3 ABRIL, 2018
França vai homenagear os soldados portugueses que combateram na Batalha de La Lys, na Primeira Guerra Mundial, com vários eventos entre 8 de abril e 7 de maio.
O programa oficial das comemorações da Batalha de La Lys, vão começar a 8 de abril, ao fim da tarde, no Arco do Triúnfo, em Paris, onde o Presidente da República Portuguesa Marcelo Rebelo de Sousa e o Primeiro Ministro António Costa, vão depor uma coroa de flores junto ao Monumento ao Soldado Desconhecido. O Presidente francês Emmanuel Macron vai deslocar-se ao Cemitério Militar Português na segunda-feira, dia 9 de abril, para se juntar ao Presidente e ao primeiro-ministro portugueses, para assinalarem juntos, o Centenário da Batalha de La Lys.
As comemorações oficiais dos cem anos da Batalha de La Lys terão lugar na segunda-feira de manhã na presença dos dois Presidentes da República, primeiro no Cemitério Militar Português de Richebourg e depois junto ao Monumento ao Soldado Português de La Couture.
Mas as atividades vão também decorrer em La Couture, Richebourg, Neuve-Chapelle e Lillers, as quatro cidades do norte de França onde ocorreu, há 100 anos, a Batalha de La Lys, na qual os soldados portugueses foram destroçados pelos alemães na véspera do render de tropas.
Em Richebourg, onde estão sepultados 1.831 soldados, será inaugurada uma exposição sobre os descendentes de militares portugueses que combateram na Grande Guerra, comissariada por Aurore Rouffelaers.
Na localidade vizinha de La Couture, onde está o Monumento aos Mortos da Grande Guerra, projetado pelo escultor Teixeira Lopes, está a ser realizado um mural para “contar em imagens a história da Grande Guerra”. O mural, promovido pelo município, deverá ser inaugurado a 9 de abril, durante as comemorações oficiais do centenário da Batalha de La Lys.
Ainda em La Couture, a associação ‘Alloeu Terre de Batailles 1914-1918’ vai fazer uma exposição sobre a participação portuguesa na Batalha de La Lys e, em colaboração com a associação ‘La Couture Champs de Cultures (L3C)’, vai publicar uma brochura sobre o Corpo Expedicionário Português (CEP).
Em Neuve-Chapelle, onde estava a linha da frente na Batalha de La Lys, vai ser exposta a coleção do Corpo Expedicionário Português de Afonso Maia, neto de um soldado português que participou na Grande Guerra e que dedicou grande parte da sua vida a estudar o CEP.
No centro de turismo de Lillers, vai ser realizada a exposição intitulada ‘Amores Suspensos’, a partir de cerca de 150 cartas de soldados portugueses e que também faz parte da coleção de Afonso Maia.
No Manoir de La Peylouse, uma mansão do século XIX que era o quartel-general do CEP, na localidade Saint-Venant, o jardim vai ter plantas com as cores de Portugal e retratos de soldados nas árvores entre abril e outubro. Vai ainda ser difundido, no canal público France3, um documentário sobre escritores e poetas portugueses que participaram na guerra.
Na localidade de Saint-Venant, onde estava o Corpo Expedicionário Português, vai ser organizada uma exposição sobre os soldados portugueses na Batalha de La Lys, numa iniciativa da ‘Association de recherches historiques, archéologiques et militaires’ (Arham).
“Um vazio” na historiografia francesa
A presença de soldados portugueses nas trincheiras da Flandres durante a I Guerra Mundial constitui “um vazio” na historiografia francesa, refere o historiador Georges Viaud, sublinhando que há um século essa presença era “bem conhecida”. Espera-se que nesta comemoração do centenário da Batalha da Lys essa presença fique, dadas as comemorações, bem vincada.
“A presença portuguesa na Grande Guerra era bem conhecida naquela época. O ‘Le Figaro’, o ‘Le Matin’, o ‘L’Express du Midi’ de Toulouse são jornais que falaram da presença portuguesa na guerra. Mais tarde há um vazio que se instala porque deixa de se falar da presença portuguesa e agora os historiadores franceses não estudaram essa presença”, indicou o presidente da Sociedade de História e Arqueologia do 14° bairro de Paris.
Para o historiador francês Emmanuel Saint-Fuscien, professor na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris, a participação de Portugal na Primeira Guerra Mundial é, simplesmente, “um ângulo morto da historiografia europeia”, sobretudo francesa.
A segunda hipótese prende-se com a determinação de França “em insistir na participação do conjunto da nação”, ou seja, nas “regiões até aqui consideradas como periféricas – como o oeste da Bretanha, a Córsega, algumas partes do Midi e as colónias – o que apaga algumas participações estrangeiras”
O tema que não merecia destaque no universo editorial francês, o que levou o historiador Manuel do Nascimento a publicar dois livros sobre o tema, «A Batalha de La Lys» e «Primeira Guerra Mundial: Os soldados portugueses das trincheiras da Flandres e a mão-de-obra portuguesa a pedido do Estado francês». “Quando apresentei o primeiro livro à editora disseram-me que os franceses desconheciam o tema. Sempre que vou a palestras, todos os franceses ficam de boca aberta porque desconhecem a participação portuguesa”, afirmou Manuel do Nascimento.
I Guerra Mundial e a participação portuguesa
Portugal não quis deixar dúvidas de que estava empenhado em lutar ao lado dos aliados e para isso treinou e mobilizou para França uma divisão reforçada de 35 mil homens, sobretudo infantaria apoiada por artilharia de campanha, com a designação Corpo Expedicionário Português. Esta força passaria mais tarde a duas divisões, num total de 55 mil homens. Em todo o conflito (de 1914 a 1918), Portugal destacou pouco mais de 105 mil homens (55 mil para o teatro europeu e os restantes para África, sobretudo Angola).
Em Janeiro de 1917, Norton de Matos, que em março de 1916 ocupou a pasta da Guerra e era partidário da intervenção de Portugal na Primeira Guerra, organizou em tempo “recorde”, conjuntamente com o general Fernando Tamagnini de Abreu e Silva, nascido em Tomar, a Divisão de Instrução em Tancos, da qual resulta o Corpo Expedicionário Português. Este episódio ficou conhecido como o “milagre de Tancos”.
O primeiro Corpo Expedicionário partiu em 26 de janeiro de 1917 para a Flandres. Uma vez declarado o estado de guerra pela Alemanha, a 9 de Março de 1916, o Governo de Afonso Costa tratou de acelerar urgentemente a preparação dos primeiros contingentes.
Para aumentar a “produção” de soldados, a 24 de Maio de 1916, o Ministério da Guerra mandou reinspeccionar todos os cidadãos com idade inferior a 45 anos e que tinham anteriormente sido declarados “não aptos”: e até coxos seriam incorporados.
E no tórrido estio da charneca de Tancos, em condições climatéricas totalmente opostas às que os soldados iriam encontrar no campo de batalha europeu, era finalmente dada por “pronta” a maioria das tropas submetidas a treino.
O Governo, “em busca da aprovação pública e do sossego dos soldados e das suas famílias”, chamou à preparação relâmpago dessas tropas “o milagre de Tancos”.
Mais de vinte mil homens, sob o comando do general Fernando Tamagnini de Abreu e Silva, desfilaram a 22 de Julho de 1916 na parada de Montalvo, literalmente ‘para inglês ver’.
Na história francesa e apesar de haver em Paris uma Avenida de Portugal há muito desconhecimento da participação portuguesa na I Guerra Mundial.
Porém, o Corpo Expedicionário Português, com duas divisões, combateu na Flandres entre Novembro de 1917 e 9 de Abril de 1918, ocupou um sector da frente entre Armentières e Bethune, compreendendo um distância de doze quilómetros.
Ao longo dos anos de 1917 e 1918 o CEP participou em vários combates. A sua intervenção ficou marcada pela Batalha de La Lys, travada a 9 de Abril de 1918, data prevista para a rendição do efetivo militar português.
O CEP foi destroçado pelo exército alemão e inúmeros dos seus efetivos feitos prisioneiros. O que sobrou do CEP deu origem à formação de três batalhões que perseguiram a forças alemãs antes do Armistício.
A Batalha de La Lys
Com material danificado pelo inverno de 1917, desmoralizado e sem reforços enviados de Lisboa, o contingente português foi submetido a uma forte barragem de artilharia e “atropelado” pelas divisões alemãs.
A 8 de Abril o comando do CEP era surpreendido com uma nova ordem que mandava proceder de imediato a alterações no sector à responsabilidade da 2ª Divisão portuguesa, conducentes à rendição de algumas unidades. E quando, ainda a 8, as primeiras tropas inglesas surgiram, a notícia da rendição próxima correu como um rastilho por todo o dispositivo português.
Foi durante o desenrolar dessa operação de substituição de forças, cuja fase intermédia decorria a 9 de Abril de 1918, que os germânicos, depois de uma intensa barragem de fogo de artilharia e de metralhadoras de que não havia memória, com várias Divisões, esmagaram a linha portuguesa, apanhando-a em contrapé.
As forças portuguesas perderam, entre mortos, feridos, desaparecidos e prisioneiros, 327 oficiais e cerca de 7.500 soldados, dos 721 e 20.359, respectivamente, que haviam entrado em combate.
Uma derrota humilhante – apesar da forte resistência dos portugueses e de algumas histórias individuais de heroísmo – que marcou o início do fim da participação portuguesa na I Guerra Mundial. Os efetivos ainda aptos do CEP foram posteriormente formados em três batalhões de infantaria, e integrados no exército inglês, no qual lutaram até ao armistício, em novembro de 1918.
A seguir à Batalha de Alcàcer Quibir, a Batalha de La Lys foi o maior desastre militar português, por mais ilustrações de heroísmo que o houve, a realidade é bem crua, triste.
Desde a entrada de Portugal na guerra até à assinatura do Armistício, a 11 de Novembro de 1918, Portugal mobilizou mais de 75.000 homens para a Flandres.
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