por CGP
Em termos genéricos, há duas formas principais de acumular poder e concentrar riqueza: pela criação de valor ou pela sua captura. Esta é uma confusão que muitos populistas gostam de fazer quando se trata de avaliar a concentração de riqueza em indivíduos. A concentração de riqueza num qualquer cleptocrata africano não tem o mesmo significado que a concentração de riqueza em Bill Gates ou Belmiro de Azevedo. Até se pode discordar de ambas, mas a verdade é que Bill Gates acumulou riqueza criando algo que fez o mundo melhor e tornou a vida de milhões de pessoas mais fácil. Já um ditador africano fê-lo pela captura de riqueza aos que a iam criando. Mesmo discordando das duas, qualquer pessoa razoável admitirá que os efeitos nos outros de cada uma destas formas de acumulação é bastante diferente. Num dos casos, todos os outros ficaram a ganhar com aquele processo de acumulação de riqueza. No outro, ficaram todos a perder, excepto quem a capturou.
Com as cidades não é muito diferente. A concentração de poder económico numa cidade pode ser favorável a todo o envolvente. Existem economias de aglomeração evidentes, especialmente dentro da mesma indústria. A concentração do sector financeiro em cidades como Nova Iorque e Londres, mesmo criando desigualdades regionais, favorece o resto dos países em que essas cidades estão envolvidas. O mesmo com os clusters tecnológicos de São Francisco ou o cluster de serviços do Dubai. No entanto, a centralização do poder também traz riscos: a de ter todas as decisões tomadas pelo mesmo círculo social, dando incentivos à captura de riqueza em vez da sua criação. Quando os poderes político, financeiro e empresarial estão tão próximos que se confundem, há um evidente incentivo a direccionar energias para a captura de riqueza em vez da sua criação.
Chegados aqui, resta a questão: a centralização de poder e riqueza em Lisboa tem sido favorável ou desfavorável ao país? Houve economias de aglomeração que, mesmo criando desigualdes regionais, favoreceram o país como um todo? Ou, pelo contrário, a centralização contribuiu para um cenário de captura de poder por um grupo social fechado que condena as outras regiões, e o país como um todo, ao empobrecimento. Podíamos discutir esta questão horas a fio, mas há uma forma mais fácil de a entender que é pensar que teria acontecido se Norte e Centro tivessem vivido como país independente (ou seja, sem "beneficiar" das economias de escala de Lisboa). Parece-me evidente que o Reino Unido sem as eficiência criadas por Londres seria bastante mais pobre. O resto dos EUA também beneficia com a centralização dos serviços financeiros em Nova Iorque e da economia digital em Silicon Valley. E as regiões norte e centro? Será que beneficiaram com a concentração em Lisboa.
No meu texto anterior, referi que, se fossem um país independente, as regiões Norte e Centro seriam um dos mais pobres da UE*, atrás de muitas das economias mais pobres dos países de Leste. Quem defende que a centralização em Lisboa beneficia o resto do país, está basicamente a dizer que, sem centralização, Norte e Centro seriam ainda mais pobres do que são hoje. Seriam ainda mais pobres do que países que atravessaram décadas de comunismo. Isso é pouco credível. Tão menos credível quanto ali ao lado há uma região em tudo igual, a Galiza, e cujo PIB per capita é cerca de 21% superior.
A Galiza e as regiões a norte de Lisboa partilham culturas e posições geográficas semelhantes. A diferença principal: a Galiza tem uma autonomia alargada dentro de Espanha, o Norte e Centro de Portugal não.
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