Translate

domingo, 1 de abril de 2018

Ladrões de Bicicletas


Descrucificar

Posted: 31 Mar 2018 07:26 PM PDT

«Numa entrevista de 1978, Eduardo Lourenço mostrou a verdade da nossa condição, na própria referência cristã: "Cristo é o momento (sem limite de tempo) em que a humanidade tomou forma humana. (...) Foi crucificado, não por querer ser deus, mas por ensinar o que era ser homem. Dois mil anos passaram sem que esquecêssemos nem aprendêssemos a lição".
(...) A cruz, a sentença de morte mais bárbara e cruel, fazia parte do mundo que Jesus queria mudar. (...) Ao contrário do que se repete há séculos, Jesus Cristo não desejou nem santificou a cruz. Alterou-lhe, porém, a significação de forma radical. Foi-lhe imposta, num julgamento iníquo, por ele recusar trair o seu projecto. Tornou-se, deste modo, o símbolo da fidelidade inquebrantável, o signo da extrema generosidade. A presença de sinais da cruz, desde o baptismo até à morte, diz que é preciso dizer não à crucifixão da vida e dizer sim à generosidade libertadora, no dia-a-dia.
Tudo isto vem confirmado no trecho do Evangelho (...): estava Jesus sentado junto ao mar da Galileia e uma grande multidão veio ter com ele e lançou-lhe, aos pés, coxos, aleijados, cegos, mudos e muitos outros. Se o mestre fosse um pregador de sacrifícios dizia-lhes: estais mal? Ainda bem. Assim podeis santificar-vos e, um dia, sereis muito felizes no céu. (...) Jesus não acreditava nessa mística. Curou-os e organizou, com pouca coisa, um grande banquete popular. (...) Poder-se-á dizer: porque não deixou a fórmula? Seria uma alternativa muito barata dos serviços de saúde, públicos e privados. Mas ele não veio para nos substituir. (...) A sua prática é um desafio à imaginação de todos os homens e mulheres, de todos os tempos, a usarem os seus talentos, as suas capacidades, não para cavar distância entre ricos e pobres, mas para as eliminar, pois não suporta ver uns à porta e outros à mesa, uns em banquetes requintados e outros na miséria.»
Frei Bento Domingues, Jesus nasceu para descrucificar
A propósito deste excelente texto de Frei Bento Domingues, publicado em dezembro do ano passado e que surge em vivo contraste com a liturgia dominante da culpa e do sacrifício, lembrei-me de uma intervenção de Miguel Baptista Pereira numa edição dos Encontros de Filosofia, em Coimbra, nos anos noventa. Questionado sobre que noção de «Homem» atravessava o pensamento marxista, o então professor na Faculdade de Letras referiu-se ao «Homem das dores», às vítimas da injustiça, do sofrimento, da desigualdade e da opressão, perante as quais o marxismo se assumia como projeto emancipatório (ou, regressando ao cristianismo e a Frei Bento Domingues, de descrucificação).

Organograma

Posted: 31 Mar 2018 12:47 PM PDT

Sanitários públicos em Alcochete

Sem comentários:

Enviar um comentário