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segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Correio da Manhã ao poder, que os (inserir palavra) já lá estão

Correio da Manhã ao poder, que os (inserir palavra) já lá estão

por estatuadesal

(Fernanda Câncio, in Diário de Notícias, 04/11/2018)

cancio

Era de uma vez acabar com a treta da lei e da ética e decidir em função do que vende. Chega de sonsice e "garantias processuais". O Estado de direito serve para quê, afinal?


Não há nada que propicie tanto o crime como a impunidade. Creio que nisso todos estaremos de acordo, até os criminosos - sobretudo esses. Daí que deva ser óbvio para toda a gente que quando se assiste, publica e repetidamente, a algo que a lei diz ser crime e nada sucede, as autoridades - quer as judiciárias quer as outras - estão a dar um sinal inequívoco de que a lei não é para levar a sério.

Temos pois de concluir que quer as autoridades judiciárias, quer as da regulação jornalística, quer o governo, quer o PR acham que a reserva e segredo que a lei impõe nos processos judiciais durante a fase de investigação e a garantia de não divulgação de partes dos processos mesmo após a acusação - por motivos que se prendem com garantias constitucionais tão pouco populares como a presunção de inocência, a reserva da vida privada, o direito ao bom nome e a proibição de tratamentos desumanos ou degradantes -, e até a condenação, não interessam para nada. Só assim se compreende que a PGR nunca tenha até hoje tornado claro que considera inadmissível a divulgação de escutas e de vídeos e áudios de interrogatórios, que nunca tenha tomado qualquer medida para a impedir em tempo útil - ou seja, quando esta está a decorrer ou é anunciada - e que leve, como foi noticiado nesta semana, quase três anos para investigar uma queixa relativa a esse ilícito.

Que as autoridades judiciárias se marimbam para os direitos de personalidade já sabíamos; mas pelos vistos marimbam-se também para o sucesso da investigação. São fornecedoras de conteúdos para alimentar audiências e encher cofres de empresas.

Refiro-me à divulgação pela CMTV, em novembro de 2015, dos vídeos dos interrogatórios do ex ministro Miguel Macedo. A PGR anunciou abertura de inquérito no final desse mês; a decisão de levar a julgamento três funcionárias da CMTV, todas com carteira de jornalista, data do início do mês passado. E a notícia desta pronúncia surge no preciso momento em que a CMTV está a divulgar áudios de interrogatórios a suspeitos do homicídio de Luís Grilo, que ainda está em fase de investigação, portanto em segredo de justiça.

Diz a PGR, questionada pelo DN, que foi aberto inquérito a esta nova divulgação. Mas recusa esclarecer quando, que crimes estão em causa e de quem foi a iniciativa - sua ou se decorreu de queixa. Para além disto, não vimos qualquer outra manifestação pública de incomodidade por parte de quem tem a obrigação de zelar e pugnar pela legalidade. Ao contrário, aliás, do que se passou quando a SIC passou vídeos dos interrogatórios do Marquês - quando a ministra da Justiça, a Ordem dos Advogados e a Associação Sindical de Juízes se pronunciaram, desaprovando.

Tal é tanto mais difícil de entender quando, se parece claro que as autoridades judiciárias tendem a marimbar-se para as garantias constitucionais e especificamente para os direitos de personalidade - tanto assim que gravam em vídeo inquirições sem avisar os inquiridos, e estou em condições de o afirmar pois sucedeu comigo enquanto testemunha -, não se espera que se marimbem também para o sucesso da investigação. Mas até isso já devemos dar de barato: ao invés de servirem para apurar a verdade, os interrogatórios pelos vistos servem é para passar na TV e alimentar audiências.

Esta mercantilização da justiça - porque é de lucrar com ela que se trata - adquiriu tais foros de normalidade que a generalidade dos meios ditos jornalísticos reproduzem o que ouvem na CMTV sem o mínimo de veleidade de fazer jornalismo, ou seja, sem sequer informarem o público de que aquilo que reproduzem está em segredo de justiça e mesmo após essa fase estará em segredo por via do artigo 88.º do Código de Processo Penal (o qual qualifica como crime de "desobediência simples" a reprodução de "peças processuais ou documentos incorporados no processo, até à sentença de primeira instância", assim como de "imagens ou tomadas de som relativas à prática de qualquer ato processual", exceto se essa reprodução tiver sido autorizada por autoridade judiciária e pela pessoa a quem sejam relativas).

Para tornar oficial o que é oficioso, a empresa do Correio da Manhã avança de novo com uma lista própria às eleições da Comissão da Carteira de Jornalista. E é justo que vença, porque já ganhou. Um dia há de, como no Brasil, formar governo.

Percebe-se: o mais certo é que quem reproduz o que ouve na CMTV não saiba que existe tal proibição (então, se ninguém impede aquilo, é porque não deve ter mal, certo?); mesmo que o saiba, não vai tornar claro que tem consciência da ilicitude. Dirão pessoas mais chatas que ainda assim um jornalista tem de conhecer as suas obrigações profissionais e legais, que incluem "respeitar a presunção de inocência" e abster-se "de recolher declarações ou imagens que atinjam a dignidade das pessoas através da exploração da sua vulnerabilidade". Mas se nem os tribunais nem o regulador ético da profissão (a Comissão da Carteira de Jornalista) impõem o respetivo cumprimento, é um jornalista mal pago e precário (todos hoje o são) que vai enfrentar a direção recusando-se a fazer "notícias" com o que passa na CMTV?

Claro que não. Até porque grande parte dos jornalistas já não distinguem o "interesse público" do "interesse em publicar": a sobrevivência substituiu o dever de informar, e a ética é, como disse um dia Teresa Guilherme, para quem quer morrer de fome. Assim, e para tornar oficial o que é oficioso, a empresa do Correio da Manhã avança de novo com uma lista própria às eleições da Comissão da Carteira de Jornalista. E é justo que vença, porque já ganhou. Um dia há de, como no Brasil, formar governo.

O BPN desapareceu

Novo artigo em Aventar


por j. manuel cordeiro

Infelizmente foi apenas o site do BPN que desapareceu

Muito foi o choro com a não recondução da ex-PGR. Esteve no cargo no período de 12 de Outubro de 2012 até 12 de Outubro de 2018. Iniciou o mandato tinha o caso BPN (só?!) 4 anos.

BPN: Seis mil milhões de prejuízo, zero presos

Dez anos após o anúncio da nacionalização do BPN, em 2 de Novembro de 2008, a Justiça ainda não responsabilizou praticamente ninguém pelos desvios e burlas de milhões de euros que arruinaram o banco e justificaram aquela decisão política. [JN]

Passados 10 anos (!!!), 6 dos quais com Vidal à frente da PGR, o número de presos por este crime continua a ser zero. Parece-me que um desfalque que equivale a 7,7% dos 78 mil milhões emprestados pela Troika, é capaz de merecer algum veredicto. Mas poderei estar enganado.

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MINISTROS DA JUSTIÇA E MAGISTRADOS

  por estatuadesal

(Eldad Manuel Neto, 04/11/2018)

golpe-a-jato-moro

(Os direitolas cá da urbe andam roídos de inveja dos brasileiros. Também queriam cá ter um Bolsonaro lusitano  e um Moro golpista. Estão cansados de "brincar" à democracia, jogo para o qual nunca tiveram muito jeito nem particular enlevo. E já nem escondem a sua afeição pelo fascista e pelos seus métodos e promessas de barbárie.

Sempre os julguei um pouquito mais civilizados mas, pelos vistos, enganei-me: a sua fé democrática era só verniz de conveniência, e do mais rasca.

Comentário da Estátua, 05/11/2018)


Leio em vários comentários, muitos deles vindos de juristas, que não existe qualquer diferença entre Moro e Francisca Van Dunem.

Isto porque, sendo ambos magistrados, são Ministros da Justiça. E afirmam, candidamente, em face das críticas a Moro, que as situações são perfeitamente semelhantes.

Não vejo nem defendo que um magistrado não possa abraçar funções políticas e de Estado. E temos na democracia portuguesa abundantes exemplos desse fenómeno. Mas o problema não é esse. O problema são as circunstâncias de cada um. E comparar uma impoluta, experiente e sábia magistrada como Francisca Van Dunem com Moro é, desde logo, um atrevimento sem pudor.

A nossa Ministra da Justiça não vazou conversas cobertas pelo segredo de justiça, não contrariou ordens e decisões de Tribunais Superiores, não pactuou nunca com inadmissíveis atropelos à Lei e ao Estado de Direito.

Moro será Ministro da Justiça, lugar que jamais desejaria no outrora verbal, dum governo presidido por um torcionário xenófobo, racista, belicista e misógino.

Na votação do impeachment de Dilma Russef invocou a memória do militar que a torturara durante a ditadura militar.

Moro não vê, nos dislates e anunciados propósitos de Bolsonaro, nada de incompatível com o exercício do cargo de Ministro da Justiça (e, pasme-se, das forças de segurança).

Ainda ontem António Jaime Martins, Presidente do Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados e Garcia Pereira demonstraram, com cristalina clareza, o perigo que espreita o judiciário brasileiro e os apressados justiceiros que sepultarão as liberdades, o Direito e a Justiça.

Por cá Cristas, Santana Lopes, Paulo Portas, Jaime Nogueira Pinto e Nobre Guedes, distintos democratas, não enxergam as diferenças.

Não são miopias! São todos da mesma família política e ideológica de Bolsonaro. Estão fartos do 25 de Abril,da Constituição e da Democracia. Contra ela conspiram todos os dias. Os tempos e o desespero, aliado ao ódio que durante anos recalcaram, vão dificultando o segurar das máscaras que afivelaram.

domingo, 4 de novembro de 2018

Os liberais portugueses e Bolsonaro

Entre as brumas da memória

Posted: 04 Nov 2018 03:07 AM PST

«Por uma vez, estou de acordo com António Araújo: “Bolsonaro e Trump revelaram que há uma direita que, em parte se julgava liberal, mas que tem traços muito mais autoritários do que propriamente liberais” (PÚBLICO, 31.10.2018). Há quinze anos, Freitas do Amaral chegou à mesma conclusão. Não surpreende que Jaime Nogueira Pinto apoie Bolsonaro, ou que, entre este e o PT, Nobre Guedes opte pelo homem que acha que polícia que “matar dez, quinze ou vinte [bandidos], com dez ou trinta tiros cada um, ele tem que ser condecorado e não processado” (Bolsonaro, 28.8.2018). Ou até que Paulo Portas não tenha encontrado na “vida pública do capitão Bolsonaro nenhum indicador eticamente reprovável em termos pessoais” (TVI, 29.10.2018). Há muito que se percebeu bem que, quando a extrema-direita ganha escala e atrai uma parte tão significativa da direita clássica, esta não hesita em colar-se-lhe.

Aquilo, contudo, para que já não há paciência é para a tese de que quem “fabricou” Bolsonaro e é culpado do seu triunfo, é a esquerda! “Tantas vezes a esquerda gritou pelo fascismo, que o fascismo finalmente apareceu” (João Miguel Tavares, PÚBLICO, 25.10.2018). A tese, que explica História com fábulas, baseia-se na ideia de que “o obsessivo anúncio [da chegada do fascismo] ajudou, e muito, a que [a profecia] viesse a concretizar-se”. Claro que JMT sabe (deduz-se) que o fascismo chega com as crises. Para ele, contudo, o fascismo não vem pela mão daqueles que, criando e beneficiando com as elas, se reservam a carta do fascismo para atrair o descontentamento das classes médias e de uma parte das classes populares (no Brasil, a grande maioria destas virou-lhe as costas) e, simultaneamente, optar por uma transição autoritária para suprimir as formas mais perigosas de contestação social. Não: JMT acha que Bolsonaro é culpa de uma “esquerda que se tornou profundamente conservadora, recusando qualquer mudança no statu quo”, deixando aberto o “espaço revolucionário” (sic) para aqueles que “anunciam mudanças radicais e o combate aos interesses instalados”.

Estranho: esta mesma direita andou os anos da troika a queixar-se da resistência dos “profissionais dos serviços e empresas públicas [que] são hoje a aristocracia ofendida do regime democrático”, e que, “privilegiados a quem os regime deixou de satisfazer as expectativas”, “com os seus diplomas, contratos coletivos, ordens e sindicatos”, e que, “na sua compreensível irritação, podem ser tentados a deitar tudo abaixo” (Rui Ramos, Expresso, 14.7.2012) - isto é, fazerem revoluções, sinónimo, pelos vistos, de defesa de direitos e da dignidade social. Agora, queixa-se a mesma direita de que a esquerda que representa estes “contratos coletivos” e estes “sindicatos”, afinal, já não querem fazer revolução alguma e deixam a bandeira aos fascistas… Não se queixem, portanto, professores, operários, empregados, mulheres, indígenas, LGBTs, estudantes, que os fascistas venham atrás deles, que os intimidem no emprego, na rua, nas redes sociais, que os processem juízes tão independentes quanto Sérgio Moro - e que os espanquem e ameacem literalmente de morte.

Queixam-se estes liberais (assim se dizem eles) da “oligarquia” da esquerda e do que chamam (que lata!) uma “elite” de “escritores, comentadores, historiadores, músicos ou jornais a criar vídeos, e manifestos (…) e o diabo a quatro, onde do alto da sua imensa sabedoria tentam explicar ao povo brasileiro (…) em quem ele deve votar” (JMT, PÚBLICO, 29.10.2018). Quem usa esta retórica (que muito fascista, dos anos 30 ou de hoje, subscreveria) que denuncia o elitismo dos “intelectuais” relativamente ao “povo”, parece esquecer-se de quem desde há mais de trinta anos, desde os anos do cavaquismo, dispõe de quantas páginas e microfones quiser (os Barretos, as Mónicas, os Ramos, os Espadas, os Valentes, os Césares das Neves, os Nogueiras Pintos…, querem que prossiga?), pontificando nas universidades e nos media públicos e privados contra o 25 de Abril, o “totalitarismo” socialista, a descolonização, as políticas sociais, a educação pública, as ciências sociais, os portugueses que vivem à custa do Estado e não aprendem… Não lhes perguntem pelo passado deles mesmos, nem das suas relações com o Estado. O que lhes interessa agora é dizer que Bolsonaro está “muito em consonância com o povo e nada em consonância com os professores da Universidade de São Paulo ou com os letristas das maravilhosas canções brasileiras” (F. Bonifácio, PÚBLICO, 1.11.2018). Isso. Profes e músicos. Pelos vistos eram quem mandava no Brasil.»

Manuel Loff

O rasto da sombra

Opinião

Rosário Gamboa

02 Novembro 2018 às 00:10

ÚLTIMAS DESTE AUTOR

Há um certo clima político e moral que se vem instalando no espaço das redes sociais e nos média que me perturba. Falo de uma cultura da vulgaridade, da grosseria sem travão, da frivolidade manifesta na facilidade com que se afirma, sem pudor, o egoísmo mais tacanho, se assume o desinteresse pela verdade em prol da conveniência do que "me dá jeito", e tudo isto é expresso na enxurrada selvagem de uma linguagem primária, sem decoro, que transforma as palavras numa exibição de força e violência.

Seguramente estes comportamentos não são novos, mas encontram-se, hoje, exponenciados e vulgarizados como "normais", através de um espaço mediático que não só os propaga, mas os usa como base de apoio à disseminação intencional e programática, de sentimentos obscuros, onde prosperam medos e ódios, rudeza e ignorância. Através dos braços difusos da net, estas atitudes espraiam-se na vida concreta: ocupam espaço público nos jornais, na TV, nas escolas, nas conversas de autocarro, ecoando como ruídos de uma caixa de ressonância escura. Não tomemos por ligeiras estas atitudes: são os pontas de lança da irracionalidade, do ataque corrosivo através da mentira, da intriga e difamação leviana, aos valores e princípios onde sediamos a convivência, as relações interpessoais, a tolerância e respeito que são a luz essencial e mais pura das democracias.

Assistimos hoje no Mundo a transições progressivas de democracias em estados totalitários, sem que se quebre a continuidade formal da ordem institucional. O radicalismo está em ascensão e ergue-se como ideologia dominante, contagiosa, sedimentada na defesa dos valores protecionistas de uns contra o ódio e a agressão aos outros. Os pequenos comportamentos não são inócuos; são o tecido social por onde flui a ideologia; a trama que manipula medos e aspirações, preparando e legitimando a intervenção totalitária - a mão forte que traz a ordem.

As sombras crescem no silêncio e, sem percebermos, a noite cai. Adormecidos ou entretidos, não vemos a película húmida que se nos cola à pele e, como um vento frio, entorpece a alma e paralisa a ação.

Professora Coordenadora do Politécnico do Porto