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terça-feira, 6 de novembro de 2018

E as unhas estavam pintadas?

Novo artigo em Aventar


por j. manuel cordeiro

O deputado e secretário-geral do PSD José Silvano tem o dom da ubiquidade, mas por interposto dedo.

a password do Senhor deputado José Silvano terá sido utilizada por pessoa diferente do Senhor deputado, enquanto este se encontrava ausente do plenário

A questão central é saber se os dedos que digitaram a password em causa tinham ou não unhas pintadas. Como se sabe, a manicure é um tema central quanto ao respeito institucional no Parlamento.

Já agora, aquela conversa pró-privado, tão popular na direita dos colégios privados, da saúde privada, dos seguros como alternativa à segurança social, do estado mínimo e por aí fora, dizia, esse amor ao que é privado também é para servir de modelo nesta situação? A questão coloca-se porque, no privado, uma situação de fraude como esta é motivo para despedimento com justa causa.

E se os promotores da justiça mediática fossem julgados pelos seus crimes?

  por estatuadesal

(Daniel Oliveira, in Expresso Diário, 06/11/2018)

Daniel

Daniel Oliveira

Muitos terão ouvido na televisão o interrogatórios a Rosa Grilo e António Joaquim, dois suspeitos da morte do atleta Luís Grilo. A primeira frase deste texto faria, há uns anos, qualquer pessoa parar e perguntar-se: “Como assim, a televisão passou um interrogatório de uma investigação em curso? Mas isso é possível?” Legalmente, não. Primeiro, porque quem seleciona o que é relevante num interrogatório, onde as pessoas não estão de livre vontade, é a Justiça, não são jornalistas. Depois, talvez ainda mais importante, porque uma investigação feita em direto, com todos os suspeitos a terem acesso ao que o outro diz, está condenada ao fracasso.

A banalização de coisas absurdas parece ser a marca do nosso tempo. Talvez isso explique, aliás, como Jair Bolsonaro pode ser eleito Presidente e tantos brasileiros não fiquem atónitos ao ver Sérgio Moro aceitar ser ministro. Há uma torrente de irregularidades que parecem empurrar o dique que defende o Estado de Direito. O facto de recorrentemente ouvirmos áudios de interrogatórios de investigações em curso e já ninguém reagir tem um efeito corrosivo no sistema. Cada passo que se dá sem consequências é um degrau para o seguinte. Talvez a transmissão em direto.

Ao que parece, Débora Carvalho, Tânia Laranjo e Mónica Palma, três jornalistas da CMTV, vão a julgamento pela divulgação do registo audiovisual dos interrogatórios de Miguel Macedo, em 2015, por violação do artigo 88º do Código do Processo Penal. As jornalistas em causa acharão que esta processo é uma medalha. Como se perante o entretenimento mediático a que abusivamente chamam jornalismo não existissem direitos dos cidadãos.

A divulgação de interrogatórios de investigações em curso é um crime. De repetido tantas vezes já ninguém o leva a sério. Até que um dia alguém que ilegalmente entregou a terceiros uma gravação de um interrogatório judicial e o jornalista que a recebeu sejam detidos, interrogados, julgados e presos

Não participo na desresponsabilização dos jornalistas. Não acho que o papel da comunicação social seja o de violar a lei. Pode ter de o fazer em nome de princípios fundamentais, como o controlo democrático do poder político. Não o pode fazer como se ser jornalista fosse uma espécie de garantia geral de impunidade. Sobretudo quando as vítimas do abuso são mais frágeis do que os próprios jornalistas, como é o caso de que agora falamos. Mas a responsabilidade é mesmo do sistema judicial. A divulgação destas escutas são um boicote de uma investigação em nome de uma justiça mediática sem qualquer validade.

Há de chegar o dia em que alguém terá coragem de levar a sério o que está na lei. A divulgação deste interrogatório é um crime. É um crime contra os suspeitos, é um crime contra a investigação, é um crime contra a Justiça e contra o Estado de Direito. De repetido tantas vezes já ninguém o leva a sério. Até que um dia, finalmente alguém que ilegalmente entregou a terceiros uma gravação de um interrogatório judicial e o jornalista que a recebeu sejam detidos, interrogados, julgados e presos. Vendo respeitados os direitos constitucionais que negam aos outros.

Estou a defender a prisão de agentes da justiça e de jornalistas? Mas onde raio está escrito que a liberdade de imprensa não está, como todas as liberdades, limitada pela lei? E que ela não se aplica a jornalistas? Na verdade, a liberdade de imprensa é a maior vítima deste crime. Porque é em nome dela que comerciantes de entretenimento voyeurista boicotam a Justiça. Retirando valor a esta liberdade constitucional e deixando-a à mercê de quem um dia, com argumentos que irão parecer razoáveis, a queira suprimir. Com tudo o que está a acontecer, não está chegada a altura do Estado de Direito se defender de quem o ataca?

Por um julgamento justo para Lula

Os primeiros movimentos do futuro governo Bolsonaro confirmam as piores expectativas que se formaram ao longo de um processo eleitoral anômalo, no qual tudo foi feito, de forma ilegal e arbitrária, para impedir a vontade do povo de eleger o ex-presidente Lula.

Esse futuro governo aponta para a criminalização dos movimentos sociais e o banimento da oposição, a começar pela esquerda; para o aprofundamento de um modelo econômico que exclui a maioria da população e privilegia os donos da fortuna; para a entrega das riquezas nacionais e a submissão do país à política externa dos Estados Unidos.

O mais grave desses movimentos foi a indicação, com aceitação, de Sérgio Moro para o Ministério da Justiça. Moro atuou nos últimos anos com objetivos políticos que agora se revelam indisfarçáveis; foi agente central no processo político brasileiro, manipulando as investigações da Lava Jato em cumplicidade com a grande mídia, para impulsionar o golpe do impeachment e a prisão do maior líder político do país.

A indicação de Moro, como confessou o vice-presidente do futuro governo, foi negociada durante a campanha eleitoral. E nesta campanha ele interferiu bloqueando uma ordem superior de libertação de Lula, adiando um depoimento em que o ex-presidente poderia se defender e dando publicidade a um depoimento mentiroso de Antonio Palocci, às vésperas do primeiro turno, prejudicando a campanha de Fernando Haddad.

O mundo está chocado com esse episódio, que desnuda a parcialidade e a arbitrariedade do juiz que condenou Lula e o manteve ilegalmente preso. Mas é ainda mais grave: o Ministério da Justiça de Moro foi redesenhado para atuar como um verdadeiro ministério da perseguição política, reunindo instrumentos típicos de um estado policial.

Os 47 milhões de votos recebidos por Haddad em defesa da democracia, num processo eleitoral fora da normalidade, conferem ao PT a responsabilidade de impulsionar a defesa da Constituição, dos direitos do povo e da soberania nacional, numa ampla frente política e social. A escandalosa indicação de Sergio Moro deixa claro que nossa primeira tarefa é deflagrar uma campanha por um julgamento justo para Lula.

Por Gleisi Hoffmann, Senadora e presidente nacional do Partido dos Trabalhadores  |  Texto em português do Brasil

Exclusivo Editorial Brasil247 / Tornado

O fracasso do jornalismo

A nomeação de Sérgio Moro como Ministro da Justiça do Brasil é exatamente o que parece – a vitória da impostura, do fingimento, da hipocrisia. Vitória do lawfare – a utilização do sistema judicial para perseguir e eliminar o inimigo político.

Vitória da subtileza – o novo golpe de mão é limpo e virtuoso, não mais precisa de tanques ou de força bruta, basta-lhes, como vimos, meia dúzia de ativistas políticos disfarçados de juízes. Mas também derrota da justiça, não uma qualquer derrota mas um golpe profundo: afinal, a legitimidade de todo o conjunto reside na imparcialidade do juiz que agora é atingida.  Como recuperar, agora que a mais obscena instrumentalização política do sistema judicial foi despudoradamente exibida perante a audiência? Como voltar a confiar que, ali, acima das partes, temos um árbitro que trata todos por igual? Como regressar ao discurso da confiança institucional, quando fica sem resposta a suspeita de um gigantesca manipulação eleitoral construída na base de uma atuação interessada, parcial e ilegítima das instituições judiciais?

A política e a justiça brasileiras tem muito em que pensar e o episódio não vai desaparecer. Mas talvez não seja injusto lembrar o que ele significa também como fracasso do jornalismo: o fracasso do silêncio, senão mesmo da cumplicidade, com tudo o que se passou. Na verdade, o jornalismo engoliu tudo – as ações parciais, os vazamentos ilegais e seletivos, a celeridade do julgamento, a vacuidade das provas, a prisão sem sentença transitada em julgado. O jornalismo calou-se quando Sérgio Moro validou e divulgou uma escuta ilegal entre Dilma e Lula; calou-se quando Sérgio Moro decidiu interrompeu as férias para impedir o cumprimento do alvará de soltura de Lula; calou-se quando o sistema judicial decidiu ignorar a determinação, de cumprimento obrigatório, do comité de direitos humanos da ONU para que Lula fosse autorizado a candidatar-se. Sem exagero, o jornalismo tornou-se cúmplice da construção da narrativa política de Sérgio Moro como herói popular e do PT como partido criminoso. Não, não foi só a política, não foi só a justiça – foi também o jornalismo.

É muito interessante ler a entrevista que a antiga assessora de imprensa da operação Lava Jato concedeu ao “The Intercept Brasil”. Diz ela:

Era tanto escândalo, um atrás do outro que as pessoas (jornalistas) não pensavam direito, (…) o facto é que as facilidades fizeram com que a imprensa “ comprasse” a Lava Jato quase que imediatamente. Denúncias do Ministério Público eram publicadas em reportagens quase na integra, assim como os inquéritos da policia e as decisões do Moro.

O caso da cunhada do Vaccari (ex tesoureiro do PT, João Vaccari) foi bem significativo . Os jornalistas foram na onda do Ministério Público Federal e da Policia Federal. Todo o mundo divulgou a prisão, mas ela foi confundida com outra pessoa. Foi um erro da polícia. Quando perceberam o erro, Inês já era morta”.

A entrevista soa a ajuste de contas – consigo própria. Seja como for, o testemunho tem a virtude de expor em público a promiscua relação do jornalismo com o mundo, mais propriamente um sub-mundo, da justiça – sem sentido critico, sem preocupação com os abusos, sem imparcialidade, sem dar sequer ouvidos à outra parte. Valeu tudo em nome do “bem maior”, clássico estratagema dos cínicos para esconder o seu próprio interesse. Agora, depois de tudo o que vimos acontecer, o juiz insiste na insuportável e traiçoeira retórica de que aceitou o convite em nome do combate à corrupção, fingindo que não percebe que o jogo virou: o que está sob suspeita é a sua própria  integridade e a sua própria corrupção – a de usar, de forma interessada e parcial, o sistema judicial a que pertencia, com a intenção de tirar adversários políticos do caminho e poder beneficiar pessoalmente do cargo de ministro, com o qual, afinal, sempre sonhou. O jornalismo “chapa branca”, como os brasileiros gostam de dizer, aprende, de forma especialmente dura, uma lição de vida: o seu dever é fiscalizar todo o poder, sem apreciações subjetivas de qual seja o bom e o mau. Na verdade há apenas poder, que vai até onde o deixam ir. A política e a justiça brasileira tem muito em que pensar. O jornalismo também.

Primeira publicação no Jornal de Notícias

Por opção do autor, este artigo respeita o AO90

Estados Unidos, uma eleição que pode criar dificuldades para Trump

A eleição que vai ocorrer nesta terça-feira (6) nos EUA será um duplo teste – para Trump e para o socialismo democrático.

O primeiro teste será o da popularidade do presidente Donald Trump; depois, a aceitação daquilo que lá eles chamam de socialismo democrático.

A disputa para a Câmara dos Representantes (435 deputados federais), um terço do senado (35 vagas estão em disputa), além de eleições locais, pode representar uma derrota para Trump, nesta eleição de meio do mandato do presidente e que, tradicionalmente, é desfavorável aos chefes do executivo.

A grande expectativa é em torno daquilo que muitos tem chamado de “onda democrática”, ou “onda azul”. Muitos esperam que prevaleça, com a eleição de uma Câmara e um Senado dominados pelo Partido Democrata, retomando o domínio do cenário político perdido desde a eleição de Trump em 2016, quando os Republicanos alcançaram a maioria nas duas Casas, além de terem conquistado a presidência da República. A maioria conquistada na Câmara é grande (241 republicanos e 194 democratas), mas no Senado é frágil – 51 Senadores, contra 49 da oposição democrata.

O que está em jogo é o estilo duro e criticado de Trump, que encontra forte oposição entre os estadunidenses. E há também aqueles que estão satisfeitos com os rumos da economia dos EUA, que dá sinais de crescimento e geração de empregos, embora sem recuperação da renda dos trabalhadores.

“Parece cada vez menos provável que os democratas conquistem o Senado”, diz David Lublin, professor da American University de Washington. Outro especialista, que tem opinião oposta, é Kyle Kondik, da Universidade da Virgínia. Para ele “os democratas estão contando com muitas oportunidades para recuperar a Câmara, mas menos no Senado”. Mas explica: “a Câmara e o Senado parecem se dirigir a resultados diferentes, o que complica a ideia de uma “onda azul” democrata.

Caso alcancem a maioria na Câmara, os democratas poderão criar grandes dificuldades para Trump. Poderão investigar ações do governo, deixar de aprovar leis do interesse do Executivo e inclusive dificultar a votação do orçamento.

Se conseguirem reeleger seus 194 deputados e conquistar ao menos 24 novas vagas, os democratas alcançarão a maioria na Câmara. Uma conquista que muitos analistas consideram provável.

Para o Senado, a dificuldade para os democratas será eleger 26 entre as 35 vagas em disputa, muitas delas em estados onde os republicanos, e Donald Trump, venceram em 2016.

O presidente, com seu estilo falastrão, participa da campanha eleitoral tentando caracterizar os democratas como “radicais”.

Trump abusa do sentimento conservador, antisocialista, anticomunista que há nos EUA, embora em aparente declínio. E o usa eleitoralmente contra os socialistas democráticos cuja visibilidade cresce nesta campanha eleitoral.

Crescimento que permite a previsão de que a novaiorquina de 28 anos de idade, Alexandria Ocasio-Cortez, será eleita para a Câmara, juntamente com outros socialistas democráticos que poderão compor uma bancada mais afinada mais com a sociedade e menos com os interesses financeiros que dominam o cenário nos EUA.

Alexandria Ocasio-Cortez

Alexandria Ocasio-Cortez, de ascendência latina, poderá vir a ser a parlamentar mais jovem a ser eleita este ano. Ela se tornou notável quando, nas primárias para esta eleição, derrotou um democrata veterano, Joe Crowley, defendendo um programa que, nos EUA, é considerado socialista e “radical”: igualdade social, distribuição de renda e críticas ao modelo capitalista americano.

Programa defendido pela ala mais à esquerda do Partido Democrata, que tem , calcula-se, mais de 60 candidatos nesta eleição. Usando a legenda do Partido Democrata, são membros da DAS (sigla em inglês para Socialistas Democráticos da América).

A ideia socialista tem crescente aprovação nos EUA, sobretudo entre os jovens, que não compartilham da aversão antisocialista difundida desde os tempos da guerra fria e do enfrentamento com a União Soviética, que deixou de existir faz um quarto de século. Uma pesquisa do Instituto Gallup, divulgada em agosto passado, mostrou que 37% dos estadunidenses são favoráveis ao socialismo, número que é muito maior entre os jovens (18 a 29 anos), entre os quais mais da metade (51%) são favoráveis ao socialismo; já entre os mais velhos, com mais de 60 anos de idade, apenas 28% aceitam o socialismo.

O crescimento da DAS nos últimos anos é um retrato desta realidade. Ela passou de: 6 mil associados em 2015, para 49 mil neste ano.

O programa que defende não é propriamente socialista, e pode ser definido como social-democrata, como aquele praticado por muitos países europeus depois da Segunda Grande Guerra, e que foi posto em xeque depois da ascensão do neoliberalismo de Ronald Reagan e Margareth Thatcher, no início dos anos 80.

Ele prevê um programa de saúde pública gratuita para todos; fim da cobrança de taxas no ensino superior; legislação trabalhista com mais poderes para regular as relações patrão-empregado; salário mínimo de US$ 15/hora; fim da Polícia de Imigração e Alfândega (ICE) e sistema seguro de documentação de imigrantes; controle das ações que prejudicam o meio ambiente. São medidas democráticas, de caráter anti-neoliberal, que teriam forte impacto na vida dos habitantes dos EUA, sobretudo os mais pobres.

O medo é a arma usada por Trump e a direita contra este visível crescimento da aceitação do socialismo nos EUA. Ele está presente por exemplo um artigo publicado por Trump no jornal “USA Today” onde diz que, no caso da vitória democrata para o Congresso, os EUA estarão “perigosamente mais perto do socialismo”. E continuou:

Os novos democratas são socialistas radicais que querem modelar a economia da América como a Venezuela.”

Lá como cá a Venezuela é o espantalho agitado pela direita para amedrontar incautos…

Texto em português do Brasil