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quarta-feira, 25 de abril de 2018

O DESAFIO DE JÚDICE

por estatuadesal

(Virgínia da Silva Veiga, 24/04/2018)

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José Miguel Júdice defendeu ontem que “antigos ministros da Justiça, grandes figuras da advocacia e grandes políticos portugueses” deviam tomar posição crítica sobre as reportagens televisivas em que a SIC transmitiu partes de inquéritos a testemunhas e arguidos do processo qualificado como “Operação Marquês”.

O ex-Bastonário da Ordem dos Advogados, que falava no âmbito da rubrica semanal “Porquê?”, por si protagonizada na TVI, considerou “de uma gravidade extrema” a emissão dos programas, criticando a reacção da Ministra da Justiça e da Procuradora Geral da República que considerou “moles”.

Argumentando ser o acto de emissão não autorizada de imagens de interrogatórios “lamentável, criminoso e não tolerável”, defendeu não poder haver tolerância “porque é um crime e quem participa em crimes comete crimes” – disse.

“Infelizmente não temos uma cultura cívica de cidadãos tão forte como devíamos ter” – concluiu depois de afirmar que “o voyeurismo” das filmagens não tem nenhuma utilidade para a investigação criminal”.

Posição próxima do ex-Bastonário da Ordem dos Advogados foi igualmente defendida pelo actual e pela própria Ordem.


TRANSCRIÇÃO

- Eis, em resumo, o que disse o Ex-Bastonário da Ordem dos Advogados, posição idêntica à da Ordem dos Advogados, do actual Bastonário e do Conselho Distrital de Lisboa do mesmo organismo. Pela veemência e porque, certamente, suscitará uma salutar discussão, transcreve-se na íntegra:

“Estou estupefacto. Não quero acreditar que a televisão do Dr. Balsemão tenha feito aquele programa. Li ou vi um debate de jornalistas, a semana passada - creio que na Sexta-feira -, e um jornalista – não vou dizer o nome -, que sabe seguramente do que fala, terá dado alguma explicação: como a Impresa, essa empresa que se chama Impresa, está com as suas dificuldades e, aparentemente parece que este tipo de programas têm imenso sucesso em audiência, embora eu tenha sabido, foi na Segunda-feira em que eu estava aqui [na TVI] [o jornal das oito manteve a liderança] e o meu programa foi capaz de aguentar aquela pressão de “voyeures”.
Claro que sim, que acho que é uma perda de tempo para muitos eu estar aqui a criticar isto, porque há muitas pessoas que acham que José Sócrates já devia estar condenado, condenado, já devia era estar metido na cadeia; que se lixem os direitos, que se lixe os Direitos Fundamentais. Mas para quem não pensa assim – e acho que ninguém devia pensar assim -, isto é realmente, verdadeiramente grave.
E é verdadeiramente grave, porquê? Porque, embora se siga e continue o que se vê noutros países - no Brasil o juiz Moro mandou para os jornais as escutas, sem usar subterfúgios que se usam aqui, as escutas de Lula, aqui há uns tempos -, e isto é grave, aprende-se com os erros dos outros em vez de se aprender com as coisas bem-feitas.
E também há pessoas que julgam que os fins justificam os meios.
Eu não acho assim.
Eu acho que isto é de uma gravidade extrema. Em primeiro lugar porque é um crime e quem participa em crimes comete crimes. E não me venham com a necessidade da comunicação e da informação porque ali a única coisa que importava era tentar esmagar e humilhar uma pessoa que está na pior posição que pode estar que é a ser interrogado sem saber exactamente porquê, por pessoas que são agressivas – neste caso, até o juiz de Instrução o é -, portanto, eu acho que isto é muito grave, mas é outra vez uma coisa muito parecida com aquilo que estávamos a falar, isto é: para os portugueses, e por isso os políticos não reagem … Eu fico estupefacto de ver uma reacção molzinha da Ministra da Justiça; a Procuradora Geral da República disse “Ah!, isto não pode acontecer”.
Não vai dar em nada!
Eu gostaria de ver antigos Ministros da Justiça, grandes figuras da advocacia, grandes políticos portugueses a virem criticar isto, a virem censurar a televisão do Dr. Balsemão por o que ela fez. Agora: os portugueses são tolerantes, sabe?, os portugueses acham que não vale a pena, as coisas não devem ser ditas com muita clareza. Os portugueses, no fundo, indignam-se um bocadinho mas passados dois dias já ninguém se indigna mais. Porquê? Porque enquanto não se passa connosco ninguém dá muito valor. Agora, quando algum estivesse metido naquela situação e isto lhe acontecesse, ele veria exactamente o que isto tem de horrível.
Eu nunca me esqueço do Fernando Negrão me ter dito há muitos anos – ele tinha tido uns problemas, tinham dito que tinha violado o Segredo de Justiça -, ele disse (ele era juiz, ele é juiz): “eu nunca tinha sido constituído arguido”. Ele disse-o com muita seriedade: eu hoje sei melhor o horrível que é ser investigado, o horrível que é ser constituído arguido”.
Ora bem, por isso é que eu dizia que as pessoas em vez de irem para a tropa deviam ser presas algum tempo, para perceberem o que custa ser preso.
Judite de Sousa interrompe - Mas quando há matéria de investigação …
Júdice retoma – Ah, sim, matéria para investigação. Mas, matéria para investigação é uma coisa, agora o “voyeurismo” das filmagens, que ele [José Sócrates] não autorizou que fossem divulgadas , que não têm nenhuma utilidade para a investigação criminal, é de uma gravidade extrema e eu não queria deixar de dizer.
Não queria deixar de o dizer e tê-lo-ia dito também se fosse cm vocês [a TVI]. Não podia deixar de dizer que isto é lamentável, é criminoso e não pode ser tolerado.
Afinal, eu estive neste programa a falar de tolerâncias, de revoltas, de raivas e depois fica tudo mais ou menos na mesma.
Nós somos um país. Infelizmente, não temos uma cultura cívica e de cidadania tão forte como devíamos ter.

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