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sábado, 7 de julho de 2018

Um jogo de sorte e Hazard

MUNDIAL 2018

  • Bruno Vieira Amaral

6/7/2018, 22:14

Mesmo descontando o efeito da emoção recente, proclamo que este foi o Brasil que mais gostei de ver jogar em mundiais. Mesmo a perder, nunca perdeu a cabeça, a organização, a fluidez.

Haverá outras formas de dizer isto, provavelmente mais simpáticas, mas o facto é que José Peseiro tem cara de derrotado. Como o rosto vitorioso de alguns indivíduos afronta, humilha, o rosto atreito à derrota, à miséria, convoca a nossa compaixão. Porque é que falo de Peseiro se ele nem está no Mundial? É que o estou a ver aqui à minha frente, na capa de uma jornal desportivo, com um sorriso que não me engana. Naquela fisionomia obnóxia estão inscritas todas as derrotas do passado e prenunciadas todas as derrotas do futuro. Podem argumentar que nada disto é científico, mas olhem bem para Peseiro e digam-me se há ali algo da natureza intimidatória, vagamente irritante, do vencedor? Pois, não há.

Resolvida a questão Peseiro, regressemos ao Mundial. Pobre Uruguai! Sem Cavani, o campo ficou muito grande. Suárez procurava-o como quem procura a perna direita. Como um McCartney sem Lennon, bem que assobiava, mas só lhe saíam coisas como “Ebony and Ivory” e “No More Lonely Nights”. Privado do seu sócio, o avançado do Barcelona viu-se sem dentes. Correu, chateou, bateu com prudência, fez tudo o que se espera de Suárez dentro das leis do jogo. Porém, pareceu sempre inofensivo, nada mais que um rafeiro atrevido.

Este foi um jogo muito semelhante ao Alemanha-França de há quatro anos, também nos quartos-de-final. O que a Alemanha fez então à França, hoje a França fez ao Uruguai, apertando o adversário num abraço que só se percebe que é constritor quando o oxigénio deixa de chegar ao cérebro. Giménez, o central uruguaio, percebeu-o ainda a tempo de nos proporcionar um momento inesquecível: a dois minutos do jogo acabar, com o Uruguai a perder 2-0, não controlou o choro. Muslera também já tinha tido a sua paragem cerebral quando deu um daqueles frangos tão monumentais que nem sequer destroem carreiras, antes criam lendas. Muslera deu hoje o seu frango eterno. Não será esquecido.

Mais do que a comparação com o jogo de há quatro anos, talvez faça sentido dizer que o Uruguai provou do veneno com que tinha derrotado Portugal. Veneno que, por sua vez, Portugal já tinha usado contra Marrocos, por exemplo. Portanto, se a Bélgica empregar o mesmo método para ultrapassar a França podemos dizer que isto não é tanto um Mundial como um fim-de-semana com a família dos Bórgias. Também não faltou ao jogo alguma dose de violência física, de quezílias, quiproquós, pisadelas, admoestações e reprimendas. As coisas atingiram um nível Copa Liberadores e, a certa altura, nem a imponência castrense de Néstor Pitana sossegou os ânimos. Ainda escreverei sobre este árbitro argentino que tem a presença física de um marine – ou, como diria Gabriel Mithá Ribeiro, o físico ideal para professor na Margem Sul – e a vocação teatral de quem ama as luzes da ribalta.

Quando o futebol é quezilento, sem imaginação, o adepto faminto até na exibição do árbitro procura consolo. Verdade seja dita, quando se chega aos quartos-de-final nenhuma equipa é amável. Dizia Balzac que por trás de uma grande fortuna há sempre um grande crime. Ora, eu acredito que uma presença nos quartos-de-final oculta sempre uma desonestidade fundamental, um crime de Ananias. Ninguém chega a esta fase impunemente. Amei a França que bateu a Argentina. Porém, assim que a projectei nos quartos-de-final, regressaram-me à memória os pecados originais de todos os jogadores franceses – que digo eu? –, de toda a França desde Carlos Magno.

Era assim que pensava antes de ver o Brasil-Bélgica. E não é que os quartos-de-final podem ter não uma, mas duas equipas amáveis? Mesmo descontando o efeito da emoção recente, proclamo que este foi o Brasil que mais gostei de ver jogar em mundiais. Mesmo a perder, nunca perdeu a cabeça, a organização, a fluidez. Criou oportunidades a jogar o seu futebol e isto, sem condescendência alguma, vale certamente alguma coisa. A Bélgica teve um treinador que soube preparar o jogo, teve Witsel e Fellaini, teve Lukaku, teve De Bruyne, teve Courtois, teve Hazard e, quando tudo isto falhou, teve sorte. Contra isto, Tite nada podia.

Neymar: pequeno grande vilão?

CRÓNICA

Ruth ManusSeguir

7/7/2018, 10:21

Podemos culpar o Neymar pela queda do Brasil? Não exclusivamente. Mas é evidente que a falta de maturidade do menino-que-já não-é-mais-menino teve um preço alto para toda uma nação.

Quando li a biografia da cantora brasileira Elza Soares, que segue na ativa até hoje com 81 anos e foi casada com Garrincha, um dos maiores ídolos do futebol brasileiro, li uma coisa que nunca mais esqueci. O autor afirmava que a geração de Elza e Garrincha (que, se não tivesse morrido aos 50 anos, hoje teria seus 85) foi a última geração a fazer música e a jogar futebol por paixão. A partir daí, ambas as coisas viraram negócio, deixando de ser arte.

De fato, quando olhamos para essa Copa do Mundo, percebemos que há pouco (quase nenhum) espaço para improviso, instinto ou arte. Tudo é absolutamente profissional, direcionado e previamente estipulado. Também, pudera, tantos patrocinadores gigantescos, tantas câmeras precisas, tanto dinheiro envolvido. Ninguém está ali para qualquer tipo de brincadeira.

Os jogadores tornaram-se máquinas. Treinos quase militares, suplementos alimentares, disciplina rigorosa, comportamento inspecionado. Pensar na seleção brasileira de 94, em Romário e Bebeto, sua indisciplina e seus excessos, é algo quase surreal 14 anos depois. O futebol está ficando chato? Talvez. A qualidade é melhor, mas certamente é um esporte muito pouco humano.

A seleção brasileira cai perante a Bélgica de Lukaku e tantos outros homens imensos e decididos. De quem é a culpa? Gabriel Jesus e sua incapacidade de decidir? Tite e o tempo que levou para mudar o time? Fernandinho e sua falta de solidez? Casemiro e seus dois cartões amarelos? Ou Neymar, pura e simplesmente? Podemos culpar alguém?

Neymar, no meio de um Mundial sério e nada aberto a gracejos e fintas, parece não estar na mesma disputa que os demais. O “menino Ney” é sempre perdoado por sua suposta imaturidade, mesmo que já mais perto dos 30 do que dos 20 anos de idade. Neymar nunca passa despercebido, seja onde for. Causa incômodo, causa furor, causa discussões. Cai no chão, rola, chora, briga, provoca. Destoa de quase todo o resto dos jogadores de 2018.

Ninguém se ilude, pensando que Neymar é um resquício de futebol arte em vez de ser o auge do futebol business. Mas, inegavelmente, Neymar é mais humano e menos máquina do que a média dos grandes jogadores. Menos máquina do que Cristiano Ronaldo, Griezmann, Kane ou Toni Kroos. E é provável que seja exatamente por isso ele nunca vá ser o melhor do mundo.

A humanidade, que tem seu lado positivo por devolver ao futebol um pouco da vida que foi perdida em tempos de VAR, acabou custando muito caro ao Brasil. As quedas, encenações e exageros fizeram, por exemplo, com que Miguel Layún, ao pisar propositalmente no atacante, não fosse expulso do jogo. A fama de simulação instituída por Neymar espalhou-se por todo o time, a ponto do árbitro sérvio não marcar o pênalti claro em cima de Gabriel Jesus no segundo tempo do jogo contra a Bélgica, que poderia ter mantido o Brasil na Copa.

Podemos culpar o Neymar pela queda do Brasil? Não exclusivamente. Mas é evidente que a falta de maturidade do menino-que-já não-é-mais-menino teve um preço alto para toda uma nação      que precisava dessa alegria mais do que nunca. É craque? É. É humano? É. É inconsequente? É. E agora vamos de volta para casa. Temos um país para tentar reerguer.

Equipas de resgate na gruta na Tailândia fizeram mais de 100 furos na montanha

7/7/2018, 9:55

Continua a procura por uma forma exterior de salvar 12 rapazes e o seu treinador, presos numa gruta na Tailândia. Houve um resgate por mergulho previsto para sexta, mas foi adiado.

THAI NAVY SEAL HANDOUT/EPA

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  • Agência Lusa
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Os socorristas que tentam o resgate das 12 crianças e do seu treinador presos numa gruta na Tailândia há duas semanas anunciaram ter feito mais de 100 furos na montanha em busca de alternativa a uma evacuação por mergulho. O resgate que chegou a estar previsto para sexta-feira foi adiado por “não ser oportuno”.

O governador da província tailadesa de Chiang Rai disse aos jornalistas que o adiamento se deve à falta de preparação dos rapazes neste momento. Narongsak Osottanakorn avisa, no entanto, que o tempo para retirar o grupo preso há quase duas semanas está a ficar “limitado”. A equipa está a tentar formas alternativas de fazer o resgate.

“Realizámos mais de 100 furos, mas ainda não localizámos a sua posição”, declarou o líder da equipa de crise, Narongsak Osottanakorn, que é igualmente governador da província Chiang Rai.

Entretanto, especialistas em deteção de ninhos de andorinhas estão a examinar a montanha no norte da Tailândia à procura de uma fissura por onde possam proceder ao resgate das crianças e do seu treinador.

“Resgatar as crianças é importante para as suas famílias, mas também para todo o país”, afirmou Maan, um dos voluntários desta equipa de especialistas, citado pela agência EFE.

A equipa que está a rastrear a montanha é composta por uma dezena de pessoas que chegou no princípio da semana para se voluntariar nas tarefas de resgate.

Estes voluntários são especialistas em pesquisa de ninhos de andorinha, estando habituados a escalar montanhas e a pesquisar nas suas fissuras. Estes ninhos são considerados uma iguaria culinária.

A morte de um mergulhador experimentado da marinha tailandesa, na sexta-feira, durante uma operação para entregar mantimentos ao grupo, veio pôr em causa a viabilidade de uma extração sem riscos do grupo que está há 14 dias bloqueado na gruta de Tham Luang.

Boa parte das crianças, com idades entre os 11 e os 16 anos, não sabe nadar e nenhum fez mergulho, o que complica as operações.

Até ao momento, um mergulhador experimentado demora 11 horas para fazer o trajeto, e voltar, até às crianças: seis horas para ir e cinco para voltar, graças à corrente.

O percurso estende-se por vários quilómetros, em canais acidentados, com passagens difíceis sob água.

Os rapazes, com idades entre 11 e 16 anos, e o seu treinador de 25 anos foram explorar a caverna depois de um jogo de futebol no dia 23 de junho.

As inundações resultantes das monções bloquearam-lhes a saída e impediram que as equipas de resgate os encontrassem durante nove dias, já que a única maneira de chegar até ao local onde se encontram é mergulhando através de túneis escuros e estreitos, cheios de água turva e correntes fortes.

As autoridades têm bombeado a água da caverna antes que as tempestades previstas para os próximos dias aumentem os níveis novamente.

Por que é que a vida política portuguesa está um pântano?

  por estatuadesal

(Pacheco Pereira, in Público, 07/07/2018)

JPP

Pacheco Pereira

No programa de debate que tenho com os meus companheiros na SIC, a Quadratura do Círculo, existe um problema que me leva a protestar (injustamente às vezes), e que se pode definir assim: está-se sempre a discutir as mesmas coisas. Exemplos: a saúde ou falta dela da “geringonça”, “não há dinheiro”, dívida e deficit, há ou não austeridade, etc.

Reconheço que não é por falta de outros temas ou de imaginação em trazer outros menos discutidos, mas sim pela necessidade de discutir os temas da actualidade semanal. Esta necessidade é muitas vezes perversa, porque nos faz depender da muito pobre agenda política ou mediática, embora a ordem correcta seja em primeiro lugar mediática e depois política, ou político-mediática, porque é um conjunto inseparável. Mas a verdade é que o problema está a montante da Quadratura, está na efectiva estagnação da vida política portuguesa, que se encontra num pântano, em que as águas não se mexem, e, quando se mexem, é por formas de vida pouco recomendáveis. É por isso que não saímos do sítio e estamos sempre a falar do mesmo.

A estagnação das águas do pântano vem da conjugação da nossa dívida, do nosso deficit, com os “constrangimentos” europeus, as “regras” europeias”, emanando das obrigações do Tratado Orçamental e das políticas da troika que estão bastante mais vivas do que se pensa. Perguntem a Centeno. O pântano é vigiado pelos seus cães de fila, de dentro e, particularmente, de fora. Esta fonte inquinada, que verdadeiramente nunca se discute a sério, espalha-se pelo PS, pelo BE e pelo PCP, os partidos da “geringonça”  que às claras ou incomodados, aceitam uma governação subordinada ao Tratado, e vai para o PSD e para o PS que igualmente aceitam, com mais gáudio, as mesmas “obrigações”.

Com um parlamento desprovido dos poderes essenciais do orçamento, de cima para baixo, para os partidos e para os eleitores emana uma podridão que infecta toda a vida democrática. No essencial torna-a menos democrática. O resultado é que toda a vida política se desenvolve ao lado e fora do centro dos problemas, na periferia do que é mais importante, adiando quaisquer medidas que nos permitissem, em Portugal e para os portugueses, ter uma política mais conforme com as nossas necessidades e com as nossas possibilidades. Assim, estamos condenados a décadas de estagnação, nem muito mal, nem muito bem, na cauda da Europa.

Para se perceber o marasmo em que estamos, basta ver como foram saudadas as intervenções, no recente congresso do PS, da sua “ala esquerda” sem uma palavra sobre os “constrangimentos” europeus. Nem os que as fizeram, nem os que as comentaram, notaram este simples facto: sem se falar das relações entre Portugal e a União Europeia, o discurso ainda que seja neste caso muito de esquerda, é de um impressionante vazio. O problema que vai mais longe do que considerar existir um tabu para se discutir a Europa, é o de se achar com toda a naturalidade, que a Europa se tornou numa coisa não nomeável, que não precisa de ser discutida no âmago da política portuguesa. Eu percebo que tal é a tradução no discurso político de uma impotência, da absoluta noção de que é uma matéria sobre a qual não temos qualquer poder, nem soberania, e por isso aceita-se como um hábito, um mau hábito. É a interiorização do protectorado, um certificado de castração. E isso é particularmente destrutivo em democracia.

PÚBLICO -

Foto

Pintura de Ivan Ivanovich Shishkin

O argumento mais importante da servidão é sempre a aceitação da força, daquilo que a direita chamava a “realidade” numa demonstração única de arrogância… filosófica. A variante para justificar ter as cabeças dentro do pântano, é da não existência de alternativas. O “não há nada a fazer” é uma espécie de bomba atómica do pensar e do fazer, destrói qualquer impulso para defrontar os problemas de atraso e desenvolvimento do país, que não seja o de obedecer ao que se nos impõe. Quando sequer se suscita esta questão, é ver de imediato uma argumentação de 8 e 80, frases ad terrorem, um efectivo bloqueio da discussão. É aquilo que podemos chamar o “argumento de Vichy”, os alemães ocupam a França, logo é patriótico aceitar essa ocupação porque não há volta a dar.

Infelizmente, vai haver, e não será muito longe no tempo, uma entrada abrupta destes temas, - “constrangimentos” europeus, dos mercados, das agências de rating, dívida e deficit, poderes transnacionais sem controlo democrático, - na discussão pública. Digo infelizmente, porque eles chegarão de repente e de forma dramática, resultado do mundo de tempestades que se estão a alinhar um pouco por todo o lado, entre a América de Trump e a Europa da “união” em decomposição (visto que com a Europa de Salvini e de Orban ele não tem problemas), na Europa entre a Alemanha, a França, a Hungria e a Itália, com o Brexit,  com as “fronteiras” com duas autocracias agressivas, a de Putin e a de Erdogan. A isso se acrescenta a actual política portuguesa, do PSD-CDS ao PS, que é inerentemente instável.

Portugal não conta para nenhuma destas tempestades, mas será atingido e duramente por elas. Então se verá como seria, pelo menos prudente, deslocar a discussão e a política para fora do pântano.

Quando li o título, até pensei que fosse sobre o financiamento partidário

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por j. manuel cordeiro

PSD quer transparência sobre donativos

Afinal, é só chicana política quanto aos donativos para os incêndios do Verão passado. Não me interpretem mal, tenho o maior interesse em termos os autarcas a prestar contas, agora ainda mais, face ao regabofe que aí vem. Mas boa ideia, até para dar o exemplo, seria primeiro começarem pela própria casa, em vez de virem para a comunicação social fazerem o número.

Ao que o PÚBLICO apurou, a operação, que recebeu o nome de Tutti-Frutti, centra-se sobretudo num conjunto de suspeitos ligados ao PSD desde os tempos da JSD. Este grupo terá escolhido pessoas da sua confiança para integrarem as listas candidatas às eleições autárquicas de Outubro passado em vários municípios, tendo entrado em negociações com responsáveis do Partido Socialista sobre a composição dos órgãos municipais eleitos. E conseguiram que empresas suas ou as pessoas da sua confiança vendessem serviços a estas autarquias, através de avenças mas também por via da adjudicação de contratos públicos. [Público, 27/06/2018]

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