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quarta-feira, 30 de maio de 2018

PS e CDS trocam piadas nas redes sociais. Cristas assume-se líder da oposição

PS e CDS trocam piadas nas redes sociais. Cristas assume-se líder da oposição

30/5/2018, 13:07

Rato Mickey, fantasia, publicações apagadas e vitórias morais. Melo comparou o Congresso do PS ao mundo da Disney, o PS reagiu e agora Cristas reclama o lugar de líder da oposição.

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

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Mais uma sequela do filme de animação em que se transformou a relação entre democratas-cristãos e socialistas. Primeiro, foi Nuno Melo a sugerir que se sentia na Disneyland Paris em pleno Congresso do PS, tal o grau de “fantasia” que reinava por aquelas bandas. O PS não se ficou e respondeu na mesma moeda: se Melo se sentia na Disney, então umas virtuais orelhas de rato Mickey ficavam mesmo a matar. Esta quarta-feira, na resposta à resposta, Assunção Cristas decidiu reclamar a vitória moral e assumir-se como “líder da oposição”.

No Twitter, a líder do CDS partilhou a montagem feita pelos socialistas com a imagem de Nuno Melo e quis ver nessa reação o reconhecimento de que o PS a vê como principal challenger de António Costa. “Quando somos elevados ao humor pela mão dos nossos adversários consagramo-nos na liderança da oposição”, escreveu a democrata-cristã.

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Assunção Cristas@CristasAssuncao

Quando somos elevados ao humor pela mão dos nossos adversários consagramo-nos na liderança da oposição.

09:23 - 30 de mai de 2018

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Não fica claro se Cristas está mesmo convencida disso ou se está a dar continuidade a esta troca de piadas entre PS e CDS — os emojis que usa para complementar o tweet dão para tudo: um braço a simbolizar força, e uma cara a chorar a rir.

Na véspera, os socialistas tinham usado a conta oficial do partido no Twitter para reagir com humor à provocação de Nuno Melo. O PS publicou uma montagem em que enfeitava o vice-presidente do CDS com umas orelhas virtuais de rato Mickey, sem dispensar o chapéu de mágico e mais alguns elementos do filme de animação “Fantasia”, um dos mais emblemáticos da Disney.

A publicação seria depois apagada sem explicação formal. Ao Observador, João Galamba explicou que se “tratou de um erro” de alguém que queria partilhar aquele conteúdo na sua conta pessoal e confundiu as duas contas. “Quando me apercebi do erro, mandei apagar”, resume o deputado socialista. Mas o post já seguia imparável nos corredores virtuais. A troca de galhardetes começa no domingo, ainda em plena sessão de encerramento do 22º Congresso do PS. No domingo, o eurodeputado usou o Facebook para dizer que se sentia “no Congresso do PS, com a mesma sensação de quem visita o pavilhão da fantasia da Disney em Paris”.

O sentido de humor (ou a falta dele, dependendo das diferentes sensibilidades) não foi compreendido por todos. Tiago Barbosa Ribeiro, deputado do PS, reagiu de imediato à provocação de Nuno Melo: “É com dirigentes deste partido, convidados para nossa casa por respeito institucional e democrático, que alguns camaradas meus acham exequível fazer entendimentos para ‘reformas estruturais’. Boa sorte…”, escreveu o socialista.

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Tiago Barbosa Ribeiro

@tbribeiro

É com dirigentes deste partido, convidados para nossa casa por respeito institucional e democrático, que alguns camaradas meus acham exequível fazer entendimentos para “reformas estruturais”. Boa sorte...

15:25 - 27 de mai de 2018

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Nuno Melo acabaria por tentar acalmar os ânimos. Ao Observador, o eurodeputado explicou que a legenda por ele escrita correspondia a um comentário meramente metafórico. “Pobre de quem está em política e não consegue interpretar o que é óbvio”, sugeriu Melo. Resta saber se haverá um quarto filme.

Língua Portuguesa: a curiosa origem dos palavrões e das asneiras

Novo artigo em VortexMag


por VxMag

Apesar de muitas vezes serem considerados ofensivos, os palavrões fazem parte da linguagem do dia-a-dia da grande maioria das pessoas. São um “hábito”, uma “convenção que se aprende”, que dificilmente se consegue largar, como defende o psicólogo norte-americano Timothy Jay. Estão por todo o lado, e não há como lhes escapar. E a Língua Portuguesa não é excepção. Muitos são os palavrões e as asneiras no nosso vocabulário e é interessante perceber quando, como e porque razão é que estas palavras começaram a ser consideradas como impróprias, ou seja, como insultos, palavrões ou asneiras. A maioria dos palavrões existe há várias centenas de anos e está longe de ser uma invenção dos tempos modernos.

Melissa Mohr, especialista em literatura medieval e autora de Holy Sh*t: A Brief History of Swearing, defende que o hábito de dizer asneiras vem desde o tempo dos romanos. “Os romanos são importantes na história dos palavrões porque as asneiras que usavam eram baseadas nos tabus sexuais e de excreção, como acontece na maioria das línguas modernas”, explicou a autora. “Eram baseados no corpo humano e em acções. Mas, como tinham um esquema sexual muito diferente, alguns dos seus palavrões eram usados de maneiras diferentes.”

PutaPuta

Rafael Bluteau, no dicionário Vocabulario Portugues e Latino, editado em 1712, explica que puta chegou a ser “um vocábulo honestíssimo”, sinónimo de “moça puríssima e limpa”. Por corrupção, a palavra terá passado a significar prostituta, de modo a “encobrir a fealdade do vocábulo meretriz ou de outro igualmente feio”.

De acordo com o autor, a definição moderna de puta terá surgido através de uma corrupção da língua, um processo linguístico que consiste na mudança de significado de uma palavra. Originalmente, na base de puta, estaria a palavra putos, um adjectivo latino para puro ou brilhante. Uma outra hipótese, referida por outros autores, é a de que o palavrão se trata de uma derivação do verbo putere que, em latim, significa estar deteriorado ou cheirar mal.

Os antigos romanos tinham também por hábito chamar lobas às prostitutas. O termo terá dado origem à palavra lupanar, usada ainda hoje para descrever um bordel ou uma casa de prostituição. É por esta razão que, segundo Bluteau, alguns estudiosos defendiam que os gémeos Rómulo e Remo, personagens da mitologia romana, não foram criados por uma loba, mas sim por uma prostituta.

PorraPorra

Não se sabe ao certo de onde terá vindo a palavra porra. Na Origem da Lingua Portugueza, obra publicada no século XVII, o historiador Duarre Nunes de Leão refere que o termo é de origem árabe. Porém, a teoria mais consensual é a de que a palavra terá surgido em Espanha.

Segundo Rafael Bluteau, durante o reinado de D. Afonso V (1432-1418), terá chegado a Portugal uma família de nobres castelhanos de apelido Porra, cujo brasão apresentava cinco maças (armas) com cabos verdes sobre um campo dourado.

No Vocabulario Portuguez e Latino, Bluteau explica que a palavra porra é, nada mais nada menos, do que o diminutivo da palavra cachaporra, uma espécie de pão que é mais grosso numa ponta do que na outra. De acordo com a definição de Eduardo Nobre, no Dicionário de Calão, na gíria popular porra serve para descrever o órgão sexual masculino, podendo também significar pau ou bastão.

CaralhoCaralho

“A frequência de uso dos termos que designam os órgãos sexuais, tanto femininos como masculinos, é relativamente baixa. Palavras que designam o sexo são normalmente banidas da conversação entre gente educada”, escreveu Heinz Kröll em O Eufemismo e o Disfemismo no Português Moderno. Apesar disso, em português, parecem não faltar palavras para as descrever. Uma delas é caralho.

Apesar de não se saber ao certo de onde terá vindo a palavra caralho, pensa-se que terá tido origem no espanhol carajo, uma expressão que pode designar um pau ou uma parte específica de um navio — a vigia, o lugar mais elevado de uma embarcação. A palavra, “muitíssimo frequente na Península Ibérica”, pode ter “uma origem ainda anterior à romanização”, defende João Paulo Silvestre.

MerdaMerda

Apesar de ser muitas vezes associada ao francês merde, a palavra merda é muito mais antiga. No latim clássico, merda era sinónimo de esterco ou de excremento. De acordo com alguns autores, o palavrão será uma derivação da palavra Erda, uma localidade romana conhecida por ser muito suja.

Em português, a palavra é geralmente substituída por outras que rimam com ela, como nas expressões vá a Palmela! ou vá pr’á marela, salientou Heinz Kröll. Mais comum, porém, é a expressão vá pentear macacos!.

Foda-seFoda-se

A expressão foda-se não é recente. O Novo Dicionário de Calão de Afonso Praça, editado em 2001, cita a forma fosga-se, uma interjeição alternativa e menos grosseira para foda-se. Para Clotilde Almeida, isto significa que a palavra já existe há bastante tempo, pois até “já foram cunhadas formas alternativas da mesma que se encontram dicionarizadas”.

José Pedro Machado, no Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, uma das poucas obras dedicadas à etimologia portuguesa, refere que o verbo foder — do qual provém a palavra foda-se — vem do latim futere, que significa ter relações sexuais com uma mulher. Ainda de acordo com José Pedro Machado, o termo aparece em textos desde o século XII, não se sabendo ao certo quando terá sido cunhado.

“Trata-se de uma expressão de desagrado que é bem portuguesa”, explicou Clotilde Almeida. Através de um processo de redução e de supressão, a palavra foda-se passou a (fo)dasse, mantendo o sentido original. Foi também a partir de foda-se que surgiram as formas fosga-se, fosca-se ou fónix, que querem dizer exactamente a mesma coisa. Estas foram criadas para suavizar (e ocultar) o sentido original do palavrão.

Fonte: observador.pt

A eutanásia é uma escolha individual

Novo artigo em Aventar


 

por Autor Convidado

folha
[Helena Ferro de Gouveia]

A eutanásia não é um programa de eugenia social, não é a eliminação dos mais velhos, dos mais fracos, dos deficientes. A eutanásia é uma escolha individual, não da família ou dos médicos, é o direito a uma morte sem sofrimento.
Chama-se compaixão e está acima de todas as ideologias ou crenças religiosas.

A dignidade da pessoa humana passa por respeitar o sofrimento do Outro e por aceitar que este lhe queira por um ponto final, se não o consegue fazer sozinho pela sua condição clínica, que um acto de piedade ( não um acto médico ) não seja criminalizado. Pela vida sempre, pelo sofrimento que nenhum cuidado paliativo atenua nunca.
O meu pai morreu numa cama de hospital e nem a morfina nos dias finais lhe aliviava a dor. Nenhum ser humano merece morrer assim, sem paz.

Assembleia da Fantasia

Opinião

Miguel Guedes

Hoje às 00:16

Nuno Melo, ironicamente, imaginou-se no Pavilhão da Fantasia da Disney-Paris enquanto assistia ao Congresso do PS mas o jogo do faz-de-conta rapidamente migrou para a Assembleia da República-Lisboa. Por alucinação democrática, por cinco votos de consciência, continuaremos país a viver no reino da Fantasia, fingindo que nada existe, que a realidade não é o que é e que não acontece no dia-a-dia dos hospitais, que a vontade inabalável que resulta do sofrimento atroz é liberdade e escolha individual que não deve ser respeitada.

Para os deputados que chumbaram os quatro projectos de lei sobre a despenalização da eutanásia, sobra uma informação: a realidade impõe-se, os factos são mais pesados do que os grãos de areia que preferem espalhar no chão. Porque a vida compreende a morte, a liberdade de poder decidir é agora projecto adiado que não tem como não fazer caminho na próxima legislatura. Num país que tantas vezes prefere atrasar-se uma década quando legisla sobre a realidade (lembremos os casos da despenalização do aborto ou do consumo de drogas), trazer a questão para o debate político foi a maior vitória táctica de quem se bateu pela despenalização.

Com algumas excepções, o debate que antecedeu a votação foi elevado e digno. Assistimos, porém, à teoria do "alarme social" do inefável Abel Matos Santos que receava que as pessoas de idade pudessem entrar doentes num hospital dizendo, e cito, "eu não quero morrer, será que me vão eutanasiar?". Esta e outras formas espúrias de manipular a realidade, criando cinicamente a confusão sobre a possibilidade de um Estado-matador que espreita às portas da doença, são insultuosas e difíceis de classificar. Viver a vida em modo de voo é uma opção individual mas convém não enganar as pessoas em matéria de consciência. As palavras de Laurinda Alves, escritas em modo "observador", são tão graves e manipuladoras como alguns cartazes onde se lia "Por favor não matem os velhinhos" ou "Eutanásia? Não mates, cuida!". Este tipo de contra-informação faz parte da miséria humana mas, ainda assim, há limites. Agora espera-se, de todas as trincheiras, algum pudor e silêncio.

Sobram algumas notas, assistidas. Recusar debater uma questão porque não consta de um programa eleitoral é declinar o poder legislativo da Assembleia da República. Evitar mais um veto presidencial não é necessariamente fazer um favor a Marcelo. Criar obstáculos ao um debate porque o debate não foi até aí suficiente, é hipotecar uma boa decisão. Ao contrário dos seus camaradas espanhóis em 1998, os primeiros a apresentar um projecto de lei na Câmara dos Deputados para despenalizar a morte assistida, ver o PCP institucionalizar-se à Direita é doloroso.

O autor escreve segundo a antiga ortografia

MÚSICO E JURISTA

Votos dispersos, chumbos inesperados. A radiografia de uma derrota no Parlamento

29 Maio 2018186

Rita Tavares

Miguel Santos Carrapatoso

Rita Dinis

Pedro Benevides

Telefonemas de última hora, votos surpreendentes e uma boa dose de estratégia em algumas bancadas ditaram o chumbo da legalização da eutanásia. PS e PSD trocam acusações sobre calculismo político.

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O debate já leva quase três horas quando começa a tocar o telefone da deputada Isabel Moreira, sentada na primeira fila da bancada do PS. Do outro lado alguém lhe comunica que, ao contrário daquilo que se pensava apenas algumas horas antes, a legalização da eutanásia ia mesmo cair às mãos do PSD. Foi um volte-face de última hora — mas não foi propriamente um choque porque se sabia desde há vários dias que qualquer que fosse o resultado seria sempre por uma margem muito curta. A divisão foi grande e para o resultado final muito contribuiu, de facto, a dispersão de votos de alguns deputados sociais-democratas. Mas também houve algumas votações surpreendentes entre os socialistas. A eutanásia acabaria por ser chumbada por uma curta margem: apenas cinco votos.

À partida para esta votação, as contas estavam assim: a esquerda tinha 107 votos garantidos, contando com André Silva do PAN e excluindo o PCP e o socialista Ascenso Simões. Ou seja, precisava de mais nove votos de deputados do PSD para garantir a maioria parlamentar.

O dia até começou com boas notícias para os defensores da eutanásia: Rui Silva, um dos deputados laranja que votava contra as propostas que estavam em jogo, não ia estar presente no hemiciclo por se encontrar fora do país. Foi o único deputado a faltar à votação, por estar na China em trabalho político — e, para quem tinha passado os últimos dias a contar cabeças, sempre era menos um. Não valeu de muito.

Na bancada do PSD, que se sabia que ia funcionar nesta votação como o fiel da balança desde que o PCP anunciou o voto contra, havia a forte convicção de que pelo menos sete deputados sociais-democratas iam votar a favor da despenalização da eutanásia: Paula Teixeira da Cruz, Teresa Leal Coelho, Margarida Balseiro Lopes, Adão Silva, Pedro Pinto, Duarte Marques e Cristóvão Norte. Era com base nesta certeza que se faziam as últimas contas e se arriscava a previsão de uma aprovação à tangente.

Mas os deputados tinham um último twist na manga só revelado durante a votação, que acabou a condicionar o resultado final.

Pedro Pinto, tido como um defensor da legalização da eutanásia e um dos que entrava como certo nestas contas, tinha deixado um aviso momentos antes de começar a sessão: “Não dêem o meu voto como garantido”. Estava dado o sinal de que o guião não ia ser seguido à risca e o deputado absteve-se em todas as votações. Pedro Pinto era um dos deputados que não queriam ser responsáveis pela aprovação de uma matéria que dividia o parlamento em dois.

Tal como previsto, Duarte Marques votou a favor. Mas fê-lo apenas nos projetos de lei do Bloco e do PEV e absteve-se em relação aos restantes. Ao Observador, explicou porquê: “Sempre entendi que o do Bloco era o mais credível no processo; votei o dos Verdes porque é o mais equilibrado. Optei pela abstenção nos restantes porque estou de acordo com o princípio”. Já Cristóvão Norte votou a favor do projeto de lei do PAN, mas absteve-se nos restantes porque “é a favor do princípio da eutanásia, mas o PAN foi o único que admitiu esse cenário no programa eleitoral”, diz ao Observador, admitindo que os últimos dias foram de “reflexão intensa”.

À medida que os votos favoráveis dos sociais-democratas iam sendo anunciados, deputados e jornalistas faziam contas e reagiam com surpresa. Começava a perceber-se que o que era difícil à partida se estava a tornar quase impossível. Com uma votação tão renhida, todos os votos a favor tinham de estar alinhados em torno de pelo menos um dos projetos, e foi precisamente isso que não aconteceu. No final da votação, existia a firme convicção entre deputados socialistas de que estas diferentes votações foram concertadas entre alguns deputados do PSD que anunciaram o voto a favor para garantir que os diplomas, na verdade, não passariam.

Ao Observador, Isabel Moreira diz que esta “dispersão de votos” por parte de alguns deputados do PSD teve como objetivo “não fazer aprovar nenhum dos quatro projetos”. “Obviamente, foi estratégico”, acusa a deputada socialista, que tem dado a cara por alguns dos temas de consciência que têm sido debatidos no Parlamento, incluindo este. Isabel Moreira era, aliás, uma das deputadas que estava em constante contacto com alguns elementos da bancada do PSD, nas últimas horas, para tentar antecipar a votação desta tarde.

O mesmo sugeriu José Manuel Pureza, do Bloco de Esquerda: “Perante projetos tão idênticos, perante projetos tão próximos uns dos outros, é difícil de entender o que é que faz haver votos de um mesmo deputado de forma diferenciada. Mas isso são juízos pessoais, que cada um faz com toda a liberdade. A mim causa-me estranheza.”

O líder parlamentar do PSD, contudo, nega qualquer “estratégia” concertada no sentido de dispersar votos a favor para o projeto do PS não ser aprovado. “Não houve nenhuma estratégia nem pressão, houve vontade, consciência e liberdade”, disse, acrescentando que não falou individualmente com nenhum deputado.  “Não houve pedagogia nenhuma”, sublinhou ainda em declarações aos jornalistas no Parlamento, no final da votação.

A questão, contudo, é mais política do que parece. O líder do PSD, Rui Rio, é um convicto defensor da eutanásia, tendo inclusive dado um contributo no livro de João Semedo Morrer com Dignidade – a decisão de cada um, onde defendia o “direito à dignidade na vida e na morte”. Ao que o Observador apurou junto de fonte social-democrata, a ideia de a legalização da eutanásia ser aprovada não era vista como boa notícia para o PSD de Rui Rio. “Já viu o que era se fosse aprovado e passássemos meses a discutir na especialidade com o PSD completamente partido ao meio?”, atira um deputado social-democrata, concluindo que, mesmo sendo Rio a favor, “isto foi o melhor que lhe aconteceu”.

Oficialmente, no PSD, as divergências entre o líder do partido e o líder parlamentar são sinal de “lição democrática”. “Rui Rio deu uma lição de democracia no sentido de dar liberdade de voto a todos os deputados, mesmo sabendo que maioritariamente os votos seriam diferentes da opinião dele. Foi uma lição de tolerância, importante para a democracia em Portugal”, disse Fernando Negrão aos jornalistas.

Uma surpresa chamada Miranda Calha

Mas a questão também não estava serena no PS, ainda que as indicações que a direção parlamentar tinha até perto da hora da votação fossem no sentido de apenas haver um voto contra, o de Ascenso Simões, e da eventualidade de uma abstenção. Afinal, foram dois os deputados socialistas que votaram contra todos os projetos que pediam a legalização da eutanásia. Além de Ascenso, também Miranda Calha se levantou para votar contra todos os projetos. Ouviu-se outra vez um ligeiro burburinho na sala neste momento da votação. Era a viragem, estava consumada a derrota.

Além destes dois socialistas, outros seis também desalinharam do guião da maioria da sua bancada. Fernando Jesus votou a favor dos projetos do PS, Bloco e Verdes e absteve-se na iniciativa legislativa do PAN. Joaquim Barreto também votou a favor do PS, e absteve-se nos restantes, tal como Lara Martinho e Pedro do Carmo. João Paulo Correia, vice da bancada socialista, aprovou os projetos do PS e do Bloco, e absteve-se no dos Verdes e do PAN. Por fim, Renato Sampaio, já quase no fim da votação, acrescentou mais uma barreira aos outros projetos da esquerda, ao votar a favor apenas dos projetos do PS e dos Verdes, abstendo-se nos restantes. Também esta dispersão acabou por baixar o número de votos favoráveis aos projetos de PAN, Verdes e Bloco e acabou por impedir que estas iniciativas ombreassem com o projeto do PS.

No final, Maria Antónia Almeida Santos, a socialista que deu a cara ao lado de Isabel Moreira pela iniciativa legislativa do PS, assumiu “alguma mágoa” perante o resultado da votação. O que faltou, disse aos jornalistas à saída do debate, “foram votos mesmo”.

CDS e PCP: as confirmações

Como esperado, as posições de princípio de democratas-cristãos e comunistas confirmaram-se esta quarta-feira: CDS e PCP votaram em bloco contra a despenalização da eutanásia.

Durante o debate, coube a Isabel Galriça Neto explicar que o CDS era contra a eutanásia por considerar que não há vidas que “vale a penas serem vividas e outras não”. Além disso, os democratas-cristãos consideravam que este era um primeiro passo num caminho que levaria, necessariamente, à “banalização da morte” e a uma “cultura de morte assistida”.

Já António Filipe, deputado do PCP, subiu ao palanque para explicar que os comunistas não acreditam que o Estado deva oferecer como solução a morte. “O dever indeclinável do Estado é mobilizar os avanços técnicos e científicos para assegurar o aumento da esperança de vida e não para a encurtar”, afirmou o deputado, antes de insistir num argumento já antes utilizado por Galriça Neto: “A rampa deslizante é um facto indesmentível”.

Em resposta, o Bloco de Esquerda atacou de forma violenta nas duas frentes, o CDS (Pedro Filipe Soares, líder parlamentar do partido, chegou a dizer que “o CDS achincalhou o debate”) e o PCP. Numa provocação aos comunistas, Mariana Mortágua chegou a dizer respeitar as posições de Cavaco Silva, Assunção Cristas, Isilda Pegado e… António Filipe, colando os comunistas ao espetro político diametralmente oposto ao do PCP. Com o tempo regimental esgotado, António Filipe ainda pediu ao Bloco que cedesse 30 segundos para responder à bancada do Bloco. “Nós pensamos pela nossa cabeça e não tomamos as nossas posições por oposição seja a quem for”, devolveu o comunista. Um duelo singular que não passou despercebido a ninguém.

No final da votação, com o chumbo da eutanásia, a bancada do CDS levantou-se imediatamente para aplaudir. Mas nem todos seguiram o gesto dos democratas-cristãos, mesmo os que votaram contra os quatros diplomas. A hesitação era evidente. À saída, e apesar da satisfação dos que sempre se opuseram à despenalização da eutanásia, os partidários do “sim” iam garantido que este foi apenas o primeiro teste. O assunto voltará, no futuro, ao Parlamento.