À margem da visita ao bairro Padre Cruz, em Carnide, Lisboa, a coordenadora do BE considerou “de uma extraordinária gravidade” que o anterior Governo “nunca” tivesse “discutido os problemas da banca em Conselho de Ministros”.
Catarina Martins no bairro Padre Cruz, em Lisboa. LUSA/ANTÓNIO COTRIM
“Assunção, por favor vai ao teu email e dá o OK, porque isto é muito urgente, o BdP tomou esta decisão e temos de aprovar um decreto-lei”. De repente, durante umas férias, Assunção Cristas recebe um pedido da ministra das Finanças, quando estavam ambas no Governo e a braços com o caso BES. “Sem conhecer os dossiers”, explicou a líder centrista, a única coisa que fez foi “confiar”.
Esta é apenas uma das partes da entrevista da centrista Assunção Cristas ao PÚBLICO, que já motivou piadas nas redes sociais e que deixou a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, de boca aberta. Mas há mais: “Não há ninguém que não fique perplexo e preocupado quando uma ministra nos diz que o Governo de que fez parte, que estava no furacão de uma crise financeira, nunca discutiu os problemas da banca e do sistema financeiro no Conselho de Ministros”, disse a bloquista, nesta terça-feira de manhã, à margem de uma visita bairro Padre Cruz, em Carnide, Lisboa.
Nem BES, nem Banif, nem CGD: “O Conselho de Ministros nunca foi envolvido nas questões da banca”
“É de uma extraordinária gravidade que PSD e CDS, que impuseram todo o tipo de sacrifícios à população por causa de uma crise financeira e do sistema financeiro que o país atravessava, nunca tivessem discutido os problemas da banca em Conselho de Ministros”, insistiu.
A deputada bloquista comentava a entrevista de Assunção Cristas ao PÚBLICO, na qual a ex-ministra do anterior Governo de direita afirmou ainda que “o assunto BES nunca foi discutido em Conselho de Ministros com profundidade”. Acrescentou que foi apenas referido e que “discussão em profundidade do problema do BES, das soluções, das alternativas, das hipóteses, isso nunca aconteceu”.
Mas Catarina Martins está também estupefacta com o episódio das férias: “Confesso que é também com muita estupefacção que alguém que foi ministra diz que assinou de cruz, ou seja, sem ler, sem conhecer algo de uma importância tão grande e com custos tão grandes para o país como a resolução do BES. Eu acho que sobre a natureza do anterior Governo estamos conversados. Quando o problema era a banca, nunca discutiram a banca em Conselho de Ministros”, continuou a bloquista.
A deputada do BE não compreende como pode uma ex-ministra mostrar esta “irresponsabilidade” num caso como o do BES: “Quando a decisão mais cara que tomaram para o país foi a resolução do BES, houve ministros que assinaram de cruz sem sequer ler o documento. O problema é que o Governo já passou e nós continuamos até hoje a pagar os custos desta enorme irresponsabilidade e incompetência”, afirmou, garantindo que o Bloco de Esquerda estará atento ao que se passa no sistema financeiro em Portugal, nomeadamente ao alerta da auditora KPMG para o facto de a Associação Mutualista Montepio Geral, dona da Caixa Económica (banco Montepio), ter capitais próprios negativos e necessitar de ser recapitalizada.
Na entrevista ao PÚBLICO, quando questionada sobre se repetiria a resolução tomada no caso BES, Assunção Cristas voltou a insistir que o anterior executivo não discutiu “os cenários possíveis” no Conselho de Ministros. E foi nessa passagem que contou que estava de férias quando recebeu um telefonema de Maria Luís Albuquerque: “Eu estava no início de férias e recebi um telefonema da ministra das Finanças a dizer: ‘Assunção, por favor vai ao teu email e dá o OK, porque isto é muito urgente, o BdP tomou esta decisão e temos de aprovar um decreto-lei’. Como pode imaginar, de férias e à distância e sem conhecer os dossiers, a única coisa que podemos fazer é confiar e dizer: ‘Sim senhora, somos solidários, isso é para fazer, damos o OK.’ Mas não houve discussão nem pensámos em alternativas possíveis — isto é o melhor ou não —, houve confiança no BdP, que tomou uma determinada decisão”.
Ovar, 14 de março 2017
Álvaro Teixeira
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