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segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

 

Síria: É sobre dinheiro, dinheiro, dinheiro

By estatuadesal on Dezembro 15, 2024

(Martin Jay, in Strategic Culture Foundation, 13/12/2024, Trad. da Estátua)

Como é possível que os jihadistas apoiados pelo Ocidente no controle de Damasco tenham um chefe que está na lista de procurados nos EUA por ser terrorista?



Os políticos ocidentais estão a trabalhar o dobro para enganar o público crédulo, que está atordoado e confuso sobre a derrocada do regime de Assad, enquanto alguns membros mais astutos do público podem questionar como é possível que os jihadistas que agora controlam Damasco tenham, não só sido pagos com dinheiro dos impostos dos EUA, mas tenham também um chefe que está na lista de procurados nos EUA por ser terrorista..

Avance o deputado super idiota David Lammy, a versão negra e trapalhona de uma personagem de desenhos animados chamada Magoo. No entanto, o Sr. Lammy não é tão burro como parece, por isso, preste atenção às suas fortuitas intervenções no parlamento britânico para explicar tudo aos eleitores que ele supõe serem mais ou menos acéfalos.

Recentemente, o deputado Brendan O'Hara fez uma declaração justificando o bombardeamento israelita na Síria que coincidiu com a tomada de Damasco pelo grupo terrorista HTS, presumivelmente para garantir que a artilharia pesada, aviões e barcos não caiam nas mãos de um bando de barbudos sujos, que, Deus nos livre, podem usar isso contra os seus patrocinadores.

Os Estados Unidos aprenderam a lição com a estonteante operação estúpida no Afeganistão, onde soldados americanos deixaram veículos blindados, tanques e até aeronaves aos Talibãs antes que de fugirem? Possivelmente. Mas pode haver outras razões, como sejam poderem estar os americanos a considerar uma segunda operação pela qual eles - ou os seus representantes - quererão derrubar aqueles que agora estão no poder.

Isso não é tão absurdo quanto parece, dada a quantidade de mentiras descaradas que estão agora a ser inventadas e devidamente processadas por uma liga de jornalistas de call center que nem conseguem encontrar Homs num mapa da Síria. "O grupo que apoiámos para derrubar Assad acabou por não levar a sério a ideia de virar uma nova página. Não se pode confiar em Joulani, como você deve saber…” será o tipo de conversa oferecida a um grupo de jornalistas na conferência de imprensa da Casa Branca. A maioria das pessoas engolirá isso.

Entretanto, vale a pena dar uma espreitadela nas divagações dos parlamentares que defendem a destruição.

É correto entender que Israel tem preocupações legítimas de segurança num país que abriga o ISIS [ISIL] e a Al-Qaeda”, disse Lammy em resposta a uma pergunta parlamentar do deputado Brendan O'Hara, acrescentando que havia falado com um seu colega israelita.

“É por todas essas razões que queremos uma sociedade inclusiva que apoie a todos, mas nenhum de nós pode ter relações com grupos terroristas”, disse ele.

Estranho que ele tenha esquecido de mencionar que os mesmos grupos terroristas aos quais ele se referiu estão na folha de pagamento dos EUA e alinhados tanto com o Reino Unido como com os EUA. Ou isso significa que agora que os terroristas entregaram o regime de Assad aos EUA e a Israel, o seu papel não é mais relevante e, portanto, eles precisam de ser eliminados?

É difícil entender a conversa fiada de Lammy quando, evidentemente, o homem mal entende a imagem da Síria e parece estar lendo um roteiro. Lammy, afinal, foi recentemente apontado por uma investigação independente no Reino Unido que identificou uma dúzia de parlamentares que receberam dinheiro de Israel.

A história da Síria é de traição, traição e asneiras em grande escala, pelo que, afinal, não deixa de ser expectável, que os parlamentares britânicos que estão aproveitando o dinheiro de Israel também adotem os pontos de discussão preparados pelas IDF.

 No final das contas, foi o dinheiro que desempenhou um grande papel no golpe sem derramamento de sangue provocando um sucesso estrondoso, então talvez seja o dinheiro que agora está a ditar a narrativa no Reino Unido? Claro, o enfraquecimento do Hezbollah no Líbano e a Rússia não apoiar mais Assad também foram fatores. Mas o dinheiro fez o seu trabalho.

Atualmente, um capanga médio com barba e uma AK no HTS ganha cerca de 2.000 dólares por mês. Não é uma grande quantia, pode você pensar. Mas na Síria, um dos países mais pobres do mundo, com uma moeda local constantemente desvalorizada, essa quantia é significativa para um soldado do exército sírio que ganha apenas 7 dólares por mês.

Foi feito um acordo, e é por isso que os soldados do regime não resistiram. Esses eram os mesmos soldados que tiveram que recorrer à fabricação e venda de pílulas Captagon, simplesmente para ganhar alguns dólares para pagar as suas contas mensais de comida. Assim como em 2003, quando o governo dos EUA se recusou a pagar os salários atrasados ​​dos soldados de Saddam – que fugiram dos seus postos com as suas armas e criaram o que mais tarde ficou conhecido como ISIS ou ISIL – hoje, a mesma história repete-se.

Assad poderia ter permanecido no poder até à sua velhice se tivesse pago melhor aos seus soldados e permitido que a Rússia os treinasse. Por alguns dólares a mais.

Soldados do regime sírio ou políticos britânicos. Todos eles têm seu preço. Tente não pensar no hit pop dos anos 90 de Jessie J chamado 'Price Tag' que saiu no mesmo ano em que a guerra na Síria começou.

Não é sobre dinheiro, dinheiro, dinheiro

Não precisamos do seu dinheiro, dinheiro, dinheiro

Só queremos fazer o mundo dançar

Esqueça o preço

sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

 

As encruzilhadas de Zelensky

By estatuadesal on Dezembro 13, 2024

(Major-General Carlos Branco, in Diário de Notícias, 11/12/2024)

Para a história ficam os líderes ocidentais e um presidente ucraniano que optaram por empurrar um país para a desgraça em vez de negociar no devido tempo. Por tudo isto, o futuro de Zelensky e da Ucrânia não será promissor.



Em duas entrevistas recentes, uma delas à Sky News, o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky mostrou-se disponível para ceder temporariamente os territórios ucranianos sob controlo russo, sem deixar de sublinhar a intenção de os recuperar posteriormente pela via diplomática, mas em troca pela admissão da Ucrânia na NATO, com as áreas atualmente sob o controlo de Kiev. A apresentação desta proposta foi feita com algum sentido de urgência, “temos de atuar rapidamente”. O cessar-fogo é essencial para “garantir que Putin não se apodere de mais território ucraniano”. Num assombro de realismo, Zelensky admite, portanto, que Moscovo se encontra em vantagem.

Não exatamente alinhado com Zelensky, mas numa onda semelhante, o seu Chefe de Gabinete, Andriy Yermak, numa entrevista à publicação sueca Dagens Industri afirmou que as negociações com a Rússia poderiam começar se a situação no terreno regressar à de 23 de fevereiro de 2022. Ou seja, mostrava-se aparentemente disponível para deixar cair a Crimeia. Esta aparente mudança de posição mostrando abertura para uma concessão temporária de território tem sido apresentada como uma “evolução significativa” da posição ucraniana. Na verdade, assim não é. Procuraremos perceber porquê.

Ao contrário daquilo que a comunicação ocidental nos tem vindo a fazer crer, por exemplo, ao comparar Zelensky com Churchill, o presidente ucraniano tem pouca margem de manobra, limitando-se a fazer o que lhe mandam, cedendo às pressões de atores exteriores, com os EUA e o Reino Unido à cabeça, e internos, às alas ultranacionalistas da sociedade, que apesar de não disporem de uma expressão eleitoral significativa, exercem uma enorme influência na vida política do país, devido ao controlo das forças armadas e de segurança. Por outras palavras, Zelensky não dirige, é dirigido. As suas contradições levam-no frequentemente a afirmar uma coisa e o seu contrário.

Foi assim quando incumpriu a promessa eleitoral de resolver o problema do Donbass, que lhe permitiu obter uma vitória eleitoral avassaladora sobre Petro Poroshenko, em 2019. A sua “determinação” esfumou-se quando os militantes ultranacionalistas o encostaram à parede e ameaçaram fisicamente, se prosseguisse com o projeto de reconciliação com as duas repúblicas secessionistas, inscrito no topo da sua agenda eleitoral.

Foi assim, também, durante as negociações de Istambul, em março de 2022, quando deu um passo atrás, depois de ter renunciado publicamente ao grande objetivo estratégico de integrar a NATO, posição que alterou devido à forte pressão norte-americana e britânica.

Zelensky sabe que a questão central na guerra que trava com Moscovo prende-se com a neutralidade estratégica de Kiev e a sua renúncia definitiva às armas nucleares. Este foi o leitmotiv que levou ao conflito. A questão territorial só se veio a colocar de modo veemente após o falhanço das citadas conversações em Istambul, onde o estatuto das duas regiões autónomas Donetsk e Lugansk ficou para ser discutido posteriormente.

Zelensky não foi capaz de se desenvencilhar do novelo de contradições em que está enredado. Apesar de saber ser impossível derrotar militarmente as forças russas e de ser carne para canhão numa guerra por procuração, o que agora é admitido despudoradamente no ocidente, com o objetivo de “debilitar o nosso inimigo [a Rússia] sem nos envolvermos diretamente com ele… com os resultados mais extremos e trágicos dos jogos de poder que têm sido jogados impiedosamente em solo ucraniano pelas grandes potências,” Zelensky fez as suas escolhas.

Numa entrevista, em março de 2022, reconheceu haver “no ocidente quem que não se importe com uma guerra prolongada, porque isso significaria a exaustão da Rússia, mesmo que representasse a morte da Ucrânia à custa de vidas humanas.” Não obstante, alinhou nesse projeto sabendo o sacrifício que isso traria ao seu povo.

O acolhimento vibrante que lhe foi dado em grande areópagos da política internacional – Parlamento Europeu, Congresso norte-americano, G20, etc. – devem tê-lo deslumbrado e levado ingenuamente a acreditar ser o centro do universo a quem todos se iriam curvar, ignorando que a política, em particular a internacional, é muito volúvel e que se reformula em permanência para satisfazer os interesses das grandes potências. Esse tratamento ter-lhe-á dado a sensação de ter o mundo a seus pés. A relação próxima com os grandes líderes mundiais tê-lo-á convencido de que era um deles. As palmas e os holofotes convenceram-no de que era o ator principal, como na sua vida anterior. Mas não era.

Essa perceção poderá justificar a tomada de posições irredentistas – a Ucrânia só se sentará à mesa das negociações quando se encontrar em vantagem, repetindo aquilo que lhe foram dizendo e em que passou a acreditar. Como afirmou numa entrevista, “a Ucrânia é um país independente e os EUA não podem forçar o regime de Kiev a “sentar-se e ouvir” à mesa das negociações”, o que levou Elon Musk a responder-lhe no “X” dizendo que Zelensky tem um “sentido de humor incrível”. Zelensky parece não perceber o caldeirão em que está metido.

Só haveria uma possibilidade de vencer a Rússia, que passava, não pelo apoio político, financeiro e militar, mas pelo envolvimento militar direto do Ocidente com contingentes em território ucraniano para fazerem aquilo que as tropas ucranianas não eram capazes. E isso foi claramente tentado em muitas ocasiões. Por exemplo, quando um míssil da defesa aérea ucraniana caiu na Polónia.

As ameaças explícitas dos ultranacionalistas no que se refere a soluções políticas e cedência de território contribuíram seguramente para que prevalecessem as visões irredentistas, impedindo-o de encarar os factos com realismo.

A apresentação do “Plano da Vitória”, insistindo num triunfo que lhe fugia no campo de batalha, cada dia que passa, foi mais um fiasco que não galvanizou os seus patrocinadores. A insistência na adesão à NATO mostrava o seu alheamento da realidade. O tempo corre contra ele e o tapete foge-lhe debaixo dos pés.

A eleição de Donald Trump para presidente dos EUA e perceção de que poderá ser reduzido o apoio à Ucrânia veio acelerar os acontecimentos. Zelensky veio reconhecer o óbvio e introduziu nuances no seu discurso: “As Forças Armadas da Ucrânia não dispõem de forças suficientes para recuperar os seus territórios por meios militares” afirmou Zelensky.

Mesmo assim, não alterou a sua posição em matéria de “cedência territorial”. Por saber que não será admitido na NATO, tem a noção de que o discurso sobre cedências territoriais temporárias é uma falácia. Se, por um lado, isso o defende dos ultranacionalistas, por outro, faz com que se tenha tornado num obstáculo à resolução do conflito, em vez de ser um elemento facilitador.

Com o comprometimento do projeto que visava derrotar estrategicamente a Rússia, Zelensky deixou de ser útil. Segundo o Economist existem movimentações para o afastar em 2025, e o substituir por alguém com a flexibilidade necessária para dirigir um processo de paz que envolva a aceitação de cedências territoriais.

O antigo comandante-chefe das forças armadas ucranianas Valery Zaluzhnyi, presentemente embaixador em Londres, parece encontrar-se bem posicionado para tal. Zelensky “já não é visto como o líder de guerra indiscutível que foi em tempos.” Segundo uma pesquisa realizada pelo Centro de Controlo Social de Kiev, apenas 16% votariam para o reeleger para um segundo mandato, e quase 60% nem sequer querem que ele concorra novamente. No topo da sondagem, à frente de Zelensky, com 27%, aparece Valery Zaluzhny.

Zelensky, ao apresentar exigências obviamente impossíveis de satisfazer, pode estar a perseguir o objetivo de apresentar o Ocidente como um “traidor” da Ucrânia, escreve a revista britânica The Spectator, e assim livrar-se da ira dos ultranacionalistas, que consideram que o problema ucraniano tem de ser resolvido agora, e não protelado para ser dirimido pelas gerações vindouras.

Mas, por outro lado, o seu irredentismo pode facilitar a vida a Trump. Como referia o Financial Times, perante a recusa em assumir compromissos, Trump poderá habilmente encenar uma tentativa para acabar com a guerra, atribuindo o insucesso à teimosia e intransigência de Zelensky, deixando a gestão do conflito para os europeus, livrando-se assim de um processo complicado.

Zelensky assume agora que "com as políticas da equipa que vai liderar a Casa Branca, a guerra vai acabar mais cedo. Esta é a sua posição [Trump] e a sua promessa à opinião pública". Sem pudor, assume, tardiamente, que quem vai determinar o futuro do conflito é Washington e que Kiev não tem voto na matéria. Mas, mesmo assim, fala como se estivesse na mó de cima e a poder impor condições.

Mostrando-se incapaz de avaliar a realidade e de a projetar no futuro, Zelensky não percebeu qual o papel que as grandes potências lhe tinha sido atribuído neste drama. Não obstante, dava indícios, volta não volta, de saber que estava a condenar o seu povo a um sacrifício inglório e nada fazer para o evitar, preferindo a cumplicidade com agiotas.

Para a história ficam os líderes ocidentais e um presidente ucraniano que optaram por empurrar um país para a desgraça em vez de negociar no devido tempo. Por tudo isto, o futuro de Zelensky e da Ucrânia não será promissor.

 

Afinal de que se podem gabar os conservadores liberais?

By estatuadesal on Dezembro 11, 2024

(Carlos Matos Gomes, in Facebook, 08/12/2024, revisão da Estátua)



As cinzentas tardes de Outono facilitam leituras cinzentas. Cinzentas como as cinzas das antigas braseiras. Um artigo de um número não muito antigo do Le Monde Diplomatique referia o domínio da Europa por elites conservadoras-liberais desde a "marcante" presidência do português Durão Barroso.

Afinal de que se podem gabar os conservadores liberais? De uma guerra por procuração na Ucrânia, da desindustrialização, da submissão aos EUA, da cumplicidade no genocídio do século na Palestina, da irrelevância internacional. Hoje na TV surgia a notícia de mais uma falência de uma fábrica fornecedora de componentes para a Auto Europa, a seguir a uma outra que fornecia bancos.

Mas, o interessante do artigo era a questão sem resposta, o que distingue Boris Jonhson, Keir Starmer, o secretário da NATO, a contabilista do Banco Central Europeu, o petit Macron e o petit Sholz?

Para a desindustrialização e a crise do estado social, os conservadores liberais propõem o desvio de capitais de setores produtivos e de prestação de serviços de bem-estar pelas despesas com compras de material de guerra aos EUA! Viva o liberalismo.

A contabilista do BCE, uma ultraliberal, impõe os juros com que os europeus pagam os seus empréstimos aos bancos privados - mercado? Livre concorrência? Isso é para tansos. Os petit do coração da Europa, Macron e Sholz o que propõem: Nada. Fugir! A Alemanha levar as fábricas para a China e os Estados Unidos, a França transformar a Renault num museu.

O que querem conservar afinal os conservadores europeus? A agua Pérrier para acompanhar o uísque escocês? E liberalismo o que é? Escolher entre dormir num banco da Gare du Nord ou da estação de Frankfurt?

Os conservadores e os liberais que há mais de 30 anos marcam o destino da Europa têm rosto e têm o dever de responder. Ou temos de perguntar ao Bugalho, que é um poço de ignorância, ou ao Paulo Rangel que é, de entre os furões ativos da politica portuguesa, um dos muito poucos que distingue o Comte do Kant e o preço do Guaidó do preço do Zelenski?

 

Para que o pagode perceba como está a ser “encavado”…!

By estatuadesal on Dezembro 10, 2024

(Ana Kandsmar, In Facebook, 09-12-2024, revisão Estátua de Sal)

(O título deste artigo foi tomado de "empréstimo" do Facebook do Major General Raúl Cunha, que lá partilhou o texto. 🙂

Estátua de Sal, 10/12/2024)



Gostaria de pedir aos "colegas" jornalistas para, por obséquio, recuarem um pouco no tempo. Alguns anos apenas e, por uma questão de elementar justiça, retratem-se. Peçam desculpa.

É que não foram terroristas do ISIS, Al-Qaeda ou outros grupos de escumalha humana que, em nome de Deus, o Grande, foram os autores dos muitos atentados em território europeu. Ou melhor, foram, mas não eram e não são terroristas.

E não foram terroristas os responsáveis pelos ataques em Paris, Colónia, Nice, Madrid... Sevilha, Helsínquia, Londres ou Torres Gémeas (aqui então é que não foram mesmo 😆). Foram freedom fighter's delicodoces como um "mon cherrie" e, até agora, incompreendidos pelo Ocidente.

Pois, acabou-se a incompreensão. Agora já os compreendemos bem. Ocuparam um país inimigo de Israel, logo, nosso inimigo; inimigo dos EUA, logo, nosso inimigo; amigo da Rússia, logo, nosso inimigo; amigo do Irão, logo, nosso inimigo.

Estes freedom fighter's, que celebramos hoje são os mesmos que combatemos ontem e que, voltaremos a combater amanhã, quando os seus alvos estiverem numa qualquer cidade europeia.

Depois chora-se um bocadinho, mas não muito, porque afinal, até fomos nós que os financiámos, e, de qualquer maneira, que interessam as vidas de uma dezena ou mesmo uma centena de pessoas que levam com uma bomba em Barcelona? Nada, quando comparado com um golpe de estado num país, lá longe, que tinha um regime que nos andava a incomodar.

Aquilo nem era democrático nem nada. O Assad era um ditador, mandava cortar pilinhas a insurgentes e cabeças a terroristas. Pelo menos agora, estes novos heróis só vão cortar as cabeças aos cristãos (os terroristas ficam a salvo, ufa!), e impor medidas bem mais duras, em especial às mulheres... Mas quanto a isso, peanuts! Elas só servem é para estar ao fogão, mesmo. Ah… e abrir as pernas por baixo da burka.

Acabou-se também o direito dos gays enrabarem e serem enrabados, mas que importa isso? Para a sodomia temos o Ocidente. Querem apanhar no cu? Não sejam parvos, têm sempre Paris! Uma enrabadela de frente para o Sena é muito mais romântica que virada para um minarete.

Não estraguem é a festa. Hoje é tempo de celebrarmos os novos democratas que devolvem a Síria à Liberdade e à Soberania! Por liberdade, entenda-se nanominimicroliberdadezinha... Pronto, podeis respirar e soltar uma bufa de vez em quando... É isto... Mas é bom, boas bufas... Até podem ser mais que duas a cada 10 minutos e ter cheiro e tudo! No mais de resto, liberdade com algumas limitações, claro... mas, nada de mais.

Vamos apenas assistir a "talibans" fazendo "talibanices". Tal como no Afeganistão. Os tais “radicais moderados”... (Ahahahaha ....isso existe? 😂😂) também vinham trazer liberdade aos afegãos, até eram feministas, queriam lutar pelos direitos das mulheres, lembram-se? E os jornalistas, muito contentinhos, do alto da sua tremendaaaaaenormeeeee e descomunal imbecilidade, lá iam preenchendo os blocos noticiosos com as barbas fofinhas dos heróis talibãs, em euforia pelas ruas esburacadas de Cabul, enquanto traulitavam o sempre tão pacificador Allahu-akbar!

É isto...hoje o Ocidente, retângulo merdoso onde eu me incluo, celebra a queda de um regime secular que, com pulso de ferro, controlava uma horda de selvagens e a ascensão ao "trono" dessa mesma horda de selvagens. Boa, boa! 👏👏

segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

 

Mário Soares — o extraordinário político prático

By estatuadesal on Dezembro 6, 2024

(Carlos Matos Gomes, in Medium.com, 06/12/2024)



Um provérbio africano ensina que a cabra come onde está amarrada. A transposição desta sabedoria para a grande política tomou o nome de realpolitik. Que é uma outra forma de designar o pragmatismo.

Mário Soares é o exemplar mais sofisticado do político português pragmático, juntamente com Melo Antunes e o processo político português a partir de 25 de Abril de 1974 desenrolou-se subordinado ao pragmatismo, ao anti-idealismo desses dois homens que perceberam onde a “cabra” estava amarrada, onde tinha que comer e viver e da cerca de onde não podia sair. Ou, na afirmação de Gil Vicente na Farsa de Inês Pereira, representada pela primeira vez no Convento de Cristo em Tomar: Antes quero asno que me leve do que cavalo que me derrube.

Ao ver chegar o 25 de Abril de 1974, Mário Soares, que recebera a herança política da República e vivera as tensões da política do Estado Novo na Guerra Civil de Espanha, da tensão entre as fações pró-Aliados e pró-Eixo na Segunda Guerra, os jogos que levaram os Aliados a preferirem manter Salazar e a ditadura no governo em vez do risco de um regime mais ou menos democrático trazer comunistas para a zona do poder, que assistira à troca dos Açores pela entrada na NATO; o apoio dos Estados Unidos pós Kennedy à guerra colonial, não tinha dúvidas que o novo regime e os novos políticos iriam ser sujeitos a um exame de admissão a um clube reservado a sócios credenciados.

Mário Soares formara-se como político no ambiente a Guerra Fria, durante o qual os Estados Unidos se estabeleceram como os únicos validadores da democracia, os senhores do selo de qualidade democrática que garantia o acesso ao clube democrático. Para atestarem a qualidade de democrata fundiram o inimigo real com o inimigo imaginário segundo as conveniências do momento. Suspeita-se dos neutros, não há lugar para terceiros, a quem cumpre hostilizar. Na Europa, depois da Grécia e da Turquia, a intervenção dos Estados Unidos foi sempre muito intensa na Itália, contra o comunismo gramsciano e ocidental de Berlinguer, também em França, contra Georges Marchais, de modo a impedir, no caso da Itália, o compromisso histórico com a Democracia Cristã, o que levou ao assassinato de Aldo Moro, e em França a promoção de Mitterrand a chefe do Partido Socialista francês como partido de governo foi feita à custa do afastamento de todos os adeptos da Frente Popular com o Partido Comunista.

A definição da linha principal de atuação dos Estados Unidos, de que Kissinger será o expoente maior, orientou-se desde o final da Segunda Guerra para a imposição de alinhamentos e punições de heresias. Os líderes políticos europeus que pretenderam ter um papel a desempenhar na “reconstrução europeia” perceberam com toda a clareza — eram pragmáticos — que tinham de abjurar o seu passado antifascista e antinazi. Willy Brandt, que seria chanceler da República Federal Alemã, começou por ser militante do Partido Trabalhador Socialista (SAP), uma formação socialista-esquerdista, combateu na Guerra Civil de Espanha ao lado dos republicanos, anarquistas e comunistas, foi expulso da Alemanha pelo partido nazi, mas como chanceler, ou para ser chanceler, promoveu uma legislação que não permitia a elementos radicais serem funcionários públicos, o que teoricamente que afetaria tanto direitistas como esquerdistas, mas na prática foi aplicado a pessoas consideradas extremistas da esquerda, porque os extremistas de direita são sempre classificados como “moderados”. Teve sempre os Liberais como um partido travão de medidas soberanas nos seus governos.

Todos estes antigos socialistas acabaram por adotar o atlantismo americano e desenvolverem política de liberalismo económico, em aliança estratégica com Margareth Thatcher. No plano das relações externas, todos eles cultivaram um bom relacionamento com os Estados Unidos, seguindo a estratégia destes de utilizarem a Alemanha do conservador Helmut Khol como a sua potência delegada na Europa continental. Em Portugal, Mário Soares seguiu um percurso idêntico desde militante do Partido Comunista a primeiro-ministro pós-revolucionário merecedor da confiança dos Estados Unidos.

A reconstrução política da Europa do pós Segunda Guerra assentou na estratégia do pragmatismo que permitiu concluir que para ser pastor não é necessário ser corajoso contra os lobos, mas merecer a confiança do dono do rebanho.

Mário Soares conseguiu com grande brilhantismo navegar entre o discurso da utopia revolucionária e a prática que garantia que a situação portuguesa não iria ofender a ordem estabelecida na Europa Ocidental e no mundo americano. Ele exerceu a grande arte da Oratória, a dos grandes cardeais que no púlpito das catedrais prometem o Paraíso aos pobres e nas sacristias e consistórios garantem o poder e os lucros aos seus financiadores. Mário Soares, foi um florentino, um Médicis, entre cabos da guarda municipal.

Mário Soares não pode, ou não deve, ser apreciado segundo os valores da moral, do Bem e do Mal, nem da Ética, do que deve ou não deve ser feito, mas sim do principio do senso e com o “pormaior” de o ter conseguido liderando um processo sobre um fino e traiçoeiro cabo, obtendo as boas graças se não de todos pelo menos da maioria.

A grande arte de Mário Soares foi a de saber de ciência certa que não podia ocorrer uma revolução em Portugal e de ter conseguido que as alterações sociais representadas pelos três D — Democratização, Descolonização e Desenvolvimento (mínimo) — que na Europa tinham sido implantadas há trinta anos, após o final da II Guerra Mundial fossem aceites como uma revolução! O slogan “A Europa Conosco” é uma brilhante afirmação como o último grito da moda de um produto com 30 anos de uso.

Por fim, comparando Mário Soares com os outros líderes europeus da época, verificamos que ele é o único líder carismático entre figuras respeitáveis, mas baças, de Willy Brandt a Miterrand, de Aldo Moro a Gonzalez, James Callaghan ou mesmo Olaf Palme o que vemos hoje nos programas de memórias são tristes funcionários que podiam andar a vender enciclopédias. Mário Soares é uma figura extraordinária em Portugal e na Europa.

Como o triste desfile de mangas de alpaca e palradores de balcão candidatos a candidatos a presidentes da República tem revelado, são tão raras as figuras extraordinárias em Portugal, ou mesmo “passables” que temos de apreciar as raras que surgiram. Haverá sempre saudosos do impossível, mas essa é uma outra abordagem. Eu, que sou e fui dos hereges, dos que, como Zaratustra, entende que devemos tentar chegar ao cume das montanhas, nem que que seja para verificar que dali se observa uma outra montanha, presto o meu tributo a Mário Soares.

Uma Nota contra a cobardia: Recordo que Mário Soares impôs uma visita à Palestina e a Gaza quando efetuou um visita oficial a Israel e uma outra como chefe de uma delegação da Internacional Socialista. Hoje assistimos a cobardes vassalagens.