(In Blog O Jumento, 28/10/2017)
Esta foi a semana horribilis de Marcelo Rebelo de Sousa, um turn point do seu mandato presidencial, Marcelo não será mais o político unânime que pretendia ser. Pressionado pelo seu próprio erro de se deixar envolver na campanha pela liderança do PSD, ao lado de um candidato pouco credível e contra outro candidato com quem não tem boas relações, Marcelo precisa de distrair as atenções da direita atacando a esquerda.
Os incêndios foram a oportunidade, sabendo que o governo ia adotar medidas e substituir a ministra da Administração Interna, Marcelo deu o seu golpe de mágica, antecipou-se invocou poderes constitucionais que não tem e fez como fazia o Hugo Chavez, mandou demitir uma ministra e deu ordens ao governo no meio de uma conversa com os portugueses.
Invocando a Constituição e dizendo que a estava cumprindo e fazendo cumprir chamou a si a competência de definir programas governamentais e definir prioridades das decisões governamentais. Do dia para a noite o Presidente passou a ter poderes de exceção, pode decidir a demissão de ministros a meio de comunicações televisivas e definir parâmetros para os programas governamentais. O governo deve esquecer o seu programa, aprovado no parlamento, para a um ritmo quase semanal definir novas metas erráticas, deve ainda decidir medidas a longo praz em dossiers cujo ministro foi demitido em direto a partir de Oliveira do Hospital.
Marcelo fez uma abordagem da Constituição a partir daquilo que ele julga ser o poder que em vez de resultar do texto constitucional decorre da sua popularidade, medida por sondagens encomendadas por jornais. A exigência de demissão de um ministro, a exigência de medidas que consubstanciam um programa a longo prazo, ao estabelecer prioridades para a ação do governo sem respeitar o programa que o parlamento aprovou ou sem que as mesmas sejam debatidas no parlamento, são gestos que podem ser interpretados como violações grosseiras da Constituição.
É o parlamento que aprova o programa do governo, é o parlamento que pode adotar resoluções que constituem orientações programáticas para a sua ação. O presidente não tem tais poderes, tem um poder de fazer cumprir a Constituição, mas isso não significa dar ordens a um governo que responde perante o parlamento. Pode sim questionar a constitucionalidade das decisões do governo, mas a verdade é que as decisões e gestos do Presidente da República dependem da Constituição e da interpretação da Constituição. Quem em Portugal interpreta a Constituição não é o Presidente, mesmo que seja professor de direito, mas sim o Tribunal Constitucional.
Marcelo nunca mais vai ter a confiança que teve junto de muitos eleitores, percebeu-se que a sua gestão de afetos não passa de uma estratégia populista que só poderá levar à invenção de um Perón de Celorico. Perdeu a confiança da direita depois de tratar Passos da forma que se viu, perdeu a confiança de uma parte do seu partido ao ter uma relação gastronómica com Santana Lopes, perdeu a confiança da esquerda ao comportar-se de forma que pode ser considerada de grosseira nesta semana.
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