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terça-feira, 30 de janeiro de 2018

por mim deixava o centeno, vulgo ronaldinho lusitano, em paz

Novo artigo em BLASFÉMIAS


por rui a.

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As notícias da manhã levam a crer que a história dos bilhetes para a bola dados pelo Benfica a Centeno será apenas um fait-divers perante uma hipótese de corrupção que pode envolver futebol, magistrados e a máquina fiscal.

A ser verdade, não seria de estranhar. Pelo poder imenso de que dispõe, que foi ao ponto de ter conseguido inverter «legalmente» alguns dos mais importantes pilares do Estado de direito - a presunção de inocência (vd. o crime de abuso de confiança fiscal) e o princípio de que quem acusa prova (a inversão do ónus probatório em todos os crimes fiscais) - o fisco português aterroriza de tal modo os cidadãos, que muitos deles, principalmente aqueles que estão em incumprimento perante ele, estão dispostos a tudo para se verem livres de uma ameaça que lhes pode levar tudo o que ganharam na vida e fechá-los numa cela por muitos anos. Como a ocasião cria o ladrão, é exactamente neste tipo de situações que aparece quem se aproveite da desgraça alheia, cobrando-se, generosamente, por serviços prestados. Não será, pois, de espantar que funcionários deixem prescrever dívidas ou até as façam desaparecer, e que juízes profiram sentenças amáveis para que se «chegar à frente».

Por outro lado, os benefícios fiscais, mais ou menos lícitos, concedidos pelo estado aos clubes de futebol também não são coisa nova. Veja-se, por exemplo, a vergonha que foi o tratamento fiscal dado ao Benfica pelo ministério de Manuela Ferreira Leite, em que dívidas de milhões de IRS foram objecto de parcelamento «garantido» pelas acções da SAD do próprio devedor, para que o clube sacasse as declarações de regularidade fiscal que o habilitariam aos fundos comunitários para a construção do novo estádio.  Enquanto empresários respondiam, nas barras dos tribunais, por dívidas infinitamente inferiores, o novo secretário de estado das finanças - por sinal acabado de largar o cargo de director financeiro do Benfica - aprovava esse extraordinário acordo. Infelizmente, nunca ninguém o investigou.

Posto isto, parece-me apenas que confundir os dois bilhetes dados a Centeno com o que se poderá aqui, de facto, estar a passar, é confundir a árvore com a floresta. Não só por ser por demais evidente que nenhum ministro das finanças do mundo - nem mesmo do Kinshasa, se deixaria sujar por tão pouco, como pode até a coisa ter sido posta cá fora como nuvem de poeira para se não ver o que mais importa. Como envolve um ministro, e logo o ministro mais importante deste governo, dá pano para mangas e para muita conversa. Mas mangas de um fato de péssima qualidade. Até porque Centeno, além de ser um ministro sensato, é a única barreira entre os cofres do estado e o Bloco de Esquerda, que anseia, de há muito, colocar os seus homens nesse ministério. Por isso, faria bem a direita em deixar estar o ministro onde está, enquanto a geringonça estiver como tem estado. Mandá-lo embora e manter o governo da frente de esquerda seria suicídio. Que todos pagaríamos bem caro.

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