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sábado, 23 de junho de 2018

Trump declara que Coreia do Norte ainda é uma “ameaça extraordinária” para os EUA

23/6/2018, 0:38

Numa ordem executiva, o Presidente norte-americano prorrogou por um ano a chamada "emergência nacional" em relação à Coreia do Norte, voltando a autorizar as restrições económicas.


JIM LO SCALZO/EPA

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  • Agência Lusa
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O Presidente Donald Trump declarou esta sexta-feira que a Coreia do Norte ainda representa uma “ameaça extraordinária” para os Estados Unidos.

Numa ordem executiva, o Presidente norte-americano prorrogou por um ano a chamada “emergência nacional” em relação àquela nação com armas nucleares, voltando a autorizar as restrições económicas. Embora esperada, a declaração surge nove dias depois de Donald Trump ter escrito na rede social Twitter que “não há mais ameaça nuclear da Coreia do Norte, depois do encontro com o líder norte-coreano Kim Jong-un, em Singapura.

A ordem refere que a “existência e o risco de proliferação de material físsil utilizável em armas” e as ações e políticas do governo norte-coreano “continuam a representar uma ameaça incomum e extraordinária à segurança nacional, à política externa e à economia dos Estados Unidos”.

A emergência nacional está em vigor desde 2008 e é um sinal das contínuas tensões entre os Estados Unidos e a Coreia do Norte, que se intensificaram no ano passado, quando o Norte procurou aperfeiçoar um míssil com ponta nuclear que poderia atingir solo americano, mas na cimeira o líder norte-coreano concordou com a “desnuclearização completa” da península coreana. Os dois lados, no entanto, ainda precisam de negociar os termos sob os quais a Coreia do Norte abandonaria as suas armas nucleares e ganharia alívio nas sanções.

Trump afirmou que a desnuclearização já tinha começado, embora o seu secretário de Defesa James Mattis tenha dito que não sabia se a Coreia do Norte tinha dado passos para a desnuclearização e que as negociações detalhadas ainda não tinham começado.

Medo continua na província que ainda cheira a queimado em Moçambique

MOÇAMBIQUE

Medo continua na província que ainda cheira a queimado em Moçambique

HÁ 2 MINUTOS

Os nervos continuam à flor da pele na província de Cabo Delgado depois de os mais recentes ataques a aldeias remotas terem matado 35 a 40 habitantes desde o último domingo de maio.

ANTÓNIO SILVA/LUSA

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  • Agência Lusa
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Os nervos continuam à flor da pele na província de Cabo Delgado depois de os mais recentes ataques a aldeias remotas terem matado 35 a 40 habitantes desde o último domingo de maio.

Os sócios de um supermercado em Pemba, capital provincial, são suspeitos de ter simulado um assalto no dia 13 de junho para encobrir um desvio de verbas, numa encenação que envolveu disparos para caixotes vazios, onde estariam os supostos bandidos — mas onde afinal não havia ninguém.

A polícia, no local, anunciou que se tratava de um falso alarme, mas ainda hoje se podem consultar textos em portais na Internet, falando de um ataque com dois mortos, entre reféns.

No dia, o susto levou outras instituições da cidade a fechar portas temporariamente, alimentando rumores de que o alegado grupo que tem aterrorizado aldeias isoladas mais a norte tinha chegado a Pemba.

“Houve gente que me disse ter ouvido rajadas de metralhadora”, que nunca aconteceram, disse à Lusa uma empresária portuguesa em Cabo Delgado que nessa manhã pegou no telefone para procurar obter informações.

A desinformação, refere, ilustra o nervosismo.

Um dos últimos ataques que se suspeita ser da autoria de grupos escondidos no mato aconteceu em Natugo, distrito de Macomia, aldeia junto à qual um homem foi encontrado morto, com golpes de catana.

Dias antes, no mesmo distrito, aconteceu um dos mais destrutivos atos da vaga de violência, um ataque que provocou sete mortos e arrasou parte de uma aldeia, Naunde, com 164 casas tradicionais (em blocos de barro, estacas e capim) incendiadas, deixando 760 pessoas desalojadas.

“Ladrão, ladrão”, foram os primeiros gritos que irromperam na noite, pelas 23:00 de 04 de junho, recorda Mariana Abedi, 62 anos, chefe da localidade de Naunde.

Dois homens acudiram à chamada, mas começaram a ser atacados com catanas e ouviu-se um novo grito de alguém que assistia a tudo: “Guerra. A guerra já entrou”.

Os outros habitantes acordaram, saíram de casa com “azagaias [lanças] e catanas”, prontos a agir, recorda Maurício Miranda, primeiro secretário da povoação, mas os agressores “dispararam armas de fogo” e os que tentavam defender Naunde ficaram “descontrolados”.

As habitações foram saqueadas e depois incendiadas num cenário de confusão em que “não se via nada, ainda não havia lua”, refere Mariana, que retém a imagem de caos com “crianças a correr, sem os pais”.

Sete pessoas foram assassinadas: três decapitadas, uma degolada e outras três golpeadas com catanas até caírem ao chão.

Os cinco carros que ligavam a Mucojo, povoação mais próxima, e a Macomia, sede de distrito, foram incendiados.

A parte central de Naunde é hoje um tapete de uma ponta à outra da aldeia, de pedras e barro cinzento, estilhaçado, misturado com cinzas de colmo e estacas de madeira, chão que ainda cheira a queimado.

Moradores cozinham, trabalham no meio dos destroços, dormem ao relento, observam a destruição que os rodeia com a mesma incapacidade da noite em tiveram de esperar que as chamas parassem, porque não tinham como as apagar e o vento soprava forte, conta Mariana.

Questionada sobre a origem do mal, a chefe da localidade refere que os autores “são filhos que conhecem Naunde”.

“São pessoas como nós”, porque ninguém entra como eles entraram “sem conhecer a casa”, acrescenta.

“Nunca suspeitámos que viviam aqui, nunca houve nada” que suscitasse desconfiança.

Capulanas, comida e materiais de construção são doações que vão chegando, ao mesmo tempo que regressam os moradores deslocados pelo medo.

Um medo crescente porque, dois dias depois, a 06 de junho, ardeu Namaluco, alguns quilómetros a sul, com 200 habitações destruídas – e mesmo que tudo se reconstrua foi semeado um sentimento de insegurança que chega à sede de distrito, Macomia, a mais de 50 quilómetros por estradas acidentadas em terra batida.

Pelos caminhos percorridos, a Lusa encontra militares estacionados em três locais, com armas de fogo e viaturas e sem adiantarem pormenores – apesar das tentativas, outros contactos com as autoridades não tiveram resultado.

Shebane Shea, jovem que enche garrafinhas de plástico com óleo alimentar para venda no mercado, no centro da vila de Macomia, passa noites em claro.

“Cheguei a dormir no mato, numa noite em que corriam rumores aqui no mercado que ia haver um ataque” à vila, conta à Lusa, ao explicar que é preferível estar ao relento para não ser apanhado em casa, que alguém podem incendiar.

Jacinta Medi também dorme fora de casa e já nem a roupa tira, adormece tal como está trajada ali no mercado, de túnica e lenço à cabeça – e o marido segue-lhe o exemplo.

“Não há tempo para namorar com esses ataques”, conta.

Suleimane Namanca, agricultor, queria armas para combater “essa Al-Shabaab, mas o governo não as dá”, lamenta, acreditando que só com uma debaixo da almofada voltaria a dormir bem.

Anastácia Jerónimo é natural de Nampula, capital provincial a cerca de 500 quilómetros para sul e faz negócio no mercado de Macomia com o marido, tanzaniano.

“A minha mãe sempre chora”, conta Anastácia, mãe que não quer ver a filha rumar àquelas terras a norte.

Sinan Jamal passou a abrir a banca de fritos mais tarde.

Chegava a fazer negócio a partir das 05:00, mas agora abre só depois das 07:00.

Sabe que a polícia anda pelas ruas durante a noite a proteger a população, mas confessa ter sono leve: “Os meus ouvidos estão sempre lá fora, à escuta”.

Trump ameaça impor taxa extraordinária de vinte por cento sobre carros europeus

HÁ 32 MINUTOS

Donald Trump ameaçou impor um imposto alfandegário extraordinário de vinte por cento sobre carros europeus se a União Europeia não levantar as taxas alfandegárias adicionais.

CRAIG LASSIG/EPA

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  • Agência Lusa
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Donald Trump ameaçou este sábado impor um imposto alfandegário extraordinário de vinte por cento sobre carros europeus se a União Europeia não levantar as taxas alfandegárias adicionais que recaem sobre algumas dezenas de produtos norte-americanos.

“Se as tarifas e as barreiras comerciais colocadas aos EUA e às suas grandes empresas e trabalhadores pela União Europeia (…) não forem logo quebradas e removidas, estaremos colocando uma taxa de 20 por cento em todos os seus carros nos EUA”, avisou o presidente norte-americano ao início da noite, através da sua conta no Twitter.

A eventual imposição pelos americanos de tarifas comerciais sobre automóveis europeus representa uma ameaça considerável, sobretudo para os construtores alemães de viaturas de luxo.

Já no passado Trump havia ameaçado com estas tarifas tendo contudo recuado. Mas, desta vez, Trump deixa até um conselho aos construtores europeus: “Construam-nos [os carros] aqui! [na América].

Em maio, o presidente norte-americano, já tinha avisado, também através do Twitter, que estava a considerar a imposição de tarifas de 25 por cento sobre automóveis estrangeiros.

O presidente norte-americano tornou público nessa altura que pediu ao Departamento de Comércio uma investigação sobre o que classificou como “uma ameaça” representada pelos automóveis importados, veículos pesados e peças.

Trump anunciou ainda na rede social Twitter que em breve teria boas notícias para os construtores norte-americanos após décadas de fraco crescimento.

A lobotomia nasceu aqui

CRÓNICA

Alberto GonçalvesSeguir

22/6/2018, 23:22406

Quando não estão a pagar impostos ou a ver a CMTV, as vítimas vão tirar “selfies” com os carrascos e prometem-lhes devoção e votos. Os portugueses apreciam ser humilhados ou não percebem o que são?

Conhecem aquela em que um marroquino, um brasileiro e um português aparecem na “flash interview” a comentar um jogo da bola? O português é Presidente da República. O maior problema desta anedota não é não ter graça: é ser verdadeira. Durante uma viagem ao “Mundial” da Rússia paga pelos contribuintes, e com os logotipos dos patrocinadores da coisa em fundo, o prof. Marcelo teceu considerações sobre os adversários, o “sistema de jogo”, a “atitude” e, suponho, a “transição”. A rematar (piadinha), anunciou que na próxima partida o primeiro-ministro estará presente. O prof. Marcelo voltará a Moscovo – “em princípio” – nos “oitavos de final”. Entretanto, naturalmente, subirá ao palco do Rock in Rio com os Xutos e Pontapés. Depois, por fim, rumará para merecidas férias em Pedrógão, de modo a evitar incêndios e curar a desertificação rural.

Não sei que diga. Literalmente, é difícil dizer o que quer que seja, já que isto começa a entrar em territórios nos quais as palavras perdem serventia. O prof. Marcelo é apenas um exemplo, piorado pela circunstância de desempenhar um papel a que, talvez com exagero, se costumava atribuir certa “gravitas”. Hoje, pulverizada por sorrisos e “afectos”, essa gravidade é menor que a da lua. Devagarinho, um país que nunca foi um modelo de ponderação lançou-se desvairadamente para os braços da pura toleima. Os oligarcas, ou funcionários de oligarcas, que nos tocaram em sorte não se satisfazem com o sequestro da nossa vida material e “simbólica”: porque querem, e porque os deixam, insistem em gozar com o pagode. E o impressionante é que o pagode gosta. Não é inédito que, em nações menos exóticas, um estadista ultrapasse as restrições e os privilégios do cargo para ridicularizar descaradamente os cidadãos. Sucede é que se arrisca a cair na prisão ou, no mínimo, nas sondagens. Mesmo em nações exóticas, acontece que o estadista caia na estrada, em fuga de uma multidão aborrecida.

Aqui, não acontece nada, excepto sucessivas paródias dos americanos, essa cáfila de pategos que depositou o ridículo sr. Trump na Casa Branca. Em simultâneo, a “nomenklatura” em peso (não raramente excessivo) saltita com belos cachecóis verdes-rubros a cada golo de Cristiano Ronaldo. Ou homenageia mortos cuja responsabilidade nunca assumiu. Ou manda o fisco torcer os rendimentos alheios enquanto celebra uma “prosperidade” sem paralelo. E o povo, perdão, as vítimas não demonstram pingo de revolta ou sequer desconforto. Pelo contrário, quando não estão a pagar impostos ou a ver a CMTV, as vítimas acorrem a tirar “selfies” com os carrascos e a prometer-lhes devoção eterna. E votos. Os portugueses apreciam ser humilhados ou não percebem que o são?

Não faço ideia. De resto, qualquer das hipóteses, a da tara ou a da idiotia, concorre para resultados idênticos. Ao longo de séculos, regimes sortidos oprimiram populações através do monopólio da força, ocasionalmente temperado com a ilusão de uma benesse. No Portugal de 2018, que parece a cobaia de uma gigantesca experiência de psicologia social, a força é completamente dispensável à opressão. Por uma vez na História, uma sociedade inteira entrega-se voluntária – e alegremente, convém notar – aos caprichos dos seus senhores, sem contrapartidas excepto a garantia de uma opressão maior e de um regozijo proporcional. Maquiavel, que previu muito, não previu isto. E nisto, como na lobotomia, somos precursores.

Podia perguntar-se se tamanha inovação é mérito dos senhores ou demérito da plebe. Porém, uma panorâmica fugaz por inúmeras figuras do Estado, da economia, dos “media” e do que calha revela a resposta: não é o brilhantismo desses vultos que lhes permite converter dez milhões de criaturas no capacho onde esfregam os sapatos. O capacho, que reza “Bem-vindo”, é que é particularmente exímio na função. A propaganda turística jura que os portugueses sabem receber. Sobretudo ordens. E enxovalhos. E beijinhos, imensos beijinhos. Na terra do respeitinho, ninguém se dá ao respeito.

Nota de rodapé:

O problema das migrações em massa nunca esclarece um enigma: porque é que as pessoas abandonam lugares aprazíveis e procuram fatalmente sociedades “fascistas” e empenhadas em tratá-las mal? A acreditar nos comentários dominantes, o expectável seria que os espanhóis fugissem para Marrocos, os alemães para a Turquia, os húngaros para a Síria e os americanos para Cuba. Misteriosamente, a realidade está de pernas para o ar e não é isso que sucede. Por motivos que ninguém compreende, uma quantidade desmesurada de mexicanos larga o conforto do mezcal e tenta regularmente atravessar a fronteira a norte a fim de se sujeitar ao jugo capitalista. Os capitalistas, que também são fascistas, não apreciam a proeza e procuram intermitentemente dificultá-la. E os “media” relatam o drama subsequente, por acaso misturando mentiras, meias-verdades e o ocasional facto. Sem brincadeiras, o assunto é complexo. Com brincadeiras, pode ser resumido na frase da dona Catarina Martins, roubada ao “activista”/sindicalista David Bacon: “no mundo não há pessoas ilegais”. Mas desonestas não faltam.

sexta-feira, 22 de junho de 2018

Entre as brumas da memória


SNS: o PS no seu labirinto

Posted: 22 Jun 2018 01:34 PM PDT

Bloco adia discussão sobre SNS e dá segunda oportunidade ao PS.

«Depois de um debate em que os socialistas se viram numa posição complexa - fazer contenção de danos à esquerda, sem hostilizar gratuitamente a direita -, foi Pedro Filipe Soares, na sua intervenção final, a colocar o dedo na ferida: hoje, disse, o Bloco não sabe se a direção do PS se revê na proposta de um dos seus fundadores ou se prefere “virar as costas a António Arnaut para dar a mão a Rui Rio”. “Esperemos que [no futuro] haja uma maioria que não lhe vire as costas”, desafiou o bloquista.

Com esta decisão, o Bloco aproxima-se do calendário definido pelo Governo: em setembro, é esperada a entrada de um diploma inspirado nos contributos da comissão presidida por Maria de Belém Roseira, a mulher escolhida por António Costa para estudar a reforma do SNS. Ainda antes do verão, o PSD entregará a sua própria proposta para rever a atual lei. Resumindo: os socialistas terão de decidir se voltam à esquerda ou se continuam ao centro.»

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Não a um museu contra nós!

Posted: 22 Jun 2018 09:34 AM PDT

Texto subscrito por 100 Negras e Negros, Público, 22.06.2018

«O debate sobre o futuro museu das descobertas ou da viagem que, no essencial, pretende manter a narrativa de glorificação da empresa colonial, tem suscitado um debate intenso na sociedade portuguesa à margem das comunidades negras. Recusando a invisibilidade que nos é imposta, nós, abaixo assinados, cem pessoas negras, estamos presentes como donas das nossas vozes e eco de outras que, por razões diversas, continuam a não poder falar e a não ser ouvidas na sociedade portuguesa.

A ausência das nossas perspetivas nas instituições nacionais e nas discussões públicas está naturalizada e normalizada, rasurando-nos enquanto sujeitos históricos e enquanto contribuidores por excelência para a edificação da sociedade portuguesa nas suas diferentes vertentes. Excluídos do corpo nacional, assistimos a uma disputa pela memória que reforça a glorificação da ideologia colonial e reifica o lusotropicalismo, que continua bem presente, apesar da derrota política do fascismo e do advento da democracia, com a “revolução dos cravos” de 1974.

A glorificação da ideologia colonial ancora-se na hipervalorização ideológica, política e cultural do colonialismo, quer através do ensino da história, quer através de comemorações recorrentes do passado imperial português que reforçam a quimera de uma suposta excecionalidade lusitana e exaltam um pretenso heroísmo dos seus conquistadores, privilegiando assim uma história que serve um proselitismo político e ideológico para aguçar a “auto-estima” nacional.

Ora, sanar e elevar a “auto-estima” nacional quer através da veiculação de uma história facciosa e que omite parte relevante da verdade histórica, quer pela edificação comemorativa de estátuas, monumentos e museus celebradores do colonialismo e da ideologia colonial, merece toda a nossa contestação. Pois um dos efeitos imediatos do cultivar da magia da época colonial é exatamente o alimentar do racismo histórico e estrutural e o prolongar das hierarquias de controlo e repressão para com as comunidades negras no país, como o testemunham as violências policiais sistemáticas e a segregação de que somos vítimas. É intolerável e merece toda a nossa contestação, que o orgulho nacional seja construído à custa das feridas e da dignidade dos nossos antepassados, eternamente cativos no lugar do subalterno na narrativa oficial.

O período colonial tem funcionado como referencial máximo da capacidade imperial e do apogeu de Portugal no mundo, assim como referencial para a construção da identidade nacional contemporânea, que nele bebe a sua heroicidade. O esplendor de Portugal, como se canta no hino nacional, está localizado na história do colonialismo, considerado o período áureo da História de Portugal, mas para isso omitem-se as violências sistémicas que este período histórico protagonizou, tais como a Escravatura, o etnocídio, a evangelização forçada, as Guerras de Pacificação, o Estatuto do Indigenato e a exploração de recursos. Omitem-se também as histórias de resistência dos povos africanos e indígenas, retratados como os povos sem história, elementos passivos, sedentos de civilização, de cultura e de fé.

Neste cenário, Colonização tem sido traduzida por descobertas, descoberta e descobrimentos. Escravatura e invasão dos territórios de outros povos têm sido confundidos com encontros de culturas, contacto entre povos e expansão marítima. O Tráfico de pessoas escravizadas, levadas como gado para outros continentes, ou seja, a desumanização massiva dos corpos negros, é apelidado de viagem e também de primeira globalização. Evangelização violenta e epistemicídio são retratados como interculturalidade e desenvolvimento. E tudo isto tem resumido a “epopeia dos descobrimentos” a uma sucessão de atos de benevolência da parte de Portugal, que faz com que o próprio sistema colonial português seja considerado suave e excecional pelos próprios.

Fala-se e escreve-se sobre o comércio triangular, sobre o tráfico negreiro e navios negreiros, sobre o comércio atlântico e transatlântico de escravos, referindo-se ao tráfico e animalização de seres humanos, como se os conceitos fossem inocentes e não precisassem de uma revisão crítica. É urgente a descolonização da linguagem que leve à descolonização do pensamento, que leve à descolonização do ensino da História e que leve à descolonização do imaginário, e que isso tenha consequências nas ações do presente.

E hoje, com esta tomada de posição, denunciamos um passado que quer continuar presente e continua a assombrar as nossas vidas quotidianas. Um presente que não pretende avançar para o futuro, contribuindo para a manutenção do estado das coisas, ancorado no passado e na ideologia colonial. O projeto da Câmara Municipal de Lisboa que pretende reforçar o número de instituições dedicadas à celebração do colonialismo português existentes no país, através da criação de um chame-se ele “Museu da Descoberta”, “Museu dos Descobrimentos”, “Museu da Interculturalidade” ou “Museu da Viagem”, inscreve-se nesta dinâmica.

É importante ressaltar que a troca de nomes reflete pouca seriedade no tratamento das questões aqui descritas e, sobretudo, um desprezo por aquilo que são os impactos da conceção de um Museu desta natureza junto da comunidade negra em Portugal. Porque se as Descobertas e as Viagens podem passar do plural para o singular, a Colonização, essa, permanecerá sempre sem grandes margens de mudança, dada a sua consistência histórica de violências várias e ao seu singular impacto que se repercute até hoje na vida de negras e negros de quase todo o mundo.

Não aceitamos um Museu construído sobre os ombros do silenciamento da nossa História, com o dinheiro dos impostos de negras e negros deste país, que não respeita nem valoriza a evolução da própria historiografia e a revisão histórica já feita e em curso, da necessidade de reinterpretação e reconceptualização dos impérios coloniais e do colonialismo.

Não em nosso nome! Porque este é um Museu contra nós, que pretende ser erigido ignorando as nossas demandas, o nosso contributo e a nossa resistência. Nós, negras e negros em Portugal, exigimos à CML uma aposta séria num Memorial de homenagem às pessoas escravizadas, num Museu do Colonialismo, da Escravatura ou da Resistência Negra, que descortine os aspetos essenciais e até aqui secundarizados daquilo que foram os reais impactos da empresa colonial de Portugal no mundo, suas consequências no presente e daquilo que foram os reais contributos das pessoas negras na resistência a esse sistema.

Subscritores: Abel Djassi Amado, Abigail Cosme, Abilio B. Neto, Airyton Cesar, Alessandra Brito, Alexandra Santos, Ana Fernandes, Anaximandro Cardoso, Andredina Cardoso, Angella Graça, Ângelo Torres, Anilza Mota, António Tonga, Apolo Carvalho, Ariana Furtado, Aridson Vaz, Beatriz Carvalho, Beatriz Dias, Bruno Sena Martins, Carla Costa, Carla Fernandes, Carla Santos, Carla Sofia Gomes, Carla Viana, Carlos Dias, Carlos Sousa, Cíntia Domingo, Cristina Roldão, Daniel Monteiro, Dara Ramos, Denise Viana, Diógenes Parzianello, Djanira Gomes, Eduardo Djaló, Eunice Rocha, Evalina Dias, Fabião Ocante, Fátima Cande, Fernando Ganga, Flávio Almada, Gio Lourenço, Inês Furtado, Inocência Mata, Iolanda Évora, Ivan Varela, Jakilson Pereira, Jaquelina Varela, Joacine Katar Moreira, João Carlos Barros, João Delgado, Joaquim Matamba, Joceline Pereira, John Kalagary, Jorge Almeida, José B. Pina, José Duarte, José Gueleka, José Monteiro, José S. Fernandes, José Semedo, Kalaf Epalanga, Karin Gomes, Karyna Gomes, Kiluanji Kia Henda, Lolo Arzik, Lubanzadyo Bula, Lúcia Furtado, Luzia Moniz, Maíra Zenun, Mamadou Ba, Manuel Santos, Maria João Pinto, Marlene Nobre, Mónica Furtado, Myriam Taylor, Ndofusu Kiala, Neusa Trovoada, Nina Manso, Noé João, Nuno Dias, Paulo Inglês, Paulo Taylor, Pedro Djassi, Raquel Lima, Raquel Rodrigues, Redy W. Lima, Ricardo Maneira, Rui Mindela, Samanta Semedo, Sandra Costa, Selma Uamusse, Shirley Van-Dúnem, Solange S. Pinto, Suzana Djiba, Ulício Cardoso, Ulika Franco, Ussumane Mandjam, Vítor Sanches, Vuza Ntoko, Zia Soares.»

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Melania e os seus casacos

Posted: 22 Jun 2018 05:42 AM PDT

«Dona Custódia, a crítica de casacos que têm escrito nas costas «I REALLY DON'T CARE DO U?» usados por primeiras-damas durante crises de indignações públicas mundiais com políticas de emigração que resultam em enjaulamentos de crianças em fronteiras com Méxicos.»

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