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quinta-feira, 17 de maio de 2018

Alcochete

por estatuadesal

(Ferreira Fernandes, in Diário de Notícias, 16/05/2018)

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Quando as estações televisivas fazem longos diretos com os borra-botas em coluna fascista atravessando a cidade à ida e vinda de um jogo de futebol. Quando se mandam polícias pastorear borra-botas pela cidade. Quando os líderes dos clubes são boquirrotos.

Quando as capas de jornais desportivos privilegiam as palavras dos boquirrotos em vez do rasgo corrido de Gelson. Quando colunistas de jornais aceitam mostrar-se indigentes, já que o assunto é, julgam eles, só de camisola e emblema. Quando essa arte e ciência que encanta miúdos e velhos é comentada em prime time por tipos talvez de meia-idade e certamente com um terço de inteligência. Quando, com muito share, insultos recíprocos são trocados por gente paga, cara e cara separadas por um palmo mas nunca havendo um gesto honrado que desagrave os desaforos lançados nos perdigotos. Quando as assembleias gerais presididas por bombeiros incendiários têm mais destaque do que o ato luminoso do Perdigão, do Desportivo de Chaves, a cuidar de uma bola. Quando os talentosos Paulinho, do Braga, e o Rafa, do Portimonense, são menos conhecidos do que o Pedro Guerra e o Francisco J. Marques, cujas conversetas têm o dom de tornar a alma dos adeptos mais pequena. Quando se vandaliza em grupo uma estação de serviço e já nem se noticia porque o autocarro dos gatunos e brutos vai a caminho de um estádio... Então, quando tantos miseráveis quandos se acumulam, arriscamo-nos a ver um admirável, forte e grande Bas Dost ferido e com uma lágrima por nós todos.

UMA CHATICE, A HIPOCRISIA

por estatuadesal

(In Blog O Jumento, 17/05/2018)

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Aconteceu com o Sporting, mas poderia ter acontecido com qualquer clube, com qualquer instituição, o país ignora a hipocrisia, faz de conta que não vê, ignora os jornalistas que se converteram em pequenos Goebbels ao serviço de clubes, não repararam no espalhar do ódio. Agora assistimos a uma verdadeira vaga de hipocrisia.

Ninguém reparou nos posts no Facebook ou em newsletters a espumar de ódio? Ninguém reparou nos jornalistas que se converteram em assessores de imprensa para com a sua escrita serem mais eficazes nos incentivos ao ódio e para ajudarem dirigentes desportivos a melhor estimular o conflito junto dos seus adeptos.

Ninguém reparou no excessivo envolvimento dos partidos com os clubes de futebol talvez por já estarem esquecidos de quando Pedro Santana Lopes organizou um jantar de presidentes de clubes de futebol para apoiarem Durão Barroso na sua candidatura a primeiro-ministro. Já não bastam os jantares na Assembleia da República, onde os presidentes dos grandes clubes são tratados com as honras devidas a um Presidente da República. Há partidos mais implantados nos clubes do que no país e há mesmo um deputado do CDS que vai para a CMTV fazer de voz do nodo, referindo-se ao presidente de um clube desportivo como o “meu Presidente”.

Ninguém reparou que treinadores como Jorge Jesus com um estádio de Alvalade cheio em vez de levar os jogadores para o centro do terreno de onde se podem dirigira aos adeptos que estão em todas as bancadas, levam-nos quase de empurrão para junto das claques, fazer vénias aos mesmos que agora fizeram o que fizeram.

Ninguém reparou que a estratégia de um presidente de um clube em vez de ser ganhar o campeonato passou a ser a destruição do clube rival, com muitos dos seus adeptos mais esperançados em que o rival desça de divisão do que em ganhar os jogos. Não só ninguém reparou como parece que este ódio foi o cimento que uniu muita gente.

Quando elogiavam os dotes negociais de um presidente que discutia preços e condições até ao último minuto do prazo das transferências, não repararam que esta forma de negociar tinha como consequência transformar os jogadores em escravos do clube, retirando-lhes a esperança. Quando Carrilho saiu ninguém reparou de quem era a culpa, os que assobiaram Carrillo apoiam agora Rui Patrício, William de Carvalho ou o próprio Jorge Jesus no seu desejo de saírem facilmente para melhor negociarem o seu futuro.

Aquilo que aconteceu foi uma desgraça, mas uma desgraça bem mais pequena do que a que poderia ter acontecido se em vez de um par de tabefes encomendados e descontrolados, fosse um confronto aberto numa final da Taça. Há muito que a violência germina apoiada por especialistas e jornalistas contratados para promover o ódio e todos faziam de conta que não viam.

Alta-ajuda

Novo artigo em BLASFÉMIAS


por Sérgio Barreto Costa

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O desporto entrou numa espiral de violência e António Costa já se encontra a tratar do problema. Não do problema da violência, claro, mas do problema de ainda não ter conseguido arranjar bons empregos para todos os amigos do Partido Socialista. A generalidade dos gurus do pensamento positivo e da auto-ajuda destaca a importância de conseguirmos transformar os acontecimentos negativos em oportunidades, mas nunca ninguém conseguiu aplicar tão bem essa panaceia como o nosso primeiro-ministro. E é por isso que vamos poder contar, a breve prazo, com uma Alta Autoridade contra a Violência.

A ideia parece-me positiva, principalmente por se tratar de uma Alta Autoridade. Toda a gente sabe que os pequenotes têm dificuldades acrescidas quando se trata de pancadaria, pelo que uma Baixa Autoridade contra a Violência seria sempre de evitar. Por outro lado, no que se refere a empregos públicos bem remunerados, é também uma boa aposta. Não é impossível que, a médio prazo, os próprios elementos da Alta Autoridade contra a Violência se envolvam em zaragatas internas, e isso permitirá, desde logo, a criação de uma Alta Autoridade contra a Violência na Alta Autoridade contra a Violência.

PSD, Santa Casa e Montepio: uma história de hipocrisia carregada de simbolismo

Novo artigo em Aventar


por João Mendes

Fotografia via Rui Rio

Pela voz do titubeante Fernando Negrão, que há uns meses atrás era o bombo da corte do seu próprio partido, o Expresso refere que o PSD se terá manifestado "contra a entrada "simbólica". da Santa Casa no Montepio". Quando li este título, fiquei a pensar com os meus botões: querem ver que já anda tudo à bulha no PSD, outra vez? Querem ver que isto foi boca para António Tavares, um dos porta-vozes do governo sombra de Rui Rio, que acumula funções com a de provador da Santa Casa da Misericórdia do Porto, instituição que prepara uma entrada "simbólica" no Montepio, a cuja assembleia-geral António Tavares irá presidir?

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Encontro na Vasco da Gama, dezenas de tochas, pânico no balneário e esvaziar dos cacifos: o filme de terror na Academia

17 Maio 2018209

Bruno Roseiro

Foram 15 a 20 minutos mas vão perdurar muito mais tempo: 50 elementos entraram na Academia e criaram um cenário nunca antes visto. Relato do filme de terror que acabou com um pedido de desculpa.

O encontro à saída da Vasco da Gama e a entrada a correr

A cara dos jogadores e restantes elementos do staff do Sporting à saída do Posto Territorial da GNR do Montijo dizia muito, mas escondia ainda mais. A seguir ao bárbaro ataque sem precedentes no clube ou no futebol português, houve muitas chamadas de profissionais do futebol para familiares mais próximos, preocupados com as notícias que chegavam da Academia, mas toda essa consternação não ficou por aí. Também alguns pais e encarregados de educação ligaram com insistência para perceberem se os filhos estavam bem e não tinham sofrido nada, por não saberem ao certo o que se passara. Esta terça-feira, em Alcochete, aqueles 15/20 minutos prometem não mais serem apagadas da história dos leões. E esta é a descrição ao pormenor dos momentos de terror vividos.

O encontro à saída da Vasco da Gama e a entrada a correr

Os agressores terão começado a juntar-se na saída da ponte Vasco da Gama, sentido Lisboa-Alcochete. Daí, partiram em direção à Academia, num plano que se percebe agora ter sido tudo menos espontâneo: deixaram as viaturas ainda a alguma distância da entrada da Academia, taparam as caras e começaram a correr em direção à entrada do centro de estágios. Nas únicas imagens que existem, o grupo está ainda a chegar à última curva da reta que dá acesso ao local; a partir daí, depois de terem avisado os jornalistas que teriam de desligar todo o material sob pena de serem agredidos ou ficarem sem o mesmo (dois elementos terão ficado mais para trás para garantir que ninguém furava esse bloqueio, como aconteceu), seguiram em direção ao relvado onde a equipa principal costuma trabalhar, na ala profissional, que fica na ponta mais oposta à entrada do recinto.

Arthur Quezada

@ArthurQuezada

Imagens dos vândalos que invadiram agora pouco o CT do Sporting. Um absurdo!


Na altura, havia apenas o habitual segurança à porta da Academia (a cancela estava fechada, mas quem passa a pé consegue contornar a mesma sem problemas pelos dois lados porque a mesma é para viaturas) mas a GNR terá sido logo nesse momento chamada ao local. Ainda assim, segundo nos confidenciaram, ninguém acreditava que as coisas chegassem ao limite que chegaram. Ninguém mesmo. Não foi a primeira vez que um grupo de adeptos entrou no espaço, sendo que na última, por exemplo, tudo acabou bem e de forma cordial com a promessa de que a equipa daria tudo para alcançar os objetivos desportivos a que se tinham proposto e que os elementos das claques leoninas a reforçarem de novo o total apoio à equipa nesse sentido. Desta vez, foi tudo diferente. Muito diferente.

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A entrada de cara tapada e as dezenas de tochas

Primeiro pormenor: a cara tapada. Segundo pormenor: a marcha acelerada na zona depois do campo principal, junto aos relvados onde equipa B e juniores costumam trabalhar (e que foi captada num dos vídeos que surgiu nas redes sociais, feito provavelmente por alguém que não da ala profissional do futebol leonino). Terceiro pormenor: a entrada na rampa de acesso à zona do ginásio e dos balneários, depois de perceberem que era ali que estavam quase todos os elementos leoninos.

Esta terça-feira à noite, havia duas “teorias” muito faladas em alguns grupos de adeptos verde e brancos, em blogues ou nas redes sociais. Por um lado, a possibilidade de ter sido mais uma incursão para manifestar o desagrado com o terceiro lugar na Liga e o reforço da importância de vencer a Taça de Portugal, prova que encerra a temporada nacional, que perdeu os limites. Por outro, a hipótese de ser um grupo mais próximo do antigo líder da Juventude Leonina, Fernando Mendes, que não gostou da forma como os dois argentinos do plantel, Battaglia e Acuña, responderam e enfrentaram os contestatários na Madeira e na garagem de Alvalade, após a viagem de avião, e queria dirigir-se aos mesmos pedindo satisfações pela atitude. Falando com fontes próximas dos jogadores, elementos presentes na Academia naquele momento e outras pessoas que conhecem bem o Sporting por dentro, há muita estranheza pelas barras de ferro que os invasores traziam, por exemplo, mas admitem que possa ter havido esse descontrolo generalizado (o que em nada desculpabiliza o que se passou, claro está).

Ao contrário do que aparenta nas imagens recolhidas, o grupo que invadiu as instalações acabou por separar-se: uns foram para a zona do relvado, onde estariam ainda apenas Jorge Jesus e mais dois elementos da sua equipa; outros focaram as atenções na rampa que dá acesso aos balneários e também à zona onde os jogadores estacionam os carros, por detrás do edifício principal; outros subiram essa rampa, entraram pela porta, viraram à esquerda e dirigiram-se ao balneário da equipa. Ponto comum: todos acenderam e lançaram tochas, ou em direção do relvado, ou em direção ao carro dos jogadores (um dos crimes pelos quais estão indiciados é por isso o de incêndio florestal, tendo em conta também a mata que rodeia a Academia) ou no balneário. E foi isso que gerou o caos e o cenário de terror.

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As agressões com cintos, bastões e ao pontapé

Mal acederam a essa zona restrita do balneário, numa fase em que os elementos estavam dispersos entre ginásio, balneário e gabinete médico antes do início do treino (que deveria ter começado às 16 horas, mas tem sempre uma conversa prévia antes do relvado, que pode ser uma palestra maior ou mais curta), começaram as agressões. Com os cintos, tirados de forma rápida das calças. E com os bastões de ferro. A certa altura, sem qualquer escolha entre jogador A ou B, de forma aleatória e à medida que avançavam. Tudo porque o fumo que rapidamente começou a sair pelas janelas do balneário fazia com que a visibilidade fosse reduzida. Ouviram-se gritos de revolta. Multiplicaram-se os gritos de medo, até porque alguns nem percebiam o que se estava a passar e o alarme de incêndio entretanto disparou, o que adensou o cenário de terror montado.

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A cabeça de Bas Dost como exemplo, mas o pior foi Montero

As feridas na cabeça de Bas Dost, um dos primeiros a ser agredido pelos invasores, ficaram como uma espécie de imagem forte do bárbaro ataque que foi perpetrado; no entanto, o mais chocante foram os pontapés que o avançado levou, indefeso. Tudo terá começado no excesso de alguns elementos que iam à frente deste grupo e que acabou por alastrar-se a quase todos os que os acompanhavam. Acuña foi alvo de pontapés quando estava no chão; Battaglia e Misic, que acorreram logo para a zona dos confrontos, foram também agredidos com cintos, tal como Montero (um dos que terá ficado com marcas mais visíveis do que aconteceu) e William.

Mais à frente, numa área mais próxima dos gabinetes técnicos, Raul José, adjunto de Jorge Jesus (que levou também uma cabeçada), e Frederico Varandas, diretor do gabinete médico que terá saída em defesa de jogadores e treinadores, também foram agredidos. Mário Monteiro, preparador físico, viu uma tocha ser atirada na direção do peito.

João M. C. Gonçalves@JG1904

Nova decoração do balneário da academia do Sporting

18:13 - 15 de mai de 2018

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A fuga e o pedido de desculpa

Os agressores colocaram-se então em fuga, sendo que fizeram o mesmo trajeto a correr para regressarem à zona onde estavam os carros. Fernando Mendes, antigo líder da Juventude Leonina, e outro elemento mais velho da mesma claque, então de cara destapada, falaram com Jorge Jesus e chegaram mesmo a pedir desculpa por tudo o que tinha acontecido e que não era suposto – a ideia passaria apenas por “pressionar” os jogadores depois de terem falhado o objetivo da Champions, ficando no terceiro lugar do Campeonato, mas ficou tudo descontrolado. Ambos estavam no local mas ficaram sempre numa zona que não a dos confrontos.

De acordo com a Sábado, e numa informação entretanto confirmada pelo Observador, os principais líderes deste ataque acabaram por conseguir fugir, havendo por isso “apenas” 23 detidos num grupo que, como é facilmente percetível, era bem maior. A GNR, que chegou às 17h20 à Academia quando os agressores já tinham abandonado a zona, montou de imediato uma operação com barreiras nos acessos possíveis ao local. Foram intercetadas cinco viaturas, sendo que uma quase abalroou a barreira existente (daí estarem indiciados também por crime de atropelamento). Outro dos carros só foi parado após perseguição. Foram então feitas as 23 detenções (e apreendidos vários artefactos) para identificação e recolha de depoimentos.

Dado importante e que mostra bem o fumo que existia no balneário do Sporting por causa das tochas: o próprio cheiro da roupa serviu também para as autoridades perceberem quem tinha estado no interior do espaço.

Os 23 detidos foram indiciados por crimes de introdução em lugar vedado ao público, ameaça agravada, ofensa à integridade física qualificada, sequestro, dano com violência, detenção de arma proibida agravado, incêndio florestal, resistência, atropelamento e coação sobre funcionário e também de um crime de terrorismo.

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Jogadores de rastos e a limparem os cacifos

No balneário, ficou um rasto enorme de destruição mas muito mais do que isso. Alguns jogadores choraram, outros mostraram-se revoltados com o que tinha acabado de acontecer. O estado de Bas Dost, e sobretudo os ferimentos na cabeça que obrigaram a que levasse seis pontos, ocupou grande parte das atenções e serviu como exemplo para mostrar, cá para fora, a violência do ato que tinha acabado de acontecer.

Mais tarde, surgiu um vídeo do estado do espaço, revirado, ainda com o alarme de incêndio ativo, com uma nuvem de fumo que continuava na zona do teto e com sangue no chão;depois, mais uma fotografia das pernas de Dost, com sangue nas meias.

Houve reações à quente, com muitos jogadores a dizer que nunca mais entravam ali nem jogavam a final da Taça de Portugal. Bruno Fernandes apareceu a vestir-se, soltando um “Foi um prazer estar com vocês”. Todos de volta do telefone para acalmar as pessoas mais próximas, alguns com medo que a família pudesse também estar ameaçada.

Bas Dost passaria ainda pelo Hospital do Montijo, por causa dos seus ferimentos. No total, 36 elementos entre jogadores, treinadores e funcionários seriam depois ouvidos no Destacamento Territorial do Montijo, alguns a entrar e sair quase de madrugada porque foram indo por grupos para o local.

Muitos jogadores limparam os seus cacifos: jogando ou não a final da Taça de Portugal, partiam com a certeza que não voltariam a entrar na Academia esta temporada. Pelo menos. Nesta terça-feira, havia a convicção de que poderia ser uma despedida definitiva; agora, poderá ser só até à próxima época. Mas para este cenário acontecer há garantias das quais o grupo não abdica e que não parecem estar restritas apenas a um melhor plano de segurança para que nunca mais voltem a viver o que viveram, como se percebeu pela recusa em falar com Bruno de Carvalho quando o presidente leonino chegou ao local.