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quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

Os direitos não obrigam a nada, a sua ausência é que nos limita!

Posted: 18 Feb 2020 03:05 AM PST

«A não punição da eutanásia, em circunstâncias especiais e clinicamente definidas, exige um debate sério e não demagógico, dissecando todos os argumentos com dignidade e respeito pelas opções de cada ser humano. Trata-se de um debate civilizacional que não pode mais ser adiado em nome da dignidade e do respeito pelo sofrimento humano.

Apesar dos avanços da medicina e dos cuidados paliativos prolongarem a vida para o dobro da idade de há um século atrás, não podemos ignorar que há pessoas para quem o diagnóstico é, infelizmente, irreversível e que estão em enorme sofrimento. Não podemos ignorar que há limites que a medicina não resolveu!

Não podemos, em nome da dignidade da pessoa humana, negar o direito a desistir, quando alguém se encontra numa situação de doença irreversível, em grande sofrimento e com perda de autonomia. O que se pretende fazer é conferir o direito à pessoa para ter liberdade, em circunstâncias muito precisas e devidamente acompanhadas e testadas clinicamente, e um espaço de decisão legalmente reconhecido quanto à sua própria morte.

Se viver é um direito e proteger a vida é um dever do Estado, que ninguém pode contestar, contesta-se que seja negado o direito à renúncia de uma vida quando o próprio considera que a sua vida não tem a dignidade necessária para prosseguir. Não respeitar esse direito, quando o próprio o quer usar, com regras estritamente definidas, em estado de consciência e de forma reiterada, é defender uma cultura de imposição que contraria a dignidade da pessoa humana constitucionalmente garantida.

Defender a descriminalização da morte assistida é defender a vida e defender que se respeitem as escolhas de cada ser humano. É defender uma cultura que não oprima as opções do indivíduo, quando, de uma forma consciente, informada e reiterada, pede para que a sua morte física inevitável, em sofrimento incomensurável e extremo, com lesões definitivas ou doença incurável e fatal, seja abreviada. Trata-se de ajudar num ato, em certas e definidas circunstâncias, que resulta em absoluto de uma decisão individual, livre e esclarecida.

Quando se sente que a autonomia e as experiências físicas e emocionais estão postas em causa, não é justo negar a alguém o direito a não querer estar nessa situação.

Alega-se que existem muitas formas de controlar a dor. Mas os efeitos secundários destes fármacos são por vezes tão intoleráveis como a dor que querem controlar. Mas não é só uma questão de dor, é uma questão de qualidade de vida. Ter mais vida com perda de qualidade é algo que muitas pessoas não querem, e esse direito não lhes pode ser negado!

Com esta Lei não se pretende impor a ninguém que, mesmo reunidas essas circunstâncias todas, recorra à eutanásia, mas sim que não seja negado o direito a quem a ela quiser recorrer.

Esta Lei não impede ninguém do acesso aos cuidados paliativos, que deverão continuar a ser ampliados com acesso universal a quem deles necessitar. Esta Lei apenas pretende descriminalizar quem, em certas circunstâncias bem definidas, quiser recorrer à eutanásia para travar um sofrimento horrendo ou uma vida sem autonomia e dignidade. Os direitos não nos obrigam a nada, a ausência deles é que nos limita!

É da mais elementar justiça, tal como já aconteceu com a despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez, pôr termo a uma situação de ilegalidade, onde se ajudem as pessoas a morrer, às escondidas e sem qualquer controlo, à margem da lei, com riscos de denúncia e consequências profissionais gravíssimas.

Como dizia João Semedo, a doença é que tira a vida, não é a eutanásia!»

Elza Pais

NA HORA DA NOSSA MORTE

Jorge Araújo

Jorge Araújo

Editor da E

19 FEVEREIRO 2020

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A morte é um dia como os outros, só que acaba mais cedo. Mas a morte ninguém discute. Todos sabemos que a vida tem princípio, meio e fim. Que às vezes caminha em linha recta, outras aos ziguezagues. E que é no fim que somos todos verdadeiramente iguais. Brancos, negros ou de qualquer uma cor do arco-íris, todos reduzidos a pó. Com mais ou menos lágrimas, deixando mais ou menos saudade.

A grande questão é a hora da morte. Morremos quando “chegou a nossa hora”? Ou morremos quando decidimos que a vida já é morte? Dito desta maneira, pode parecer que o debate sobre a eutanásia, que tanta tinta tem feito correr, é mais sobre a morte do que sobre a vida. Não estou certo disso. Quando um homem se reconcilia com a vida, a morte pode ser a única estrada.

Nos últimos tempos, a eutanásia alimenta discussões. Os dois lados da barricada esgrimam argumentos - é curioso como uma barricada tem sempre dois lados e nunca um pouco de bom senso – a igreja apostou tudo num referendo, admite-se que Marcelo Rebelo de Sousa avançe para o veto e encaminhe o diploma para o tribunal constitucional.

Certo é que o debate sobre a despenalização da eutanásia acontece amanhã no parlamento. E tudo indica que o sim é um dado adquirido.

Os deputados sabem que o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) mostrou, ontem, um cartão vermelho aos quatro projectos-lei.

Em sua defesa, o CNECV afirma que “não constituem uma resposta eticamente aceitável para a salvaguarda dos direitos de todos e das decisões de cada um em final de vida, não considerando nem valorizando os diferentes princípios, direitos e interesses em presença, que devem ser protegidos e reafirmados”. O debate no parlamento promete.

Na hora da verdade, alguns deputados, nomeadamente do CDS, devem levar a lição bem estudada. Hoje à noite, o auditório municipal Eunice Muñoz, em Oeiras, vai ser palco de um colóquio sobre a Eutanásia, promovido pelo partido que já foi de Paulo Porta e agora é de Xicão. Para além do presidente do partido, o destaque vai para a especialista em cuidados paliativos, Isabel Galriça Neto.

UM CRIME É UM CRIME

Há dias que não riscam uma única linha no calendário. Vivem suspensos entre a véspera e o dia seguinte. Hoje é um desses dias.

Os holofotes já estão todos virados para o debate sobre a despenalização da Eutanásia, mas ainda persistem as ondas de choque do caso Marega - o jogador maliano do Futebol Clube do Porto que, no domingo, abandonou o campo, em protesto contra os insultos racistas de que foi alvo, por parte de adeptos do Vitória de Guimarães.

É triste a pele ter cor. Alguém ver a cor da pele do outro. Na verdade, é mais do que triste, é crime. Quem vê a cor, nunca vê o outro. Quem vê a cor tem dioptrias de ignorância. Aqueles que julgam pela cor da pele costumam fazer doutrina no café, na paragem de autocarros, no anonimato das redes socias. Quantas vezes os ouvimos insultar e assobiamos para o lado? É assim que a onda cresce.

Mas o que aconteceu naquele estádio foi diferente. Foi ao vivo e a cores, passou no horário nobre das televisões, incendiou as redes sociais. O que aconteceu foi um crime à vista de todos. E um crime deve ser punido. O racismo merece sempre tolerância zero. O que aconteceu naquele estádio vai muito para além do futebol, diz respeito a todos. Temos de decidir em que mundo queremos viver. Temos de decidir se queremos continuar a ser homens.

Ontem, ficou a saber-se que a polícia identificou pelo menos dez suspeitos. E o número deve aumentar.

A cada dia que passa, cresce a solidariedade com Marega. Depois de Ricardo Quaresma, foi a vez de Abel Xavier dar conta da sua indignação.

Mas não tenhamos ilusões. O que aconteceu com Marega acontece quase todos os dias, em quase todos os estádios portugueses. A diferença é que o maliano teve a coragem – sim, é preciso coragem – de dizer basta. Esperemos que a sua coragem encontre par na nossa.

O racismo é apenas um dos problemas do futebol – cada vez mais um mundo à parte, cada vez mais um mundo onde vale tudo. E eu, que cresci com a bola nos pés, já não me sinto em casa num estádio.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Manifestação contestada do Pegida em Dresden

De  Rodrigo Barbosa  •  Últimas notícias: 18/02/2020 - 11:20

Manifestação contestada do Pegida em Dresden

Direitos de autor

Robert Michael/dpa via AP

Centenas de apoiantes do movimento xenófobo Pegida mobilizaram-se numa nova manifestação em Dresden.

A organização anti-imigração e anti-Islão organizou, até ao momento, 200 protestos na cidade alemã.

O desta segunda-feira contou com a presença de Björn Höcke, líder do partido da extrema-direita Alternativa para a Alemanha no Estado federal da Turíngia.

É importante assinalar que 200 manifestações do Pegida é demasiado. Sobretudo com Höcke, temos em Dresden o mais feroz representante da Alternativa para a Alemanha e temos de mostrar-nos contra isso.

Carsten Biesok

deputado do Partido Liberal Democrata (FDP)

A mobilização do Pegida foi fortemente contestada em Dresden, com mais de 2500 pessoas a manifestarem-se em oposição.

Mais de 400 polícias foram mobilizados para tentar evitar situações tensas.

Não podemos simplesmente permitir discursos de ódio que, com cada palavra, minam a nossa ordem e liberdade democrática, golpeando-a sistematicamente.

Markus Reichel

União Democrata-Cristã (CDU)

O movimento Pegida contesta, deste 2014, as políticas de Angela Merkel que permitiram a entrada de milhares de refugiados na Alemanha, denunciando uma suposta "islamização" da Europa.

ONU destaca situação "horripilante" na Síria

De  Rodrigo Barbosa com AFP / EFE / AP  •  Últimas notícias: 18/02/2020 - 09:37

ONU destaca situação "horripilante" na Síria

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AP Photo

Ao mesmo tempo que o presidente sírio Bashar al-Assad canta vitória, as Nações Unidas dizem que a situação atingiu um "nível horripilante" no noroeste do país.

Segundo a ONU, a ofensiva do regime fez 900.000 deslocados desde o dia 1 de dezembro.

O secretário-geral-adjunto para Assuntos Humanitários da ONU diz que a maioria são mulheres e crianças e que escolas, hospitais e áreas residenciais não escapam à violência.

Mark Lowcock afirma também ter recebido testemunhos de ataques contra campos de refugiados.

A face sombria da guerra, que fez mais de 380.000 mortos desde 2011, contrasta com o tom do discurso de Assad.

Numa rara aparição televisiva, o presidente sírio felicitou as suas tropas, garantindo que vão continuar as operações militares com o objetivo de obter o que classifica da "libertação das províncias de Alepo e Idlib [...] independentemente dos discursos vazios que vêm do norte", numa alusão aos avisos repetidos pela vizinha Turquia.

Nas últimas semanas, forças governamentais apoiadas pela aviação russa conquistaram mais de 1500 quilómetros quadrados de território no noroeste da Síria que estavam nas mãos de grupos jihadistas e fações rebeldes, consolidando o controlo sobre Alepo no passado domingo com a conquista de 30 aldeias e pequenas localidades num único dia.

Pobres os economistas que não sabem de política

por estatuadesal

(Ricardo Paes Mamede, in Diário de Notícias, 18/02/2020)

Peçam a um economista escolhido ao acaso que vos indique um exemplo de sucesso entre os países da zona euro. Com grande probabilidade falará da Irlanda, cujo PIB é hoje quase o dobro do que era antes da crise (o português é quase igual). A seguir perguntem-lhe sobre os motivos desse sucesso. Dirá, com certeza, que os irlandeses aceitaram fazer as reformas estruturais necessárias para dar a volta à crise, aceitando cortes drásticos nos salários e mantendo os impostos sobre as empresas a níveis mínimos. Uma história de sucesso, portanto. Isto é, mais ou menos.

É expectável que o bom desempenho das economias beneficie quem governa. Não é isso que tem acontecido na Irlanda. Nas últimas eleições legislativas antes da crise, em 2007, o Fianna Fáil e o Fine Gael, os dois partidos que governaram o país nos últimos cem anos, somaram 68,9% dos votos. No passado dia 8 de Fevereiro ambos tiveram menos votos que o Sinn Féin (uma formação de esquerda, que não participa num governo desde há um século) e juntos não foram além de 43,1%.

Com tanta conversa sobre o Brexit e o futuro da fronteira entre as duas Irlandas, é fácil acreditar que o resultado das eleições se explica por factores políticos circunstanciais. Mas não é o caso. Diz quem acompanhou de perto a campanha que o Sinn Féin deve o seu sucesso mais a uma impaciência dos eleitores jovens em relação às questões económicas e sociais (baixo crescimento dos salários, preços da habitação, desigualdades de rendimento e de riqueza, etc.) do que a um ressurgimento do velho republicanismo irlandês.

O caso da Irlanda chama mais uma vez a atenção para um facto que muitos economistas insistem em ignorar: as opções económicas dos governos têm quase sempre consequências políticas. Há economistas que julgam que este não é um problema seu - que à "ciência sombria" cabe apenas analisar as condições para uma afectação eficiente dos recursos, sendo função dos políticos levar em consideração outro tipo de objectivos. Mas não é só a economia que é um problema político - também a política pode ser um problema económico.

Medidas que parecem justificáveis com base numa análise económica de custos e benefícios directos podem ter consequências políticas que afectam a eficiência económica futura. Seja pela instabilidade social que geram (a qual desincentiva o investimento privado), pelo reforço da posição dominante de certos grupos em sectores específicos (que retira eficiência ao funcionamento dos mercados), pelo aumento das desigualdades na distribuição de rendimentos (que afecta os níveis de procura agregada e de endividamento privado), ou por outros resultados que originam, as decisões económicas têm consequências políticas que retroagem no desempenho económico.

A preocupação com as consequências políticas das decisões económicas é hoje comum entre aqueles que estudam o desenvolvimento dos países. Por exemplo, Daron Acemoglu e James Robinson apresentam uma lista extensa de decisões que foram recomendadas pelos economistas ao longo dos tempos e cujas consequências políticas prejudicaram o desempenho económico dos países que as adoptaram. Os exemplos incluem: a redução do poder dos sindicatos, que conduziu ao reforço da posição dominante de grandes empregadores em vários países; a rápida privatização de empresas públicas, que deu origem a uma classe de oligarcas com poder para determinar a má regulação dos mercados em que actuam (no leste europeu e não só); a liberalização de preços e de taxas de câmbio, que frequentemente se traduziu numa degradação drástica do poder de compra das populações, resultando em instabilidade social e política prolongada (em vários países africanos e não só); entre outros.

As conclusões de Acemoglu e Robinson são claras: reformas económicas que são implementadas sem ter em conta as suas consequências políticas, em vez de promoverem a eficiência económica, podem reduzi-la significativamente.

Por estas e outras razões, os economistas deveriam ter uma sólida formação em ciência política (e noutras ciências sociais, incluindo a história), da mesma forma que os cientistas políticos precisam de saber de economia (já que boa parte da luta pelo poder se faz pelo acesso a recursos materiais). Já foi assim no passado. Talvez um dia volte a ser.

Economista e Professor no ISCTE