Posted: 09 Mar 2018 01:16 AM PST
Mário Centeno declara que o chamado ajustamento grego foi demasiado longo (de facto, a crise grega ultrapassou a Grande Depressão em duração e severidade da queda do PIB), mas, traduzindo a novilíngua da troika por si adoptada, diz que a falta de convicção com que as elites gregas aplicaram as políticas impostas pelos credores atrasou tudo. Varoufakis vê justamente nisso um insulto, que se soma à injúria sofrida.
Nem de propósito, em artigo no número deste mês da edição portuguesa do Le Monde diplomatique - Por quem o sininho dobra no Eurogrupo? - mobilizo o último livro de Varoufakis, que tem algumas boas revelações e que foi recentemente editado entre nós, para tentar aprofundar a reflexão sobre os efeitos perversamente reveladores da chamada eleição de Centeno para a chamada Presidência do chamado Eurogrupo. Centeno está bem onde está, tendo em conta a sua orientação ideológica. A questão com Centeno não é pessoal, mas sim política. Um problema, em suma.
Enfim, apetece dizer: eles que apostem no bloco central europeu, do ponto de vista político, e em dar novo fôlego à financerização da economia, como já defendeu Centeno em declarações e opções recentes; eles que tragam cá para dentro tais tendências europeias, o que se nota aqui e ali, e veremos então se a social-democracia nacional escapa a prazo ao destino das suas congéneres europeias.
Entretanto, Varoufakis insiste na fuga em frente dita pan-europeia, esquecendo que não se conquista na escala transnacional o que se perdeu na escala nacional, rumo a um resultado residual nas eleições europeias para os partidos que integrem o seu movimento, nuns casos, ou a fazer de flor na lapela de uma social-democracia em declínio generalizado, noutros.
Posted: 08 Mar 2018 06:19 PM PST
Posted: 08 Mar 2018 01:37 PM PST
Na sexta-feira passada, a propósito do livro que celebra o 10º aniversário do Observatório das Desigualdades (OD), o Público chama à capa uma notícia bombástica: «Desemprego real é o dobro do que mostram os números oficiais». Curiosamente, talvez porque os tempos eram outros, uma notícia semelhante não teve o mesmo destaque em março de 2015, quando a taxa de desemprego real era bem mais significativa (superior a 25%), de acordo com as conclusões do estudo do Observatório das Crises (OsCA). Nessa altura, de facto, quem no Público acabaria por prestar mais atenção a esse trabalho foram cronistas como João Miguel Tavares e Fátima Bonifácio, que o tentaram descredibilizar, alegando falta de «cientificidade» e sugerindo que o mesmo não passava de um exercício de «endoutrinação».
Na devida altura (agosto de 2017), o João Ramos de Almeida chamou à atenção para o facto de o INE voltar a publicar dados agregados sobre formas atípicas de desemprego (não integradas no cálculo do desemprego oficial), retomando o conceito de «desemprego em sentido amplo», mas agora sob a designação de «subutilização do trabalho». Este indicador, suspenso durante os anos da troika, não recupera contudo os critérios anteriores, tornando impossível reconstituir, nos mesmos moldes, a série de dados anterior a 2011 (gráfico aqui em cima). Entre as várias alterações sobressai a transição do subemprego para o universo dos ativos empregados (até 2009 fazia parte da população inativa) e dos desencorajados para o universo dos inativos, passando os ocupados a ser contabilizados também como emprego e não como desemprego (escapando portanto aos cálculos da respetiva taxa).
Ora, o que os exercícios do OsCA e do OD pretendem é justamente apurar de forma global as diversas situações de desemprego, de modo a melhor refletir a dimensão real do fenómeno, superando assim as limitações dos cálculos oficiais de emprego e desemprego. O que permite, por seu turno, evidenciar até que ponto os critérios estatísticos adotados em 2011 ajudaram por um lado a dissimular a degradação do mercado de trabalho na vigência do anterior Governo (camuflando o desemprego) e, por outro, compreender a sua evolução desde o final de 2015.
A partir destes exercícios é possível fixar alguns pontos relevantes: sobretudo entre 2013 e 2015, o volume de «desempregados ocupados» foi essencial para escondero desemprego (se em 2011 os «ocupados» representavam 7% das formas atípicas de desemprego, em 2014 e 2015 assumem um peso de quase 30%, descendo desde então para valores já próximos dos 20%); é apenas em 2015 (e não em 2014) que o desemprego oculto começa a diminuir, sendo significativa a queda entre 2015 e 2017 (-131 mil). Ou seja, o facto de o desemprego real ser em 2017 «o dobro do que mostram os números oficiais» não significa - ao contrário do que possa sugerir a manchete do Público - que o desemprego oculto esteja a aumentar. Não, apenas a recuperação do mercado de trabalho tem sido essencialmente feita, como é natural, através de um ritmo de integração dos desempregados contabilizados pelo INE, que é superior ao da integração de desencorajados, do subemprego e dos «ocupados». Um desemprego real acima do desemprego oficial não é portanto propriamente uma «notícia». E muito menos uma notícia bombástica.
Sem comentários:
Enviar um comentário