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Programa de Estabilidade terá lista de investimentos, com compromisso de montantes e calendário para execução. Em causa a áreas sociais mais afetadas pelos cortes, como a saúde.
JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR
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As últimas semanas foram de tensão crescente à esquerda, sobretudo do Bloco, que não quer ver no Programa de Estabilidade um défice abaixo do orçamentado em outubro, quando vários serviços públicos se queixam de falta de meios para funcionarem de forma eficiente ou até de serviços parados. O tom de crispação entre a “geringonça” aumentou publicamente, mas nem por isso o Governo cedeu nas metas. A resposta virá por outro lado, no Programa de Estabilidade entregue esta sexta-feira no Parlamento: uma lista de investimentos estruturantes, com montantes específicos para cada obra e um calendário de execução concreto.
O Programa foi aprovado esta quinta-feira, numa reunião do Conselho de Ministros que demorou sete horas e onde o documento que o Governo tem de entregar em Bruxelas até ao final deste mês ocupou a maior parte do tempo. No Programa que Mário Centeno apresenta esta sexta, vai constar uma lista de investimentos considerados prioritários pelo Governo que pretende dar respostas concretas em áreas sectoriais com um compromisso temporal para a execução assumido e escrito, segundo apurou o Observador. Uma das áreas é a da Saúde, por exemplo, e ainda esta semana o ministro das Finanças foi confrontado no Parlamento com a falta de condições na ala pediátrica do Hospital de São João, no Porto.
Na lista estarão investimentos que já foram anunciados, alguns deles já com a obra adjudicada ou em fase de concurso público, como é o caso do novo Hospital Lisboa-Oriental com que o Governo prevê gastar mais de 400 milhões de euros até 2023. Na área da Saúde estão outras obras, como a do Hospital de Évora (mais de 150 milhões de investimento até 2021) ou o do Seixal (mais de 50 milhões até 2022). A novidade maior é mesmo o compromisso com um prazo de execução e um montante para investimento, em projetos que a esquerda tem insistido. No caso do Hospital de Évora, ainda no início do ano o PCP exigiu que a obra avançasse até ao final deste legislatura. E no BE, Catarina Martins fez recentemente a mesma exigência em relação ao Hospital do Seixal, por exemplo.
A falência dos serviços públicos é uma das críticas centrais que a esquerda à esquerda do PS faz ao Governo liderado por António Costa. BE e PCP sempre disseram não comungarem das metas orçamentais assumidas pelo país junto de Bruxelas. Os dois partidos consideram que as exigências comunitárias cortam qualquer ambição nacional de investimento nos serviços públicos, sobretudo na saúde e na educação. A posição fez até o Bloco de Esquerda vir ameaçar, esta semana, com “instabilidade” na maioria parlamentar, caso o Governo apertasse mesmo no Programa de Estabilidade a meta de défice para este ano, em relação ao que estava no Orçamento do Estado. A diferença é de quatro décimas: 0,7% que vêm no Programa de Estabilidade, contra os 1,1% de défice que ficaram no Orçamento que a esquerda aprovou em outubro.
Um esticar de corda que pode resultar num projeto de resolução sobre o Programa de Estabilidade, que o Bloco de Esquerda não tem excluído nestes últimos dias de escalada de críticas contra Mário Centeno. O que isso significa? Que o Bloco tomaria uma posição pública, através de uma iniciativa parlamentar que tem o valor de recomendação ao Governo, contra o Programa de Estabilidade ou de, pelo menos, parte dele. Consequência prática? Nula, porque mesmo que fosse aprovado (e seria muito improvável), não seria mais do que uma recomendação. Valor político? Significativo, já que o Bloco nunca o fez, relativamente a um Programa de Estabilidade, desde que a “geringonça” é “geringonça”. É sempre importante lembrar que, em 2011, foi assim que caiu um Governo, o segundo de José Sócrates, embora o clima político seja hoje bem diferente do de um país à beira do resgate financeiro.
No PS e no Governo esta subida de tom do Bloco de Esquerda é visto como um efeito direto do clima eleitoral que já se começa a preparar. “O Bloco tem de dar sinal para a parte do eleitorado mais à esquerda”, diz um destacado socialista convencido de que os partidos que apoiam o Governo no Parlamento estão cientes de que provocar agora uma crise política não era do interesse de nenhuma das partes. Esta quinta-feira, confrontado pelos jornalistas com a ameaça da esquerda, o líder parlamentar socialista disse que tanto os comunistas como os bloquistas conhecem as consequências de um deslize nas contas públicas, fruto de um afrouxar da consolidação orçamental. No dia anterior tinha falado de “entusiasmo juvenil” dos dois partidos e avisava: “Não se pode dar um passo maior do que a perna”.
No lado do PCP, o Programa de Estabilidade é desvalorizado, o que explica a posição mais recuada dos últimos dias face ao Bloco de Esquerda. Os comunistas nunca fariam um ultimato, já que a sua posição é de discordância total de uma programação orçamental espartilhada por ditames comunitários. Ou seja, as críticas deste parceiro do Governo centram-se na forma, nem chegam ao conteúdo propriamente dito, ainda que todos estejam em uníssono quanto a queixas sobre o que consideram ser a falência do Estado e, neste ponto, o alvo central é Mário Centeno.
A posição do ministro das Finanças começou a ser cercada de forma mais vincada pelo Bloco de Esquerda nas últimas semanas, com figuras de topo da bancada parlamentar a aproveitarem uma frase do ministro da Sáude para instalarem nas redes sociais uma frente de oposição ao ministro Centeno. Adalberto Campos Fernandes disse “somos todos Centeno”, garantindo solidariedade orçamental com o responsável pelas Finanças, e vários deputados do Bloco logo inauguraram um hashtag #nãosomostodoscenteno. Foi utilizado no Twitter para marcar posição face a polémicas como a do apoio à artes, por exemplo, mas não só.
Nem só na esquerda esta fricção existe. Dentro do Governo, os ministros das áreas setoriais manifestam, dentro de portas, uma incompreensão semelhante à dos parceiros parlamentares. Nomeadamente em matéria de ajustamento orçamental. E isto quando exigem reforço de dotação para as áreas que têm a cargo e veem as Finanças não aproveitarem a folga orçamental deixada, por exemplo, no último ano: o défice foi de 0,92% (sem contar com a capitalização da Caixa Geral de Depósitos), quando a meta prevista no Programa de Estabilidade entregue em abril de 2017 era 1,4%. A preocupação foi manifestada publicamente pelo porta-voz do PS, João Galamba, que veio dizer que “em 2018 e 2019, o país dispensa brilharetes”, ou seja, a postura orçamental do Governo deve atender ao investimento público e não em ir além das metas estabelecidas com Bruxelas.
Governo não recua na meta do défice mas a redução é diminuta
A necessidade de cumprir as regras orçamentais europeias, que impõe que o défice estrutural continue a descer até Portugal atingir um saldo estrutural positivo na ordem dos 0,25% do PIB, tem sido a justificação dada pelo Governo aos partidos à esquerda para a necessidade de apertar mais o cinto.
No ano passado, o défice ficou significativamente abaixo do previsto no Orçamento do Estado (1,6% do PIB) e até da meta revista no Programa de Estabilidade (1,4%).
A redução do défice – excluindo o impacto do aumento de capital da Caixa Geral de Depósitos – foi de tal ordem que o défice ficou pelos 0,92% do PIB, menos do que o previsto para este ano, 1,1% do PIB.
Depois do bom resultado de 2017, e devido às obrigações de Bruxelas, o Governo indicou aos partidos que iria rever a meta de 0,9% para 0,7%, mas esta redução de duas décimas não caiu bem à esquerda.
No entanto, a redução prevista no défice que foi comunicada aos partidos é residual: de apenas 295,6 milhões de euros face ao ano anterior, sendo que mais de 40% desta redução deve-se a uma queda nos custos que o Governo está a prever ter com os juros da dívida pública. Sem contas com estes encargos, a redução do défice seria de apenas 168,2 milhões de euros, num cenário em que o Governo está a contar com um aumento na receita fiscal acima do previsto, mesmo com a redução negociada no IRS.
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