por estatuadesal |
(Nicolau Santos, in Expresso Diário, 25/09/2017)
As eleições alemãs trouxeram um cenário que parecia ter sido afastado depois das pugnas eleitorais na Áustria, Holanda e França: o regresso em força da extrema-direita ao panorama político europeu. Com efeito, a espetacular votação conseguida pela Alternativa para a Alemanha (AfD) leva, pela primeira vez no pós II Guerra Mundial, um partido xenófobo, racista e violentamente antieuropeu a sentar 94 deputados (!) no parlamento germânico. E esta não foi a única má notícia.
Angela Merkel conseguiu a sua quarta vitória em eleições legislativas, o que é seguramente um feito. Mas é o seu terceiro pior resultado (32,9% e 239 deputados) e um dos piores do seu partido, a CDU, coligada com a CSU. Mais complicado, o SPD, o outro grande partido alemão, afundou-se, tendo ficado com 20,6% dos votos e 146 deputados. Por outras palavras, o centro, que tradicionalmente tem governado a Alemanha desde o fim da Guerra, está claramente em perda. E está em perda, no caso de Merkel, devido à sua política de acolhimento dos imigrantes e ao seu apoio aos resgates financeiros dos países do euro. Ou seja, dois dos principais valores em que assenta a União Europeia (direitos humanos e solidariedade) estão a deixar de ser populares na Alemanha.
Ainda por cima, os liberais, candidatos a ser um dos parceiros do necessário governo de coligação, regressaram ao parlamento depois da derrota de 2013 com um discurso muito crítico das políticas de resgate e de imigração, no que foi visto como uma tentativa de roubar eleitorado AfD, mas que aproximou o discurso do FDP do da extrema-direita.
Digamos, pois, que as forças críticas da construção europeia e da solidariedade com os países do sul regressaram em força nesta eleição. E o caso é bastante mais complicado porque 1) a situação se verifica no país mais importante da União Europeia 2) é provável que as linhas base do discurso do FDP e da AfD venham a obrigar Merkel a tornar-se mais distante e crítica da União Europeia.
A incerteza decorrente destas eleições já se manifestou hoje nos mercados, quer na bolsa, quer através do enfraquecimento do euro. É normal que tal aconteça, porque os investidores detestam a incerteza e a imprevisibilidade. E o regresso a uma certa normalidade só ocorrerá quando o governo estiver formado e quando a chanceler alemã der sinais claros de qual vai ser, a partir de agora, o seu posicionamento em relação à União Europeia, à moeda única e aos outros Estados membros. Por outras palavras, mais que nunca, a Europa precisa de uma líder forte e coerente, que não abdique das suas ideias e que saiba resistir à pressão que o discurso da extrema-direita está a testar no seu país.
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