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terça-feira, 28 de novembro de 2017

Um Ricardo Araújo Pereira em cada esquina

por Sérgio Barreto Costa

rap

Na semana passada, entre assuntos sem qualquer importância tais como o aumento de impostos para as empresas (que irá certamente promover o investimento na Holanda e no Luxemburgo, dois países que, ao contrário do nosso, bem dele precisam) e o aumento da despesa pública estrutural (um presente simpático para o governo que estiver em funções quando a conjuntura económica se alterar), tivemos direito a uma polémica verdadeiramente interessante. Ricardo Araújo Pereira, ex-vendedor de bifanas na Festa do Avante, apoiante do LIVRE nas últimas eleições legislativas, galardoado por uma associação (ILGA) que se dedica à “intervenção Lésbica, Gay, Bissexual, Trans e Intersexo”, figura central na campanha pela despenalização do aborto e Miss Dezembro 2009 da Playboy Portugal, foi acusado de ser um reaccionário.

Alguns frequentadores das redes sociais, defendendo o humorista, insinuaram que os críticos de RAP estavam apenas a sofrer de uma pequena luxação na zona do cotovelo, uma maleita que, de acordo com a vox populi, é frequente em Portugal. Muito honestamente, não vejo fundamento nessa teoria. Se excluirmos o facto de Araújo Pereira ser inteligente, culto, divertido, bonito, famoso, simpático, bem-sucedido, influente, espirituoso, alto, magro e, segundo consta, familiarmente feliz, que raio de motivos teria alguém para o invejar?

Também não partilho de uma outra opinião, que fui ouvindo, em que as críticas são atribuídas à falta de bom senso e de razoabilidade dos acusadores. Estamos a falar, de uma maneira geral, das mesmas pessoas que disseram que Passos Coelho era um radical do liberalismo, que Vítor Gaspar era um clone do Salazar, que Angela Merkel era um Hitler de saias e que o Syriza de Alexis Tsipras ia acabar com a austeridade na Grécia. Como a moderação e a perspicácia não desaparecem de um dia para o outro, a explicação deve ser outra.

Na minha análise – devidamente não fundamentada, como todas as outras que por aqui deixo – toda a polémica se baseia num equívoco. O reaccionário, tal como é visto pela ciência política, é alguém que pretende, usando as palavras de Marx e Engels, fazer andar para trás a roda da história. A esta luz, teríamos de concluir que Ricardo Araújo Pereira sente saudades da época em que era estagiário na TVI; e de usar camisas à programador informático. Já para não falar do penteado. Não é plausível, o contexto tem de ser outro. RAP apenas se limitou a não embarcar em todas as causas que lhe apareceram à frente. E, nesse sentido, foi mesmo reaccionário. Mas à maneira de Nelson Rodrigues: quando achou que não prestava, reagiu. Fez bem. Que nunca lhe doam os dedos.

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