Translate

sexta-feira, 22 de novembro de 2019

Em vez de sabonetes, Ventura vende polícias

por estatuadesal

(Bárbara Reis, in Público, 21/11/2019)

Quantos polícias estão na rua e, desses, quantos estão expostos a situações de risco que justifiquem o uso de colete antibala? Parece um segredo de Estado. O que se sabe é que a criminalidade violenta diminuiu 40% nos últimos dez anos e que, em 2018, dos 45 mil homens e mulheres que trabalham nas forças de segurança só houve seis feridos.


Não é por acaso que o deputado do Chega se agarra aos polícias com unhas e dentes. André Ventura fez Direito na Universidade Nova de Lisboa com 19 valores e doutorou-se no University College Cork, na Irlanda, que está 300 lugares acima da Nova nos rankings internacionais.

É por ser inteligente que Ventura sabe que usar os polícias é uma boa estratégia para ganhar poder. Alguns polícias terão votado no Chega — quando chumbou o registo inicial do partido, o Tribunal Constitucional disse que havia centenas de assinaturas de polícias. Mas isso é quase irrelevante. Há 45 mil pessoas nas forças de segurança e o Chega teve 67 mil votos. Mesmo que todas “as polícias” tivessem votado nele — hipótese absurda —, faltariam 22 mil eleitores.

Relevante é a forma como Ventura usa o marketing e manipula a realidade. E como, para esse objectivo, os polícias são presa fácil. Ventura quer chamar a atenção. Para ser notado, a cada frase que diz no Parlamento grita “é uma vergonha!” Na semana passada, disse que é “uma vergonha” haver polícias que compram “do seu próprio bolso” algemas, coletes de protecção balística e gás pimenta. O primeiro-ministro, António Costa, respondeu-lhe que devia “mudar de informador”, porque o informador que usava era “mau”. Esta semana, Ventura regressou ao tema e levou “as provas” para o Parlamento: facturas. “O primeiro-ministro mentiu aos portugueses: disse que os polícias não têm de comprar equipamentos para si. Aqui estão as facturas, de dezenas de polícias, da compra de material pago do seu bolso. Vergonha, sr. primeiro-ministro! Vergonha, sr. ministro da Administração Interna!”

São frases sexy para as redes sociais, mas é demagogia venenosa. Qualquer criança percebe que as facturas provam que os coletes foram comprados, mas não provam que os coletes sejam necessários. Alguém perguntou a Ventura se era mesmo preciso comprar aqueles coletes?

Em Portugal há 20 mil “efectivos” da PSP, 22.829 da GNR, 1224 da Polícia Judiciária, 859 do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e 525 da Polícia Marítima: 45 mil “polícias”.

As facturas provam que há falta de coletes no país ou apenas que “dezenas de polícias” — num universo de 45 mil — compraram um colete diferente do que lhes é dado pelo Estado?

Os coletes de protecção balística são motivo de frustração entre alguns polícias — nisso Ventura está certo. Recolhi vários protestos nos últimos dias: os coletes são partilhados e atribuídos por carro de patrulha e por isso os “patrulheiros” recebem-nos sujos dos colegas do turno anterior. Apesar de serem usados em cima da farda, há queixas de que os coletes ficam suados e cheiram mal. Há coletes fora de prazo. Há coletes sem bolsos e isso é um problema no caso das fardas que não têm bolsos. Na GNR, há coletes para mulher, mas na PSP não. Isso é tudo verdade e merece respostas do Governo.

Coisa diferente é falar dos coletes à prova de bala como se fôssemos a Síria. Não estamos em guerra, não somos o Brasil, nem os Estados Unidos, onde há mais armas do que cidadãos e dezenas de polícias mortos por civis e centenas de civis mortos por polícias todos os anos.

Em Portugal, no ano passado, houve 13.981 participações de criminalidade violenta, uma descida de 8,6% em relação a 2017 e de 42,5% em relação a 2008. Os crimes violentos são 4,2% de todos os crimes. É o que diz o último Relatório Anual de Segurança Interna, feito pelas “polícias”. Foi também nesse documento que aprendi que, em 2018, “em resultado da actividade operacional, registaram-se, nas Forças de Segurança Pública, seis feridos com necessidade de internamento e 1159 feridos ligeiros”. Seis feridos em 45 mil “efectivos”.

Ventura sabe tudo isto, mas estes números não lhe interessam. Fala dos coletes antibala para dar nas vistas. Como David Bowie quis dar nas vistas no início da carreira e anunciou que era gay ou a psicóloga que esta semana publicou um livro cujo título é Como sobreviver a um chefe idiota. Nos truques da popularidade, é tudo simples.

Mais interessante seria saber quantos elementos da PSP estão em posições de risco no seu dia-a-dia, um risco que justifique o uso de um colete antibalístico. Todos os 20 mil polícias? Claro que não. Os polícias da Equipa de Prevenção e Reacção Imediata (EPRI), os motards da PSP, precisam de coletes. Os polícias da Unidade Especial de Polícia (UEP) também. Os GOI a mesma coisa. Como também para os “patrulheiros” de certos lugares, em certos dias, a certas horas. Mas não para todos. A polícia conhece os padrões de violência e é com base nessa análise que uns polícias recebem subsídio de risco e outros não. As necessidades de equipamento antibalístico são calculadas com base na mesma informação. Pode haver um tiroteio na Avenida de Roma a um domingo à tarde. Mas a probabilidade é de 0% ou de 50%?

O dinheiro público tem de ser distribuído com sabedoria. Em vez de discutir coletes antibala num país onde há poucas balas, Ventura podia propor soluções para tirar os 500 PSP e GNR que trabalham nas 128 cantinas policiais e podiam ser mais úteis na rua, um esforço que repetidos governos são incapazes de concretizar. Ou uma reforma que reduzisse a burocracia de uma profissão cuja essência é ser operacional.

Para falar de coletes, é preciso saber quantos polícias são “administrativos”, quantos estão na rua e, desses, quantos estão expostos a um risco razoável. Chateei meio Portugal à procura da resposta e do rácio ideal colete/operacionais definido pelo Estado. Não consegui. O MAI diz que há 18 mil operacionais da PSP, mas que “operacional não significa estar na rua”. São quantos? O Governo não responde. Há falta de coletes? O Governo não responde. Os que compraram coletes fizeram-no por capricho, ou conforto ou fetiche, mas não por necessidade? Quantos coletes estão fora de prazo? E gás de pimenta? O Governo responde que nos últimos meses comprou quatro mil coletes balísticos e “29 mil fatos e equipamento de protecção, como luvas, capacetes, bastões”, no valor de 15 milhões de euros. Mas não responde à pergunta simples: há falta de coletes? Se é mentira, deve ser desfeita. Se é verdade, deve ser assumido.

O vazio só ajuda ao populismo de Ventura. Fico com a sensação de que as polícias não querem dizer quantos dos 20 mil estão “na rua”, porque isso evidenciaria o seu sedentarismo e necessidade de reorganização radical. E que o Governo não quer dizer isso, porque exporia a incapacidade para impor a reforma. Uns a seguir aos outros, diferentes ministros de Administração Interna dizem que vão tirar os polícias da secretária e pô-los na rua. Mas não conseguem. Porquê?

Em vez de gritar que “é uma vergonha”, Ventura podia estudar qual o rácio ideal dos coletes, como fizeram os defensores do reforço do Orçamento do Estado na Saúde, quando pediram ao Governo para cumprir o rácio europeu de seis aceleradores lineares por milhão de habitantes (temos 3,98), essenciais para os doentes com cancro. Mas isso é pouco sexy e difícil de postar no Facebook. É mais eficaz criar alarme e confusão. Em vez de sabonetes, Ventura vende medo e polícias. É o que lhe dá lucro.

quinta-feira, 21 de novembro de 2019

O empoderamento das mulheres africanas

De  euronews • Últimas notícias: 20/11/2019 - 17:56

Em parceria com

O empoderamento das mulheres africanas

O empoderamento das mulheres africanas a nível empresarial foi o grande tema do Fórum das Mulheres Africanas.

África é a única região do mundo onde há mais mulheres empresárias do que homens. Apesar de a maioria dos empresários africanos serem mulheres, as empresas dirigidas por mulheres têm menos rendimentos devido a uma série de obstáculos, como a discriminação ou a falta acesso a financiamento.

A edição 2019 do Fórum das Mulheres Africanas reuniu governantes, políticos, empresários e ONGs. O objetivo do encontro é criar uma plataforma para trocar ideias e trabalhar em conjunto para que haja uma verdadeira mudança para as mulheres em África.

As competências das mulheres na agricultura

Durante o fórum, foram apresentadas estratégias para melhorar as competências empresariais das mulheres africanas nas comunidades rurais. "Encorajamos as mulheres a abrir negócios agrícolas em vez de praticarem a agricultura de subsistência. Queremos mudar o paradigma atual e dar a oportunidade às mulheres de modernizarem a agricultura para que haja um aumento da produtividade e do rendimento das famílias", explicou Josefa Leonel Correia Sacko, comissária para a economia rural e a agricultura da União Africana.

A mudança do paradigma agrícola

Segundo o Banco Mundial, o setor agrícola na África Subsariana deverá valer um bilhão de dólares em 2030. Atualmente, as mulheres asseguram 80% da comida que é produzida no continente africano, apesar de só terem acesso a 15% das terras. Para Josephine Favre, a agricultura vertical (um método de cultivo fora do solo, que permite poupanças de água) pode ajudar a resolver o problema da falta de acesso à terra agrícola. "A agricultura vertical não precisa de terra, precisa apenas de espaço. Se uma ou duas mulheres podem arranjar espaço na comunidade podem dedicar-se à agricultura vertical e tornar-se independentes. Se pudermos dar às mulheres africanas a oportunidade para alimentar a família, elas podem usar o excedente para criar um negócio", disse à euronews Josephine Favre, presidente da Associação Africana de Agricultura Vertical.

Défice de capital e investimento

Um estudo realizado em dez países do continente africano indica que em média as empresas pertencentes a homens têm seis vezes mais capital que as das mulheres, o que entrava o crescimento dos negócios. A advogada Grace Camara criou um fundo de investimento que é alimentado pela diáspora africana, a partir de Londres. O dinheiro é investido em pequenas empresas de vários setores, da agricultura, à tecnologia e à moda.

"A moda africana é uma tendência atual. Pensei que seria importante apoiar as estilistas africanas e estabelecer o fabrico em África. Há milhões de seguidores no Instagram, as roupas são vendidas a celebridades em todo o mundo, o que poderia criar potencialmente entre 50 e 100 empregos. O nosso projeto passa por promover o desenvolvimento com o apoio da diáspora africana para que ela possa marcar a diferença", disse à euronews Grace Camara, diretora da Remitfund.

Estimular comportamentos proativos

Segundo o Banco Mundial, a formação é outra das áreas com grande impacto no desempenho das mulheres. No Togo, um curso sobre comportamentos proativos contribuiu para uma subida significativa dos rendimentos das empresárias.

O apoio do Fórum Crans Montana

O encontro dedicado às mulheres africanas foi organizado pela ONG suíça Fórum Crans Montana e decorreu em Bruxelas, entre 14 e 16 de novembro de 2019. "Para ajudar verdadeiramente as mulheres africanas é preciso vir a África ajudá-las, é essencial, e por outro lado apoiá-las ao nível das relação internacionais para que possam trocar ideias e estabelecer redes de contacto a nível mundial", sublinhou Jean-Paul Carteron, presidente do Fórum Crans Montana.

Apoio dos EUA a Hong Kong é um "incentivo a criminosos", diz China

De  Euronews com Lusa• Últimas notícias: 21/11/2019 - 12:25

Apoio dos EUA a Hong Kong é um "incentivo a criminosos", diz China

O ministro chinês dos Negócios Estrangeiros, Wang Yi, considerou hoje a aprovação pelo Congresso norte-americano de uma lei de apoio à democracia e aos direitos humanos em Hong Kong como um "incentivo a criminosos violentos".

O objetivo deste texto é "causar estragos ou até destruir Hong Kong", acusou Wang Yi, num comunicado divulgado pelo seu ministério.

Também o porta-voz do ministério chinês dos Negócios Estrangeiros afirmou hoje que a China está pronta a "reagir com determinação" e exigiu ao Presidente norte-americano, Donald Trump, que vete a legislação.

"Nós condenamos e opomo-nos veementemente" a esta iniciativa, que "mina os interesses da China e dos EUA", na região semiautónoma chinesa, disse Geng Shuang.

"Se os EUA continuarem a tomar medidas erradas, a China de certeza tomará fortes contramedidas", avisou Geng.

O Congresso norte-americano aprovou na quarta-feira uma resolução que apoia os "direitos humanos e a democracia" em Hong Kong e ameaça suspender o estatuto económico especial concedido por Washington à antiga colónia britânica, que é há quase seis meses palco de manifestações antigovernamentais, cada vez mais violentas.

O texto, que põe em causa o estatuto comercial de que beneficia atualmente a região administrativa especial chinesa, ainda não foi assinado pelo Presidente norte-americano, Donald Trump, mas a Casa Branca não ameaçou vetar.

REUTERS/Thomas PeterAtaque à Universidade de Hong KongREUTERS/Thomas Peter

A votação surge numa altura em que as duas maiores potências mundiais negoceiam uma saída para a guerra comercial.

"Os Estados Unidos estão convosco e sempre vos apoiarão", disse Michael McCaul, membro eleito da minoria republicana na Câmara dos Representantes, denunciando "a brutalidade" da China.

Questionado sobre o risco de aquela votação prejudicar as negociações, o porta-voz chinês disse esperar que Washington "trabalhe com o lado chinês para encontrar soluções".

"Ninguém deve subestimar a determinação da China em salvaguardar a sua soberania nacional, segurança e interesses de desenvolvimento", apontou Geng.

O Congresso aprovou a resolução com 417 votos a favor e um contra, após a adoção unânime pelo Senado, na terça-feira passada. A votação levou a China a ameaçar com retaliação.

As duas câmaras do Congresso também aprovaram uma medida que prevê a proibição da venda de granadas de gás lacrimogéneo, balas de borracha e outros equipamentos antimotim utilizados pela polícia de Hong Kong para reprimir manifestações.

Escândalo sexual de Epstein: Príncipe André abdica das obrigações reais

De  Ana Serapicos  com BBC, Reuters• Últimas notícias: 21/11/2019 - 13:47

Escândalo sexual de Epstein: Príncipe André abdica das obrigações reais

Direitos de autor

REUTERS/Toby Melville/File Photo

O Príncipe André, o terceiro filho da Rainha Isabel II (segundo filho homem), decidiu abdicar das obrigações reais. O Duque de York diz ter tomado a decisão pela forma como a família real está a ser afetada com o escândalo sexual de Jeffrey Epstein, no qual está envolvido.

O anuncio foi feito através de um comunicado partilhado nas redes sociais, onde se lia que uma autorização foi pedida à Rainha, pedido que Isabel II aceitou.

"Talvez a decisão correta teria passado por não dar a entrevista, porque ele não foi capaz de mostrar remorsos."

Claudia Joseph

Especialista em assuntos da Família Real

A decisão chega depois de uma entrevista polémica que o Príncipe André deu à BBC. Foi questionado, ao pormenor, sobre a relação que mantinha com Jeffrey Epstein, e foi confrontado com os depoimentos das vítimas, que o acusam de conhecer o comportamento do amigo. Uma das mulheres acusa o Príncipe André de a forçar a várias relações sexuais. O Príncipe nega tudo.

A entrevista está a ser criticada porque o membro da família real não terá mostrado compaixão no depoimento. Claudia Joseph, especialista em assuntos da família real, diz que o Príncipe nem sequer devia ter dado a entrevista.

"Foi uma entrevista muito mal orientada e acho muito triste que ele não tenha sido preparado adequadamente. Talvez a decisão correta teria passado por não dar a entrevista, porque ele não foi capaz de mostrar remorsos.", diz Claudia Joseph.

Ver a entrevista da BBC ao Príncipe André

Considerado por muitos o filho favorito de Isabel II, o Príncipe André abdica de vários compromissos com a sociedade, entre eles promover o crescimento da economia e ajudar a criar emprego. Desde a entrevista, feita esta semana, várias entidades e empresas, incluindo a BT e a Barclays, decidiram afastar-se da imagem do membro da família real.

O maior risco de António Costa

por estatuadesal

(David Dinis, in Expresso Diário, 21/11/2019)

Há quatro anos, quando formou o seu primeiro governo, António Costa entrou a todo o gás: tinha na mão uma estratégia clara, que passava por acelerar a saída das medidas mais restritivas da troika, dar gás à economia (por via da devolução de rendimentos) e comprometer a esquerda com a governação do país. Os primeiros meses, dois anos, foram assim. De alta intensidade.

Esta segunda legislatura arrancou ao contrário, ao sabor das intendências. Com um programa eleitoral muito menos comprometido, sem medidas muito fechadas nem plano de ação para os primeiros 100 dias, com um orçamento de 2020 já bastante comprometido, com as reversões concluídas, em pleno comprometimento com a Europa, na sombra de uma desaceleração económica, o primeiro-ministro fez do dia 1 da nova legislatura o dia 1461 da segunda.

O problema? É que se não há agenda proativa, há problemas que não desapareceram. E passam a dominar a agenda. Dito de outra forma: à entrada do quinto ano de governação, Costa dá a sensação de ter perdido a iniciativa - deixando que esta seja dominada pelas más notícias que se acumulam. Quer ver como?

Na Saúde, as listas de espera para cirurgias não se resolvem, acumulam-se; a falta de profissionais nos hospitais adensa-se; os problemas dentro de cada serviço também, em consequência. Dia a dia, temos novas notícias disto mesmo.

Nas escolas continuam a faltar profissionais, agora com o problema adicional da dificuldade de deslocar docentes para as zonas do país onde as rendas se tornaram impraticáveis. Costa ainda ensaiou uma saída no Parlamento, dizendo que com a descentralização as câmaras tomariam conta dos processos; mas 'esqueceu-se' de dizer aos deputados que a lei continua a prever que as colocações continuarão a ser centralizadas no Ministério da Educação. Na prática, nada mudará.

Os polícias, entretanto, manifestam-se nas ruas. Cansados de assistir, sentados, ao fecho de negociações com outras carreiras; cansados das promessas de quatro anos sem que nada se resolva; cheios de esperar, até, pela integração na folha salarial de um suplemento que até os tribunais já condenaram o Estado a pagar. Para não falar da falta de meios. Agora, o que o ministro lhes promete é negociar em seis meses uma fórmula para resolver tudo… nos próximos quatro anos. Só que já passaram quatro.

E ainda poderíamos falar dos sem-abrigo, que têm um plano aprovado há três anos que não saiu do papel (apesar da pressão do Presidente). Como poderíamos falar do aeroporto do Montijo, do novo pacote de obras públicas, das pensões que se atrasam um ano até serem atribuídas, dos problemas na habitação, entre um sem fim de outros problemas que sempre se acumulam.

Não há nada de novo nisto, nem alguém espera que se resolvam todos os casos, como se houvesse milagres. Costa tem decisões em curso para alguns destes problemas. Mas sabe que não só tudo custa dinheiro (e precisa de prioridades definidas), como demora tempo a tirar do papel e pôr no terreno.

Mas o que também ninguém espera é que António Costa fique sentado, à espera dos resultados. A paciência de quem espera não é a mesma ao fim de cinco anos, de seis anos, que era no primeiro dia da primeira legislatura.

Atenção: ao contrário do que têm sido dito, não tenho dúvida que António Costa quer continuar primeiro-ministro para lá desta legislatura. Porque quer bater os 10 anos de Cavaco Silva. Porque se apresentou em 2015 com um programa para uma década. Porque sabe que só com tempo pode deixar uma marca - como lembrava, bem, Ascenço Simões no “Público”, um dos socialistas que o conhece melhor.

Não creio que seja por acaso que, durante a campanha das legislativas, António Costa lembrou várias vezes o seu percurso na Câmara de Lisboa. Foi assim: começou em minoria, na Câmara e na Assembleia Municipal; foi reeleito com maioria apenas na Câmara; acabou com um terceiro mandato, em maioria nos dois órgãos. Já no Governo, Costa foi PM depois de perder eleições; e conseguiu agora novo mandato ganhando eleições, ficando mais perto de uma maioria e menos dependente dos partidos. O objetivo, claro, é provar agora que o sucesso da legislatura anterior não foi do Bloco e PCP, foi dele e do PS. Chegará à terceira etapa?

É aqui que entram os obstáculos. O primeiro é a autonomia: quando prescindiu de formar uma maioria parlamentar com o Bloco, António Costa assumiu o bom e o mau do que virá: nestes quatro anos, estará por sua conta - os resultados bons serão seus, os maus também. O segundo é a economia, que será determinante para a margem de manobra que terá: orçamental, para distribuir rendimentos e aumentar investimento; assim como política, para garantir a sobrevivência no Parlamento.

Mas há um terceiro, e com isto volto ao início: António Costa precisa de recuperar a iniciativa política. E não pode perder muito tempo nisso, sob pena de exasperar o eleitorado da geringonça (que é o seu alvo). O Orçamento que se segue, para isso, será determinante. Se for mais do mesmo, pode ser o princípio do declínio.Voltar ao topo.