Hoje às 00:04
Das telecomunicações à energia, a privatização das melhores empresas portuguesas serviu os interesses de bancos e escritórios de advogados, alimentou a especulação bolsista e uma clique de administradores habituados aos corredores do poder. O que tantas vezes foi apresentado como prova da excelência empresarial eram, na verdade, lucros fáceis de empresas em regime de quase monopólio, beneficiárias de rendas à medida.
Há de tudo no cadastro das privatizações, mas ninguém terá beneficiado mais deste rentismo parasita que os acionistas da EDP. Adensam-se agora as suspeitas de corrupção a olear a porta giratória entre interesses públicos e privados. O maior suspeito é Manuel Pinho, o ex-ministro do PS que mudou as regras dos CMEC para favorecer ainda mais a EDP. Criados em 2004, sob um Governo PSD/CDS, e em vigor desde 2007, estes contratos garantiram uma receita de 2500 milhões de euros a favor da EDP, financiado pelos consumidores de eletricidade. Destes, segundo a própria Entidade Reguladora, 510 milhões terão sido cobrados indevidamente.
Passaram-se dez anos e os partidos que partilharam o poder e apoiaram a privatização da EDP continuam sem fazer uma avaliação crítica do processo. PS, PSD e CDS travaram sistematicamente as iniciativas do Bloco e do PCP para combater as rendas excessivas, desde a proposta de revisão dos CMEC em 2011 até à criação de uma contribuição extraordinária sobre as rendas das renováveis no Orçamento do Estado para 2018.
Da Justiça, espera-se que faça rapidamente o seu caminho quanto às acusações de corrupção, nomeadamente a Manuel Pinho. Mas há um processo político que não pode esperar mais e que tem de ser consequente: as rendas da energia são abusivas e lesivas para os interesses do país. Devem ser eliminadas.
Este Governo faz mal se optar pela posição medrosa que já vimos antes, nomeadamente de Passos Coelho, que afastou o secretário de Estado da Energia Henrique Gomes por querer concretizar um corte nas rendas.
Não chega rever os pagamentos dos CMEC. É preciso pará-los, e há base para o fazer. O Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República já emitiu dois pareceres, homologados pelo Governo, em que estabelece a nulidade das decisões de Manuel Pinho na redefinição dos CMEC: estes contratos constituem um tributo cobrado diretamente aos consumidores, que teria de ser decidido e votado no Parlamento. A sua elaboração a partir dos gabinetes ministeriais foi considerada "usurpação de poder", o que justifica a sua nulidade.
Suspender os pagamentos à EDP baseados nos CMEC é um primeiro passo de coragem, a que se deverão seguir outros. Teremos ainda, nesta legislatura, oportunidade de votar outras medidas de combate às rendas da energia. Esperemos que o escrutínio público e a visibilidade deste processo sirvam para que PS, PSD e CDS não as travem mais uma vez.
DEPUTADA DO BE
Sem comentários:
Enviar um comentário