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quarta-feira, 4 de julho de 2018

António Costa passou a ser um tipo banal?

  por estatuadesal

(Pedro Tadeu, in Diário de Notícias, 04/07/2018)

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(Em relação ao tema deste artigo, não resisto em referir o epíteto que o Jumento, no seu Blog, propõe para António Costa, a saber, Um Passos Coelho porreiro:

"...As sacanices do Passos era à filho da mãe, as do António Costa são ao estilo do gajo porreiro. A prazo o resultado é o mesmo, António Costa deu aquilo que estava obrigado e agora tira com a outra mão o que aparentemente tinha dado." (Ver aqui).

Comentário da Estátua, 04/07/2017


Quando o primeiro-ministro António Costa decide ir cortar uma fita, para publicitar o início das obras de melhoria do IP3, não está a fazer nada de original na história da governação deste país: afinal não há fontanário, estatueta ou passeio público, construídos dentro destes 92.212 quilómetros quadrados de terreno a que chamamos Portugal, que não tenham merecido cerimoniais inaugurativos com a presença das mais altas e prestigiadas individualidades. É uma tradição.

Quando o primeiro-ministro António Costa fica a saber por um dos autarcas presentes no evento, o presidente da Câmara Municipal de Viseu e social-democrata Almeida Henriques, que aquela era já a quarta vez que se fazia uma cerimónia a anunciar o início das obras de melhoria do IP3, não está a ser confrontado com algo de anormal: de certeza que, daqui até ao final de 2022, quando as obras ficarem concluídas, vários grupos de governantes, de hoje e de amanhã, regressarão a essa estrada para cortar outras fitas a um ritmo de, pelo menos, uma dúzia de cada um dos 75 quilómetros de intervenção - e assim tratarão de glorificar para a lente de TV mais próxima a sua proverbial sabedoria na gestão dos bens públicos. Sempre foi assim. É uma tradição.

Quando o primeiro-ministro António Costa garante que os 134 milhões de euros para pagar este arranjo, essencial, são um investimento que serve para o Estado "salvar vidas" ao "assegurar a segurança rodoviária" numa parte da longa tira de alcatrão que leva as pessoas da Figueira da Foz, na costa atlântica, até Vila Verde da Raia, na fronteira com Espanha, não está a ser original: são incontáveis, na história desta nação, os casos de governantes capazes de cobrar à opinião pública medidas capazes de poupar portugueses a um confronto inesperado com a morte. Esta ocasião até nem era das mais disparatadas para o fazer, dado o trágico registo de acidentes dos troços em causa. Os políticos não perdem uma ocasião para mostrarem que se preocupam connosco, é uma tradição.

Quando o primeiro-ministro António Costa afirma que a decisão de avançar com este investimento implica "que estamos, simultaneamente, a decidir não fazer outra obra", para acrescentar que "quando estamos a decidir fazer esta obra, estamos a decidir não fazer evoluções nas carreiras ou vencimentos" está a seguir uma velha tendência do breviário político luso, capaz de misturar alhos com bugalhos para obter, nas audiências, um efeito sonante. É uma tradição.

Acontece, porém, que a discursata do líder do executivo liga diretamente os 134 milhões de euros a gastar pelo Estado numa via rodoviária com a limitação da despesa com funcionários públicos. Esta comparação legitima todas as outras comparações equivalentes anteriormente feitas por sindicatos, grevistas, militantes da oposição, dirigentes partidários, adversários, colunistas de cadastro diverso, tantas vezes apelidados pelos governantes de "populistas", "demagógicas", "irresponsáveis" ou, pretensiosamente, "tecnicamente erradas".

Gostaria, portanto, de perguntar ao primeiro-ministro, depois de colocar nos dois pratos da balança a reparação de uma pequena parte dos 279 quilómetros totais do percurso do IP3, precisamente a zona que não é autoestrada (e continuará a não ser) e, no outro prato da balança, os aumentos salariais reivindicados por cenetans de milhares de trabalhadores, o que acha se nessa balança colocássemos outros ingredientes? Dou só três exemplos:

1 - O custo anual de 400 a 600 milhões de euros com a contagem total de tempo de carreira dos professores num prato e, no outro prato, o gasto de 768 milhões de euros, no último ano, mais mil milhões de euros a gastar pelo Estado este ano (e não se sabe o que se segue daí para a frente) com bancos falidos.

2 - O perda pelo Estado de 700 milhões de euros na arbitragem de conflitos com a Parcerias Público-Privadas num lado com a recusa ou adiamento das obras que tornem decente o hospital pediátrico de São João no outro lado dessa balança.

3 - O aumento da dívida do Estado que, ao contrário das promessas, subiu para um recorde de 250,3 mil milhões de euros comparado com a falta de equipamentos de proteção e combate aos fogos florestais também anteriormente prometidos a bombeiros e militares.

É demagógico fazer estas comparações? Talvez, mas estão ao mesmo nível das comparações que o primeiro-ministro fez ao cortar as fitas das obras do Itinerário Principal 3.

António Costa, no entanto, tem razão numa coisa: governar um orçamento do Estado é fazer escolhas, é decidir onde se pode ou não gastar o dinheiro dos contribuintes.

Infelizmente, pelo que tem dito e feito nos últimos tempos, António Costa optou pela banalidade e faz o mesmo tipo de escolhas de outros senhores de outros tempos, que consumiram imensos recursos do Estado numa visão desfocada do bem comum. Vi isso nos tempos de Sócrates. Vi isso nos tempos da troika. Vi isso nos tempos de Vítor Gaspar. Vi isso nos tempos de Maria de Lurdes Albuquerque. Vi isso nos tempos de Pedro Passos Coelho. Oiço agora isso das bocas de Mário Centeno e de António Costa. É uma tradição.

A cimeira da capitulação

por estatuadesal

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 04/07/2018) 

Daniel

Daniel Oliveira

Quando foi a crise financeira convencemo-nos que era por causa da Alemanha que nada se podia fazer. Em parte é verdade: o euro foi desenhado à medida das necessidades e receios de Berlim, a resposta à crise foi limitada pela necessidade de resgatar a banca alemã e francesa da exposição às dívidas soberanas dos países periféricos e muito do que se decide no Banco Central Europeu é, apesar de algumas momentos excecionais, determinado pelos tabus alemães. Mas é otimismo pensar que a vontade de um Estado é mais importante do que todos os interesses privados, sobretudo os do poder financeiro, que se movem em Bruxelas. Foi a confluência do poder dos Estados mais fortes da Europa e do poder financeiro que determinou aquilo que a Europa fez e não fez para enfrentar a crise de 2008-2011. E foi o que fez e o que não fez que criou as condições para o crescimento exponencial de movimentos de extrema-direita.

Mas tivemos, na última cimeira do Conselho Europeu, a oportunidade para relativizar o poder alemão. Merkel precisava de um acordo mas, como se viu, estava disposta a ceder em toda a linha, externa e internamente. Podemos disfarçar, mas António Costa explicou de forma clara: “O Conselho não fez mais do que mandatar a Comissão e o Conselho para dialogarem com as Nações Unidas, com a Organização Internacional para as Migrações, com países terceiros para explorar uma ideia, e nada mais do que isso”. E o que se empurrou com a barriga não é mau, é péssimo. Quando o primeiro-ministro do Governo italiano, um fantoche da Liga e dos idiotas úteis do 5 Estrelas, diz que “este Conselho Europeu marca o início de uma Europa mais responsável” estamos conversados.

O que sai desta cimeira são as plataformas de desembarque, os centros controlados e o reforço da vigilância das fronteiras. Não é qualquer política de solidariedade entre Estados para acolher os refugiados, até porque a extrema-direita do Leste deixou claro que não daria nada para esse peditório. A maioria das plataformas de desembarque deverão funcionar em países exteriores à UE. A ideia de garantir um circuito oficial que seja uma alternativa ao negócio dos passadores seria excelente. Mas a “estreita cooperação com países terceiros” denuncia a repetição do vergonhoso acordo com a Turquia para que países sem qualquer respeito pelos direitos humanos recebam os refugiados, em troca de dinheiro, para os conter fora da Europa, em centros de detenção degradantes. Não é difícil imaginar o que é ter o Egito, a Líbia ou a Argélia a garantirem a segurança destes migrantes.

A União Europeia que realmente existe está muito mais próxima de Órban do que de Tsipras. O primeiro é integrável sem ceder um milímetro, o segundo só o foi quando se vergou. E é por isso que as lições europeias a Trump só me provocam um sorriso amargo. Diz o roto ao nu...

Os centros controlados, para receberem pessoas resgatadas em operações de salvamento e selecionar refugiados entre os migrantes irregulares (a serem recambiados ao seu destino), parecem encaminhar-se para centros de reclusão de imigrantes. E os meios financeiros e materiais da UE serão canalizados para o controlo de fronteiras. Perante a tragédia humana que está à nossa frente, a prioridade é para impedir a entrada e “intensificar significativamente o regresso efetivo de migrantes irregulares” à sua origem. É para políticas de regresso que se podem meios e nova legislação. Todos os problemas são para ficar para lá das fronteiras europeias. Quanto a uma Europa solidária para receber em conjunto os refugiados, nada.

O que saiu do Conselho Europeu encaminha tudo para a repetição do acordo com a Turquia no norte de África, a contenção de imigrantes do outro lado da Mediterrâneo, a construção de centros de detenção e toda a prioridade à intensificação do regresso compulsivo. A extrema-direita de Órban e Salvini não se limitou a impedir qualquer solução. Foi o confronto entre a extrema-direita do Leste e a extrema-direita italiana que encaminhou a Europa para as suas soluções. E provou que a Alemanha não é imbatível. A diferença é que a extrema-direita é bem mais firme na defesa da sua sinistra agenda do que a esquerda foi quando era preciso garantir a coesão europeia e a solidariedade com os países do sul. Mesmo nesta última cimeira, os governos de extrema-direita foram claros ao explicar que vetariam um conclusão se não fosse a que desejavam. Já Costa bracejou, protestou e assinou. A diferença é que a União que realmente existe está muito mais próxima de Órban do que de Tsipras. O primeiro é integrável sem ceder um milímetro, o segundo só o foi quando se vergou.

E isto aconteceu apesar de, supostamente, Merkel e Macron terem como bandeiras humanistas uma política diferente para a imigração. Continuem a pôr as fichas em quem, na última década, fez tudo para minar qualquer sentimento de dever solidário entre os europeus, impondo às vítimas da crise o egoísmo alemão, e num boneco cheio de retórica cosmopolita desde que a França esteja primeiro, e não iremos muito longe. Quando os seus egoísmos não estão em causa, a Alemanha amocha e a França é a França. Mandam os Salvini, os Órban e todos os que mostram ao Mundo o verdadeiro rosto da Europa. E é por isso que as lições europeias a Trump só me provocam um sorriso amargo. Diz o roto ao nu...

EUA. Responsáveis de centros de detenção de menores têm ligações à Administração Trump

4/7/2018, 16:40

É um negócio de milhões de dólares entregue a organizações sem fins lucrativos, empresas e grupos religiosos. O The New York Times descobriu ligações entre estas entidades e a administração Trump.

MICHAEL REYNOLDS/EPA

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Desde que Donald Trump pôs em prática a política de “tolerância zero” para com famílias de sul-americanos que tentam entrar ilegalmente nos Estados Unidos, o número de pessoas retidas em centros temporários à espera de serem repatriadas disparou. Uma investigação do The New York Times concluiu que muitos dos responsáveis destes centros — que nos últimos anos receberam apoios públicos de mais de mil milhões de dólares — têm fortes ligações a elementos da Administração Trump.

A secretária de Estado da Educação (o equivalente a uma ministra daquela área) financia um dos grupos que gerem estes centros de detenção temporária, ou abrigos, como também são designadas as instalações onde os migrantes são retidos — locais que, nas últimas semanas, estiveram sob particular escrutínio depois de ser tornado público que pelo menos dois mil menores tinham sido separados das suas famílias. O secretário de Estado da Defesa é outro dos responsáveis políticos do Governo norte-americano com estreitas ligações a estes grupos, uma vez que chegou a ter assento no conselho de administração de uma dessas instituições.

A gestão destes mais de 100 centros, refere o The New York Times, levou a que nos últimos anos tivessem sido feitas transferências de mais de mil milhões de dólares do Governo norte-americano para estes grupos (entre organizações sem fins lucrativos, empresas e confederações religiosas). A política de gestão de fronteiras é determinada por decisão do Governo dos EUA, naturalmente, mas a gestão dos centros de detenção e abrigos é entregue a organizações da sociedade civil, que ficam encarregues não apenas do alojamento mas também do transporte e da vigilância destes cidadãos estrangeiros.

O artigo publicado esta quarta-feira no The New York Times faz uma ressalva: não há qualquer dado que aponte para favores ou jogadas de influência políticas junto do Departamento de Serviços de Saúde e Humanos, a entidade pública que entrega a gestão dos centros às organizações da sociedade civil. Aliás, muitas destas entidades já estavam ligadas à gestão destes centros no tempo em que Barack Obama era presidente dos EUA.

No entanto, há um dado que também é relevado pelo jornal norte-americano: a política de “tolerância zero” imposta por Donald Trump fez subir os números de pessoas detidas temporariamente nestes centros. E esse número não vai diminuir com a mudança (forçada) de paradigma da Administração Trump, que recuou na decisão de manter separados das suas famílias pelo menos dois mil menores sul americanos (na sua maioria, crianças e jovens mexicanos), porque os menores que sejam apanhados a cruzar a fronteira sudoeste sozinhos vão ser encaminhados para estes mesmos centros.

A Bethany Christian Services, com ligações à responsável política pela área da Educação, disse ao The New York Times estar “profundamente abalada e preocupada” com a política de “tolerância zero” do Governo norte-americano e ao reforço do policiamento na fronteira com o México.

Acreditamos que todas as crianças devem estar com as suas famílias”, referiu o grupo que assegura a prestação de serviços sociais.

Donos de centros financiaram Trump

As ligações entre os donos deste negócio privado, sustentado com dinheiros públicos, e Donald Trump não se esgotam nas ligações a elementos do seu Governo. Há empresas que financiaram diretamente o atual presidente dos EUA.

São os casos da Geo Group e da CoreCivic, que gerem prisões privadas no país e, também, centros de detenção de famílias em situação ilegal no país. Cada uma delas doou 250 mil euros para o fundo de onde saíram as verbas que serviram para pagar as cerimónias (entre jantares, bailes e outros eventos) que decorreram no momento da tomada de posse do presidente, em janeiro de 2017.

View of a temporary detention centre for illegal underage immigrants in Tornillo, Texas, US near the Mexico-US border, as seen from Valle de Juarez, in Chihuahua state, Mexico on June 18, 2018. – Mexico strongly condemned US President Donald Trump’s administration Tuesday for its policy of separating immigrant children and parents detained after crossing the US-Mexican border, calling it “inhuman.” (Photo by HERIKA MARTINEZ / AFP) (Photo credit should read HERIKA MARTINEZ/AFP/Getty Images)

Além disso, a Geo Group — que habitualmente transfere largas milhares de euros para Democratas e Republicanos, com predominância para os últimos — contratou um lobista que representou as empresas que gerem os campos de golfe de Donald Trump na Florida antes de este se ter tornado presidente dos EUA. O registo da empresa desse lobista, Brian Ballard, refere que o seu foco estava na área de “legislação sobre imigração”.

Em comunicado, a Geo Group diz que “cuidou exclusivamente de mães, juntamente com os seus filhos, desde 2014, quando [a detenção] foi consagrada pela administração Obama”.

A Bethany Christian Services também rejeita a ideia de oferecer algum apoio à política de separação de famílias de imigrantes.

Décadas de trabalho duro deram-nos o conhecimento necessário para apoiar crianças e famílias em crise”, referiu a entidade em comunicado.

“Estando extremamente agradecidos aos nossos doadores e apoiantes, a ideia de que um qualquer indivíduo ou uma organização poderia levar a que mudássemos as nossas práticas é simplesmente falsa e diminui o incrível trabalho de todas aquelas famílias fortemente focadas no bem-estar de crianças deslocadas”, acrescenta o documento citado pelo New York Times.

A Sagrada Família enjaulada. É este o novo protesto contra Trump

Virgem Maria, José e menino Jesus em jaula


Em protesto contra a política de tolerância zero do governo norte-americano na questão das migrações, uma igreja em Indianapolis, no estado de Indiana, tem as figuras de Virgem Maria, José e menino Jesus “detidas” numa jaula. O argumento apresentado pela comunidade é de que a sagrada família “era, também, uma família de refugiados”.
A Episcopalian Christ Church Cathedral quis responder à separação de famílias por parte do governo: “Não vamos apoiar o governo, enquanto crianças estiverem a ser levadas dos seus pais e famílias a serem retiradas das suas comunidades e congregações”, pode ler-se no comunicado divulgado no site da igreja.

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CCC Indy@CCCathedralIndy


On our lawn tonight we placed The Holy Family...in #ICE detention. #Immigration
06:13 - 3 de jul de 2018
Segundo o Reverendo Lee Curtis à BBC, “esta era, também, uma família de refugiados que procurava asilo, depois do nascimento de Jesus.”
O reverendo afirma que “todas as famílias são sagradas” e que a igreja está neste momento a rezar “pelas famílias que procuram melhores oportunidades para os seus filhos”.

Racismo e um parque pop

Cimento líquido
Miguel Guedes
Hoje às 00:01
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A história fúnebre da Europa, perto de se repetir aos nossos olhos. No momento em que alguns comemoram o mal menor na Alemanha que permite - fruto do acordo entre a chanceler alemã e o seu ministro do Interior - sustentar Ângela Merkel no poder, Portugal conta a quem passa a ladainha mentirosa de que não é um país racista. Quando muito, diferenciador. Tão diverso como o que se mostrou ser na agressão bárbara a uma jovem colombiana por um fiscal da STCP na noite de S. João no Porto. O estigma reside nessa diferença de pormenor que permite fechar os olhos a três campos de internamento ao ar livre para refugiados, autorizados por Merkel à força de querer evitar uma crise política interna que podia arrastar a Alemanha para onde rasteja parte da Europa. Eis a barbárie da radicalização que se vive pela ascensão ao poder da extrema-direita. Pela fraqueza das soluções de todo o espectro político, a Europa rende-se à réplica dos piores momentos da história do século XX e vamos todos fingindo que é uma atitude isolada de um fiscal numa viagem. Fragilidade, temor e vergonha.
Fechando os olhos, divertimento e rotinas diárias, a vida a correr costumeira. Os emigrantes portugueses em New Jersey passaram boa parte do seu tempo de ócio no "Palace Amusements", parque de diversões com 100 anos de história, onde gerações estacionaram os seus veículos perto do passadiço de Asbury Park, gozando alucinação e delírio com bilhete familiar. Mas a vida de emigração não é igual para todos na relação luso-americana. Três décadas exactas depois do encerramento do parque americano, um Palácio português serve uma só rainha pop, sendo a populaça a que sofre com a portagem. O campo de concentração para veículos de Madonna avança em Lisboa, sito nas traseiras do Palácio Pombal, propriedade da Autarquia lisboeta. Um terreno público em saldo, sim.
Nada disto seria grave se não fosse ultrajante para milhares de pessoas, lisboetas na sua esmagadora maioria, que tentam estacionar na zona de Santos, um inferno bíblico-alfacinha de enormes proporções. Sem auscultar nada nem ninguém, a decisão em velocidade vertigem de Fernando Medina fez contrato no Palácio perto do Palacete onde a artista vive. Não é uma visita, ela vive: Lisboa, a província de Madonna. E há quem, à sombra da árvore do turismo, ache normal que um município escorregue nesta casca de banana. O que agora resta do parque de diversões de Asbury Park é um sombrio museu online. Sem tráfego mas onde ninguém aparca. Só fragilidade.
O autor escreve segundo a antiga ortografia
*Músico e jurista