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sexta-feira, 28 de agosto de 2020

A Igreja não diz nada da apropriação que lhe faz a extrema direita?

Posted: 27 Aug 2020 03:24 AM PDT

«Há anos, a propósito de uma qualquer diatribe minha com os aficionados do ultraconservadorismo católico, um amigo jesuíta lembrou-me o dito popular entre os espanhóis: quando queriam confessar um pecado sexual, iam aos jesuítas; quando se tratava de um pecado social ou económico, confessavam-se à Opus Dei. Parecendo que não, é uma boa caricatura do mundo atual no que toca ao catolicismo.

A parte conservadora da Igreja obceca com a vida sexual alheia, com os gays, os transexuais (desconfio que têm pesadelos todas as noites com a ideologia de género), as mulheres não castas, os contracetivos e, acima de tudo, o aborto. Pobreza, exploração de recursos do planeta (que, afinal, é criação divina para católicos preservarem), racismo, exclusão dos mais vulneráveis, desigualdades sociais? Nada disso interessa. Pessoas por aí a fornicar fora do sacramento do matrimónio é que é grave.

A parte progressista da Igreja, mesmo se mantém a moral sexual, não lhe dá maior relevância. Como os espanhóis bem atestam, as penitências por escapadelas sexuais nas ordens mais progressistas são deveras leves. Já questões de exclusão social, pobreza, doença, abusos do capitalismo desregulado, refugiados, atentados ambientais e todos estes temas quentes sociais e económicos merecem grande atenção.

Este conservadorismo católico cai que nem uma luva na nova direita que se consolidou nos últimos anos. Negacionista das alterações climáticas com causa humana, tem as guerras culturais contra a modernidade como cimento estruturante, endeusamento do capitalismo desregulado, ataque ao Estado social, recusa absoluta de intervenção para corrigir injustiças e distorções e discriminações de longa duração (sejam sexuais, raciais, de classe social). O ódio e a vontade de exclusão dos diferentes, o dogmatismo. Tudo igual.

Até na incapacidade de conceber posições moderadas – considerando-as como a papel químicos do extremo oposto – são semelhantes. Aconteceu-me e acontece-me. Católicos ultraconservadores passaram anos a gritar-me, a cada vez que opinava sobre temas de religião e sexualidade, que não sou católica mas protestante. A nova direita dá-me como marxista – porque não lhes compro as guerras culturais nem construo templos garantindo que os mercados nunca erram.

Donde, não me espantei quando comecei a ler da proximidade entre Steve Bannon e os sinistros setores mais conservadores da Igreja que organizam a resistência ao Papa Francisco. Os media americanos – com aquela ingenuidade americana que vê de forma insuflada o poder dos seus nacionais – apresentavam Bannon como o homem que poderia deitar abaixo o Papa Francisco.

Que Bannon pretendesse reforçar os setores conservadores católicos era esperável. Já que bispos, religiosos e teólogos católicos, de qualquer inclinação, acolhessem alguém com as ideias e o percurso de Bannon, é problemático e reflete muito mal para a Igreja. A ex-mulher acusou-o de violência doméstica, tem atrás de si indícios de antissemitismo, promove ideologia da mais absoluta falta de caridade para os semelhantes (amor ao próximo, toca algum sino?), pretende isolacionismos nacionalistas (quando a Igreja é universal e universalista), aplaude construção de muros e prisão traumática de crianças migrantes. Só nos últimos dias Bannon foi preso por suspeitas de apropriação de fundos, porém já havia abundante matéria para se considerar um crápula sem escrúpulos.

E, no entanto, partes da Igreja associaram-se-lhe.

Não é caso singular. Antes das eleições europeias do ano passado, o Patriarcado publicou um quadro informando os fiéis dos partidos que, dizia, mais defendiam a vida. Declaração de apoio pouco subtil a esses partidos. Entre eles, o Chega. O quadro foi apagado depois de gerar polémica, mas ficou à vista que há, no Patriarcado, quem queira entrar na discussão partidária. E não se se incomode, até recomende, ideologias como a do Chega.

O líder deste partido repetidamente usa imagética e referências católicas. Já se deu como uma espécie de quarto pastorinho de Fátima, escolhido por Nossa Senhora. No twitter declarou querer ter todas as igrejas com ele. É frequente, nos mais ativos apoiantes do Chega das redes sociais, muitos deles da estrutura do partido, garantirem-se devotos católicos, lá pelo meio de publicações de ostensivo incentivo ao ódio aos mais variados e numerosos grupos, que são gente possuidora de uma grande manancial de rancor a distribuir por muitos lados – gays, transexuais, feministas, socialistas, ciganos, imigrantes, negros, refugiados, comunistas, moderados, a lista é quilométrica. A linguagem religiosa, sempre afastada da retórica política desde que tenho idade para me lembrar, é um recurso usado e abusado por esta direita extremista.

O italiano Salvini costuma enfeitar-se com crucifixos ostensivamente grandes e apresenta-se como um defensor da cristandade contra a invasão dos bárbaros maometanos. Na Polónia e na Hungria, a direita baseia grandemente as suas ideias políticas na supressão de direitos das mulheres e dos gays, de acordo com a moral católica mais conservadora.

Regressando à infelicidade Trump, na semana passada descreveu a crise da covid como um teste que Deus lhe fazia. Uma espécie de castigo bíblico: foste tão bem-sucedido economicamente, ficaste tão orgulhoso, que agora te castigo e terás de fazer novamente as tuas maravilhas na economia. Um bispo católico americano, Rick Stika, atacou no Twitter Joe Biden e apoiou Trump como aceitável líder antiaborto. A Kamala Harris menorizou-a como ‘sidekick’, mera ajudante. (Ah, o sexismo.)

Que há setores católicos prenhes de vontade de tornar o aborto no único assunto da política, promovendo uma política económica egoísta, bem como ódio a tudo o que é diferente e inovador – não tenho dúvidas. Conheço vários católicos no processo de radicalização infelizmente comum em pessoas de direita. Há vinte anos aceitavam Guterres como um político catita; presentemente partilham a propaganda dos mais populares sites de fake news de extrema-direita.

Mas causa-me estranheza que a porção progressista da Igreja não reaja mais a estas investidas. O Papa Francisco, afinal, também é dado como marxista por esta turba. No fim de semana, o Papa tuitou pedindo que se parasse de usar o nome de Deus para disseminar ódio e extremismo. Porém só o twitter e só Francisco é poucochinho.»

Maria João Marques

Há um mundo estranho, cheio de pessoas, fora do telemóvel

por estatuadesal

(Daniel Oliveira, in Expresso, 27/08/2020)

Daniel Oliveira

A destruição de regras de convivência que obriga os restantes comensais a acompanharem os desenhos animados, cenas de apanhados ou videochamada é a ilustração gráfica de como a alienação individual do espaço que nos rodeia mata a empatia com os outros. É o mesmo que torna normal o insulto quotidiano nas redes sociais. Imaginem como virá a ser quem já nasceu num mundo assim.


A uma mesa, adultos e crianças da mesma família regressam ao convívio depois da refeição. Cada um pega no seu telemóvel e lê, escreve, ouve e fala com pessoas que ali não estão. Parece que toda a mesa entra em estado de hibernação. Estou a ser injusto. A criança mais nova nunca chegou a interromper esse estado. Viu desenhos animados durante toda a refeição, com o som bem alto. Os pais conseguiram evitar o transtorno do aborrecimento infantil, ela perdeu a oportunidade de seguir conversas de adulto, crescer com isso ou, na pior das hipóteses, ganhar a resistência ao tédio que aguça a criatividade.

Ao ver aquela cena lembrei-me de um excelente filme de animação que fez furor há 12 anos: o "Wall-E". Numa nave, longe de um planeta destruído, a humanidade vivia sentada olhando para monitores, sem se mover, sem interagir com o espaço físico em que estava. Animais inúteis, totalmente tomados pelo prazer passivo de ver coisas que acontecem sem as poder viver. Já na altura se percebia como era premonitório um desenho animado bem mais sofisticado do que o entretenimento fazia crer.

Pagaremos no futuro esta estranha forma de socialização que se tornou no novo normal, em que a fuga ao contacto de quem está ao nosso lado nos faz viver as férias dos outros, as conversas dos outros, a vida dos outros. Pagaremos no futuro estas crianças protegidas do vazio, do silêncio, do tédio. Mas o que me custa é o que eu próprio paguei naquele jantar. Para além da criança, um outro adulto, noutra mesa, via vídeos aos gritos. De vez em quando mostrava aos amigos, que levantavam os olhos dos seus telemóveis, sorriam e voltavam para o seu torpor internauta. Num outro dia, na esplanada do mesmo restaurante, um homem falou durante quase uma hora em videochamada, na mesa ao lado.

Ao olhar para aquilo, consegui perceber parte dos problemas deste tempo. A atomização dos indivíduos tem consequências comezinhas e imediatas. A mais evidente que ali se sentia era a destruição de regras de convivência que há não muito tempo impediam que qualquer pessoa desatasse a ouvir alguma coisa aos gritos num restaurante, obrigando os restantes comensais a acompanharem desenhos animados, cenas de apanhados ou videochamadas aos gritos num restaurante. É a ilustração gráfica de como a alienação individual do espaço que nos rodeia mata a empatia com os outros. É o mesmo que torna normal o insulto quotidiano nas redes sociais. Imaginem como virá a ser quem já nasceu num mundo assim.

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Era uma vez um lar

Posted: 26 Aug 2020 03:38 AM PDT

«A Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva, em Reguengos de Monsaraz, foi o primeiro lar onde entrei na vida, era ainda aluna de Enfermagem. Lembro-me dos tectos altos do edifício, da simpatia da funcionária que nos recebeu, vestida com uma bata azul e branca aos quadradinhos, e de uma sala de convívio que me pareceu gigante. Infelizmente as recordações boas terminam aqui. E começa o cenário dantesco.

O meu estágio, note-se, não era na fundação. Mas eram as enfermeiras do centro de saúde da cidade que lá se deslocavam para fazer as dezenas de pensos diários. E, quando entrei numa camarata imensa, cheia de senhoras idosas acamadas, quase todas demenciadas e profundamente emagrecidas, nem fui capaz de perceber por que é que ali cheirava tanto a morte e a decomposição. Só quando começámos a destapar as feridas que lhes cobriam os corpos, literalmente da cabeça aos pés, é que percebi que tinha acabado de me confrontar, pela primeira vez, com o lugar onde a dignidade termina.

Como aluna de Enfermagem, ainda com insuficiente sentido crítico, fiz o melhor que consegui. Num esforço hercúleo para não fugir, franzi o sobrolho em concentração, coloquei um bocadinho de creme perfumado debaixo do nariz, tal como a minha orientadora tinha feito, e uma máscara. E depois passámos horas a fazer pensos.

Tudo isto que vos conto aconteceu em 2009 e suponho que, ao longo destes 11 anos, muita coisa tenha mudado. Só que aparentemente não mudou o suficiente. E sabem qual é o verdadeiro problema, muito maior que qualquer trica política? É que este lar está longe de ser caso único.

Contei há dias, na minha página pessoal de Facebook, que no início da minha carreira comecei a fazer umas horas num lar de onde acabei por me despedir após ser repreendida aos gritos porque, num dia quente de Agosto, coloquei protector 50+ no rosto de um idoso de 80 anos que andava a trabalhar na horta. Aparentemente e segundo me gritaram, o protector era demasiado caro para ser utilizado assim. Ainda estou para perceber o que raio seria este “assim”, mas nesse dia percebi que, nestes casos, não pode existir um “se não os podes vencer, junta-te a eles”. A única solução, quando não conseguimos mudar as más práticas, é vir embora e denunciar. Mesmo que as denúncias caiam quase sempre em saco roto.

Sei que é importante que no caso de Reguengos se apurem responsabilidades. Também sei as coisas terríveis que os meus colegas lá viram e viveram. Sei do cheiro a urina, dos idosos só de fralda, do calor abrasador e da falta de condições. Mas também sei que é ainda mais importante que nos façamos ouvir agora, enquanto sociedade, para mudar de uma vez por todas o paradigma de muitos lares deste país.

Não vou cair no caminho fácil do “se fossem cães estava toda a gente indignada”, porque, além de ser um argumento vazio, me parece falacioso. Eu também me preocupo com os cães. E isso não quer dizer que não me preocupe com os idosos. Ou com as crianças. Preocupo-me com todos aqueles que, sendo frágeis, temos obrigação de proteger. E preocupo-me ainda mais quando percebo que falhamos.

Reguengos pode servir como bode expiatório, mas está longe de ser caso único. Pensem nos lares que conhecem, pensem em quantos deles têm quartos individuais, em quantos respeitam a sabedoria dos idosos, em vez de os infantilizar, pensem naquelas salas de estar que parecem antecâmaras da morte… E as imobilizações? Já pensaram sobre isso? Todos os estudos apontam que as imobilizações não reduzem de forma significativa o número de acidentes, mas, ainda assim, continuamos a ver em todo o lado idosos presos a camas, cadeirões e cadeiras de rodas.

Parece-me que é altura, enquanto sociedade, de levantarmos a voz e de exigirmos respeito e dignidade para com aqueles que nos deram a vida. É altura de não nos calarmos, de denunciarmos, de não deixarmos passar, de pressionarmos a Segurança Social para que faça inspecções surpresa e para que não feche mais os olhos.

A minha avó, que felizmente esteve sempre em casa connosco, dizia muitas vezes: “Filho és, pai serás, como fizeres assim encontrarás.” E eu acho que podemos adaptar esta frase para um “novo és, velho serás”.

Para que Reguengos não se repita. Nunca mais.»

Carmen Garcia

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Esta crise também é de amnésia?

Posted: 25 Aug 2020 03:37 AM PDT

«Rufam os tambores da crise. O Mundo avança numa espiral de angústia e incerteza à medida que as piores previsões se vão tornando realidade, sem que possamos dizer que a pandemia foi domada.

Na maior crise das nossas vidas, o pior que podemos fazer é ceder ao medo, entrar em pânico e desaprender todas as lições do passado.

Compromissos fortes em torno de medidas que protegeram o emprego e os rendimentos evitaram a turbulência política quando saímos da anterior maior recessão das nossas vidas. E esse resultado não foi conseguido com desistência face às intransponíveis "inevitabilidades" da altura, mas sim com determinação e exigência. Também então as escolhas exigiam prudência e o país avançou porque tomou as decisões certas. Enfrentamos então a Comissão Europeia e os arautos da austeridade sabendo que o salário, a pensão, a proteção social e os serviços públicos são o nosso melhor escudo contra a crise. Acertamos - e nenhuma nova crise deve fazer-nos esquecer o que aprendemos.

A natureza da crise pode ser muito diferente, mas a sua dinâmica não se alterou. Quantos mais compromissos forem quebrados, quanto mais cortes, quanto mais rendimentos desprotegidos, maior e mais profunda será a recessão. É tentador acreditar que, no presente quadro de dificuldades, "sacrifícios" compensam - mas é mentira. E a responsabilidade da Esquerda que nunca se rendeu à doutrina do empobrecimento redentor é propor e negociar medidas fortes que deem ao país um rumo que não seja o da pobreza.

Há quem ache que, quando exigimos ao Governo que cumpra o que acordou connosco para o Orçamento de 2020, o que nos move seria a mera tentação de apresentar "boas notícias". Engana-se profundamente. É precisamente porque os próximos anos não trarão boas notícias que exigimos agora que o Governo contrate os 8400 profissionais para os quadros do SNS, tal como prometeu.

Move-nos a responsabilidade de responder por quem trabalha, por quem vive da sua pensão ou já está no desemprego. De responder pela qualidade do SNS e da Educação. Move-nos a urgência de retomar a produção e a certeza de que não é ceifando direitos e rendimentos que se colhe prosperidade. E move-nos também a decência de querer evitar uma nova injeção no Novo Banco que custaria ao país, num único golpe, mais do que as medidas exigentes que queremos incluir no Orçamento para 2021. Fácil - e talvez tentador - seria pôr em causa o salário e os rendimentos sem perguntar porque é que a crise não bate às portas do dono privado do Novo Banco.»

Mariana Mortágua

Shadow Gate, o vídeo censurado – Estado Profundo esmaga jornalista por dizer a verdade

por estatuadesal

(Paul Craig Roberts, in Resistir, 25/08/2020)

O link que postei anteriormente para o documentário Shadow Gate foi removido pelo Youtube. O documentário está incorporado neste artigo: www.thegatewaypundit.com/... . [NR]

Recomendo que o assista e que o guarde.

Está em pleno curso uma tentativa da imprensa de manter o documentário afastado do público. O Youtube mentiu ao dizer que o documentário violava a sua política sobre o discurso do ódio. Não há ódio no documentário. O que o filme violou foi a política dos media de ocultar a verdade ao povo.

O documentário apresenta dois denunciantes que estiveram envolvidos na recolha e utilização de informações obtidas ilicitamente. Este tipo de informação foi utilizado na tentativa de descarrilar a presidência de Trump.

O documentário mostra que o Estado Profundo (Deep State) inclui empresas de segurança privadas as quais têm acesso à informação que a NSA recolhe alegadamente para fins de segurança nacional, mas realmente a fim de controlar as nossas percepções e o nosso comportamento.

Quando os presidentes da Chefia do Estado-Maior Conjunto e os membros do alto escalão do aparelho de segurança nacional deixam a sua posição, tornam-se chefes de empresas de segurança privada para as quais são desviados os dados da NSA. O documentário dar-lhe-á uma ideia da dimensão e profundidade do Estado Profundo. Poderá ver os pormenores da Matriz (The Matrix) dentro da qual eles nos colocaram.

A censura no You Tube.
A jornalista que produziu o vídeo e o seu marido foram presos sob falsas acusações. Ao contrário de Julian Assange, eles não divulgaram qualquer informação classificada. Ambos os denunciantes são claramente identificados. O Estado Profundo está simplesmente a esconder qualquer informação sobre si mesmo. Seja o que for que os Estados Unidos sejam, não são certamente uma democracia com um governo responsável.

18/Agosto/2020

[NR] O vídeo também pode ser descarregado aqui: shadow_gate.mp4 (1,34 GB, clique com o botão direito do rato e faça Save As...). Se algum dos leitores puder legendá-lo, resistir.info agradece o envio de uma cópia.

O original encontra-se em www.paulcraigroberts.org/...

Este artigo encontra-se em https://resistir.info/ .