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terça-feira, 26 de junho de 2018

Não ter o PSD na mão, nem mão no PSD

Opinião

Não ter o PSD na mão, nem mão no PSD

Paulo Baldaia

Hoje às 00:57

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A guerrilha que é feita pelo grupo parlamentar do PSD ao seu presidente era expectável porque Rui Rio não era, não é, nem vai ser o líder da maioria daqueles deputados. A maioria daqueles deputados também vai deixar de ter lugar na Assembleia da República, depois das eleições do próximo ano, e é por isso que faz tantas tropelias. Por não ser líder de alguns maus deputados foi possível assistir à falta de vergonha desses eleitos que mudaram de posição numa matéria que apelava exclusivamente à consciência de cada um e para a qual a liderança do partido tinha dado liberdade de voto. Fizeram-no para derrotar Rio, derrubando as suas próprias convicções, mas concederam-lhe a vitória de demonstrar que a liberdade é sempre o bem maior, mesmo quando há gente que tudo faz para parecer que não a merece. Foi assim que a eutanásia não passou no Parlamento.

Acontece que a descoordenação entre Rui Rio e alguns dos que ele próprio escolheu, como bem notou Marques Mendes, é que tem feito história nos últimos tempos. Não é a guerrilha dos que esperam por Luís Montenegro ou por outro qualquer. Nos episódios da carreira dos professores, do adicional do ISP e do Orçamento, Rui Rio tem razão em todos, mas todos revelam que Rui Rio ainda não conseguiu afirmar a sua liderança.

Rio tem razão quando olha para o conflito entre os professores e o Governo, por causa da contagem do tempo para efeitos de progressão na carreira, e procura resistir à tentação populista de ficar ao lado dos sindicatos para causar embaraço ao Executivo. A carreira dos professores é bem diferente das restantes da Função Pública e isso aconselha prudência por causa do aumento de despesa fixa com salários. Não são as centenas de milhões de euros com impacto no primeiro orçamento, são as centenas de milhões em todos os orçamentos seguintes. A verdade é que os ziguezagues sociais-democratas foram protagonizados pelo vice-presidente David Justino e pelo líder parlamentar, Fernando Negrão.

A demagogia com que se aprovou na generalidade o projeto-lei do CDS para acabar com o Adicional do Imposto sobre produtos petrolíferos é ainda mais confrangedora. Ao que se sabe, a liderança parlamentar estava ciente da recusa do presidente do partido em entrar por estes caminhos mas, mesmo assim, preferiu dar a mão ao CDS para receber do CDS uma mãozinha. Por causa da lei travão, nenhuma diminuição de receitas poderá entrar em vigor na vigência do atual Orçamento, sem a aceitação do Governo. Mesmo que o adicional terminasse, não há nenhuma garantia de que isso tivesse reflexo no preço dos combustíveis. Por exemplo, o IVA para a restauração baixou e os preços não desceram. Uma vez mais, para embaraçar o Governo, o PSD contraria a vontade do presidente e dá um tiro no pé.

A questão da viabilidade do Orçamento do Estado é menos embaraçante, mas revela igualmente que, na ausência de uma liderança forte, todos sentem que lhes basta dizer publicamente o que pensam, sem cuidar de perceber qual é o pensamento do presidente. Silva Peneda é o porta-voz do PSD para a área da solidariedade, não das finanças ou da economia, mas é mais um caso desnecessário. Peneda diz que o PSD deve dar a mão ao PS e negociar com os socialistas se lhes falhar a Esquerda na aprovação do Orçamento para 2019. Uma vez mais, é Rio quem tem razão. Se António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa já determinaram que haverá eleições antecipadas, caso a Esquerda não aprove o documento, é um erro tentar ajudar quem não quer ser ajudado. Tanto mais que revela um receio de partir para eleições antecipadas.

Temos, portanto, que uma coisa é não ter o partido na mão. Há um poder instalado que não quer perder os lugares e é natural que estrebuche. Faz parte da vida, é natural e até é saudável que formas tão distintas de estar na política colidam. Outra coisa é não ter mão no partido. Aí Rui Rio ainda tem caminho para fazer no PSD, se quiser um dia liderar os destinos do país.

* JORNALISTA

Fonte: JN

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