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sexta-feira, 10 de novembro de 2017

O que querem os homens?

Estátua de Sal

por estatuadesal

(Por Valupi, in Blog Aspirina B, 10/11/2017)

assédio

Num ano sem eleições presidenciais na fabulosa e hoolywoodesca América, a October surprise foi protagonizada pelas mulheres que denunciaram a conduta sexual de Harvey Weinstein. O próprio reconheceu a veracidade desses testemunhos, iniciando-se com a queda desse gigante da indústria cinematográfica uma avalanche de casos similares com outras figuras do mundo do espectáculo. Corrente que não se sabe quando nem onde irá parar. Aliás, a dimensão do fenómeno é tal que a perspectiva de se descobrirem “oficialmente” os “podres” da maioria das estrelas consagradas seja qual for a sua área de actividade profissional, obrigando ao seu ostracismo e ao apagamento da sua memória, já não surge como um cenário de desvairada ficção à luz do que se está a fazer com Weinstein e Kevin Spacey.

Estamos a assistir a um momento de mudança de paradigma? Foda-se, claro que sim. Basta analisar o caso inicial, o qual era do conhecimento generalizado do meio durante décadas e que só foi denunciado nesta altura – apesar de tantas mulheres, e tão poderosas no seu estatuto e recursos financeiros, terem sido vítimas ou saberem dos abusos. Apenas uma coerção social tácita, nascida de um calculismo dominante, explica o prolongamento e extensão dos actos de alguém tão exposto pela sua notoriedade e descontrolo. Portanto, independentemente do imprevisível desfecho judicial e das voláteis convulsões morais, a dimensão social parece suficientemente alterada para levar a uma mudança cultural.

Seguir-se-á uma nova era, sendo que por agora a sexualidade masculina é o novíssimo continente desconhecido. Como se pode constatar neste artigo – Why men use masturbation to harass women – os especialistas consultados não fazem sequer a mínima ideia do que poderá estar a gerar comportamentos como os atribuídos ao hilariante LOUIS C. K. Porém, a resposta encontra-se à vista dos curiosos, basta assistir aos seus números em palco para tropeçar em conteúdos retintamente pessoais. E pode-se logo agarrar numa primeira questão: será possível separar a qualidade do seu humor, a eficácia dos seus quadros teatrais, do drama em gente onde o material criativo é arrancada da sua privacidade? Teremos de inverter a vexata questio freudiana, “O que querem as mulheres?”, e darmos atenção a estoutra, potencialmente ainda mais enigmática, “O que querem, afinal, os homens famosos e poderosos que batem pívias à frente do mulherio?”

Todos os homens são sexualmente predadores. Se não o forem, algo de errado se estará a passar. Não há moral nesta realidade, apenas biologia. Uma mulher não poderá jamais saber em que consiste esse estado – ou seja, a mulher não sabe o que é ter “tesão” – tal como um homem não poderá jamais saber o que seja ter o período ou estar grávido. Assim, as mulheres não compreendem o desejo masculino, embora se adaptem com maior ou menor facilidade a ele. Igualmente, os homens não entendem o desejo feminino, e, acima e antes de tudo, não concebem que a mulher possa ter uma radicalmente diferente motivação e dinâmica sexual. Era aqui que o tio Freud patinava, projectando na fêmea o seu masculino e, portanto, redutor e erróneo entendimento do que seja a experiência feminina. Este estado predatório nos homens não é uma escolha, antes uma condição que a biologia e a cultura têm ambas reforçado. O falocentrismo que origina nasce tanto da exterioridade anatómica do pénis como da procura das recompensas químicas geradas nos cérebros masculinos com a fácil ejaculação e, por fim, cristaliza-se numa celebração simbólica inserida numa “luta de géneros” muito parecida com uma luta de classes.

Há uma história imensa por contar. É a história do homem como sexo fraco. E ridículo. Por isso, violento. Por isso, violentador por exigência mecânica. E tão periclitante e efémero na sua erecção sempre triunfal. Que seria deste mundo se as mulheres contassem tudo o que sabem desses seres a quem suportam a fragilidade logo na família, tantas vezes, e ao longo de toda a vida, quase sempre?

Elas ainda não estão capazes de contar o que testemunham directa e indirectamente. Na família, nos amigos, nas festas, no emprego, nas férias, nos consultórios, nas saídas, nas conversas, nos quartos. Mas tinha de se começar por algum lado. Começou-se por um celebérrimo ogre. Só que esse, paradoxalmente, era um alvo fácil. Venham os mais difíceis, os ogres que as mulheres amam. Os ogres que as mulheres perdoam. Os ogres que as mulheres protegem.

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