada com a ideia de vocês, e eu tenho certeza que companheiros como os sem-terra, o MTST, os companheiros da CUT e do movimento sindical sabem, e esta é uma prova, esta é uma prova, eu vou cumprir o mandado e vocês, vocês vão ter que se transformar, cada um de vocês, vocês não vão mais se chamar Chiquinha, Joãozinho, Zezinho, Albertinho. Todos vocês, daqui pra frente, vão virar Lula e vão andar por este país fazendo o que você tem que fazer. E é todo dia! É todo dia! Eles têm que saber que a morte de um combatente não para a revolução. Eles têm que saber. Eles têm que saber que nós vamos fazer, definitivamente, uma regulação dos meios de comunicação para que o povo não seja vítima das mentiras todo santo dia. Eles têm de saber que vocês, quem sabe, são até mais inteligentes do que eu, e poderão queimar os pneus que vocês tanto queimam, fazer as passeatas que tanto vocês queiram, fazer as ocupações no campo e na cidade. Parecia difícil a ocupação de São Bernardo, e amanhã vocês vão receber a notícia de que ganharam o terreno que vocês invadiram.

Portanto companheiros, eu tive chance agora. Eu estava no Uruguai, entre Livramento e Rivera, e as pessoas diziam assim: “Lula, você dá uma voltinha ali. É só atravessar a rua. Finge que vai comprar um ‘‘uisquizinho’’, você está no Uruguai com o Pepe Mujica e vai embora e não volta mais, pede asilo político. Ô Lula, você pode ir na embaixada da Bolívia, você pode ir na embaixada do Uruguai. Ô Lula, vai na embaixada da Rússia. Ô Lula vai na embaixada, de lá você fica falando.”

Eu falei: “eu não tenho mais idade”. Minha idade é de enfrentá-los de olho no olho e eu vou enfrentá-los aceitando, aceitando cumprir o mandado. Eu quero saber quantos dias eles vão pensar que tão me prendendo e quantos mais dias eles me deixarem lá, mais lulas vão nascer neste país e mais gente vai querer brigar neste país, porque a democracia, a democracia não tem limite, não tem hora para a gente brigar. Por isso eu estou fazendo uma coisa muito consciente, mas muito consciente. Eu falei para os companheiros: se dependesse da minha vontade eu não iria, mas eu vou porque eles vão dizer a partir de amanhã que o Lula tá foragido, que o Lula tá escondido. Não! Eu não estou escondido, eu vou lá na barba deles para eles saberem que eu não tenho medo, para eles saberem que eu não vou correr e para eles saberem que eu vou provar minha inocência. Eles têm que saber disso. E façam o que quiserem. Façam o que quiserem.

Eu vou terminar com uma frase que eu peguei em 1982 de uma menina de 10 anos em Catanduva, que eu não sei quem é, e essa frase não tem autor. A frase dizia: “os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas jamais conseguirão deter a chegada da primavera”. E a nossa luta é em busca da primavera. Eles tem de saber que nós queremos mais casa, mais escola, nós queremos menos mortalidade, nós não queremos repetir a barbaridade que fizeram com a Marielle no Rio de Janeiro. Não queremos repetir a barbaridade que se faz com meninos negros nas periferias desse país. Não queremos mais que volte a desnutrição, a mortalidade por desnutrição neste país. Não queremos mais que um jovem não tenha esperança de entrar numa universidade, porque este país é tão cretino, que ele foi o último país do mundo a ter uma universidade. O último! Todos os países mais pobres tiveram, porque eles não queriam que a juventude brasileira estudasse. E falaram que custava muito fazer escola. É de se perguntar quanto custou não fazer há 50 anos atrás.

Então, eu quero que vocês saibam que eu tenho orgulho, profundo orgulho, de ter sido o único Presidente da República sem ter um diploma universitário, mas sou o Presidente da República que mais fiz universidade na história deste país para mostrar para essa gente que não confunda inteligência com a quantidade de anos na escolaridade. Isso não e inteligência, é conhecimento. Inteligência é quando você sabe tomar decisão. Inteligência é quando você tem lado. Inteligência é quando você não tem medo de discutir com os companheiros aquilo que é prioridade, e a prioridade desse país é garantir que este país volte a ter cidadania. Não vão vender a Petrobras! Vamos fazer uma nova constituinte! Vamos revogar a lei do petróleo que eles tão fazendo! Não vamos deixar vender o BNDES, não vamos deixar vender a Caixa Econômica, não vamos deixar destruir o Banco do Brasil! E vamos fortalecer a agricultura familiar, que é responsável por 70% do alimento que nós comemos neste país.

É com essa crença companheiros, de cabeça erguida, como eu estou falando com vocês, que eu quero chegar lá e falar para o delegado estou à sua disposição e a história, a história daqui a alguns dias vai provar que quem cometeu crime, foi o delegado que me acusou, foi o juiz que me julgou e foi o Ministério Público que foi leviano comigo, por isso, companheiros, eu não tenho lugar no meu coração para todo mundo, mas eu quero que vocês saibam se tem uma coisa que eu aprendi a gostar neste mundo é da minha relação com o povo, quando eu pego na mão de um de vocês, quando eu abraço um de vocês, quando eu beijo… agora estou beijando homem e mulher igualzinho, não mistura mais, quando eu beijo um de vocês, eu não estou beijando com segundas intenções, eu estou beijando porque quando eu era presidente eu dizia eu vou voltar para onde eu vim e eu sei quem são meus amigos eternos e quem são os amigos eventuais, os de gravatinha que iam atrás de mim, agora desapareceram, e quem está comigo é aqueles companheiros que eram meus amigos antes de eu ser Presidente da República, é aqueles que comiam rabada aqui no Zelão, é aqueles que comiam frango com polenta ali no Demarchi, é aquele que tomava caldo de mocotó no Zelão, esses continuam sendo os nossos amigos, é aqueles que têm coragem de invadir um terreno para fazer casa, é aqueles que têm coragem de fazer uma greve contra a Previdência, é aqueles que têm coragem de fazer alguma greve ocupar um campo para fazer uma fazenda produtiva, é aqueles que na verdade precisam do Estado. Então, companheiros, eu vou dizer uma coisa a vocês, vocês vão perceber que eu sairei dessa maior, mais forte, mais verdadeiro e inocente porque eu quero provar que eles cometeram um crime, um crime político de perseguir um homem que tem 50 anos de história política, e por isso eu sou muito grato, eu não tenho como pagar a gratidão, o carinho e o respeito que vocês têm dedicado por mim nesses tantos anos, quero dizer a você, Guilherme e a Manuela, quero dizer a vocês dois, para mim é motivo orgulho pertencer a uma geração que está no final dela vendo nascer dois jovens disputando o direito de ser Presidente da República deste país. Por isso, companheiros, uma grande abraço, pode ficar certo que esse pescoço aqui não baixa minha mãe já fez o pescoço curto para ele não baixar e não vai baixar porque eu vou de cabeça erguida e vou sair de peito estufado de lá porque vou provar a minha inocência. Um abraço, companheiros. Obrigado, mas muito obrigado a todos vocês pelo que vocês me ajudaram.

Um beijo queridos e muito obrigado!»

(Daqui.)

.

08.04.1929 - Brel 89

Posted: 08 Apr 2018 09:39 AM PDT

É um ritual a que regresso todos os anos: recordar que Jacques Brel seria hoje um velho (de 89 anos) se não tivesse adormecido demasiado cedo: «Les vieux ne meurent pas, ils s’endorment un jour et dorment trop longtemps» – disse ele:

Um dos meus monstros mais do que sagrados, com um registo especial: tive a sorte de o ver e ouvir, em pessoa, era ele jovem e eu muito mais ainda... Em Lovaina, na Bélgica, num espectáculo extraordinário a que se seguiu, já na rua, uma cena de pancadaria entre valões e flamengos, com bastonadas da polícia e muitas montras partidas à pedrada. Tudo porque Brel, em terra de flamengos, insistiu em cantar um dos seus êxitos – Les Flamandes – onde uma parte das suas compatriotas não é muito bem tratada. Ele era assim.

Uma das minhas preferidas:
E a inevitável:
.

Quem se mete com Centeno, perde

Posted: 08 Apr 2018 02:46 AM PDT

Pedo Adão e Silva no Expresso de 07.04.2018:

domingo, 8 de abril de 2018

Centeno considera “adequado” antecipar data de legislativas

HÁ 2 HORAS

Ministro das Finanças considera que seria bom alinhar data das eleições europeias com as legislativas, antecipando o escrutínio nacional. Medida seria boa, diz, por uma questão de "estabilidade".

TIAGO PETINGA/LUSA

Autor
  • Agência Lusa
Mais sobre

O ministro das Finanças português admitiu este domingo que seria “adequado” alinhar as eleições legislativas com a votação para o Parlamento Europeu, o que anteciparia o escrutínio nacional em alguns meses.

A declaração foi feita em resposta a uma pergunta do público que assistiu à conferência de encerramento da primeira edição das Conferências Ulisses 2018, comissariadas pelo historiador e ex-eurodeputado Rui Tavares, que hoje decorreram no Centro Cultural de Belém, em Lisboa.

A pergunta feita a Mário Centeno foi: “Defende que as eleições legislativas de 2019 devem ser antecipadas para antes do verão?”, recordando que o PS defendeu, no passado, um alinhamento com o calendário europeu.

“A transição que o país passou de 2015 para 2016 foi difícil e colocou desafios grandes ao Governo na altura e, portanto, é uma decisão política, que compete aos partidos políticos e ao senhor Presidente da República”, começou por dizer Mário Centeno.

O ministro acrescentou, logo a seguir: “Diria que é adequado, do ponto de vista da estabilidade que temos procurado incutir à gestão das finanças públicas, que houvesse esse alinhamento [com as eleições europeias, agendadas para maio].”

Insistindo na “estabilidade orçamental” e na “previsibilidade”, já antes, durante a conferência, Mário Centeno, também presidente do Eurogrupo, tinha destacado que “o desalinhamento entre ciclos políticos é uma das maiores barreiras à tomada de decisões europeia”.

Bruno de Carvalho ao ataque: “mentores” da crise são “jogadores que exigem sair do Clube há anos”

O presidente do Sporting escreveu mais um comunicado, relatando o que se passou nas reuniões em Alvalade. Fala em bufos no balneário e responsabiliza jogadores desestabilizadores que não nomeia.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Autor
Mais sobre

Bruno de Carvalho voltou ao ataque. Apesar de criticar a maioria dos jogadores pelo comunicado que subscreveram e publicaram nas nas redes sociais (“os atletas decidiram tratar através dos seus Instagram, aquilo que tinha sido reclamado pelos próprios como devendo ser tratado internamente” e serão mesmo alvos de “processos discplinares“),o presidente do Sporting tem alvos concretos: fala em jogadores que passaram informação à comunicação social, em “manipulação” de alguns elementos do balneário e em “grupos de atletas” que se comportam de forma “sobranceira” e responsabiliza ainda como “grandes mentores de toda esta questão jogadores que, há anos, exigem sair do Clube de todas as maneiras e feitios”.

Bruno de Carvalho conta ainda os pormenores das reuniões entre presidente, team-manager (André Geraldes), treinador (Jorge Jesus) e jogadores do Sporting, confirmando que houve uma chamada a Mustafá, líder da Juventude Leonina, no decorrer da reunião. “Essa situação [responsabilidade de certos jogadores na crise] ainda foi mais vincada quando, a dada altura, um atleta confrontou o Presidente com o facto – que notoriamente já tinha partilhado com o grupo -, de que o Presidente teria ligado no dia anterior ao líder da Juventude Leonina, pedindo-lhe que batesse nos jogadores, num ato que deixou o Presidente totalmente indignado”, conta Bruno de Carvalho.

O Presidente, recusando este tipo de insinuações, intrigas e manipulações de grupo, que já vêm sendo modus operandihabitual daqueles que, por várias vezes, tentaram desestabilizar o plantel, ligou em frente aos atletas para o líder da referida claque. Não sabendo que estava em alta voz perante toda a equipa, desmentiu categoricamente esse atleta, e os colegas puderam perceber o nível de manipulação a que se chega dentro deste balneário.”

Não houve pedido de desculpas de nenhuma das partes e os jogadores não o exigiram a Bruno de Carvalho, refere ainda o presidente do Sporting: “Não houve nem poderia haver qualquer tentativa por parte dos atletas para que o Presidente se retratasse (…) até porque existe o sentimento e reconhecimento de que, por muito que possa desagradar a alguns, o Presidente coloca e colocará sempre os interesses do Sporting CP acima de tudo. É claro para todos que quem manda no Clube é o Presidente”.

O Presidente foi claro e reafirmou que no Sporting CP não podemos estar perante grupos de atletas que se queiram comportar de forma sobranceira, e que têm, de uma vez por todas, que se focar na obrigação e missão de conquistar títulos e agradar e fazer felizes os Sócios e Adeptos do Sporting CP. Não podemos compactuar com joguinhos de “bastidores” internos, prejudicando os grupos e com atitudes de “ameaças e pressões” a colegas (…)

Para o presidente do Sporting, a ação de alguns jogadores “tem sempre na sua base a tentativa de esconder insucessos, e promover na opinião pública um novo sentimento de revolta, cujos mentores terão aprendido a fazer, certamente, com as lições que tiveram durante o célebre e triste episódio protagonizado por alguém [Marco Silva] que, com uma agenda própria, tentou, com relativo sucesso, virar os sportinguistas contra o seu Presidente.”

Bruno de Carvalho justificou ainda porque decidiu não avançar com a suspensão dos jogadores para a partida deste domingo dos leões: “O Presidente chegou à conclusão que a suspensão imposta aos atletas, não teria efeito de castigo mas apenas serviria para ser mais uma desculpa para que não pudessem cumprir as suas funções e as obrigações para que são pagos”. Porém, acrescenta, “perante a situação grave que se viveu, com a atitude dos jogadores que acabou por manchar o bom nome do Presidente e do Clube, serão mantidos os processos disciplinares.”

O comunicado, diz Bruno de Carvalho, é feito por uma questão de transparência e para não permitir que os sportinguistas sejam induzidos em erro pela comunicação social. “Se os jornais não continuarem a ser inundados por “fontes” que sabemos bem quem são, iremos remeter-nos, a partir daqui, ao silêncio sobre este assunto. Se assim não for, continuaremos na nossa política de transparência de que os Sócios e Adeptos têm sempre o direito de saber o que se passa dentro da sua casa para que (…) não vivam na opacidade, no obscurantismo e na ignorância”. A transmissão de informação do interior do balneário para a comunicação social foi aliás um dos aspetos mais criticados por Bruno de Carvalho:

Alguém dentro daquelas duas salas [de reuniões], apressou-se (…) a colocar uma série de notícias falsas por todos os jornais. São este tipo de hipocrisias em que se apela publicamente para que os assuntos sejam tratados dentro de casa, para que depois, com recurso a serem “fontes anónimas”, poderem livremente conspurcar uma Comunicação Social que, já por si, inventa todos os dias novas mentiras sobre o Sporting CP – facto que é intolerável – que não podemos nem iremos permitir”, acusa o presidente.

Leia o comunicado na íntegra:

Quando a equipa de futebol regressou de Madrid, os jogadores pediram uma reunião com o Presidente. A mesma ficou de imediato marcada para este domingo, após o jogo com o Paços de Ferreira. Em seguida, foram ter com o treinador abordando o mesmo assunto. A reunião voltou a ser confirmada, com acordo de todos, e contaria também com a presença do treinador e outras pessoas da estrutura do futebol. Para espanto do Presidente, do treinador e demais pessoas da estrutura, e ao arrepio de tudo o que estava combinado entre todos, os atletas decidiram tratar através dos seus Instagram, aquilo que tinha sido reclamado pelos próprios como devendo ser tratado internamente.

Durante o dia de ontem, realizaram-se duas reuniões em que, além do Presidente, estiveram presentes o team-manager, o treinador e os atletas do plantel principal. Coisa estranha, quisemos tratar de tudo em família e dentro de casa, como aliás nos tem sido pedido, e eis que hoje está tudo na praça pública, plantado em todos os jornais, com vários factos deturpados, truncados ou, simplesmente aldrabados. E por isso aqui estamos, outra vez, obrigados a repor a verdade do que se passou.

Na primeira reunião, ficaram claras duas coisas: a total lealdade do treinador perante o Presidente e quem foram os grandes mentores de toda esta questão, de que fazem parte jogadores que, há anos, exigem sair do Clube de todas as maneiras e feitios. Aliás, essa situação ainda foi mais vincada quando, a dada altura, um atleta confrontou o Presidente com o facto – que notóriamente já tinha partilhado com o grupo -, de que o Presidente teria ligado no dia anterior ao líder da Juventude Leonina, pedindo-lhe que batesse nos jogadores, num acto que deixou o Presidente totalmente indignado.

O Presidente, recusando este tipo de insinuações, intrigas e manipulações de grupo, que já vêm sendo modus operandi habitual daqueles que, por várias vezes, tentaram desestabilizar o plantel, ligou em frente aos atletas para o líder da referida claque. Não sabendo que estava em alta voz perante toda a equipa, desmentiu categoricamente esse atleta, e os colegas puderam perceber o nível de manipulação a que se chega dentro deste balneário.

Na referida reunião, a que depois se seguiu outra na Academia, não houve nem poderia haver qualquer tentativa por parte dos atletas para que o Presidente se retratasse, nem dentro do grupo nem publicamente, até porque existe o sentimento e reconhecimento de que, por muito que possa desagradar a alguns, o Presidente coloca e colocará sempre os interesses do Sporting CP acima de tudo. É claro para todos que quem manda no Clube é o Presidente, pelo que, os retratamentos ou não que possa ter necessidade de fazer, acontecerão sempre em actos eleitorais ou AG‘s com os Associados, e nunca por exigência de assalariados ou colaboradores do Clube.

O Presidente foi claro e reafirmou que no Sporting CP não podemos estar perante grupos de atletas que se queiram comportar de forma sobranceira, e que têm, de uma vez por todas, que se focar na obrigação e missão de conquistar títulos e agradar e fazer felizes os Sócios e Adeptos do Sporting CP. Não podemos compactuar com joguinhos de “bastidores” internos, prejudicando os grupos e com atitudes de “ameaças e pressões” a colegas, sobretudo quando já havia uma reunião marcada para hoje, após o jogo, acordada por todos – Presidente, treinador e atletas. Isto tem sempre na sua base a tentativa de esconder insucessos, e promover na opinião pública um novo sentimento de revolta, cujos mentores terão aprendido a fazer, certamente, com as lições que tiveram durante o célebre e triste episódio protagonizado por alguém que, com uma agenda própria, tentou, com relativo sucesso, virar os sportinguistas contra o seu Presidente.

Estamos a fazer este comunicado pois não permitiremos, através do nosso silêncio como fizémos no passado, uma nova situação como a que ficou conhecida no universo sportinguista como “o caso Marco Silva”. Foi, aliás, por gerir esse assunto só “dentro de casa”, que se permitiu a criação de um mito e que se deixou que uma pessoa alimentasse uma “guerra” dos sportinguistas contra o seu Presidente, com constante passagem de informação falsa e deturpada para a Comunicação Social.

O mesmo se pode concluir da leitura das notícias de hoje. Alguém dentro daquelas duas salas, apressou-se, ao estilo do episódio já aqui referido, a colocar uma série de notícias falsas por todos os jornais. São este tipo de hipocrisias em que se apela publicamente para que os assuntos sejam tratados dentro de casa, para que depois, com recurso a serem “fontes anónimas”, poderem livremente conspurcar uma Comunicação Social que, já por si, inventa todos os dias novas mentiras sobre o Sporting CP – facto que é intolerável – que não podemos nem iremos permitir.

Neste Clube, apesar das lições tristes que, há 3 anos, alguns jogadores tiveram, não iremos compactuar com atitudes dissimuladas, manipuladoras e desestabilizadoras, ficando, do nosso lado, em silêncio. Não se pode combater quem luta de forma “suja”, recorrendo ao anonimato para atacar o Presidente e com isso o Clube, sem os desmascarar a cada passo.

Sobre as várias restantes notícias hoje veiculadas, há que salientar alguns aspectos. Desde logo, é totalmente falso que aquelas pessoas a quem os jornais chamam de “VIP‘s” – que para nós são os mais de 3.5 milhões de sportinguistas -, tenham tido qualquer conversa com o Presidente sobre o tema em questão. Aliás, das pessoas referidas e em que constam nomes como José Maria Ricciardi ou José Eduardo, apenas Eduardo Barroso ligou ao Presidente, num gesto de grande elevação como é seu apanágio, com a única preocupação de saber como estava a sua saúde, a da sua esposa e a da filha que está para nascer. Ainda existem muitos, num meio pejado de hipócritas e oportunistas, como por exemplo Paulo Abreu, Carlos Seixas, Menezes Rodrigues, Vítor Ferreira, Isabel Trigo Mira ou Madeira Rodrigues, que nestes momentos sabem demonstrar a sua total confiança e amizade plena.

Também são de salientar os telefonemas do Presidente do Conselho Fiscal e Disciplinar do Clube, Nuno Silvério Marques, do Presidente do Conselho Fiscal e Disciplinar da SAD, Rui Moreira Carvalho, e do Presidente da MAG do Clube, Jaime Marta Soares, dando conta da sua total solidariedade. É nestes momentos em que, como diz o povo, conseguimos distinguir o trigo do joio, e conseguimos perceber quem, de forma discreta e directa, demonstra a sua solidariedade, como foram os casos das pessoas já referidas ou de toda a Direcção do Clube e Administração da SAD, dos outros que não resistem aos holofotes da Comunicação Social ou das pressões mediáticas ou no seu meio de “amigos” e, ao invés de deixarem os que por direito, estatutos e regulamentos, podem e devem apagar os fogos que vão existindo de forma natural em todas as instituições, tentando intrometer-se e conseguindo atear ainda mais o fogo de um incêndio que já estava controlado em todas as suas frentes, não respeitando a autonomia de cada órgão e podendo pôr em causa o princípio da lealdade institucional entre órgãos sociais.

No final do dia, todos temos que tirar as nossas lições:

1. O Presidente faz e age como quer e onde quer, sendo que a única coisa que o move é e será sempre a defesa dos superiores interesses do Sporting CP e honrar a confiança dos Sócios que o elegeram;

2. O Presidente não age a mando nem de atletas, nem de treinadores, nem de presidentes ou membros de outros órgãos sociais;

3. O Presidente exigirá sempre, pelas formas que considere adequadas, a excelência, a atitude, o compromisso e o respeito pelas hierarquias e autonomias e, sobretudo, por aqueles que são de facto o maior activo e património do Clube, os seus Sócios e Adeptos;

4. O Presidente chegou à conclusão que a suspensão imposta aos atletas, não teria efeito de castigo mas apenas serviria para ser mais uma desculpa para que não pudessem cumprir as suas funções e as obrigações para que são pagos;

5. Perante a situação grave que se viveu, com a atitude dos jogadores que acabou por manchar o bom nome do Presidente e do Clube, serão mantidos os processos disciplinares;

6. Existem coisas que, mesmo sendo de casa, nunca podem ser ditas ou feitas, pois um Clube e uma SAD podem ser uma família, mas também serão sempre instituições com hierarquias, regras e princípios, e onde uma das normas basilares – além do respeito pelas mesmas -, é e será sempre, pelo menos enquanto esta Direcção e Administração continuarem à frente do Clube e da SAD, o nunca se poder faltar ao respeito aos Sócios e Adeptos. Nem por atitudes, nem por palavras, nem por falta de empenho.

Do nosso lado, se os jornais não continuarem a ser inundados por “fontes” que sabemos bem quem são, iremos remeter-nos, a partir daqui, ao silêncio sobre este assunto. Se assim não for, continuaremos na nossa política de transparência de que os Sócios e Adeptos têm sempre o direito de saber o que se passa dentro da sua casa para que, ao contrário do que aconteceu até 2013, e no já referido episódio acima mencionado, não vivam na opacidade, no obscurantismo e na ignorância.

Dito isto, vimos pedir a todos os Adeptos e Sócios do Sporting CP que continuem, de forma apaixonada e genuína, a serem o 12° Jogador, demonstrando que são de facto os melhores do mundo, sem nunca terem receio de exigir a todos sem excepção, os que servem o Clube e a SAD, que se superem num clima de exigência máxima, que aquele que faz com que, apesar de passarmos décadas sem ser campeões no futebol sénior masculino, vemos a nossa família, a cada dia, crescer de forma exponencial.

É esta paixão e amor incondicionais que devemos continuar a passar aos que nos rodeiam e, sobretudo, exigindo a todos aqueles que são pagos para servir o Clube.

Quanto à Direcção do Clube e da SAD, continuaremos com o mesmo Esforço, Dedicação e Devoção a gerir estas instituições e a lutar pela verdade desportiva, que deve voltar a ser o foco de todos nós. Pois são casos como os vouchers, os e-mails, o E-toupeira ou os jogos para perder que nos podem também afastar do caminho da Glória que traçámos e pela qual trabalhamos diariamente, 24 horas, para conquistar.

Fáxistas! Rásssistas! É p’racabar est’resto a um eurinho

Novo artigo em BLASFÉMIAS


por vitorcunha

Segundo a actriz que lidera – perdão: coordena – o manicómio a que se decidiu convencionar – porque até os bichinhos merecem respeito – a denominação de partido político, a prisão de Lula corresponde a “um golpe da direita reaccionária, racista, fascista”. Presumo que o citado golpe, além das enumeradas virtudes, também possua pontos passíveis de crítica: de outra forma, não se compreenderia o insulto aos portugueses que não andam aí na roubalheira evitando serem alvo dos decretos de “enriquecimento ilícito” defendidos por esta gente.

Desde que deixaram o esganiçar em virtude da necessária compatibilidade sonora com humanos, facto que se tornou notório com a diminuição brutal de cães que uivam durante o telejornal, passaram a optar pelo discurso populista para os charrados que constituem o seu eleitor-alvo, diga-se de passagem, com grande sucesso.

É sempre bom termos a apoiar o governo pessoas deste calibre em oratória psicadélica. De outra forma corríamos o risco de passar por um país decente.

Quatro hipóteses sobre uma disputa não encerrada

por estatuadesal

(Por António Martins, in OutrasPalavras, 08/04/2018)

lula3

Preso político do regime pós-2016, Lula não poderá disputar as eleições. Seu encarceramento busca, sobretudo, consolidar a agenda de retrocessos. Mas o triunfo dos conservadores não se consumou.


1.
O gargalhar das hienas

Condenação de Lula expressa, ao mesmo tempo, força e fracasso. Bloco pró-golpe mantém-se coeso e tem poder – mas precisa de um espetáculo para tentar ocultar ruína de seu projeto.

Como tudo muda, em tempos de crise civilizatória e de impasse nos projetos de esquerda. No final da II Guerra, em meio a um mundo devastado e à “ameaça” da União Soviética, as elites ocidentais promoveram um movimento notável de entrega dos anéis para poupar os dedos. Firmaram-se novos pactos sociais. Os salários cresceram, houve pleno emprego, surgiram o Estado de Bem-Estar Social, as redes igualitárias de Saúde e Educação. Abriu-se espaço para grandes processos de urbanização e industrialização da própria periferia – como no Brasil. Setenta anos depois, tudo mudou – e a condenação infame de Lula precisa ser enxergada nesta perspectiva mais ampla.

Porque o enorme retrocesso brasileiro, este ataque incessante aos direitos, esta ameaça concreta de fascistização, é parte de um processo global. Ao contrário do pós-guerra, o sistema respondeu à crise do 2008 aprofundando suas características mais antidemocráticas e retrógradas. Golpes de Estado ou eleições frandadas, como no Brasil, Egito, Honduras, Paraguai. Morte de milhares pelas milícias, como nas Filipinas. Militarização, como no México e agora no Rio de Janeiro. Destruição dos Estados nacionais, como no Iraque, Líbia, Yêmen, Síria. Regressão dos direitos sociais, como em toda a Europa. E algo comum, em todos os casos: a política é substituída pelo espetáculo. Não há mais democracia real alguma; tirou-se das sociedades o direito de decidir sobre seu futuro. Por isso, é preciso deleitá-las com sensações.

A prisão de Lula não visa apenas afastá-lo da disputa à Presidência – o que poderia ser feito muito mais facilmente por meio da Justiça Eleitoral. Ela pretende, além disso, impor uma nova narrativa, nos meses decisivos que nos separam de outubro. Além da “guerra ao crime”, supostamente disparada na intervenção militar no Rio de Janeiro, estaríamos vivendo agora uma “guerra à impunidade”.

Foi este o teor do voto proferido, de olho nas câmeras, pelo ministro Luís Barroso, na sessão do STF na última quarta-feira. É esta a fala martelada, incessantemente, nas mensagens dos comentaristas da TV, dos “especialistas” jurídicos, dos editoriais.

Segunda: o golpe, obviamente, não foi uma decisão técnica, mas um pacto político entre os conservadores. Por isso o próprio discurso do “combate à impunidade” é um farrapo, um guarda-chuva esburacado incapaz de esconder o caráter partidário das decisões judiciais. A procuradora-geral, que pediu a prisão imediata de Lula, é a mesma Raquel Dodge que comandou o arquivamento de inquéritos contra José Serra, está livrando Alckmin das denúncias da Camargo Corrêa e mandou soltar em tempo recorde os aliados de Michel Temer envolvidos com corrupção bilionária no Porto de Santos. De Sérgio Moro, são notórias as relações com Aécio Neves. De Carmem Lúcia, os encontros fora da agenda com o presidente.Há, porém, uma fragilidade dupla neste script. Primeira: a realidade que ele busca esconder manifesta-se todos os dias, diante de milhões de brasileiros. O discurso essencial do golpe de 2016 fracassou. Garantia-se que o afastamento da esquerda devolveria ao país à prosperidade e a ordem. Produziu-se, ao contrário, desemprego, legiões dormindo nas rua, perda de direitos, desmonte dos serviços públicos, venda do país, aumento nítido da insegurança e da violência.

Certos analistas de esquerda precipitam-se em dizer que não haverá eleições em outubro. Curiosamente, difundir esta crença – ou ao menos criar incertezas desmobilizadoras – é o objetivo essencial dos que promoveram o golpe; que o radicalizaram, a partir da intervenção militar no Rio; e que gargalham como hienas diante da condenação de Lula. Porque cancelar as eleições seria, no cenário atual, a única forma de superar as duas enormes debilidades do projeto ultra-conservador em curso no Brasil. É o que veremos no próximo capítulo.


2.
Ainda estão rolando os dados

Prisão-espetáculo busca blindar agenda de ataques aos direitos sociais e ao país. Mas enorme impopularidade dos golpistas mostra que há espaço para garantir as eleições e lutar

Três fatos destacados marcaram uma mudança profunda no cenário nacional nos últimos quatro meses. Não há provas – mas pode-se ter forte convicção – de que os responsáveis por eles agiram articulados entre si. Juntos, estes acontecimentos tiraram o governo Temer da insignificância a que estava relegando, restituindo ao presidente a iniciativa política. Também interromperam, pelo menos temporariamente, o forte movimento que se formava em favor da revogação das políticas adotadas após o golpe de 2016. Por fim, transformaram as eleições nacionais de outubro – cujo prognóstico era uma ampla vitória de Lula – numa loteria cujo resultado é hoje imprevisível.

Eis os três fatos. Em 13 de dezembro do ano passado, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região marcou o julgamento do recurso de Lula, contra a condenação por Sérgio Moro, para 24 de janeiro último – quando todos previam que ocorresse no meio do ano. Foi uma decisão arbitrária, que quebrou todos os recordes anteriores de celeridade do tribunal e significou interferência dos desembargadores do TRF-4 na fila cronológica de análise dos processos. Julgado seis semanas depois, Lula teve sua pena aumentada. Os desembargadores certamente combinaram previamente a sentença. Ao fixarem-na, todos, em exatos 12 anos e um mês, tornaram ainda mais sumário o julgamento, cerceando o direito da defesa a recorrer por meio dos chamados “embargos infringentes”. O efeito na agenda nacional foi imediato. O debate político sobre o sentido das políticas do golpe, que crescia, foi substituído pelas expectativas em relação ao futuro de Lula.

Em 16 de fevereiro, veio o segundo grande fato. Ainda com popularidade próxima de zero, ridicularizado em centenas de blocos de Carnaval pelo país e no sambódromo do Rio de Janeiro, Temer decretou intervenção federal-militar naquele Estado. Foi mais um raio despolitizador. Nas semanas seguintes, e até hoje, a segurança pública avançou para o centro das preocupações nacionais. Foram fundamentais para isso o massacre midiático e, em grau menor, à resistência histórica da esquerda a refletir e produzir propostas sobre o tema.

Enfim, em 21 de março, o ato final. Pressionada por seus própios pares por reter, durante meses, o julgamento da possibilidade de prender pessoas que ainda têm direito de recurso à Justiça, a presidente do STF, Carmen Lúcia, colocou o tema em pauta de forma capciosa. Não aceitou discutir o mérito da questão (que diz respeito a uma garantia constitucional de todos). Agendou o debate o pedido de habeas corpus de Lula (para que fosse apresentado como a defesa de um privilégio para os poderosos). Duas semanas depois, fato consumado: pedido negado, carta branca a Sérgio Moro para decretar a prisão. Mais espaço para que a TV e os jornais afastem o debate do que importa nas eleições e foquem nas acusações contra Lula.

Foram três vitórias dos conservadores, em quatro meses. O cenário mudou. E no entanto, ainda estão rolando os dados: nada indica que consolidação da agenda de retrocessos seja definitiva. Há uma razão básica para isso. Temer e o bloco estratégico que promoveu o golpe – grandes empresários, máfias parlamentares e mídia – retomaram a iniciativa, mas continuam tão impopulares quanto antes. Nenhum de seus candidatos prioritários à Presidência (Geraldo Alckmin, Henrique Meirelles e Rodrigo Maia) conseguiu chegar a 10%. Pesquisas do Datafolha mostram que a população segue contrária às privatizações e às contra-reformas da Previdência e Trabalhista.

A tentativa de despolitizar as eleições, de submetê-las aos espetáculos da intervenção no Rio de Janeiro e do “combate à impunidade” segue um scritp global. Nas democracias de fachada, ninguém debate ideias, apenas produtos. Mas o Brasil se renderá a esta lógica? Por que, então, em todas as pesquisas, Lula mantém folgada dianteira (ainda que perseguido), Ciro Gomes aparece como uma alternativa poderosa, Guilherme Boulos e Manuela Dávila têm chances de crescer? Tudo indica que não estamos condenados a Bolsonaro, nem ao cancelamento do pleito. Mas por que caminhos retomar a ofensiva contra a agenda de retrocessos? É sobre isso que especularemos, na terceira parte desta análise.


3.
Procura-se o anti-Temer

Com Lula afastado da disputa eleitoral, surge um imenso vácuo. Para ocupá-lo, será preciso denunciar radicalmente a agenda de 2016 e propor sua revogação. Quem se atreverá?

A grande praga das democracias de fachada que marcam o século XXI é o apagamento das diferenças. Em quase nenhum caso há disputa de projetos. Amparados pela mídia, os partidos de centro e direita sugerem agendas cada vez conservadoras e submissas aos mercados. Por temer o confronto, a velha esquerda iguala-se. Quem cresce são os outsiders de extrema-direita: Trump, o Brexit, Marine Le Pen, o filipino Rodrigo Duterte, a Alternativa para a Alemanha e tantos outros.

Há exceções – poucas porém notáveis. Na Espanha, em poucos anos, o partido-movimento Podemos desafiou o sistema político (a “casta”) e, ainda assim, obteve mais de 20% do apoio popular. No Chile, o mesmo ocorreu com a Frente Ampla. Por enquanto, o exemplo mais notável é o de Jeremy Corbyn, na Grã-Bretanha. Lançando-se desde uma posição marginal no acomodado Partido Trabalhista, aproveitou brechas democráticas na estrutura da organização, empolgou sua militância, aproximou-se da juventude e se tornou um fenômeno. Enfrenta a mídia de mercado, defendendo ideias hostilizadas por ela (os serviços públicos de excelência, mais impostos para os ricos, a reversão das privatizações). É provável que se converta no próximo primeiro-ministro do país. Algo semelhante seria possível no Brasil?

Há muitos sinais de que, com ou sem Lula, a resposta é sim. Nos dois anos em que pôde apresentar e defender sua candidatura – de março de 2016, quando foi coagido a depor e saiu-se com o discurso da jararaca viva, até agora –, o ex-presidente figurou como um fenômeno. A mídia o demonizou sem tréguas. Cada delação premiada de seus detratores, cada pronunciamento do juiz Sérgio Moro, convertia-se num factóide político, trombetado em múltiplos minutos nos jornais televisivos. Mas ao invés de despencar, como o pensamento tradicional esperaria, o apoio a Lula cresceu incessantemente. Chegou a 37%, nas últimas pesquisas de intenção de voto. Caso não fosse perseguido, tudo indica que se elegeria com folgas, talvez já no primeiro turno.

A força de Lula reside na empatia, na inteligência, em sua trajetória de resgate das maiorias, em seu carisma de plebeu capaz de sensibilizar os seus iguais. Algumas destas características são irreprodutíveis. Mas há um núcleo que transcende o indivíduo. Ele é composto pelo resgate do país e dos direitos.

O ex-presidente nunca quis transformar estas ideias em programa. Seu estilo, para o bem e para o mal, é sua personalidade. Porém agora, sabido que Lula não poderá se candidatar, será preciso procurar, para as mesmas propostas, outros caminhos – ligados menos a carismas, e mais a propostas.

Apresentar o anti-Temer – e principalmente o pós-Temer – parece um caminho politicamente mobilizador e eleitoralmente viável. Os índices ridículos de popularidade do presidente (4,8%) indicam algo. O país está farto de corte de direitos, das decisões sem consulta alguma à sociedade, do governo apoiado nas máfias parlamentares, da venda do patrimônio nacional, da humilhação.

Como construir, sem Lula, o contraponto a tudo isso – que ele representava pela própria evocação de seu governo e de sua trajetória pessoal? Será preciso furar o bloqueio da mídia, que fará tudo para demonizar propostas heterodoxas. Mas há uma trilha clara: ir muito além das “reformas fracas” que, segundo André Singer, o lulismo expressou. Compreender, como Jeremy Corbyn, que em tempos de ataque aos direitos sociais e de anulação da política, é preciso dizer não resolutamente; assumir a revolta popular conta a política sequestrada; politizar este movimento.

Passar da resistência às alternativas. Que Reforma Tributária, para manter e ampliar os direitos previdenciários, o SUS, uma Educação Pública de excelência? Que Reforma Política, para estabelecer mecanismos de democracia direta e participativa. Quais políticas para a Reforma Urbana, as cidades para todos, uma Segurança Pública cidadã, um novo modelo agrícola, uma política energética que valorize as fontes limpas que o país tem em abundância, o combate ao racismo e ao patriarcalismo?

Na construção de um novo projeto de transformações, há um mundo a desbravar – e ele vai muito além das eleições. Mas para construí-lo, talvez, seja necessária uma nova esquerda. É o que veremos na parte final de nossa análise.


4.
Parem de falar em “apatia popular”

Depois dos atos gigantescos por Marielle Franco, resistência à prisão de Lula volta a demonstrar que há multidões dispostas a agir. O que falta é quem ocupe o papel que os partidos abandonaram

O impasse dos projetos de emancipação que marcaram os séculos XIX e XX é um drama central de nossa época. Diante da miséria social e ambiental provoca pelo capitalismo, há intensa revolta. Mas faltam novos projetos, formas de organização e ação. Surte uma questão. As respostas do sistema à crise são cada vez mais destrutivas. Pense, por exemplo, na invasão das comunidades do Rio de Janeiro pelo exército, ou no desmonte dos sistemas públicos de Saúde e Educação, na Europa. No entanto, como não há uma alternativa real, as chances da própria reistências diminuem. Exaustas, as sociedades, enfim, submetem-se.

No Brasil, disseminou-se recentemente uma explicação oportinista para tal problema. Estaríamos vivendo uma “apatia social”. Confrontadas em seus direitos, as maiorias, por alguma razão nunca explicada, teriam deixado de lutar. Segundo esta hipótese, o fenômeno teria deixado a esquerda institucional sem opções.

Talvez valha a pena examinar uma hipótese oposta a esta. É mesmo possível falar em passividade? Isso não significa deconhecer, por exemplo, as lutas dos secundaristas, dos sem-teto, dos vários feminismos (inclusive o das mulheres periféricas e negras?). E se o problema estiver no polo oposto da equação? E se a explicação para a “falta de respostas” diante da ofensiva neoliberal estiver não no cansão das multidões, mas na demissão de suas supostas lideranças?

Considere dois fenômenos recentes. Embora tenha resultado em mobilização menos numerosa, a prisão infame de Lula gerou comoção nacional e internacional. Semanas antes, a execução de Marielle Franco levou centenas de milhares às ruas. É evidentemente impossível falar em “passividade”, diante de tais fatos.

Mas o que se propôs a estas multidões? Que tipo de ação autônoma ela puderam executar na sequência, de forma articulada? Nem os partidos de esquerda, nem as frentes Brasil Popular e Povo em Medo, ousaram oferecer uma resposta. A energia levada às ruas dispersou-se.

Sim: a emergência, entre outras, da consciência negra mobilizadora, dos novos feminismos, das lutas secundaristas – que também evidenciam o protagonismo das meninas – representa alvo muito novo e promissor: o ponto de partida principal. Mas como dar-lhe universalidade? Em outras palavras, como propor a uma secundarista em luta caminhos para transformar não apenas seu ambiente escolar, mas o mundo que levou à devastação do ensino público, em especial após a Emenda Constitucional 95?

A resposta não é fácil, e não está pronta – nem no Brasil, nem em lugar algum. Há muitas dúvidas. Ainda são possíveis os grandes projetos que enxergam o mundo em sua totalidade? Se não eles, o quê? A mera multiplicação dispersa das lutas particulares? Mas como, se as forças desumanizantes parecem cada vez mais poderosas, articuladas e implacáveis?

Estamos em busca de respostas. Para encontrá-las, será preciso generosidade, diálogo, desapego político. Algo, porém, parece claro: chega de falar em “apatia social”. Trata-se de uma resposta fácil e pobre. Transfere responsabilidades, mascara problemas, aplaca artificialmente certa angústia. Não conduz a nada. Quem quer de fato mudar o país e o mundo precisa assumir sua própria responsabilidade de enxergar o novo e encontrar as respostas que ainda não temos – em vez de sair à caça de respostas fáceis.


* Esta série de textos e vídeos reflete um debate interno, do qual participaram André Takahashi (Outras Palavras), Antonio Martins (OP), Cauê Ameni (Autonomia Literária), Gabriela Leite (OP), Lívia Ascava (Matrioshka) e Michelle Coelho (Rizoma Livros). Texto final: Antonio Martins | Vídeos: Gabriela Leite