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quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

Isolar, isolar, testar, testar, vacinar, vacinar

Posted: 26 Jan 2021 09:02 AM PST

 


«Os subscritores desta tomada de posição quanto à situação sanitária que se vive no país são os mesmos que desde 2017 intervieram activamente na necessidade de haver uma nova Lei de Bases da Saúde, que veio a ser aprovada em Julho de 2019, e que há meses reclamam a elaboração do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, previsto naquela Lei. 

Contudo, perante o agravamento da pandemia por covid-19, verificado nos últimos dias, que está a levar o SNS ao limite das suas capacidades, entendem que se torna prioritário responder com todas as soluções ao dispor das autoridades de saúde de maneira a diminuir drasticamente a escalada de infectados, internamentos e óbitos que se estão a verificar. 

Consideram os subscritores que as medidas até agora tomadas, embora sejam necessárias para conter o agravamento ainda maior da situação, representam um compasso de espera para que seja posta em prática, em larga escala, a única solução que pode responder ao enorme número de acontecimentos indesejáveis que diariamente são noticiados. 

Não menosprezamos a importância do confinamento e de todas as medidas de protecção aconselhadas pelas autoridades de saúde. Defendemos que se torna necessário maior tomada de consciência por parte da população relativamente à gravidade do que se está a passar, defendendo a sua saúde e a dos outros. No entanto constituiria um grave erro de avaliação, com consequências sociais e epidemiológicas dificilmente controláveis, atribuir à população os danos que toda a sociedade está a sofrer. É na acção pedagógica que está a chave para que se verifique melhor compreensão e maior adesão ao aconselhamento que é prestado pelas autoridades. 

Entendemos que o governo tem procurado tomar as decisões que mais se ajustam aos desafios que tem de enfrentar, mas fê-lo baseado num modelo de intervenção que em vez de os antecipar ou prevenir foi quase sempre reactivo e de contenção de danos, acomodando-se às restrições orçamentais. Compreendemos que estamos perante riscos para a saúde de todos nunca antes conhecidos e que alguns erros e hesitações seriam sempre inevitáveis. Contudo, não basta admitir que se cometeram erros ou que algumas soluções foram mal equacionadas. Eles devem ser explicados de maneira a que o escrutínio democrático seja feito, mas também para que todos e cada um participe na prevenção desses erros. 

O princípio da transparência na tomada de decisões deve estar sempre presente, principalmente quando altera e colide com a vida das pessoas, obrigando-as a modificar hábitos, rotinas e modos de vida há muito adquiridos. Nestes casos, a opacidade da informação é um inimigo do combate à pandemia. Ter-se conhecimento dos fundamentos das decisões é não só um instrumento facilitador das soluções que em cada momento têm de ser tomadas, considerando a sua evidência científica, mas também um factor de aceitação e cumprimento da decisão. 

Os subscritores consideram que as medidas intercalares que estão a ser tomadas não devem ser consideradas como um fim, mas como um meio para ganhar tempo até que a vacinação massiva seja possível. Isso seria criar falsas expectativas quanto ao caminho que há a percorrer até que a pandemia esteja controlada. 

No entanto, só será possível minimizar o impacto do atual descontrolo da propagação da infeção recrutando todas as competências técnicas e científicas ao serviço de políticas mobilizadoras, fundamentadas na investigação. Compete, por outro lado, aos governantes proceder à avaliação política da situação objetiva por forma a envolver simultaneamente a população e todos os agentes que, no terreno, intervêm na aplicação das decisões que tecnicamente são consideradas as mais aconselhadas. 

O único motivo que leva os subscritores a tornar pública esta tomada de posição é a saúde da população e as insuficiências que se estão a verificar nas respostas que estão a ser dadas. Toda a capacidade instalada tem de ser colocada ao serviço de quem está doente. Em situações excepcionais têm de ser tomadas medidas excepcionais. Se há recursos que ainda não estão a ser aproveitados no sector social e privado eles devem ser de imediato accionados de maneira a que não se verifique o agravamento ainda maior da situação pandémica. Todos, sem excepção, têm o dever de solidariamente contribuir para debelar esta catástrofe sanitária. Cabe, por isso, ao governo tomar as decisões que previnam males maiores para o que está a acontecer. 

O governo deve investir todos os seus esforços na vacinação, sem esquecer a logística e a quantidade de profissionais necessários para que no menor espaço de tempo possível se consiga fazer a cobertura da grande maioria da população, considerando os critérios de risco etário, social e epidemiológico. Este é um aspecto crítico do planeamento, que deve estar suficientemente delineado de maneira a não se verificarem falhas na sua aplicação. Nomeadamente, deverá ser público, elaborado por escrito e tecnicamente fundamentado. Qualquer alteração ao seu cumprimento, por motivos imponderáveis, também deverá ser de imediato publicamente justificada. 

Estando a verificar-se algumas dificuldades na produção de vacinas por parte dos laboratórios que abastecem a União Europeia, compete à presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, com o apoio dos outros estados membros, proceder às diligências indispensáveis para que este défice seja rapidamente ultrapassado, por exemplo, adquirindo vacinas a quem está em condições de as fornecer sem quebra de compromissos e garantia da qualidade. Estão em jogo milhões de vidas em toda a Europa e é inaceitável que o planeamento das necessidades não tenha sido feito com o máximo rigor exigido.» 

25 de Janeiro de 2021

Adelino Fortunato (economista); Aguinaldo Cabral (médico); Ana Feijão (médico); Ana Matos Pires (médica); Ana Prata (jurista); André Barata (jurista); Antónia Lavinha (médica); António Avelãs (professor); António Rodrigues (médico); Armando Brito Sá (médico); Augusta Sousa (enfermeira); Carlos Ramalhão (médico); Cipriano Justo (médico); Corália Vicente (matemática); Daniel Adrião (consultor); David Pires Barreira (psicólogo); Fernando Gomes (médico); Fernando Martinho (médico); Gregória Caeiro Von Amann (médica); Guadalupe Simões (enfermeira); Helena Roseta (arquitecta); Heloísa Santos (médica); Jaime Correia de Sousa (médico); Jaime Mendes (médico); João Lavinha (investigador); João Proença (médico); Jorge Espírito Santo (médico); José Aranda da Silva (farmacêutico); José Calheiros (médico); José Carlos Martins (enfermeiro); José Manuel Boavida (médico); José Maria Castro Caldas (economista); José Reis (economista); Luiz Gamito (médico); Luísa d´Espiney (enfermeira) ; Maria Deolinda Barata (médica); Maria João Andrade (médica); Maria Manuel Deveza (médica); Mariana Neto (médica); Mário Jorge Neves (médico); Nídia Zózimo (médica); Paulo Fidalgo (médico); Pedro Ferreira (matemático); Ricardo Sá Fernandes (advogado); Sérgio Esperança (médico) ; Sérgio Manso Pinheiro (geógrafo); Sofia Crisóstomo (farmacêutica); Teresa Gago (dentista)

(Recebido por mail) 

terça-feira, 26 de janeiro de 2021

Já não escutam só jornalistas…


por estatuadesal

(Dieter Dellinger, in Facebook, 23/01/2021)

O Ministério Público anda a escutar o Primeiro-ministro António Costa nas conversas com os seus ministros Matos Fernandes, João Galamba e Siza Vieira.O Expresso diz que foram apanhados em escutas. O jornalixo do Balsemão devia saber que ninguém é apanhado em escutas telefónicas. Há é pessoal corrupto do Ministério Público que anda a escutar, utilizando a aparelhagem que dispõe para ver se consegue chantagear o governo ou atirar-se a ele por um motivo inventado, o que é sempre fácil.

E há uma invenção que seria o hidrogénio verde em estudo pelos governantes sem que tenha sido tomada alguma decisão ou iniciado sequer um estudo por parte de técnicos contratados. Este caso como a perseguição pidesca a jornalistas revela que há uma máfia dirigida pela Lucília com o objetivo de arranjar uma intriga para deitar abaixo o governo atual, a braços com o problema da pandemia e da crise económica. A judicatura deve estar com o fascismo e gostaria de arranjar uma crise política, aproveitando os problemas atuais. Para o MP, parece que o governo só pode estudar e discutir um assunto com a autorização de pessoas que não foram eleitas para governar e tentam arranjar uma intriga a antecipadamente a qualquer decisão. O assunto foi ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça António Piçarra que mandou destruir as escutas por não terem nada de relevante ou matéria criminal. Sucede que um governo só trata e estuda ou discute assuntos relevantes. O governo não é um grupo de procuradores e oficiais de justiça que cometem o crime de escutar aos modos da Pide os membros de um governo. Apesar da ordem do Presidente do STJ, o MP recorreu e quer manter as escutas. Os jornalixos do Expresso utilizam uma terminologia malévola ao escrever que o governo foi apanhado em escutas. Ora, ninguém é apanhado em escutas. Os procuradores é que com uma mentalidade de pides ou agentes dos serviços secretos chineses ou russos é que iniciam escutas ilegais e altamente mafiosas. Mesmo que não se tratasse de um governo, o que é gravíssimo, mas de simples cidadão, o MP não deve colocar ninguém em escuta que é algo não autorizado automaticamente aos procuradores sem ordens de um juiz. Em Portugal, o MP considera-se o dono disto tudo e quer ser mais que o governo, a Constituição, a Assembleia da República e a própria presidência da República.

O António Costa anda a ser manietado pelo MP. Por isso encarregou um empresa estrangeira para selecionar as pessoas para a nova direção da RDP/RTP e também por isso pediu ao Quartel-general da Nato para estudar qual a arma mais adequada para substituir as velhíssimas e gastas G-3. Assim, o MP e a Lucília que escutem a NATO e tentem processá-la. Do modo de atuar do MP temos de tirar ilações lógicas nada abonatórias da honra, dignidade e profissionalismo dos atuais procuradores. Podemos dizer que são politicamente corruptos no sentido de estarem a trabalhar para intrigar a opinião pública contra um governo. Sabem que podem acusar quem querem, fazer uma espécie de julgamento através dos pasquinas e daqui a dez anos talvez a falsa acusação chegue à sala de um tribunal. Veja-se o caso Sócrates que foi condenado ilicitamente na praça pública em corrupção com o pasquim CM pela judicatura e passados cerca de dez anos não foi a julgamento.

Há em Portugal uma grande admiração pelas ditaduras assassinas e parece haver uma vontade da judicatura de instaurar uma ditadura. Como as Forças Armadas não podem ser utilizadas para o efeito porque a União Europeia não deixa ou cortava logo os dinheiros, nada como inventar processos-crime com a aparência de serem legais.

São muitas as pessoas que admiram as ditaduras chinesa e russa e daí atacarem-me sempre escrevo críticas a essas ditaduras. O meu objetivo é precisamente destruir os argumentos daqueles que querem uma ditadura para Portugal. Sim quem gosta da ditadura chinesa é porque desejava que existisse o mesmo na nossa Pátria, são os inimigos de Portugal.

O Ministério Pública com as suas escutas à Pide, Gestapo, etc. viu o seu futuro derrotado no terceiro lugar do fascista Ventura, aquele que se pudesse legislava a favor da liberdade do poder judicial escutar e, por Ventura, prender e torturar indiscriminadamente. O vírus está lá e vimos como os agentes policiais do SEF assassinaram um pacato cidadão ucraniano. Claro, isto é exagero meu, mas mais uma dedução ou ilação do pensamento anti extremista. 

Lá vai o português

Posted: 25 Jan 2021 03:58 AM PST

 



Hoje só me apetece sacudir o pó e regressar aos meus clássicos que já se foram embora e é Cardoso Pires que me acompanha.

«Lá vai o português, diz o mundo, quando diz, apontando umas criaturas carregadas de História que formigam à margem da Europa.

Lá vai o português… lá anda. Dobrado ao peso da História, carregando-a de facto, e que remédio – índias, naufrágios, cruzes de padrão (as mais pesadas). Labuta a côdea do sol-a-sol e já nem sabe se sonha ou se recorda. Mal nasce deixa de ser criança: fica logo com oito séculos.

No grande atlas dos humanos talvez figure como um ser mirrado de corpo, mirrado e ressequido, mas que outra forma poderia ele ter depois de tantas gerações a lavrar sal e cascalho? Repare-se que foi remetido pelos mares a uma estreita faixa de litoral (Lusitânia, assim chamada) e que se cravou nela com unhas e dentes, com amor, com desespero, ou lá o que é. Quer isto dizer que está preso à Europa pela ponta, pelo que sobra dela, para não se deixar devolver aos oceanos que descobriu, com muita honra. E nisto não é como o coral que faz pé firme num ondular de cores vivas, mercados e joalharia; é antes como o mexilhão cativo, pobre e obscuro, já sem água, todo crespo, que vive a contra-corrente no anonimato do rochedo. (De modo que quando a tormenta varre a Europa é ele que a suporta e se faz pedra, mais obscuro ainda).

Tem pele de árabe, dizem. Olhos de cartógrafo, travo de especiarias. Em matéria de argúcias será judeu, porém não tenaz: paciente apenas. Nos engenhos da fome, oriental. Há mesmo quem lhe descubra qualquer coisa de grego, que é outra criatura de muitíssima História.

Chega-se a perguntar: está vivo? E claro que está: vivo e humilhado de tanto se devorar por dentro. Observado de perto pode até notar-se que escoa um brilho de humor por sob a casca, um riso cruel, de si para si, que lhe serve de distância para resistir e que herdou dos mais heróicos, com Fernão Mendes à cabeça, seu avô de tempestades. Isto porque, lá de quando em quando, abre muito em segredo a casca empedernida e, então sim, vê-se-lhe uma cicatriz mordaz que é o tal humor. Depois fecha-se outra vez no escuro, no olvidado.

Lá anda, é deixá-lo. Coberto de luto, suporta o sol africano que coze o pão na planície; mais a norte veste-se de palha e vai atrás da cabra pelas fragas nordestinas. Empurra bois para o mar, lavra sargaços; pesca dos restos, cultiva na rocha. Em Lisboa, é trepador de colinas e de calçadas; mouro à esquina, acocorado diante do prato. Em Paris e nos Quintos dos Infernos topa-a-tudo e minador. Mas esteja onde estiver, na hora mais íntima lembrará sempre um cismador deserto, voltado para o mar.

É um pouco assim o nosso irmão português. Somos assim, bem o sabemos.

Assim, como?»

José Cardoso Pires, E Agora, José?, 1977 

Eu fui contra esta campanha

 

por estatuadesal

(Joana Gomes Cardoso*, in Facebook, 25/01/2021)

(A Estátua não fez campanha por nenhum candidato de esquerda, apesar de ser à esquerda o sentido do seu voto. Mas agora, eleições passadas, não posso deixar de publicar este brilhante texto, cuja autora é filha de Ana Gomes. É que não é uma declaração de amor filial mas uma excelente análise política do que se jogou nas eleições e dos desafios, que o cenário que delas resulta, irá colocar nos tempos próximos a todos os democratas deste país, nomeadamente às forças políticas de esquerda.

Estátua de Sal, 25/01/2021)


Eu fui contra esta campanha. Por razões pessoais mas também pela evidente falta de meios e de apoio político, e por adivinhar que a esquerda não teria a maturidade nem a sageza para se unir, apesar dos riscos evidentes.

Depois do que aconteceu ontem vejo como estava enganada. A candidatura de Ana Gomes foi fundamental para este país poder manter a cabeça erguida. Os resultados, como a própria disse, foram uma desilusão, mas podia ter sido bem pior se o seu sentido de missão e de serviço público não tivesse prevalecido.

Ana Gomes cometeu erros. O primeiro deles foi não se reger pelas lógicas e cálculos eleitorais vigentes e dizer o que pensa, mesmo quando sabia que isso a faria perder votos. Mas essa é também a sua força. A vantagem de não precisar de um cargo e de ser uma pessoa livre é poder fazê-lo. Porque não eram as eleições que lhe interessavam, obviamente sabia que perderia, eram os valores e a postura que defendeu, para que tenham um legado e um futuro, que extravasa muito estas eleições. (Pena que tantos à esquerda não o tenham percebido).

E a única questão que importa agora é essa: o amanhã. O país que vamos ter amanhã. Da minha parte, muito descobri e aprendi nestas eleições. Já lá vamos. O mais importante é que há muito por fazer, muitas pessoas que deixaram de acreditar no Estado, nos eleitos, e que precisam de ser agarradas. Mas como e quem?

Quando precisávamos de um PS forte e inequívoco na defesa dos valores que importam, assistimos a um partido decadente e sem princípios. Carlos Cesar personifica-o lindamente, não podiam ter escolhido melhor, mas também todos aqueles que por cálculos políticos não votaram em consciência. Com muita pena e preocupação, não acredito que este PS seja capaz de agarrar o país com a urgência que é necessária, está demasiado comprometido e complacente. As legislativas o dirão muito brevemente.

E o PSD? Numa altura em que o país precisa desesperadamente de adultos honestos na sala, o Rui Rio presta-se a um papel que envergonha todos aqueles que no PSD se bateram e batem por um país democratico e pelos valores da social-democracia. Onde estão essas pessoas? Apareçam por favor, que por este andar não é só ele próprio que Rio vai afundar.

E depois temos a imprensa (o PC e o BE, e os seus eleitores, não me suscitam qualquer reação, confesso - não carecia, é só). Como ex-jornalista não alinho em diabolizações gratuitas. Há muito bom jornalista por aí, sem os quais não saberíamos da missa à metade. Mas há directores de informação, e de entretenimento, com responsabilidade no que vemos - e sobretudo no que não vemos.

As escolhas dos comentadores de ontem foram elucidativas quanto à falta de representação, a todos os níveis: não há mulheres, não há minorias, uma pobreza. E depois ainda há os supostos comentadores liberais ou de esquerda, como Pedro Marques Lopes e Pedro Adão e Silva, que com pena minha mostraram que não são livres, têm agendas e cálculos, muito evidentes, como tantos outros.

De todos, o pior insulto que fizeram a Ana Gomes nestas eleições foi chamar-lhe populista. Ousar chamar a uma pessoa que não fez outra coisa na vida que dedicar-se a serviço público e lutar por causas perdidas, (sem tachos em troca), e compará-la a um arrivista sem princípios que nada fez pelo país até hoje, é a maior desonestidade intelectual a que assisti.

Já não falo do 25 de Abril. Lembrem-se quem estava lá quando Timor era uma causa esquecida de Portugal, quem denunciou os vôos da CIA, quem expôs a corrupção angolana patrocinada por Portugal, quem denunciou Sócrates apesar de ser o líder do seu partido, quem denunciou a morte da Gisberta no Parlamento Europeu, quem levou para Bruxelas a democracia da Etiópia e a morte da jornalista Daphne Caruana de Malta. Nem de propósito, uso as palavras que Ana Gomes usou quando o PS esticou a passadeira vermelha para o Primeiro Ministro de Malta (já então suspeito de encobrir o assassinato): shame on you, shame on you.

E sim, sou filha desta pessoa. O que habitualmente me leva a ter muito pudor e não dizer nada. Porque já levo bastante por tabela e porque não a represento, nem ela a mim. Mas hoje digo, a alto e bom som: tenho o maior orgulho do mundo na minha mãe. Uma pessoa que não deve nada a ninguém e que se dependesse de mim não se tinha metido nisto. Estaria alegremente a escrever o seu livro de memórias sobre Timor e a estragar os netos de mimos.

Mas a minha mãe, como o meu pai, e como uma geração inteira que infelizmente está desaparecer da vida activa, tem um sentido de patriotismo e de dever público muito específico, que em nada se parece com o acvitismo de sofá ou de televisão, nem a preocupação pela popularidade, que tanto vemos por aí.

A todos esses: divirtam-se. Deste lado a consciência está tranquila, dorme-se bem de noite. E a luta continuará. Com a voz e os trejeitos que não estão na moda. Teimosa, e inconveniente às vezes. Cometendo erros. Sem escolher o caminho fácil ou evidente. Mas sempre do lado certo e com uma coragem e dedicação que inspira, e há lá coisa melhor que isso...

Aliás, disseram-lhe para não ligar ao jovens, que não votam, e sabem qual foi a resposta? Então o que é que eu ando cá a fazer? 🙂

(P.S. não vou responder nem comentar, só quis escrever isto, porque na nossa família quem não sente não é filho de boa gente. a foto da Ana Gomes, diplomata bem comportada é do Eduardo Gageiro. apeteceu-me).


  • A autora é filha da candidata Ana Gomes.

O uno e o múltiplo: lições das presidenciais

 

por estatuadesal

(Porfírio Silva, in Blog MaquinaEspeculativa, 25/01/2021)

Em maio de 2020, quando foi possível debater explicitamente as eleições presidenciais nos órgãos do meu partido, apresentei o meu ponto de vista, com dois alertas (como foi noticiado, com razoável rigor, por exemplo aqui). 

Primeiro, o apoio, declarado ou implícito, do PS a Marcelo Rebelo de Sousa introduziria desequilíbrios no regime democrático, porque, ao criar a expectativa de uma votação esmagadora (com o apoio de todos os partidos que alguma vez governaram Portugal em democracia constitucional), abriria um novo espaço à direita extrema, oferecendo-lhe o bónus de ser a principal novidade das presidenciais e, consequentemente, o palco da campanha, sendo desse palco que vivem os movimentos contra o sistema democrático. Com a agravante de que o palco à extrema-direita perturba a capacidade do PSD para ser uma alternativa decente de governo.

Segundo, alertei para o perigo de, naquele cenário de união de facto com MRS, virmos a ter na área socialista somente uma candidatura populista, sem histórico de um programa de esquerda articulado e coerente, mas vocal na crítica à política e nos ataques ao PS.

2. Infelizmente, creio hoje que os factos mostram que tinha razão.

A reeleição de MRS é um resultado que, em si mesmo, nem coloca em perigo nem enfraquece a democracia. Pode vir a ser um risco para a governação socialista, e é provável que isso aconteça no segundo mandato, mas isso é diferente de afectar a democracia. Aliás, MRS não descurou o ataque político ao candidato extremista, em nome de uma direita democrática que não se inibe de invocar o Papa Francisco ou Sá Carneiro. 

Entretanto, a expectativa de uma fácil reeleição abriu o palco ao candidato extremista. Um candidato com capacidade para representar toda a diversidade do espaço do PS teria criado uma verdadeira disputa pelo resultado e teria a vantagem de reduzir a margem de espectáculo para AV, estreitado a sua margem de progressão eleitoral.

Obviamente, a candidatura de uma militante socialista não foi capaz de preencher esse papel, na medida em que resvalou permanentemente para o discurso de uma candidatura contra o PS, insistiu nos temas do populismo justiceiro que sabe serem inaceitáveis para muitos democratas e, finalmente, decidiu misturar a candidatura com a vida interna dos socialistas (pecado mortal de qualquer candidato, qualquer que seja o partido que implique). Tentei alertar para esse perigo, em Carta aberta a Ana Gomes, mas de nada serviu. O resultado está à vista, mesmo quando os candidatos não assumem a responsabilidade pelos seus maus resultados e tentam sacudi-los para os ombros de outrem.

3. Não votei MRS (não me basta achar que um candidato é decente para lhe dar o meu voto, até porque espero que a maioria dos candidatos sejam decentes), mas entendo que muitos socialistas tenham votado na reeleição. Gostando mais ou menos do estilo às vezes excessivamente dominado pela necessidade de ser popular, ou até discordando de algumas das suas posições políticas, uma esmagadora maioria dos portugueses valoriza positivamente a descrispação e a normalização da vida política nacional que MRS operou desde o início do seu primeiro mandato. Basta lembrar que o antecessor foi Anibal Cavaco Silva… para dar logo alguma tolerância a MRS.

Aliás, o PS, ao definir a sua posição face às presidenciais, não podia ignorar que uma maioria do seu eleitorado estava inclinado para votar no PR em exercício: os partidos não podem pensar que podem definir as suas posições ignorando as posições de partida do seu eleitorado. De qualquer modo, o PS tem de fazer, agora, o trabalho de curar as feridas abertas entre os seus militantes e entre os seus eleitores por esta campanha e eleição presidencial.

4. O resultado, alto, excessivamente alto, da extrema-direita, é uma preocupação para todos os democratas. É um problema que está alojado no campo da direita, mas, sendo um factor de contaminação da direita, sendo uma dinâmica que põe em causa a autonomia estratégica da direita democrática, afecta todo o sistema político. Um país democrático precisa de uma direita democrática – e, neste momento, não vejo nenhum partido de direita a assumir um claro combate às teses iníquas do partido fascistóide. Isso é um problema de todos os democratas. Rui Rio não percebe isso e fez uma declaração na noite eleitoral onde o principal destaque foi o seu empenho em sublinhar os sucessos do candidato protofascista.

5. A esquerda que não votou MRS dividiu-se, mas não foi isso que a fez perder eleitoralmente. A ideia de que seria preferível uma candidatura única da esquerda é o regresso à ilusão de uma esquerda unitária, ilusão essa que só se pode alimentar de um completo desconhecimento da sociedade portuguesa e de um grande desapreço pela diversidade ideológica e política da esquerda. A fixação na mítica unidade por obrigação persegue a esquerda há décadas e ainda não foi compreendida na sua negatividade intrínseca. Não precisamos de bloco homogéneo contra bloco homogéneo, precisamos de pluralismo, precisamos de diversidade e, acresce, precisamos de capacidade para o compromisso. A pluralidade é complexa e os simplistas querem ter pouco trabalho com a deliberação democrática. Essa mitologia tem de ser desconstruída, para podermos, à esquerda, fazer o que é necessário sem um pesado nevoeiro de ilusões.  6. A esquerda de que precisamos é uma esquerda plural que assuma as suas responsabilidades. Na transição de legislaturas, a solução política que a direita baptizou de “geringonça” desconcentrou-se. Depois de uma legislatura em que um governo minoritário do PS e uma maioria parlamentar plural de esquerda conseguiram desmontar o rumo austeritário e imprimir um rumo de progresso social e económico, e de umas eleições legislativas em que o país renovou a confiança nessa fórmula, com reforço do PS, a cidadania assistiu a uma série de desentendimentos, sobre cuja repartição de responsabilidades não vou aqui insistir, mas que transmitiram ao país a mensagem de que a cooperação estruturada à esquerda estava desordenada. Sem voltar aqui à distribuição de culpas, é evidente que o voto contra do BE no OE 2021 sinalizou uma emergência política: a insensibilidade de uma parte da esquerda às nossas responsabilidades comuns em respondermos conjuntamente ao país. Sem ser cada um por si. Sem ser o salve-se quem puder. Sem a perigosa ilusão de passar as culpas. Especialmente quando enfrentamos a crise maior das nossas vidas, provocada pela pandemia.  

7. Para assumir as suas responsabilidades, a Esquerda Plural (o PS, o BE, o PCP, o PEV) tem de voltar a sentar-se à mesa e assinar um compromisso político conjunto, com um horizonte pelo menos até ao fim da corrente legislatura, onde fique traçado o essencial do rumo e do método para darmos ao país a estabilidade política positiva que é necessária para fazermos frente à pandemia – e para vencermos a pandemia dentro da pandemia que é o aumento das desigualdades sociais.

Se não reunirmos as ferramentas para podermos fazer o que o país necessita, e se deixarmos a direita tomar conta do país neste contexto, o nosso povo sofrerá de novo o peso das políticas anti-sociais da anterior crise. A Esquerda Plural não pode desperdiçar energias e deve concentrar-se, focar-se no essencial – o que passa por um compromisso claro acerca, precisamente, do que é essencial e prioritário.

8. Entretanto, o PS só pode fazer a sua parte neste processo se mantiver a sua identidade e preservar a sua autonomia estratégica.  Tenho a noção das diferenças entre o PS e o BE, e das diferenças entre o PS e o PCP. Não acho sequer que possa ser útil para o Bloco que o PS queira parecer ter as mesmas políticas que o Bloco. Ou que seja útil para o PCP que o PS queira parecer ter as mesmas políticas que os comunistas. Ou que seja útil para a democracia que o PS queira parecer igual a outros partidos, de esquerda ou de direita. O PS só pôde cumprir as suas responsabilidades históricas, desde a clandestinidade, passando pelo período revolucionário, até hoje, porque os socialistas souberam preservar a autonomia estratégica do nosso partido, o partido do socialismo democrático. Preservar a nossa autonomia estratégica é agir de forma a podermos continuar a seguir os nossos critérios nas nossas opções políticas, o que depende de entendermos a nossa identidade histórica e nunca esquecermos o que os portugueses esperam de nós. Só faremos a nossa parte na Esquerda Plural se assumirmos as nossas próprias propostas e o nosso próprio perfil – e, a partir daí, sermos a peça fundamental de uma governação progressista agregadora e mobilizadora.

9. Cabe ao PS entender a dinâmica do uno e do múltiplo e dar um contributo decisivo para definir e concretizar um rumo partilhado pela Esquerda Plural, com os olhos postos no país, especialmente nos mais carenciados e desprotegidos e nos que contribuem, com o seu trabalho, para o desenvolvimento e a coesão entre portugueses. Isso é essencial, também, para travar a caminhada da extrema-direita.