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quarta-feira, 13 de junho de 2018

UM PRIMEIRO-MINISTRO COM SORTE

por estatuadesal

(In Blog O Jumento, 12/06/2018)

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Há quem diga, com alguma ou mesmo muita razão, que António Costa poderá ter nascido com o rabinho virado para a lua, já que tudo parece correr-lhe bem. Na verdade, talvez não seja assim: em três anos de governo o país já enfrentou duas desgraças naturais, os incêndios e a seca extrema, não esquecendo a situação que financeira que o país atravessa.

Mas, que mais poderia desejar um primeiro-ministro do que ver o país a discutir de forma tão animada se o Bruno sai ou não, se o Marta Soares é o futuro do Sporting ou qual o próximo jogador a mandar uma carta de amor ao presidente do Conselho Diretivo do clube?

Desde que o Bruno de Carvalho escreveu no Facebook, a partir de Madrid, que se antecipou a Silly Season, até é pouco provável que alguém vá aos comícios da rentrée, já que em finais de agosto o tema que preocupará o país será saber com que equipa vai jogar o SCP na Liga.

Já ninguém se lembra de que 2019 será um ano de muitas eleições; a dúvida não será saber se a Ana Gomes continua como deputada Europeia ou se vai partir a loiça em Lisboa, se o Assis continuará a representar a maioria dos eleitores do PS ou se o Costa terá a maioria absoluta. O grande problema de 2019 será o SCP.

Por esta altura, no ano passado, o país chorava os mortos de Pedrógão, Passos Coelho inventava mais mortos por suicídio segredados pelo senhor da Santa Casa local. Há um ano discutia-se incêndios, o assalto a Tancos e receavam-se mais incêndios por causa da seca extrema. Este ano chove em junho, as barragens estão cheias, Tancos tem trancas à porta e nada sucede que anime a oposição.

O pobre do Rui Rio quase desapareceu e se alguém perguntar como se chama o novo secretário-geral do PSD ninguém se lembra do seu nome. Pelo meio temos as intervenções do Negrão que, como se sabe, são de tão grande nível intelectual que ninguém as entende.

O Verão quente, que muitos desejaram, acabou por ser bem diferente daquilo que seria o resultado das rezas da oposição. Temos um verão quente em Alvalade mas, como já não existe Copcon, ou o MP prende alguém ou teremos de esperar pelos tribunais, o que significa que este verão quente veio para ficar.

Entretanto parece que o nosso verão é tão bom que até o inverno veio cá passar férias. Que mais poderia desejar António Costa? E por falar em Verão, será que a Assunção Cristas já foi de férias? Tal como o deputado Helder Amaral, até parece que desapareceu.

Uma besta é uma besta

Novo artigo em Aventar


por j. manuel cordeiro

Para justificar as novas tarifas alfandegárias para produtos canadianos, Trump precisava de alegar que a importação de aço e alumínio era uma ameaça para a segurança. E como a justificou ele?

«Trump asked, according to CNN: “Didn’t you guys burn down the White House?”»

Só dois detalhes. Foram tropas britânicas e foi em 1814.

"The White House was burned by British troops in 1814 as part of a failed invasion of the mid-Atlantic, more than 50 years before the signing of Canada’s confederation paved the way for the founding of modern-day Canada."

No entanto, a verdade para Trump e seus correlegionários não deve estragar uma boa história. Fica aqui esta nota também para os deslumbrados portugueses que por aí vão debitando coisas.

[imagem]

Pela piscina morre o Pablo

por estatuadesal

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 13/06/2018)

Daniel

Daniel Oliveira

(A direita sempre usou o cliché da "coerência" como exigência à esquerda para combater a própria esquerda. Só que o conceito de "coerência" que a direita usa não passa de uma mistificação que, muita gente de esquerda - numa espécie de estado de má consciência religiosa -, aceitou durante décadas: para se ser de esquerda, teria que se ser pelintra. Nada mais falso, perverso e tortuoso. Aceitar tal conceito de "coerência" seria reduzir a capacidade de oposição à própria direita e, de certa forma, legitimar a desigualdade e o estatuto predestinado dos "bem nascidos" que precisamente se pretende combater.

Comentário da Estátua, 13/06/2018)


Apesar de termos tido a nossa minipolémica doméstica em torno da casa da mulher de António Costa, ela não tem a clareza nem atingiu a dimensão da casa de Pablo Iglesias, o líder carismático do Podemos. A história conta-se depressa. O líder do Podemos comprou, com a sua companheira e porta-voz do grupo parlamentar, Irene Montero, uma casa de 600 mil euros com piscina. E acabou, vexado por todos, por ter de fazer um referendo interno à sua liderança – que venceu, numa participação recorde de 190 mil inscritos, com 68% dos votos.

Qualquer pessoa de esquerda com visibilidade sabe o que é o controlo social que a direita tenta impor sobre o dinheiro que tem e como o usa. Eu, que sou ninguém, já ouvi bocas por ter iPad, viver no centro de Lisboa, usar uma camisa de marca. Por tudo e um par de botas. E não é seguramente por apontar pecados semelhantes aos outros. Isto nasce de um equívoco: que a esquerda, pelo menos a que não defende o igualitarismo absoluto, é contra o bem-estar. Pelo contrário, a esquerda é pelo bem-estar. O Die Linke (partido de esquerda alemão) tem um pin onde explica isso mesmo: “Luxo para todos!”. Claro que frase faz uma provocação com um absurdo. Se for para todos não é luxo. Mas pretende passar a ideia certa: de que a esquerda defende a distribuição da riqueza, não da pobreza. Quem gosta de pobreza são alguns cristãos, que acham que ela dignifica.

O que a esquerda combate é a desigualdade. E porque, ao contrário de alguma direita, não acredita que a justiça social deva resultar do altruísmo dos privilegiados – através da caridade ou da filantropia de milionários generosos –, defende que cabe ao Estado distribuir a riqueza, o poder e as oportunidades, através de impostos, serviços sociais, escola pública, sistema de reformas, leis laborais, salário mínimo nacional e por aí adiante. A promoção da igualdade é uma função do Estado. Nunca resultará, para a esquerda, da bondade de cada um. Nisso acredita a direita conservadora.

A imagem de José Mujica, o austero e feliz antigo Presidente do Uruguai, é inspiradora. Porque o despojamento é, num homem com as suas responsabilidades, sinal de uma enorme liberdade. E porque significa que, num continente onde isso é tão raro, saiu da política com aquilo com que entrou. Se tivesse entrado com muito e saído com o mesmo o valor ético era igual, só a inspiração seria menor. Não usar o poder político para enriquecer é um dever igual para um político de esquerda ou de direita – e não é seguro que seja o caso de Pablo Iglesias. Viver na pobreza não é um dever de ninguém. A não ser, talvez, dos franciscanos.

Assumamos então, de uma vez por todas e para acabar com a conversa primária sobre a "esquerda caviar", que nada há de errado em alguém de esquerda ter dinheiro, desde que pague os seus impostos, não explore ninguém e não tenha, na sua vida cívica e profissional, qualquer atividade que condene aos outros. Mesmo a muitos gestores de empresas, a única crítica que se faz é serem os próprios a definirem os seus salários milionários e a determinarem uma aviltante desigualdade salarial nas suas empresas. Aí, a responsabilidade é mesmo deles. Mas não é na casa de cada um, no carro de cada um, na roupa de cada um que o debate político que interessa se faz. Quem, na política, escolhe esse caminho é porque nada tem a dizer de fundamental aos cidadãos.

E esse é o problema de Pablo Iglesias. Quando Luis de Guindos comprou uma casa, curiosamente do mesmo preço, ele não resistiu a fazer a sua demagogia e escreveu no Twitter: “Entregaria a política económica do país a quem gasta 600.000 num apartamento de luxo?” Tinha tanto por onde pegar, até do ponto de vista ético. Perante um homem que vive da promiscuidade entre o serviço público e os interesses privados e que, como político, impôs aos cidadãos a fatura que resultou de uma crise financeira provocada, entre outros, pela Lehman Brothers (onde foi responsável para Europa e diretor para Espanha e Portugal até ao colapso), uma casa de 600 mil euros é o menor dos seus pecados.

Em 2015, enquanto corria com uma jornalista no parque do bairro operário de Vallecas, em Madrid, Pablo Iglesias dizia, sobre os políticos: “Acho perigoso que se isolem... Não sabem o que acontece lá fora. Um político que mora em Somosaguas [zona residencial de luxo, nos arredores de Madrid, com o preço médio mais alto de Espanha], que mora em chalés, que não sabem o que é pegar transporte público..." Quem escolhe a demagogia fácil no lugar da proposta política merece ver-se ao espelho. E o ter organizado um referendo interno por causa de um assunto da sua vida pessoal, apenas piora tudo: não é repetindo a demagogia para corrigir a demagogia que resolve a contradição que a demagogia acaba sempre por tornar inevitável.

A Coreia é a sua praia

Opinião

Miguel Guedes

Hoje às 00:07

A realização da cimeira em Singapura foi a verdadeira cedência de Donald Trump a Kim Jong-un. Foram-se avolumando, nas últimas semanas, sinais de que o presidente norte-americano não estaria pelos ajustes do encontro. Percebe-se agora a relevância e seriedade do plano de fuga: não há nada acordado neste acordo. Brindemos, então, à teoria do copo meio cheio ou meio vazio. Pessimistas dirão que todos os passos foram dados para o lado e a caminho de uma fotografia; optimistas dirão que foi o primeiro de muitos passos em frente com a meta à vista. Tudo em família, ambos tinham a ganhar. Trump ergue-se como o homem da paz e Kim como o homem do seu regime. Mútuo e historicamente legitimados e sem tiros, certificados a papel de boneco.

"Fogo e Fúria", fanfarrona prequela de guerra, "homem-foguete" ou o "velho demente". As palavras foram engolidas pelo tempo em nome de princípios gerais. No princípio era o verbo, a guerra foi de palavras. Depois de quase 70 anos de confrontos políticos após a Guerra da Coreia e 25 anos de tensão decorrentes do programa nuclear de Pyongyang, os líderes comprometem-se em quatro pontos: estabelecer novas relações bilaterais, combinar esforços para a paz nas Coreias, trabalhar para a desnuclearização da Península (nunca se referem à "desnuclearização completa e irreversível", adoptando-se a versão vazia de compromissos anteriores) e o repatriamento de prisioneiros de guerra ou desaparecidos em combate. Acordo de quatro pontos para o futuro em que o único ponto com nó diz respeito aos restos mortais de militares americanos a identificar desde o fim da Guerra da Coreia de 1950-53.

Pese embora o fascínio pelas praias da Coreia do Norte (numa "perspectiva imobiliária" podia ter "os melhores hotéis do Mundo" em vez de mísseis, disse), é difícil perceber como Trump não se acanha na legitimação do regime de Kim Jong-un com a moda do presidente dos afectos (Kim "ama o seu povo", o que "não me surpreende", referiu). Esta brusca compreensão por um regime que tortura, assassina e mantém cativos dezenas de milhares de presos políticos, com taxas de 30% de subnutrição em crianças com menos de 5 anos, está longe de significar que tenha sido subitamente assolado pelo respeito democrático pela autodeterminação dos povos. Jogo de espelhos. O proteccionismo económico de Trump podia ser assinado de cruz pelo regime de Pyongyang e vice-versa. Até pode dar certo. É enorme a possibilidade de duas personalidades autocráticas se respeitarem e admirarem por períodos tácticos de felicidade conjunta.

MÚSICO E JURISTA
O autor escreve segundo a antiga ortografia

A cimeira Trump-Kim

Novo artigo em Aventar


por j. manuel cordeiro

"Veja só sr. polícia, o marujo que eu empurrei borda fora sabe nadar e não se afogou. E até chamei a guarda costeira para o recolher. Salvei-o, é o que é."

Esta rábula ilustra o que aconteceu entre Trump e o Kim. Ambos se entretiveram a quase iniciar uma guerra nuclear e agora encontraram-se para voltar ao ponto de partida em que estavam quando começaram a medir o tamanho das respectivas pilas.

A comunicação social, talvez por suspirar de alívio, confunde voltar à estaca zero com progresso. Não lhes ficava mal recordar os leitores que este tipo de tratado não foi o primeiro que os EUA estabeleceram com a Coreia do Norte e não será, seguramente, o último deles a dar em nada.

Fica a seguir uma selecção, em nada exaustiva, para ilustrar um ponto simples: este tratado de 2018 vale zero. Serviu, isso sim, para dois líderes melhorarem a péssima imagem resultante dos seus próprios actos.

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